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Entre a loucura e a norma: Mulheres internadas no Sanatório Pinel (São Paulo, 1929-1944)
Entre a loucura e a norma: Mulheres internadas no Sanatório Pinel (São Paulo, 1929-1944)
Entre a loucura e a norma: Mulheres internadas no Sanatório Pinel (São Paulo, 1929-1944)
E-book262 páginas3 horas

Entre a loucura e a norma: Mulheres internadas no Sanatório Pinel (São Paulo, 1929-1944)

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Sobre este e-book

Esta pesquisa investiga a história de mulheres diagnosticadas como loucas e internadas no Sanatório Pinel de Pirituba entre 1929 e 1944. Por meio dos prontuários médicos produzidos naquela instituição e de alguns escritos do Doutor Pacheco e Silva, fundador e diretor do Sanatório, pretende-se rastrear os perfis considerados desviantes da norma, problematizando os padrões destinados às mulheres. O espaço em que se desenvolveram essas histórias foi São Paulo, por isso tornou-se necessário elaborar um panorama da cidade em sua perspectiva modernizadora, destacando seu processo de urbanização e a intervenção da medicina na constituição urbana. Relaciona-se o projeto modernizador da cidade com a institucionalização de clínicas psiquiátricas, bem como a ampliação da inserção do discurso médico, visando uma normatização de comportamentos, tanto no espaço público como no privado. Dessa forma, questionam-se os papéis conferidos às mulheres, enquanto responsáveis pela família e pela formação dos futuros cidadãos, atrelando sua função social à sua constituição biológica/ reprodutora, delineando os discursos existentes acerca da feminilidade, as funções de esposa, mãe e dona de casa como destino natural para as mulheres, em contraposição à restrição de outras possibilidades de experiências femininas identificadas como desviantes, anormais e patológicas.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento17 de mai. de 2018
ISBN9788593955259
Entre a loucura e a norma: Mulheres internadas no Sanatório Pinel (São Paulo, 1929-1944)

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    Pré-visualização do livro

    Entre a loucura e a norma - Bruna dos Santos B. Pereira

    Bruna dos Santos Beserra Pereira

    Entre a loucura e a norma:

    mulheres internadas no Sanatório Pinel

    (São Paulo, 1929-1944)

    São Paulo

    e-Manuscrito

    2018

    AGRADECIMENTOS

    Ao escrever estas palavras percebo que uma parte importante da minha trajetória está sendo concluída, foram dois anos dedicados a leituras, escrita, reflexão, angústia e felicidade, em um misto de sentimentos por vezes opostos, mas que refletiam o que representava a produção deste trabalho. Ao longo do processo de elaboração da dissertação de mestrado (defendida na PUC/SP) que dá origem agora a esta obra, muitas foram as mudanças pelas quais passei, mas em todos os momentos pude contar com a colaboração de pessoas que foram fundamentais, por isso não posso deixar de agradecê-las.

    Agradeço à minha mãe, Marcia, por me apoiar em todas as decisões, por me dar suporte e auxílio nos momentos em que mais necessitei e por não permitir que tudo se desmoronasse nos momentos caóticos. Aproveito para me desculpar pelos livros, cadernos e papéis espalhados pela casa e pelas ausências quando você precisava de mim. À minha irmã, Sofia, sua presença me traz felicidade e serenidade, obrigada pelas conversas, passeios, alegrias e por me ajudar em tantas tarefas. Agradeço ao meu pai, Amilton, meus avós, tios e primos por me incentivarem e me proporcionarem momentos descontraídos. Agradeço ao querido André, pelo apoio, amor, suporte e por tudo o que representou para mim nesses anos de convivência.

    Agradeço à professora Maria Izilda por todo o suporte e apoio necessários para realização deste trabalho, obrigada pela paciência, gentileza, generosidade, prontidão e profissionalismo. Sua trajetória me desperta admiração e foi um grande incentivo para a escrita deste estudo.

    Agradeço às professoras Andrea Borelli e Sandra Colucci pela gentileza em participarem da banca de qualificação. Obrigada pela leitura atenta do texto, pelas críticas, sugestões e por terem proporcionado novas possibilidades de análise e caminhos para a pesquisa.

    Agradeço a todos os professores do Departamento de Pós-Graduação em História da PUC, em especial à professora Yvone Dias Avelino pelas sugestões para a pesquisa.

    Agradeço aos amigos que estiveram comigo nesse processo. Especialmente ao Redson, por compartilhar textos, ideias, cafés, angústias, felicidades e por me incentivar quando eu achava que nada mais daria certo. À querida Mariana, obrigada por estar comigo durante algumas disciplinas, pelo compartilhamento de ideias, pelas conversas aleatórias, pelas risadas, por me apresentar o Ilu Oba de Min – tocar junto com você e com todas as mulheres que compõem o bloco me fez perceber que não estou sozinha e me deu forças para superar momentos difíceis. À Carol pelo apoio na escola, pelas viagens, por me mostrar novos caminhos para ensinar história e por não me deixar acomodar diante das injustiças. À Lucimara por todo o apoio, compreensão e incentivo.

    À Capes pela concessão da bolsa, que foi fundamental para que eu concluísse este trabalho.

    A todos os funcionários do Arquivo Público do Estado de São Paulo e da biblioteca da PUC campus Monte Alegre, sem a competência e auxílio de vocês não teria chegado às fontes que foram utilizadas neste estudo.

    Aos meus alunos, pelos questionamentos, pela convivência, por me incentivarem a ser uma pessoa melhor e por serem uma das razões pelas quais eu estudo e compartilho a História.

    Por fim, a todas as mulheres, estudadas aqui ou não, por suas trajetórias, lutas, rupturas e conquistas.

    Muito obrigada!

    SUMÁRIO

    Apresentação

    Capítulo I – Transformações na Pauliceia: médicos, cidade e sociabilidades

    1.1 São Paulo em busca da modernidade: desafios constantes

    1.2 Novas formas de lazer e espaços de sociabilidade

    1.3 Cidades e médicos: higiene e controle social

    Capítulo II – Consolidação do saber médico-psiquiátrico

    2.1 Dr. Pacheco e Silva: Trajetória acadêmica, política e profissional

    2.2 Consolidação do saber médico e fundação do Sanatório Pinel

    2.3 Prontuários médicos: possibilidades de análise

    Capítulo III – Ser mulher: norma médica e loucura

    3.1 A inferioridade feminina: uma questão

    3.2 Mulher: medicina e família

    3.3 Modelo ideal de família e a nova mulher

    Considerações finais

    Fontes e Bibliografia

    Notas

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 - São Paulo, em 1862 – cidade com ruas irregulares e sem calçamento

    Figura 2 - São Paulo, início do século XX – bonde movido por burros

    Figura 3 - São Paulo, século XX – bonde movido a energia elétrica

    Figura 4 - Rua Libero Badaró na década de 1920

    Figura 5 - Praça da Sé em 1940, com a Catedral em construção e grande quantidade de carros e ônibus em circulação

    Figura 6 - Casa no Jardim América (idealizado pela Companhia City), na década de 1930

    Figura 7 - Grupo de crianças em um cortiço no bairro de Santana, São Paulo, no início do século XX

    Figura 8 - Vila Maria Zélia, São Paulo, no início do século XX

    Figura 9 - Antonio Carlos Pacheco e Silva, 1930. Obra de Tarsila do Amaral

    Figura 10 - Propaganda do Sanatório Pinel, publicada no jornal,O Estado de S. Paulo em 12 de janeiro de 1932

    Figura 11 - Fragmento de questionário com informações sobre a paciente L.B

    Figura 12 - Frente e verso do cartão de visita da irmã da paciente E.C., direcionado ao Dr. Pacheco e Silva

    Figura 13 - Carta da paciente M.A.Q. endereçada à sua mãe

    Figura 14 - Carta do pai da paciente I.C.A. endereçada ao Dr. Pacheco e Silva

    Figura 15 - Fragmento de questionário com informações escritas pelo marido da paciente B.P

    Figura 16 - Eunice Caldas

    APRESENTAÇÃO

    A pesquisa na área da História é repleta de subjetividades, atualmente não se nega que os historiadores partem de inquietações particulares para desenvolver sua pesquisa. Mesmo que não seja um interesse objetivo e diretamente relacionado com suas vivências, a questão do fascínio pelo objeto a ser estudado é uma das premissas para o desenvolvimento de um trabalho historiográfico.

    Novas preocupações da historiografia com a descoberta de outras histórias¹ abriram possibilidades para os historiadores, ampliando tanto os temas de pesquisa como os sujeitos estudados. Uma diversidade de trabalhos historiográficos surgiu e enriqueceu a pesquisa em história.

    Cabe ressaltar que o estudo do passado não pretende, e não pode, recuperá-lo como ele ocorreu. O trabalho do historiador é a construção de um discurso a partir da análise das fontes com a articulação do contexto em foram produzidas. Nesse sentido, o domínio que se tem sobre o passado é sempre parcial².

    Este livro, resultado de uma pesquisa de mestrado, tem como objetivo principal estudar mulheres que foram internadas no Sanatório Pinel de Pirituba entre os anos de 1929 e 1944. A baliza cronológica compreende o ano em que o sanatório foi fundado até o momento em que passou para a administração estadual.

    As fontes utilizadas para elaboração deste trabalho são os prontuários médicos do referido sanatório, disponíveis atualmente para consulta pública no Arquivo Público do Estado de São Paulo. Inicialmente, devido ao alto número de prontuários (4.000, divididos em 100 latas), a seleção foi feita seguindo o critério de identificar os casos de mulheres que foram internadas mais de uma vez no sanatório. No entanto, a leitura de alguns prontuários de mulheres que sofreram uma única internação, mas por motivos incomuns levou à adoção de um critério menos fechado: analisar prontuários de mulheres que trazem informações a respeito de condutas consideradas fora do padrão adequado para a época. Também foram estudados os livros Psiquiatria clínica e forense e Direito a Saúde, ambos escritos pelo Doutor Antonio Carlos Pacheco e Silva, fundador e diretor do Sanatório Pinel.

    A mente e o corpo sempre foram objetos de preocupação, controle e regulação social. A possibilidade de analisar os diferentes discursos a respeito desses aspectos permite desvelar histórias e personagens que muitas vezes não são estudados ou foram excluídos da escrita da história.

    Pode parecer distante a legitimação e poder que o discurso médico exercia naquele período, no entanto, atualmente a medicina continua a ditar regras para o bem viver. Jornais, revistas, anúncios publicitários e programas televisivos enfatizam a necessidade de cuidar da saúde e propagam diversas ações visando alcançar um bem-estar e, consequentemente, a felicidade, sempre com a palavra final de médicos, o tempo todo a lembrar como se deve viver.

    Esses discursos são excludentes e tentam impor um padrão de vida considerado adequado: é preciso praticar exercícios físicos, ter uma alimentação balanceada, fugir do estresse, encontrar um hobby e ter momentos de lazer, tudo em busca da satisfação. Esses discursos homogeneizantes não levam em consideração os diferentes modos de viver, normatizam-se comportamentos sem pensar de que maneira as pessoas podem vivenciá-los e se gostariam de vivenciá-los em seu cotidiano. Ao refletir sobre esses discursos amplamente divulgados, resta a dúvida: quem determinou esses padrões?

    Para além dos discursos médicos relacionados à saúde e ao bem-estar físico, nota-se que a psiquiatria e, em alguns casos, a psicologia estão sendo utilizadas como guias por grande parte da população atual:

    As pessoas se voltam para as psicociências para organizar seus relacionamentos, educar suas crianças, para interpretar a arte, para melhorar a vida sexual, para nos dizer por que estamos infelizes, deprimidos, ansiosos ou fatigados.³

    As pessoas que não se identificam com esses discursos por vezes se sentem excluídas. Dessa forma, nota-se que a construção de uma norma, com apoio da mídia, é capaz de criar uma série de desajustes, visto que aqueles que não conseguem se enquadrar nos padrões considerados normais tendem a viver uma situação desconfortável, se não perante os outros, perante si mesmos. Para aqueles que apresentam esses desajustes, a medicina se apresenta como capaz de curar as inquietações quando já instaladas ou, o que é preferível segundo o discurso médico, preveni-las, de modo que a sociedade permaneça (ou se torne) saudável. Pretende-se que este trabalho possibilite ao leitor compreender que os discursos médicos não podem ser naturalizados, pois são construções históricas e culturais que se modificam de acordo com a sociedade em que se inserem.

    As mulheres abordadas nesta pesquisa foram internadas e diagnosticadas como loucas, nesse sentido, cabe analisar suas experiências sob uma perspectiva histórica levando em conta que cada época guarda sua particularidade em relação à loucura, que desperta atenção como objeto, já que, para se tentar sua cura, várias práticas foram criadas e reelaboradas. Desse modo, busca-se problematizar a institucionalização da internação em hospitais psiquiátricos como mecanismo de tratamento e cura da loucura, sem perder de vista que essa prática vem acompanhada de violência, restrição de direitos e a ampliação do poder médico. Poder que existe por conta de um saber – uma vez que os médicos são detentores desse saber, são os responsáveis pelo domínio e controle desse poder, utilizando os hospitais como lugar privilegiado para o desenvolvimento de suas práticas e legitimação de seus discursos.

    Aqui, pretende-se questionar sobre a dita loucura feminina e os discursos que levavam à determinação da loucura em uma pessoa. As mulheres são priorizadas nesta pesquisa por sua situação de exclusão ao longo da história e pelo fato de serem consideradas mais propensas à loucura. Analisar esses prontuários permite perceber as representações sobre os comportamentos femininos normais e anormais segundo os discursos estabelecidos.

    O início do século XX marcou um novo momento na história. O discurso médico se inseriu na sociedade e, ao lado do discurso religioso e do jurídico, passou a ser um dos orientadores comportamentais, com um forte repertório composto por regras e deveres. Naquela conjuntura, era perceptível a necessidade de higienização e controle da ordem social. Esse controle era embasado nos discursos médicos da época e tinha por objetivo orientar as pessoas em relação a diversos aspectos de suas vidas, criando uma rígida regulação social. Quem não se enquadrasse nos padrões estabelecidos, rapidamente seria estigmatizado como alguém desviante e deveria ser recuperado para bem viver em sociedade e não atrapalhar a ordem.

    Havia um entendimento entre o governo e os institutos de medicina, enquanto os médicos produziam teses e tratados, o governo criava instituições para reestabelecer a ordem pública e segregar da sociedade os que pudessem causar problemas. Surgiram então as primeiras clínicas psiquiátricas, ainda no início do século XX. Antes desse período já havia algumas casas de internação para loucos, mas elas tinham caráter assistencial e eram mantidas pela Igreja. A partir da institucionalização das clínicas psiquiátricas, é possível notar um esforço em medicalizar o corpo doente e torná-lo saudável para devolvê-lo à sociedade.

    Havia uma grande mobilização para normatizar as mulheres: os estereótipos da rainha do lar e da mãe e esposa dedicada eram propagados em toda a sociedade, nas revistas femininas, nas propagandas do governo, no discurso religioso e no discurso médico. As que não se enquadrassem no padrão estabelecido seriam marginalizadas e, muitas vezes, penalizadas.

    O primeiro capítulo, Transformação da Pauliceia: médicos, cidade e sociabilidades, pretende abordar aspectos da história da cidade de São Paulo e articular as experiências urbanas com as novas formas de lazer e os novos espaços de sociabilidade, além de identificar de que maneira as mulheres se relacionavam com o espaço urbano. Pretende-se relacionar o projeto de modernização e higienização com a intervenção da medicina no espaço urbano.

    O segundo capítulo, Consolidação do saber médico-psiquiátrico, procura levantar a trajetória de Antonio Carlos Pacheco e Silva, buscando suas orientações ideológicas e sua influência em diversos âmbitos. Para se compreender a ampla influência da medicina, esse capítulo demonstrará como se organizou a consolidação do saber médico através do ensino, articulado com a construção de hospitais, em especial o Sanatório Pinel. E, por fim, abordará a estrutura e composição dos prontuários médicos do Sanatório Pinel.

    O último capítulo, Ser mulher: norma médica e loucura, pretende historicizar as teorias a respeito da mulher, o modo como seu corpo foi visto e redefinido por diversos discursos que buscaram explicá-lo em comparação com o corpo masculino, criando uma ideia de inferioridade inerente. Também propõe problematizar a loucura feminina, buscando suas especificidades e relação com questões de moralidade e sexualidades impostas, bem como o papel da família na identificação desses desvios. Por fim, busca compreender a associação entre a família e a mulher na construção da modernidade e do progresso nacional.

    CAPÍTULO I – TRANSFORMAÇÕES NA PAULICEIA: MÉDICOS, CIDADE E SOCIABILIDADES

    O advento dos veículos de tração a motor, a rapidez com

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