A Educação em Direitos Humanos na Pedagogia de Paulo Freire
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Sobre este e-book
Primeiramente, foram enumerados os princípios identificados na EDH, a partir da análise dos artigos selecionados, sendo relacionados a cada um deles os pressupostos identificados na pedagogia freireana, a partir da análise dos artigos e obras estudadas, de acordo com similaridades e relações observadas. Através desse estudo foi possível observar que a maior parte dos princípios da EDH se faz presente na pedagogia freireana, e que nesta perspectiva a concepção pedagógica de Paulo Freire apresenta uma defesa da EDH em seus pressupostos.
O livro trata de maneira simples tais princípios, permitindo a apropriação, o entendimento e por vezes a crítica aos modos como a educação tem sido conduzida no país, assim como provoca reflexões sobre a necessidade da inclusão desse debate na formação de professores. Assim, convidamos o leitor a mergulhar nesta análise, para conhecer e fortalecer a luta por uma Educação em Direitos Humanos.
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A Educação em Direitos Humanos na Pedagogia de Paulo Freire - Marta Mazetti Clemente Furtado
1. INTRODUÇÃO
O presente livro foi baseado na pesquisa que teve por objetivo observar as incursões da Educação em Direitos Humanos nas ideias de Paulo Freire, analisando possíveis semelhanças e convergências. Considerando que a pedagogia freireana assume forte posicionamento político, numa perspectiva de consciência crítica e luta pela libertação das classes oprimidas e, assim, de transformação social com vistas à promoção da dignidade humana, foram percebidas potenciais convergências com as ideias da EDH, e dessa forma partiu-se para uma reflexão acerca das relações entre a pedagogia de Paulo Freire e a Educação em Direitos Humanos.
A Educação se constitui como importante ferramenta de transformação social quando aliada aos Direitos Humanos. A relevância da EDH nesse sentido se dá na medida em que visa ao desenvolvimento de uma cultura de respeito, igualdade e paz, conforme Gorczevski e Tauchen (2008).
[...] a Educação em Direitos Humanos é essencialmente a formação de uma cultura de respeito à dignidade humana, através da promoção e da vivência de atitudes, hábitos, comportamentos e valores como igualdade, solidariedade, cooperação, tolerância e paz (GORCZEVSKI; TAUCHEN, 2008, p. 71).
Dessa forma, observamos que o processo educativo é muito mais do que mera transmissão de conteúdos, apreensão e construção de conhecimentos científicos. Para além da produção dos conhecimentos propriamente ditos, também é produtor de valores e atitudes capazes de contribuir para uma melhor qualidade de vida, possibilitando ressignificar e atuar diretamente nas relações humanas de forma positiva. Ainda segundo os mesmos autores, a Educação em Direitos Humanos visa […] o desenvolvimento da capacidade de perceber as consequências pessoais e sociais de cada escolha
(GORCZEVSKI; TAUCHEN, 2008, p. 73), ou ainda, […] o senso de responsabilidade e comprometimento com a mudança daquelas práticas sociais que violam ou negam os direitos de ser mais humano
(GORCZEVSKI; TAUCHEN, 2008, p. 73).
Em 2006 foi publicado no Brasil o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH), e conforme o portal do governo federal o documento consiste em
[...] uma política pública que consolida um projeto de sociedade baseado nos princípios da democracia, da cidadania e da justiça social, por meio de um instrumento de construção de uma cultura de direitos humanos que visa o exercício da solidariedade e do respeito às diversidades (BRASIL, 2018).
O mesmo portal relata que o documento foi organizado em cinco eixos de atuação, sendo eles a Educação Básica, a Educação Superior, a Educação Não-Formal, a Educação dos Profissionais dos Sistemas de Justiça e Segurança Pública e Educação e Mídia. O Plano considera a Educação em Direitos Humanos como [...] um processo sistemático e multidimensional que orienta a formação do sujeito de direitos [...]
(BRASIL, 2007, p. 25), e articula as dimensões:
a) apreensão de conhecimentos historicamente construídos sobre direitos humanos e a sua relação com os contextos internacional, nacional e local;
b) afirmação de valores, atitudes e práticas sociais que expressem a cultura dos direitos humanos em todos os espaços da sociedade;
c) formação de uma consciência cidadã capaz de se fazer presente em níveis cognitivo, social, ético e político;
d) desenvolvimento de processos metodológicos participativos e de construção coletiva, utilizando linguagens e materiais didáticos contextualizados;
e) fortalecimento de práticas individuais e sociais que gerem ações e instrumentos em favor da promoção, da proteção e da defesa dos direitos humanos, bem como da reparação das violações.
(BRASIL, 2007, p. 25).
Em 2012 o educador Paulo Freire foi declarado patrono da educação brasileira, e sua pedagogia, conforme já mencionado, assume forte posicionamento político, concebendo a educação como ferramenta capaz de proporcionar uma consciência crítica e enganjamento na luta pela libertação das classes oprimidas. Maciel (2011) relata a participação de Paulo Freire no Movimento de Educação Popular, em que é considerado uma das figuras de maior destaque nessa modalidade educativa. A autora comenta que o movimento ocorreu a partir das transformações sociais da década de 1940, com a assunção do modelo econômico urbano-industrial e o consequente aumento da [...] inserção das massas na definição dos rumos da sociedade [...]
(MACIEL, 2011, p. 330). Conforme Maciel (2011) relata, o movimento consiste em importante ferramenta de empoderamento das classes marginalizadas, na medida em que concebe a educação como ferramenta para que haja problematização e conscientização acerca da realidade social, conferindo aos sujeitos meios de intervenção na sociedade e luta por seus direitos (MACIEL, 2011). Sendo assim, é possível constatar semelhanças entre a pedagogia freireana e a Educação em Direitos Humanos, tomando-se como base, por exemplo, as afirmações de Gorczevski e Tauchen (2008, p. 73), segundo os quais a Educação em Direitos Humanos visa […] o senso de responsabilidade e comprometimento com a mudança daquelas práticas sociais que violam ou negam os direitos de ser mais humano
.
É manifesta, porém, uma rejeição significativa de grande parcela da sociedade brasileira às ideias de Paulo Freire, entendidas por estes como esquerdistas
e incentivadoras de indisciplina e insubordinação. Em 2017, a Ideia Legislativa nº. 90.310, transformada na Sugestão nº 47 de 2017, procurou revogar a Lei nº 12.612/2012, que conferiu o título de patrono da educação a Paulo Freire, conforme o site do senado federal (BRASIL, 2017). Ainda o mesmo site aponta que a referida ideia obteve apoio de mais de 20.000 manifestações individuais, tendo sido, apesar disso, rejeitada pelo Senado. Em 2019 houve ainda uma nova tentativa, através do Projeto de Lei nº 2.589/2019, anexado ao Projeto de Lei 1.930/2019, atualmente em processo de tramitação (aguardando parecer do relator na Comissão de Educação), conforme o site da Câmara dos Deputados (BRASIL, 2023).
A manifestação dessa rejeição, embora não concretizada em termos de revogação do título a Paulo Freire, foi reforçada recebendo o apoio do governo de Jair Bolsonaro (2019-2022), conforme Bermúdez (2019), Dimenstein (2019), Benites (2021) e Rocha (2021). Conforme eleito por processos democráticos, tal governo refletiu ideais de parcela significativa da população brasileira.
Há no país, ainda, uma rejeição de parte da população para com os direitos humanos, considerada como defesa de bandidos
(GRAGNANI, J., 2018). Independente das causas que tenham disseminado tal pensamento entre a população, a solução colocada por Gragnani está na educação.
Nesse contexto, faz-se necessária uma reflexão a respeito das relações entre a pedagogia freireana e a Educação em Direitos Humanos, na medida em que o ataque e rejeição manifestos às ideias de Paulo Freire enquanto pedagogia crítica possam representar rejeição a princípios comuns à Educação em Direitos Humanos. A reflexão acerca dessas relações mostra-se ainda como relevante a fim de que a necessidade da Educação em Direitos Humanos seja reforçada.
Por essas razões, buscou-se trabalhar as seguintes questões: os princípios da EDH se fazem presentes na pedagogia de Paulo Freire, de forma que em sua concepção pedagógica haja uma defesa da Educação em Direitos Humanos? Caso sim, quais pressupostos dessa pedagogia abarcam os princípios da Educação em Direitos Humanos?
Através de uma busca e leitura inicial, foram encontrados alguns trabalhos acerca dessas relações entre a EDH e a pedagogia de Paulo Freire, tais como: Rosas (2006); Gorczevski e Tauchen (2008); Padilha (2008) e Marinho e Gonçalves (2016). A partir de conhecimentos anteriormente construídos e sistematizados, buscou-se compreender se há uma defesa da Educação em Direitos Humanos nos pressupostos constantes na obra de Paulo Freire e em quais deles, buscando a complementação e contribuição às discussões já iniciadas por outros autores.
O objetivo geral da pesquisa foi verificar se os princípios da Educação em Direitos Humanos (EDH) estão presentes na pedagogia de Paulo Freire, e em quais de seus pressupostos. Complementarmente, buscou-se conhecer as principais ideias da Educação em Direitos Humanos, sintetizar as principais ideias da pedagogia de Paulo Freire e buscar nas ideias da pedagogia freireana pressupostos que se relacionassem aos princípios da Educação em Direitos Humanos, indicando em quais deles essa relação está explicitada, permitindo assim afirmar ou não a existência de uma defesa da EDH na pedagogia de Paulo Freire.
A pesquisa foi realizada a partir da metodologia qualitativa e bibliográfica, consistindo em uma pesquisa teórico-bibliográfico-narrativa, desenvolvendo-se a partir de duas etapas: revisão bibliográfica sobre a EDH e estudo bibliográfico sobre a pedagogia de Paulo Freire. Para Goldenberg (2004, p. 14), a pesquisa qualitativa preocupa-se não com uma representabilidade numérica, "[...]