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E-book455 páginas9 horas

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Sobre este e-book

Por todo o mundo, os humanos estão alucinando após noites sem sonos.

Em um estéril instituto sob a terra, os prognosticadores continuam falando sobre os mesmo eventos.

E, em algum lugar remoto do Texas, uma garota de dezesseis anos está a ponto de ser levada para uma batalha feroz e etérea.

Conheça Roya Stark. Toda noite ela se afoga em seus sonhos, passa seu tempo lendo literatura clásica para evitar o menosprezo de sua familia e é propensa a ter premonições; as quais estão cada vez mais frequentes. E agora seus sonhos estão repletos de estranhos que a oferecem o que sempre quis saber. Quem ela é? Esta é a pergunta que a persegue e que esta prestes a descobrir. Porém, Roya viverá para se arrepender de saber a verdade?

IdiomaPortuguês
Data de lançamento22 de out. de 2016
ISBN9781507160039
Despertada
Autor

Sarah Noffke

Sarah Noffke is a bestselling author who specializes in young adult and new adult science fiction, paranormal, and urban fantasy. After receiving her master's degree in management, she went on to teach business writing courses at the college level. When she's not writing, she enjoys running her own podcast and being a mother to her children.

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  • Nota: 4 de 5 estrelas
    4/5
    I received this book from the author in exchange for an honest review :)Summary: Roya Stark never would have guessed that a bookworm outcast like herself would be thrown into a world of dream traveling, confusing teammates and the minor task of killing the creator of nightmares who has been terrorizing the world for centuries. As Roya gets thrown in the Institute with other Dream Travelers like herself, her perception of herself and the world begins to change. While enduring having the fate of the sanity of the world resting on her shoulders she also has to come to term with the facts that everything she knows isn't exactly what it seems.Review: Honestly, when I first started this book I was kind of confused. I felt like there was a book before it I should have read. Due to the fact that I was confused, I couldn't really get into the book. I kept reading little pieces and then going off and doing something else. Today I sat down and told myself I was going to finish it. After reading for about an hour, I was hooked. I'm not completely sure what trapped me, but it did. Noffke's writing was clear and I didn't notice any major grammar issues. I felt myself connected to the characters and rooting for different ones and experiencing their emotions. The book had some points that were fairly predictable because they're common in YA books, but other points had me on the edge of my seat, wondering what was going to come next. Needless to say, as soon as I finished Awoken I immediately checked to see if my library had the next book in the series, Stunned.
  • Nota: 5 de 5 estrelas
    5/5
    An electrifying science fiction adventure told with great imagination. The lead character Roya is chosen to challenge and destroy Zhuang who is an evil trickster threatening the dream world and ultimately the universe. Roya discovers her inner strength and matures into a young woman of determination and emotional wholeness. An exceptionally good read.I was given an electronic copy in return for an honest review.

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Despertada - Sarah Noffke

Capítulo um

Quarenta e oito horas depois.

Não acreditaria que nada disto fosse real se não fosse pelo corte de 5 centímetros em meu braço. Entretanto, a negação alugou um quarto na minha mente e com frequência surge pisando forte e batendo as portas. Nunca me considerei normal, mas só agora eu realmente percebi o quanto sou anormal. Não é mais com essa parte que estou em negação, mas sim com meu possível destino.

Agora tenho que fazer aquilo que parece impossível: me concentrar. É difícil quando minha vida rapidamente virou uma grande confusão. Forço-me a me livrar das distrações. A resposta que procuro abriga um lugar em que só poderei entrar se eu me deixar levar.

Com grande esforço, relaxo o suficiente para me concentrar. Na minha mente, vejo a barragem. O concreto se estende como uma barreira, impulsionando a água. Presto atenção nela, como se move no vertedouro. As respirações lentas intensificam a meditação, lhe concedendo cor e som. Continuo a visualizar até que percebo uma mudança. Está se polarizando, em um bom sentido. Meu corpo permanece plantado na cama confortável enquanto viajo em meus sonhos. Agora, estou correndo pelo túnel prateado - meu transporte para a outra dimensão. Na minha boca, a adrenalina tem o sabor de água salgada. Rapidamente a jornada acaba, deixando-me ofegante quando sou atirada num enorme espaço.

O túnel me coloca no topo do vertedouro sobre uma barragem de concreto. Um olhar rápido para trás revela um lago sereno; à frente, o vertedouro escoa a água acerca de centenas de metros ou mais antes de cair sobre o lago. A lua acima está cheia. Atrás de mim está uma mulher.

—Estava começando a achar que tinha se perdido novamente —disse ela.

—É bom lhe ver, também —digo.

—Suponho que já saiba meu nome.

Aparentemente os Luciditas não acreditavam em saudações.

—Bem, alguma identificação não machucaria.

O cabelo negro de Shuman se assemelha a fios de seda. Ela veste um colete de couro e calças jeans. Me endireito, sentindo-me menor do que o normal ao seu lado.

—Você decifrou o enigma sozinha? –perguntou Shuman, ignorando meu comentário. A lua reflete as maçãs altas de seu rosto, fazendo-a parecer angular.

—Não —admito— Bob e Steve me ajudaram.

Estou confusa do porquê Shuman me deu um enigma ao invés de dizer para onde eu deveria viajar em sonhos. Suponho que como ela seja líder mentalista dos Luciditas, tenha que tornar tudo o mais perplexo possível. Deve ser ótima em seu trabalho.

—Sim, foi previsto que eles lhe ajudariam —disse ela.

—Certamente —digo, sem mascarar a irritação em minha voz. —Não é a ajuda de Bob e Steve que me deixa chateada, mas sim os Luciditas estarem a par de minha vida por meios psíquicos.

—E estamos aqui por causa de uma previsão diferente.

—Sim, já ouvi falar.

—Já ouviu falar também que envolve você?

—Bem, eu sei que há uma possibilidade de eu estar envolvida.

—Temos novas informações. Seu nome é o único que está na profecia agora.

—O quê? —digo silenciosamente incrédula. —Não, isso é impossível.

—É possível e lhe garanto que é verdade. A especulação das previsões se solidificam a medida que o próximo evento se aproxima. Agora, os prognosticadores a veem como a verdadeira desafiante.

—Não —digo rápido demais, a negação é evidente em meu tom. —E eu não estou aqui por causa da profecia; estou aqui porque me disseram que me ajudaria.

—Estão certos. A primeira maneira de lhe ajudar é fazer com que aceite o que tenha sido profetizado.

—Profecias são apenas suposições. E se eles estiverem errados? —pergunto.

Shuman levanta a sobrancelha em desaprovação e balança a cabeça.

—Roya, você tem dúvidas de que isto envolve você?

—Especialmente por isto ser um absurdo. Nada disto faz sentido.

—Talvez ainda não faça, mas fará —disse Shuman. —Infelizmente, o nosso tempo está se esgotando. Os prognosticadores determinaram que o momento será exatamente às vinte e uma horas, do dia 13 de junho.

É daqui um mês. Minha garganta fecha e meus ombros se encolhem.

—O quê? Não posso.... Não há maneira de.... —Fui apagando, perdida em pensamentos mórbidos sobre minha morte iminente. —Por que não você ou alguém mais qualificado?

—Se eu fosse escolhida ficaria honrada, mas não fui. Você foi. —Shuman contempla a lua cheia, seus brincos de prata se destacam sobre a luz branca. —Tenho rastreado Zhuang por décadas, mas sem sucesso. Muitos de nós tem feito isso. —Ela se vira e me olha pela primeira vez. Seus olhos negros lembram ametistas. Este ponto fixo de tempo é a única chance que alguém terá para desafiá-lo. E os prognosticadores afirmam que você é a pessoa com a melhor oportunidade de acabar com seu reinado brutal.

—Isto é ridículo. Não sou ameaça para ninguém.

—Há alguns dias você se viu bem diferente do que é agora, não é mesmo?

—Bem, sim, mas...

—Então considere possível que em um mês você será uma força letal.

Depois do que aprendi estou quase disposta a crer que seja verdade. Suspiro.

—Então, o que realmente quer de mim? —pergunto.

—Faça uma escolha —Shuman disse prontamente. —Deve decidir se aceita ou não este papel. Se aceitar, aí poderei lhe ajudar naquilo que pediu.

—Se tudo o que disse for verdade, então, não tenho escolha.

—É tudo verdade —disse ela cerrando os dentes. —E tanto na vigília quanto nos sonhos, sempre temos uma escolha. Isto que difere os Viajantes de Sonhos dos Middlings. Nós não dormimos e caímos em sonhos que acontecem conosco. Nós os criamos. Escolhemos para onde viajar.

Coço os meus olhos, frustrada e bizarramente cansada.

—Enfrentar Zhuang parece ser uma sentença de morte. Não quero passar por tudo isso para então morrer em junho.

—Se você escolher ser a desafiante, então enfrentará muitos perigos. Pode ser que nem chegue até junho. Pode ser que morra esta noite. —O rosto de Shuman não mostra nem um pouco de compaixão.

—Se está tentando me convencer a fazer isto, acho que não está fazendo um bom trabalho. —digo.

Shuman encara a lua por um minuto como se estivesse calculando algo.

—Preciso da sua resposta.

—O quê? Agora? — Minha voz ecoa pelo vertedouro. —Desse jeito? Não posso ter um minuto para pensar, ou ir para casa e avaliar minhas opções?

—Você não tem casa —me lembra ela.

Meus pés estão conectados ao meio fio à minha frente. Quero jogar tudo para o alto. Correr e me esconder também parece uma boa ideia. O comportamento opressivo de Shuman, indiferente ao meu dilema, torna o pensamento ainda mais difícil. Espero ela dizer algo, mas apenas permanece imóvel observando a lua. Está começando a me assustar.

—O que acontecerá à minha família? —perguntei, a última palavra soa estranha quando sai da minha boca.

—Suspeito que Zhuang manterá seu controle sob eles, mas quem ele realmente quer é você. —Shuman diz com indiferença. —Sua família está oficialmente classificada como alucinadores. Ele tem a habilidade de mantê-los assim por um bom tempo. Ou poderia também acabar com eles imediatamente.

Acabar com eles? Isso significa o que estou pensando? Este homem, parasita, está roubando de minha família a habilidade de sonhar, fazendo com que eles caiam em estados alucinatórios. Sou incapaz de deter Zhuang se ele decidir drená-los de suas consciências. Além disso, ficariam como cascas vazias, sonâmbulos. Mortos num instante. Um arrepio sobe por minha espinha.

Shuman continua:

—O plano de Zhuang era fazer com que você entrasse em pânico e se entregasse a ele. Felizmente, a encontramos antes. Meu palpite é que sua família ficará no limbo. A atenção de Zhuang será em lhe encontrar. Se quer ajudar a sua família, então, fique longe, se não ele os usará contra você. Mas se você quer salvá-los, então precisa lutar contra ele.

—E vencer—digo, a dúvida escoando em minhas palavras.

—Bem, é claro.

—Nada disto faz sentido. —Coço a cabeça com a mão trêmula. —Por que eu? Mal tenho idade para dirigir. Fiquei sabendo dessa confusão toda há alguns dias. Como fui escolhida? Como posso ser a melhor pessoa a enfrentá-lo?

—Não sei as respostas destas perguntas —diz ela, ainda obcecada pela lua.

—Então, por que eu deveria fazer isto? Por que deveria comprometer minha vida sem ao menos saber do porquê fui escolhida?

Shuman aperta os olhos como se estivesse pensando ou meditando. Suas palavras são tênues e tranquilas quando finalmente diz:

—O grande Buda uma vez disse: Três coisas não podem ser escondidas por muito tempo: o sol, a lua, e a verdade.

Mordo os lábios com força. Então, é assim?  Vivo minha vida sozinha pelas ruas, observando Zhuang roubar os sonhos da humanidade, ou opção dois, me ofereço para matá-lo e provavelmente morro tentando. Mas pelo menos meu prêmio de consolo será que saberei porque fui escolhida. Saberei quem eu era e onde eu teria pertencido...se eu não morrer nas mãos de Zhuang. Isto parece uma fraude, mas uma bem engenhosa.

Uma parte de mim quer voltar para a minha família e sacudi-los até que se libertem das alucinações. Logo, poderemos viver nossas vidas onde os acontecimentos mais interessantes são: futebol, igreja e churrascos. Não é uma grande vida para uma agnóstica vegetariana, mas é melhor do que a morte. Talvez eu seja um produto da terra do leste do Texas, mas os ventos aqui nunca concordaram comigo. Tenho procurado uma maneira de sair desta cidade, mas não desse jeito.

—Não posso lhe garantir mais tempo —diz Shuman —Preciso da sua resposta.

Examino a superfície da água, olhando para nada em particular. Ela pode esperar pela minha resposta. Vai esperar.

Pressiono meus olhos com os dedos e inspiro profundamente. Este duelo é inevitável. O futuro de Zhuang e seu desafiante está entrelaçado. Qualquer tentativa de fugir só vai fazer com que os dois fiquem juntos. De alguma forma fui eleita por pessoas que não conheço, por um perigo que só descobri que existia, recentemente. Nada disto ainda faz sentido, por esse motivo sei que tenho que confiar no instinto. É tudo que me resta.

—Tudo bem —digo de maneira meio patética. —Eu vou.

Um sorriso seria gentil, ou talvez um muito bem. Ao invés disso, Shuman, que parecia estar tão ocupada a todo o tempo, começa a jorrar instruções:

—O próximo passo é encontrar o Instituto Lucidita. Como você é relativamente nova em viagem de sonhos, há muitos riscos que possa correr.

Grande surpresa.

Shuman continua:

—Você deve viajar em sonho ao Instituto Lucidita completamente imersa em água.

—Hum, quê? Está falando sério? Vou me afogar.

—Há esse risco sim, mas o único jeito de entrar no Instituto é através da água. Para viajar até lá, você deve voltar ao seu corpo e então submergir-se em água. Te aconselho a ter em mente que você e a água serão uma só. É através desse conhecimento que dominará o medo de se afogar e lhe auxiliará no foco das tarefas maiores da viagem de sonhos. Se permanecer calma e concentrada propriamente, então viajará e chegará ao Instituto. Se não for bem-sucedida, sim, você se afogará.

—Ah, isso é tudo? Parece moleza.  —agora me pergunto se tomei a decisão certa.

Shuman me olha com os olhos estreitos, mas não me responde de outra forma.

Esfrego minhas têmporas quando irrompe uma pressão esmagadora por trás de meus olhos.

—Isso tudo é tão estranho, parece um sonho que venho tendo... —Minhas palavras desaparecem quando me dou conta da inevitável verdade. —Você pôs esses sonhos na minha cabeça, não é mesmo? —Acuso Shuman, encarando sua rígida postura.

—Os Luciditas são responsáveis sim —diz ela, em tom pragmático.

—Como? Isso é loucura! É horrível. Noite após noite sonhei que estava me afogando. Você tem ideia de como isso é terrível?

—Deveria estar grata. Preparamos você para a jornada que está prestes a começar. Em sua mente, seu subconsciente já praticou muito o que irá fazer.

—Grata? —Balanço a cabeça em descrença. —Achei que estava perdendo o controle. Não dormi bem durante semanas. Não, não fico nem um pouco grata. Você invadiu meu subconsciente. Agora estou mais frustrada do que assustada.

Shuman inspira lentamente e diz:

—Tudo que fizemos foi para proteger você e o seu futuro.

Como argumentar com essa afirmação? Como argumentar com tudo isso? Quero correr, abandonar essa farsa que se tornou a minha vida. Entretanto, meu instinto pesa como concreto sobre as minhas pernas, me prendendo no lugar, assegurando-me que este é o meu lugar.

—Roya, estamos ficando sem tempo —diz Shuman, quebrando o silêncio. —Tem alguma pergunta?

—Por que tem que ser tão complicado viajar para o Instituto? Não há outra alternativa? Como uma nave espacial ou uma droga?

—Não, não há —diz Shuman. —O Instituto é fortemente protegido por água. A dificuldade de se chegar lá faz com que seja o lugar mais seguro do mundo.

A ideia cai sobre mim como um edredom de plumas. Segurança. Como seria isso? Cada momento foi camuflado com uma ameaça escondida por tanto tempo. Quando meus recorrentes sonhos não estavam me atormentando, a paranoia se escondia nas sombras e me incapacitava. Foi quase o suficiente para me fazer tomar os remédios que o terapeuta me empurrava. Quase.

—Se eu fizer isso tudo —as palavras saindo da minha boca como conta-gotas —se eu não me afogar, então chegarei ao Instituto? Ficarei a salvo? Pelo menos, por um tempo, certo?

Seus olhos distanciam-se bruscamente de seu foco de atenção. Contraindo os lábios, ela diz:

—Sim.

Eu suspiro. É o primeiro de alívio desde então.

—Pois bem, eu vou —digo sem entusiasmo.

Ela se vira e me encara de frente, cruzando os braços. Em um de seus antebraços há uma tatuagem de uma cobra cascavel. A calda da cobra encontra-se em seu cotovelo e a cabeça no dorso de sua mão.

—Há só mais uma coisa —diz ela, com alerta em sua voz. —Apenas os Luciditas podem entrar no Instituto. Deve querer ser uma de nós, ou será proibida de entrar.

Pisco os olhos, surpresa. Minha boca se abre para expressar hesitação, mas ela desaparece, me deixando sozinha e sentindo-me como se estivesse na extremidade da terra.

Capítulo dois

Atirar-me do vertedouro é uma ideia intrigante. Com um pouco de sorte, o inverno não me mataria. Seria apenas mutilada quando fosse caçada.

A energia que sai do meu peito é intensa. Meu corpo não se esforça muito para gastá-la. Passo a mão pelo meu cabelo e percebo que, mais uma vez, meus braços e mãos possuem uma aparência fantasmagórica. Suponho que meu rosto também esteja assim.

Dez minutos se passam onde não faço nada a não ser mergulhar em incertezas. Eu disse que faria isso, mas a parte real do fazer que é difícil. Há um lugar que preciso ir antes de entrar na água. Sei que disseram para eu não ir, mas essa é provavelmente, a minha última chance.

Mantenho-me firme. O vento frio bate no meu rosto e no dorso das minhas mãos. Com os olhos fechados, vejo em minha mente o lugar que pretendo viajar em sonhos: folhas verdes oscilam ao vento, a rede balança, o aroma de baunilha flutua do jardim até meus pensamentos. Estou envolvida numa inocência tão pura e real. Mãos varrem longas folhagens a medida que a costa se aproxima. A boia flutua sobre as águas longínquas. Uma montanha de livros situa-se empilhada, que parecem posses preciosas.

O túnel prateado me engole novamente. Avanço como se estivesse num trem subterrâneo. Porém, é como se eu fosse o trem em si, acelerando por uma passagem claustrofóbica. Meu coração bate forte e justo quando penso que colidirei em algo, desço para um túnel diferente. Minha aterrissagem é interrompida com um flash e um solavanco. Abro os olhos para encontrar uma selva e uma casa obscura. Mesmo sabendo que é arriscado, fico de pé na extremidade do cais. Não vou demorar muito.

O túnel depositou-me no lugar onde Trey me dissera quem eu era e do que eu era capaz. Recordo pensando que, o sócio-diretor dos Luciditas parecia um pouco com o jovem Harrison Ford, com seu cabelo grisalho e seus olhos de turquesa. É difícil de acreditar que foi só há alguns dias. Pareciam meses. Presumo que é o que acontece quando não se perde noites com sonhos sem sentidos.

A primeira vez que viajei em sonhos foi quando me encontrei com Trey. Bob e Steve que organizaram e me deram o protocolo de Viajantes de Sonhos antes de eu partir. Não iriam me contar mais nada. Disseram que não era coisa deles.

—Apenas feche os olhos e tenha um pouco de fé— Bob disse.

Não acreditei que fosse real o que aconteceu em seguida. Mesmo assim, Trey sabia dos meus pesadelos, da estranha figura que eu via na selva, e do porquê minha família estava perdendo o controle.

—Nós podemos lhe ajudar —disse Trey balançando os pés para o lado de fora do cais. Nosso plano de sentar no cais e ter uma conversa informal era absurdamente contraditória a quão tenso o encontro realmente foi. Sentei com um estranho que me contava como seu sonho era real. Que eu fazia parte de uma raça especial de pessoas. Que se os Luciditas não me protegessem, eu seria assassinada. Conversas como essas deveriam acontecer em ambientes mais formais.

—Como vou saber se devo deixá-lo me ajudar? E se você for o cara mau? –perguntei à Trey, fixando os olhos no botão da manga arregaçada de sua camisa branca.

—Temos protegido você. Bem, fizemos o melhor que podíamos através do mundo onírico. Sinto muito se não conseguimos ajudar a sua família. Aconteceu tudo muito rápido.

—O que Zhuang fez com eles? –perguntei.

—Zhuang tem vivido por muito tempo porque entra na cabeça dos sonhadores enquanto dormem. Domina suas consciências para enfraquecê-los, normalmente causando-os pesadelos, criando ansiedade e estresse, ou, cortando completamente sua capacidade de alcançar a fase REM.

—Mas porque a minha família? Já entendi que ele está atrás de mim por causa de uma profecia ridícula, mas eles são completamente inocentes. Eles são Middlings.

Trey sacudiu a cabeça. Suspirou.

—Não é apenas a sua família. Zhuang tem feito isso em diversos níveis por milhares de séculos. Às vezes ele opera tão rápido como no caso de um ataque cardíaco ou aneurisma. Às vezes seus ataques são mais lentos como se fosse um derrame. A doença possui várias formas. E essas são umas das condições que Middlings usaram para descrever o que Zhuang faz, mas você deveria saber a verdade.

—Zhuang é responsável por todas essas doenças? —perguntei, horrorizada com as notícias.

Trey assentiu com a cabeça.

—Normalmente sim. Infelizmente, há outros Viajantes de Sonhos que abusaram de seus poderes dessa maneira. Somos uma raça muito poderosa, capazes de destruir os Middlings se quisermos. Para os Luciditas isso não é uma opção, é contra as nossas leis. Protegemos, e por isso deveria confiar em nós. Permitir que cuidemos de você.

Depois de acordar daquele encontro com Trey, pretendi esquecer completamente aquelas palavras, sua persuasão, e seus argumentos de permitir que os Luciditas me protejam. Intenções são frágeis à face do perigo adversário. Determinação, por outro lado, é resistente ao desafio. É o antídoto.

Agora, do meu lugar no cais, dou uma olhada furtiva em minha casa. Desde que viajo em sonhos, previa que apareceria diferente, mas não. Todos ali estão adormecidos, presos em sonos profundos. Espero olhar para a casa e ser bombardeada por tristeza. Todavia, não foi isso que aconteceu. Na verdade, era como se eu estivesse olhando para a casa de outra pessoa. Minha família foi afastada. Não posso ir para lá e tudo que sinto é um vazio, mas isso é normal. Nasci com isso.

Uma parte da última conversa com meu irmão passa pela minha cabeça.

—Não sei por que, mas você é diferente. Não pertence à nossa família. Nunca pertenceu e nunca irá. —disse Shiloh antes de me atacar. É verdade que ele vinha sofrendo de alucinações, mas suas palavras ainda permanecem comigo, assim como os hematomas.

Desde muito cedo, era evidente, em muitos aspectos, que eu era diferente da minha família. Meu cabelo louro e minha natureza subjugada se destacavam entre suas cabeleiras escuras e seus sorrisos de orelha a orelha em todas as fotos das férias. Posteriormente, minha mãe nos fez vestir toucas de natal, e ainda assim, não pôde me obrigar a sorrir. Tampouco pôde dispersar os rumores que circulavam pela cidade; rumores que ocorriam desde que brotara meu primeiro fio de cabelo.

Eu era a excluída, sempre soube e aceitei isso. Porém, quando Shiloh usou as palavras não pertence, uma luz iluminou o lado obscuro do meu coração. Suas palavras deveriam ter feito me sentir rejeitada. Em vez disso senti esperança.

As palavras anteriores de Shuman parecem mais pesadas e bem mais significativas agora. Três coisas não podem ser escondidas por muito tempo: o sol, a lua e a verdade. Minhas mãos estão firmes, não tremem mais. Dentro de mim, uma emoção sobe para outro patamar. Anseio. Contém som, cor e sabor. É nítido, vermelho, picante. Com os dedos firmes, pressiono minhas têmporas empurrando o anseio, mas este não renuncia, se agarra em minhas entranhas.

Uma questão permanece nessa rede de confusão que se tornou minha vida. O fogo que se acende dentro de mim queima aos poucos, porém sua ambição tem a capacidade de incendiar uma floresta inteira. Quero saber onde pertenço. Infelizmente, é por esta razão que aceitei o papel de desafiante. Queria dizer que era para salvar a minha família, mas isso está em segundo plano. Embora eu não tenha vivido muito, aprendi que no mundo existe um sentimento que é capaz de mover montanhas e que a possibilidade de cavar pequenos buracos não é o suficiente. Estou decidida a entender quem sou, porque sou a única Viajante de Sonhos da minha família, e porque fui escolhida para lutar contra Zhuang.

Com dificuldade para engolir, dou uma última olhada na casa. Fecho os olhos e através das minhas pálpebras vejo seu modelo. Sua forma. Sua luz. Sua escuridão. Deixo esse lugar e viajo de volta para meu corpo. Quando levanto, me sinto a um milhão de quilômetros de onde estava segundos atrás. Isso facilitará os passos seguintes.

Ando pela casa de Bob e Steve, perfeitamente iluminada por luzes tênues de luminárias Tiffany. Sem dúvidas que já partiram para viajar em sonhos. Disseram que tinham negócios a tratar esta noite em Taiwan e na Islândia. Tudo bem. Quem não tem?

Dou risada quando meus pés se deparam com o tapete Persa. Estou quase na porta dos fundos. Poderia me retirar agora, aninhar-me na cama de dossel e levantar quando Bob estivesse fazendo panquecas. Poderia deixar esse desafio todo para trás. Bob e Steve disseram que me ajudariam. Isso queria dizer que me aceitariam enquanto minha família estivesse privada da capacidade de sonhar e os Luciditas estivessem combatendo Zhuang? Por que deveria me importar? Quem eram os Luciditas e Zhuang para mim? Mas minha família.... Quem me dera querer protegê-los, ao invés de me sentir obrigada a isso. É difícil ser leal às pessoas que me puseram apelido de Sterco abreviatura de esterco. Mas ainda são do meu sangue, então isso não deveria me unir a eles independentemente de sua crueldade?

Desde o princípio me pergunto por que Bob e Steve conviveriam com minha mãe. Eles eram cultos e ela uma noveleira de primeira. Não os tolerava muito bem, mas ainda insistia em aceitar seus convites para jantares.

—Por que está me levando para a casa dessas pessoas? —perguntei a ela enquanto passávamos por uma rua esburacada.

—Pediram que você me acompanhasse —disse ela.

—Mas porque está indo a esse jantar? Você acabou de discursar o quão arrumadinhos eles são.

—Roya, você realmente entende bem pouco de política —disse com a voz carregada de condescendência. —Francamente, que homem vai à manicure para fazer as unhas? É ridículo.

—Então, você está desperdiçando a minha noite só para conseguir um cheque gordo para sua caridade?

—Não tem nada a ver com a caridade. Saberia disso se prestasse atenção. Abrirá um cargo novo no conselho. Se eu conseguir essa doação, ganharei facilmente a vaga.

—Fala sério, todo esse fingimento só para conseguir dinheiro, é....

—Fingir gostar de alguém não é nada —me interrompeu. —Acho que você não entende. Nunca se abre um cargo no conselho. Farei o que for preciso.

Reviro os olhos.

—Bom, então esperamos que Emily Dickson esteja certa e que a sorte favoreça os audazes.

Seus lábios endureceram numa linha tênue. Quase recuei achando que me esbofetearia de novo.

Minha mãe não tolerava três tipos de pessoas: mulheres de sucesso, homens com sobrancelhas aparadas, e qualquer pessoa que usasse citações literárias. Achava isso tudo pretensioso demais.

Talvez tenha sido a intolerância da minha mãe que tenha feito eu adorar Bob e Steve à primeira vista. Falavam com sofisticação, com um vívido toque de humildade. Era como se eu pudesse sentir sinceridade nas suas palavras mais sucintas. Ninguém jamais falava comigo da forma que falavam ––com respeito. Quando me mostraram sua biblioteca eu os amei ainda mais. E então, me drogaram, me deram instruções estranhas, e acordei em um mundo novo que não tinha certeza se era real ou não. Céus, nem sabia quem eu era mais.

Sabia que as pretensões da minha mãe não importavam, pois quem estava sendo enganada o tempo todo era ela. Apesar disso, eu ainda confiava no Bob e no Steve. Esses homens tiveram muito trabalho para me ajudar; toleraram a minha mãe, e me salvaram quando Shiloh, meu irmão, estava prestes a me atropelar. Por causa deles eu estava segura e por eles que sabia que não era anormal. Eu era diferente, mas de uma forma poderosa. O papel deles era guiar-me em minha primeira viagem de sonhos, então eu encontraria Trey, mas fizeram mais do que isso. Bob e Steve foram as primeiras pessoas que me recordavam ser sinceramente amáveis. Dói muito ter que deixar isso agora, mas eu tinha que ir.

Minha pressa leva-me ao cais num minuto. Tal como Jay Gatsby, estou de pé no cais e olho para o infinito. Em algum lugar da margem oposta encontra-se a casa que acabei de deixar. Ao contrário de Gatsby, não me sinto atraída por ela, e nem com saudade de alguém. Meu segredo obscuro era que sempre quis ser Gatsby. Por mais despedaçado que fosse seu coração e por mais horrível que tenha sido seu destino, admiro que tenha amado. É uma coisa difícil de se fazer.

Sentindo-me insensível facilita que eu passe minhas pernas para fora do cais e escorregue para o lago frio. Num instante, minhas roupas ficam como âncoras. Ignorando esse fato, deslizo para a água. Após algumas braçadas, viro-me e flutuo de costas; meu cabelo louro desliza ao meu lado. Deveria mesmo ter pensado em prender minhas tranças longas antes do mergulho. Fecho os olhos, mas a luz brilhante da lua ainda penetra as minhas pálpebras. Meus braços empurram a água para manter-me na superfície, e elimino todos os pensamentos indesejados.

Respiro bem fundo e seguro a respiração. Bem devagar solto o ar e depois puxo de novo. Sem saber de algum lugar específico terei que usar métodos cognitivos para chegar ao Instituto. Informações que obtive nesses dias que se passaram conectarão minha consciência ao local. Ou, talvez eu me afogue. Só há uma maneira de descobrir.

Puxo o oxigênio pelo nariz até o topo dos meus pulmões e flutuo em meus pensamentos. Uma raça secreta. Pessoas primitivas. Uso superior do córtex pré-frontal dorsolateral. Uma sociedade secreta com este tipo de população. Uma sociedade feita para proteger.

Meus pensamentos ganham cor com a respiração seguinte. São dinâmicos e carregam emoções na qual me envolvi quando estavam apenas guardados. Uma sociedade de Viajantes de Sonhos. Os Luciditas. Nessas últimas semanas, sinto mais do que penso sobre a presença deles ao meu redor. Era como se fosse um borrão ao lado da minha visão. Sempre desaparecia quando fazia uma análise mais minuciosa. Me observavam enquanto eu estava acordada e interagiam com a minha família Middling. Depois, Trey comentava que eu não merecia o abuso que minha família submetia a mim. Sua voz carregava um tom tenso e pesado enquanto dizia:

—Você não merece que lhe tratem com tanto desprezo. Se houvesse algo que pudéssemos ter feito para interver e para lhe proteger dos abusos deles, teríamos feito. Espero que saiba disso.

Nunca respondi. Deu um nó na garganta de saber que poderia estar me observando por um outro plano existencial. Dali em diante, Trey e as autoridades dos Luciditas mantiveram Zhuang longe, enquanto espreitava-se pela floresta, atraindo-me para ele. Os Luciditas, como Zhuang, pregam truques com o vento e as marés.

Prendo a respiração pela última vez, paro de nadar e relaxo os músculos. A água sobe pelas minhas bochechas, cobrindo meus olhos, e depois, o meu rosto inteiro. Como uma pedra saltando pela água, minha mente estala a cada ideia conectada aos Luciditas. Repórteres de notícias. Feitiços de proteção. Poderes de convocação. Artemísia. Projeções. Percepção extra-sensorial (PES). Clarividência. Ilusões. Trey. Ren. Shuman. Bob. Steve. E por fim, a pedra dá seu último salto antes de afundar. Eu. Eles querem que eu me junte a eles.

Quando meu corpo afunda cada vez mais para o fundo do lago, eu não luto para respirar. Diminui a respiração o suficiente para que o último suspiro me sustente nos próximos minutos. A fim de desviar-me do medo de me afogar, penso nos Luciditas. Eles têm um Instituto. É um lugar seguro. É para lá que estou indo. Serei a desafiante deles e enfrentarei Zhuang.

Um puxão dentro dos meus pulmões manifesta sua fome de oxigênio. Ainda estou afundando. O peso da água é semelhante a cem mantas em cima de mim. Estão me sufocando. Não é hora de ser dominada pelo medo, digo a mim mesma. Porém, a essa altura já usei meu oxigênio reserva e estou longe da superfície da água; se eu me lançar para cima agora, nunca chegarei à superfície. Tenho que me acalmar e me concentrar.

Os Luciditas são uma pequena parcela de pessoas que viajam quando sonham. Sou um deles. Sou uma Lucidita. Sou uma Lucidita. Meu corpo faz contato com o fundo irregular e arenoso do lago. Sou uma Lucidita. Sou uma Lucidita. Sou uma Lucidita. Minha pele molhada dá de encontro com o chão frio como metal.  Um barco a motor faz um estrondo acima, seu motor é silenciado, pelo que parece, por ligas de água. Mesmo que minha consciência esteja explodindo de excitação e ansiedade, tento ficar calma. Sem pensar, separo meus lábios e respiro fundo. Sou uma Lucidita. Sou uma Lucidita. Sou uma Lucidita. 

—E está prestes a ser uma garota morta se não acordar! —gritou um garoto.

CAPÍTULO TRÊS

Luzes efervescentes agridem os meus olhos.

—Vamos, você tem de acordar! Estamos ficando sem tempo! —um desconhecido fala com urgência. Contemplo a auréola que flutua sobre sua cabeça. Eu morri? Aqui é o céu? Ele é um anjo?

Preocupação paira em suas feições quando o vejo se afastando. Com a luz já não tão diretamente atrás dele, o efeito some. A aréola desaparece.

Ele agita as mãos, implorando que eu acorde e o siga. Se estou totalmente acordada, tenho certeza que não parece que estou. De alguma forma, estou num estado entre o sonhar e o acordar. Presa. Tudo parece desfocado, como se estivesse atrás de um toldo de plástico. Qualquer ação ou voz se cala. Abafa. Silencia. Há um zumbido nos meus ouvidos, como se galões de água estivessem pressionando meus tímpanos.

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