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Cristãos pelo Socialismo no Governo de Salvador Allende:  Chile 1970-1973
Cristãos pelo Socialismo no Governo de Salvador Allende:  Chile 1970-1973
Cristãos pelo Socialismo no Governo de Salvador Allende:  Chile 1970-1973
E-book372 páginas4 horas

Cristãos pelo Socialismo no Governo de Salvador Allende: Chile 1970-1973

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Sobre este e-book

Um estudo pormenorizado acerca da experiência do movimento Cristãos pelo Socialismo que surgiu e atuou durante o governo de Salvador Allende, no Chile, entre os anos 1970 e 1973. O texto nos permite aprofundar o debate acerca da relação fé e política, tanto quanto acerca dos conflitos dos projetos de sociedade e Estado entre as classes sociais de interesses econômicos e políticos oponentes. A leitura poderá resultar em uma inquietante reflexão sobre a relação entre fé e política, utopia e realidade, teoria e prática transformadora.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento22 de ago. de 2023
ISBN9786525294650
Cristãos pelo Socialismo no Governo de Salvador Allende:  Chile 1970-1973

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    Cristãos pelo Socialismo no Governo de Salvador Allende - Marco Arroyo

    CAPÍTULO I – O GOVERNO DE SALVADOR ALLENDE COMO MARCO HISTÓRICO DOS CRISTÃOS PELO SOCIALISMO

    Porque de esta vez no se trata

    de cambiar un presidente

    será el Pueblo que construya

    un Chile bien diferente

    Quilapallún

    I. ANÁLISE DA CONJUNTURA SOCIOPOLÍTICA E ECONÔMICA DA AMÉRICA LATINA NA DÉCADA DE SESSENTA

    Neste capítulo, procuramos demarcar o contexto sociopolítico em que surgiu o movimento Cristãos pelo Socialismo no Chile durante o governo de Salvador Allende. Entretanto, para melhor entender o governo de Allende, os conflitos sociopolíticos e econômicos desencadeados nesse contexto e que motivou o surgimento dos Cristãos pelo Socialismo, começaremos com uma necessária análise de conjuntura da América Latina na década de 1960. Essa análise visa não apenas servir como marco histórico dos acontecimentos que estudamos, mas também visa ajudar-nos como chave de interpretação na medida em que se compreendam os movimentos históricos de maneira dialética, como o resultado de mediações materiais criadas entre a luta dos interesses políticos e econômicos de agentes sociais antagônicos. Nesse entendimento, o governo de Salvador Allende, assim como o surgimento e a atuação do movimento Cristãos pelo Socialismo, deve ser compreendido dentro do conflito de interesses entre o imperialismo norte-americano e o avanço do socialismo e o permanente conflito de classes na sociedade chilena.

    A década de 1960 está marcada na América Latina por uma acentuada crise sociopolítica e econômica. Na década de 1930, os países de economia agroexportadora começavam a industrializar-se na dependência do capital multinacional. Os governos acentuadamente populistas, baseados na propaganda do nacionalismo desenvolvimentista, prometiam garantias sociais para a classe trabalhadora e esplendorosos lucros para as oligarquias.

    As oligarquias agrárias, com ajuda da mecanização, dos avanços tecnológicos e do capital multinacional, não encontravam grandes dificuldades para se transformarem na nova burguesia industrial. Abandonava-se a produção no campo, surgindo as massas de desempregados que seriam absorvidos pelo mercado de trabalho nos grandes centros industriais como mão de obra barata devido à falta de qualificação profissional. De maneira abrupta passava-se do modo de produção semifeudal concentrado na produção agrícola e na vida rural para o capitalismo industrial e suas formas de vida urbana. Nas cidades explodia o crescimento populacional reservando-se os luxuosos centros urbanos para a burguesia, enquanto nas periferias pululavam os bairros dos empobrecidos. Nascia a paisagem da miséria na periferia e no subúrbio das cidades.

    Desse novo modelo socioeconômico, na virada da década de 1960, conforme análise de Samuel Silva Gotay¹, podem verificar-se cinco situações particulares:

    • Nova dependência tecnológica e financeira.

    • Falta de elasticidade do mercado.

    • Conflito de interesses entre o Estado e a burguesia, que precisava de associação com o mercado multinacional.

    • Ruptura da aliança política e da paz industrial, produto da inflação e da aplicação das restrições do FMI e organismos afins.

    • Aprofundamento das tensões sociais pelo crescimento do desemprego e a falta de garantias sociais para os movimentos migratórios vindos do campo para a cidade.

    Já nesses cinco elementos levantados por Gotay, percebe-se a dependência dos países latino-americanos em relação à tecnologia e à economia estrangeira. Percebem-se os conflitos entre a burguesia e o Estado e as tensões sociais provocadas pelo descontentamento das camadas populares mais afetadas pelo modelo industrial em crise. Há também uma crescente interferência do FMI nas decisões políticas e econômicas nos países dependentes.

    Conforme Gotay, a crise da década de sessenta na América Latina manifestava os seguintes processos:

    • Estagnação econômica. O crescimento per capita anual do produto nacional bruto baixa de 2,2% em 1951/1955 para 1,5% em 1960/1965 e para 0% em 1965/1966.

    • Marginalidade da população rural pela estrutura de propriedade da terra que tornava impossível a produção industrial para a alimentação da população rural e para sustentar a população urbana (a Guatemala chega a importar milho). Isso lançará ondas de camponeses nas cidades formando os cinturões de miséria, as favelas, as cidades perdidas e os subúrbios em redor das grandes cidades.

    • Marginalidade da população trabalhadora das cidades. A dependência da tecnologia estrangeira e a desnacionalização da indústria levarão à contínua diminuição de mão de obra e ao consequente aumento do desemprego nas cidades. O emprego nas indústrias baixará de 27,8% em 1950/1960 para 22% no período de 1960/1965.

    • Desnacionalização econômica, tecnológica e cultural. A estagnação da indústria latino-americana nos anos cinquenta pela penetração do capital norte-americano, a compra de indústrias latino-americanas, a dependência tecnológica, a aceitação das condições dos prestamistas, especialmente o Fundo Monetário Internacional e depois a Aliança para o Progresso, leva à desnacionalização cultural e à desnacionalização política-militar, à descapitalização da América latina e, finalmente, ao aumento da dívida externa e a uma perigosa situação no balanço de pagamentos. Paradoxalmente, quando chega ao fim o período do nacionalismo econômico da América Latina, o capital estrangeiro tem uma posição predominante sobre o nacional. A isso é preciso acrescentar que essas corporações estrangeiras vêm usufruir das vantagens de baixos custos de consumo de energia (eletricidade e petróleo nacional) e de proteção do mercado interno, desenhado décadas antes para fomentar e proteger a indústria nacional. Com a tecnologia estrangeira transfere-se a atenção da educação técnica e profissional para a literatura e universidades estrangeiras, deixando de lado a nacional e, com isso, a definição de problemas e soluções técnicas para o desenvolvimento nacional.

    • A desnacionalização dos exércitos. Esse processo começou com a Ata de Chapultepec da Conferência sobre a guerra e paz de 1945; foi confirmado pelo Tratado Interamericano de Assistência Recíproca no Rio de Janeiro em 1947 e com o estabelecimento da Organização dos Estados Americanos – OEA em 1948. Foi posto à prova no caso da Guatemala e na invasão da República Dominicana em 1965. Os exércitos são treinados no Canal do Panamá na doutrina da segurança nacional e na ameaça comunista como problema fundamental da civilização contemporânea segundo definição dos Estados Unidos. Essenciais a esta dependência são a integração dos exércitos em sistemas de defesa como o da América Central (CONDECA), a modernização dos exércitos através da venda de armamentos e a elaboração de uma cortina anti-insurreição².

    Esse acentuado processo de dependência vem estabelecer relações econômicas desiguais entre os países do Terceiro e Primeiro Mundo.

    Fica-se sabendo pela literatura da época e pelas informações da UNCTAD, dos países não alinhados e dos organismos da ONU, que 15% da população mundial (os países ricos) usavam para o seu desenvolvimento 85% dos recursos enquanto os países pobres só podiam usar para mitigar sua fome 15% dos recursos do mundo ³.

    Essa realidade nos revela uma perversa ordem nas relações internacionais em que os países ricos ficam cada vez mais ricos e os países pobres, cada vez mais pobres.

    Para as classes dominantes dos países pobres, únicos beneficiados com esse sistema, essa é a ordem natural das coisas, e na medida em que os ricos ficam mais ricos, os pobres naturalmente não serão beneficiados. Para os setores mais liberais da burguesia, a única saída para superar o crescente quadro de miséria é a adoção de reformas sociais que possam garantir alguns benefícios aos empobrecidos, uma falida iniciativa liberal para humanizar o capitalismo. Entretanto, as forças populares avançam na compreensão das verdadeiras raízes dos problemas desse sistema, insuflando os movimentos revolucionários como alternativas para combater a perversidade do sistema capitalista. No terreno da teoria política, as ciências sociais, baseadas no instrumental de análise marxista, irão jogar um papel fundamental não só na compreensão teórica dos problemas sociopolíticos e econômicos, mas especialmente na definição da ação revolucionária necessária para superar o sistema de dependência e exploração. Surge assim a teoria da dependência.

    Esta teoria assinalaria o fato de que não é correto que os países subdesenvolvidos possam voltar a passar historicamente pelos mesmos processos que os países desenvolvidos, porque estes últimos se desenvolveram como produto da colonização imperialista das economias dependentes das quais extraíam as matérias-primas e transferiram o capital produzido por uma mão-de-obra cujo custo de reprodução era mínimo. Esta ciência descobre que historicamente o subdesenvolvimento é produto do desenvolvimento dos países capitalistas que foram despojando os países do chamado terceiro mundo ou mundo explorado. Assim elaboram um novo entendimento do problema do subdesenvolvimento do processo histórico do imperialismo. Daqui provém a única estratégia possível para extirpar a dependência constante do subdesenvolvimento: a libertação das ataduras da economia estrangeira⁴.

    Gotay nos apresenta uma ampla bibliografia de cientistas sociais que trabalharam com essa teoria⁵.

    É necessário entender que essa teoria não é desenvolvida de maneira desvinculada de uma práxis revolucionária. Muito pelo contrário, o processo de produção teórica se dá de maneira dialética. O conhecimento revolucionário desenvolve-se entre a teoria e a prática e vice-versa. Do mesmo modo, a práxis dos movimentos revolucionários compreende os problemas dos países empobrecidos como o resultado de uma relação dialética entre os interesses: império-nação e burguesia-proletariado. Conclui-se, portanto, que o conhecimento acerca da realidade deve ser aplicado na geração de mudanças estruturais na sociedade e assim é colocada como tarefa fundamental a libertação dos povos do domínio imperialista e das burguesias nacionais.

    Diante desta situação de estagnação, marginalização, dependência, exploração, aumento da miséria e de repressão na América Latina, a revolução cubana surge como a única alternativa viável para romper o núcleo causal do subdesenvolvimento: a dependência⁶.

    De maneira diferente do que Gotay, nesse ponto, compreendemos que a Revolução Cubana é um marco histórico fundamental para os movimentos revolucionários na América Latina, entretanto, ela não pode ser defendida como a única alternativa para acabar com a dependência política e econômica dos povos. Em primeiro lugar, como mostraremos nesse trabalho, no Chile, Salvador Allende desde 1952 defendia a via eleitoral e democrática para acabar com a dependência do imperialismo e a exploração das classes dominantes. É verdade que, como veremos mais tarde, a estratégia política de Allende não chegou a implantar mudanças radicais como sugeridas durante a campanha eleitoral. Em segundo lugar, hoje temos um melhor conhecimento acerca dos riscos enfrentados por Cuba na sua dependência da economia da antiga União Soviética e do abastecimento do petróleo. Entretanto, isso não tira o mérito de Cuba representar de fato, para uma grande parcela dos movimentos revolucionários na América Latina, uma verdadeira fonte de inspiração.

    Dos vários movimentos de caráter revolucionário que surgiram na América Latina, durante a crise sociopolítica e econômica na década de 1960, Gotay nos ajuda a localizar os mais importantes:

    • "A resistência popular à tentativa de golpe militar no Brasil em 1961.

    • A instalação do movimento guerrilheiro na Guatemala, entre 1961 e 1963, como resultado de uma série de levantes provocados pela radicalização dos setores militares, e ampliação da resistência armada nas cidades.

    • Na Nicarágua, a formação da frente Sandinista de Libertação Nacional, em 1961, e a instalação do movimento guerrilheiro.

    • O início, em 1962, do movimento insurrecional na Venezuela, que consegue unificar o movimento de esquerda revolucionário e o partido comunista, através de ações de guerrilhas urbanas e rurais.

    • O novo caráter assumido pelo movimento camponês na Colômbia que culmina em 1964 com os acontecimentos de Marquetalia e o surgimento das guerrilhas, com um caráter insurrecional, comandado no sul por Marulanda, membro do PC colombiano, e no norte pelo Exército de Libertação Nacional, dirigido por Fábio Vásquez Castaño, que começa suas ações em 1964.

    • O movimento camponês no sul do Peru, dirigido por Bianco e o surgimento do FIR (Frente Esquerda Revolucionária), a formação do Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR) que representava uma tentativa de superação do PARA rebelde e que, posteriormente, em 1965, inicia ações guerrilheiras no centro e no sul do país.

    • Além disso, houve tentativas guerrilheiras, embora frustradas, no Paraguai, Argentina, Equador e Brasil, entre 1960 e 1963.

    • O surgimento, em praticamente todos os países, de organizações de esquerda com o claro objetivo de preparar a insurreição"⁷.

    No caso chileno, como já fora mencionado, mesmo desde 1952, quando surge pela primeira vez a candidatura de Salvador Allende apoiado por minoritárias forças de esquerda, iria desenvolver-se, paulatinamente, um importante movimento revolucionário fundado num ideário da via pacífica ao socialismo.

    O modelo e a via revolucionária defendida no Chile será bem diferente do que em Cuba. Tal movimento seria liderado pelos partidos comunista e socialista. Desde 1952, esse movimento foi crescendo significativamente, concorrendo, sucessivamente, em quatro pleitos eleitorais com Salvador Allende como candidato à presidência da República, até se obter a vitória em 1970.

    Em 1958, a burguesia e o imperialismo levaram o primeiro susto com a candidatura de Allende. Nessa oportunidade Allende perdeu as eleições por causa de uma astuta jogada de marketing eleitoral executada pela direita. E em 1964, Allende perdeu por ampla margem de votos para Eduardo Frei, devido, basicamente, à ajuda econômica que recebera dos Estados Unidos para financiar sua campanha eleitoral e, também, devido ao astuto discurso eleitoral reformista, que prometia uma revolução em liberdade, com o qual conseguiu o voto da classe média favorável às reformas, de importantes setores obreiros e camponeses e da massa mais despolitizada do país.

    O certo é que o movimento iniciado com Allende em 1952 atravessaria toda a década de 1960 com suas crises, descontentamentos populares e o avanço das forças revolucionárias, até que, em 1970, a vitória de Allende seria inevitável.

    II. A VITÓRIA DE ALLENDE E AS REAÇÕES DO IMPERIALISMO NORTE-AMERICANO

    No dia 4 de setembro de 1970, o povo chileno ia às urnas para eleger o sucessor do presidente Eduardo Frei, cujo mandato havia exercido desde 1964. Nessa eleição concorriam 3 candidatos: Radomiro Tomic do Partido Democracia Cristã, correligionário do presidente Eduardo Frei, em final de mandato; Jorge Alessandri, do Partido Nacional coligado ao Partido Democracia Radical, que já havia derrotado Allende e governado no Chile entre 1958-1964; e Salvador Allende do Partido Socialista, apoiado por uma ampla coligação de partidos de esquerda denominada Unidade Popular. Do ponto de vista político e ideológico, Jorge Alessandri representava a direita conservadora, Radomiro Tomic as forças de centro e Salvador Allende a esquerda revolucionária.

    Apurados os votos, verificou-se o seguinte resultado:

    - R. Tomic = 27,8%

    - Alessandri = 35,3%

    - S. Allende = 36,5%

    Salvador Allende havia sido eleito pela vontade popular por uma maioria simples. Nesse caso a Constituição chilena determinava que se nenhum dos candidatos obtiver a maioria absoluta (50% mais 1), o Congresso Pleno, em Assembleia Conjunta da Câmara dos Deputados e do Senado, devia eleger entre os dois mais votados o novo presidente da nação.

    O Congresso mantinha uma firme tradição de confirmar, sempre que acontecia esse caso, a vontade popular, elegendo o primeiro colocado. Assim havia sido em 1958, quando Alessandri ganhara de Allende por estreita margem dos votos (por 32,2% a 28,5%), o Congresso o confirmara como presidente do Chile. Mas, dessa vez, mesmo não havendo impedimentos legais, corriam rumores de que o Congresso não confirmaria a vitória de Allende. O que poderia haver por trás desses rumores?

    O resultado eleitoral de 4 de setembro surpreenderia a comunidade internacional. A notícia foi recebida com grande alegria nos países do bloco socialista, especialmente em Cuba. Fidel Castro diria mais tarde:

    No Chile, pela primeira vez na história, uma nova experiência estava ocorrendo: a tentativa de realizar a revolução por meios pacíficos, por meios legais. E nesse esforço encontrou a compreensão e o apoio de todos no mundo, não apenas do movimento comunista internacional, mas de diferentes correntes políticas. Digamos que encontrou reconhecimento mesmo daqueles que não eram marxista-leninistas. E o nosso partido, o nosso povo – apesar de termos feito a revolução de maneira diferente – e todos os povos revolucionários do mundo apoiaram-na⁸.

    Não poderia ter sido diferente, como diria Fidel, tratava-se de uma experiência nova, a qual pela primeira vez na história ensaiava a transição do capitalismo para o socialismo pelas vias pacíficas, pelos caminhos legais, de tal modo que a experiência chilena seria conhecida como: a via chilena, a via pacífica, a via legal ou a revolução sem custo social.

    Essa experiência iniciava uma nova página na história do socialismo. Se as teorias marxistas sobre a revolução do proletariado admitiam outras vias de se passar do capitalismo para o socialismo sem ser necessariamente pela luta armada aos cuidados da ditadura do proletariado, a verdade é que nunca essas outras vias de transição haviam sido ensaiadas na história.

    Embora a vitória de Allende houvesse provocado simpatias no bloco socialista, as reações não seriam semelhantes nos países do bloco capitalista, especialmente nos Estados Unidos. Mais tarde, o embaixador norte-americano no Chile durante o governo de Allende, Nathaniel Davis, diria:

    Os resultados da eleição chilena foram recebidos com certa inquietação por parte de muitas capitais do hemisfério ocidental. Em Washington, ao que parece, Richard M. Nixon e Henry Kissinger ficaram furiosos. Kissinger, ao descrever a reação do presidente americano à votação do dia 04 de setembro, disse que Nixon ficou fora de si, acrescentando que o presidente responsabilizava o Departamento de Estado e o Embaixador Edward M. Korry pelos resultados. De acordo com Kissinger, Nixon também a partir de então resolveu ‘passar por cima da burocracia’ ⁹.

    E não era para menos, no meio da Guerra Fria e após a Revolução Cubana, a Guerra Fria era uma questão de vida e morte para o imperialismo norte-americano. Nesse contexto parecia até óbvio que a vitória de Allende provocasse inquietações nos países capitalistas. Por outro lado, a manifestação de fúria do presidente Nixon, que acusou o Departamento de Estado de incompetência em tratar assuntos considerados de segurança nacional e que também o responsabilizou ao embaixador norte-americano no Chile pelas suas informações desencontradas sobre a situação chilena, eram mostras de quão dependente o Chile havia se tornado da interferência do Tio Sam. Assim, desde que se soube a notícia da vitória de Allende, o imperialismo norte-americano acionaria, indiscriminadamente, métodos golpistas de intervenção no Chile a fim de impedir a confirmação da vitória de Allende por parte do Congresso Nacional e sua posterior posse

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