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Orgulho e Preconceito
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Orgulho e Preconceito
E-book472 páginas7 horas

Orgulho e Preconceito

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Sobre este e-book

Neste romance, Jane Austen procede a uma profunda introspecção das suas personagens. E, como noutros livros seus, a ironia é posta ao serviço dessa compre- ensão.
A chegada de vários jovens marca uma súbita transformação na vida de uma família de classe média rural, os Bennets, em particular na das suas cinco filhas.
Um desses jovens é Darcy, um membro da alta sociedade que se distingue pelo orgulho. Desenvolve-se uma série de desafios, de equívocos, de julgamentos apressados, que conduzem à mágoa e ao escândalo, mas também ao autoconhecimento e amor. E os encontros e desencontros entre Elizabeth Bennet e Fitzwilliam Darcy vão marcando o ritmo da narrativa e o seu adiado epílogo.

«As principais heroínas de Austen — Elizabeth, Emma, Fanny e Anne — possuem uma tão grande liberdade pessoal que as suas individualidades não podem ser reprimidas. (…) Uma concepção de liberdade interior que se centra numa recusa de aceitar estima a não ser de alguém a quem se conferiu estima situa- -se no mais alto grau da ironia. A suprema cena cómica em toda a obra de Austen é a rejeição que Elizabeth faz da primeira proposta de casamento de Darcy (…).» [Harold Bloom]
IdiomaPortuguês
Data de lançamento22 de mai. de 2020
ISBN9789897830426
Autor

Jane Austen

Jane Austen (1775-1817) was an English novelist known for six major novels, Pride and Prejudice; Sense and Sensibility; Becoming Jane; Emma; Mansfield Park>; and Northanger Abbey. Her writing style has been widely thought of as a cross between realist and romantic genres. Austen’s prose is poignant, and always features a strong-willed female protagonist. While sparing no detail depicting the lavishness of women in the English upper class, Austen also portrayed the reality of gendered social dynamics in the 19th century. Austen has been hailed as a heroine of her own time, in large part because most of the novels of the day were written by men. Indeed, her literature portrayed a female narrative that was often overlooked in the catalogue of male authors at the time. Austen’s platform gave an important voice to girls and women in literature, and it is for that reason, among countless others, that her works continue to inspire readers today.

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    Orgulho e Preconceito - Jane Austen

    Jane Austen

    É provável que se Miss Cassandra Austen tivesse levado a sua avante nada mais tivéssemos de Jane Austen do que os seus romances. Só nas cartas à irmã mais velha ela era realmente franca; só a ela confiava as suas esperanças e, se acreditarmos nos rumores, também a grande decepção da sua vida; mas quando Miss Cassandra Austen foi ficando mais velha e a fama crescente da irmã a fez suspeitar de que estaria próximo o tempo em que os estranhos se intrometeriam e os académicos especulariam, queimou, embora com grande pesar, todas as cartas que pudessem satisfazer­-lhes a curiosidade e guardou apenas as que considerou demasiado triviais para suscitarem interesse.

    Assim, o nosso conhecimento de Jane Austen provém de rumores, de algumas cartas e dos seus livros. Quanto aos rumores, os que sobreviveram à sua época nunca são de menosprezar; com alguns ajustes, servem admiravelmente os nossos propósitos. Por exemplo, Jane «não é nada bonita e é muito recatada; nem parece uma menina de doze anos... Jane é caprichosa e afectada», diz da prima a pequena Philadelphia Austen. Temos depois Mrs. Mitford, que conheceu as Austens na adolescência e achava Jane «a mais bonita, mais tonta e mais afectada borboleta namoradeira que jamais conhecera». A seguir temos uma amiga anónima de Miss Mitford «que é agora visita da casa [e] diz que ela se transformou no mais directo, preciso e taciturno pedaço de solitária bem­-aventurança que já existiu, e que, até Orgulho e Preconceito ter mostrado a jóia preciosa que se escondia naquele estojo inflexível, ela era tão respeitada socialmente como um atiçador ou um guarda­-fogo... O caso agora mudou muito de figura», continua a dizer a velha senhora; «ela continua a ser um atiçador — mas um atiçador de quem toda a gente tem medo... Um espírito superior, uma delineadora de carácter que não fala é realmente terrível!» Claro que do outro lado há os Austens, uma raça pouco dada a manifestações autopanegíricas, mas apesar disso dizem que os irmãos de Jane «eram muito seus amigos e estavam muito orgulhosos dela. Estimavam­-na pelas suas virtudes, talentos e modos cativantes, e cada um deles gostava de encontrar semelhanças entre alguma filha ou sobrinha e a sua querida irmã Jane, cuja réplica perfeita contudo não desejavam vir a encontrar». Encantadora mas directa, amada pela família mas temida pelos estranhos, de língua afiada mas coração terno — estes contrastes não são de modo algum incompatíveis, e quando considerarmos os romances daremos por nós a tropeçar também nas mesmas complexidades da escritora.

    Para começar, a menina recatada, caprichosa e afectada, que Philadelphia achava não parecer nada uma criança de doze anos, iria ser em breve a autora de uma história bem pouco infantil, Love and Freindship, que, por mais incrível que pareça, foi escrita aos quinze anos. Aparentemente, foi escrita como forma de entretenimento para a sala de aula; uma das histórias do mesmo livro é dedicada com jocosa solenidade ao irmão e uma outra está primorosamente ilustrada pela irmã com cabeças pintadas a aguarela. Tudo isto são graças que sentimos como coisas de família, remoques satíricos que eram levados para casa, porque todos os pequenos Austens troçavam em conjunto das senhoras que «suspiravam e desmaiavam no sofá».

    Os irmãos e irmãs devem ter rido com gosto quando Jane leu em voz alta o seu último ataque aos vícios que todos eles abominavam. «Morri mártir da minha mágoa pela perda de Augustus. Um desfalecimento fatal custou­-me a vida. Cuidado com os Desfalecimentos, Querida Laura... Enlouquece quantas vezes quiseres, mas não desmaies. ..» E lá desatou ela, tão depressa quanto conseguia escrever e mais depressa ainda do que conseguia soletrar, a contar as incríveis aventuras de Laura e Sophia, de Philander e Gustavus, do cavalheiro que conduzia uma carruagem entre Edimburgo e Stirling dia sim dia não, do roubo da fortuna que estava guardada na gaveta da mesa, de mães famintas e filhos que representavam Macbeth. Sem dúvida a história deve ter arrancado sonoras gargalhadas na sala de aula. No entanto, nada é mais óbvio do que esta rapariga de quinze anos, sentada no seu canto da sala a escrever, não para arrancar uma gargalhada ao irmão e às irmãs, nem para consumo familiar. Estava a escrever para todos, para ninguém, para a nossa época, para a sua própria época; por outras palavras, mesmo com tão pouca idade, Jane Austen já era escritora. Sentimo­-lo no ritmo, na harmonia e na sobriedade das suas frases. «Ela não passava de uma jovem simples e bem­-disposta, amável e delicada; portanto, era quase impossível antipatizar com ela — ela era apenas um objecto de desprezo.» Uma frase como esta é escrita para sobreviver às férias de Natal. Espirituoso, fácil, divertido, aproximando­-se na sua liberdade do puro disparate — Love and Freindship é tudo isso; mas que nota é esta que nunca se funde com o resto, que ressoa distinta e penetrantemente por todo o livro? É o som de gargalhadas. É a menina de quinze anos a rir­-se do mundo no seu canto.

    As meninas de quinze anos estão sempre a rir. Riem quando Mr. Binney se serve de sal em vez de açúcar. Quase morrem de riso quando a velha Mrs. Tomkins se senta em cima do gato. Mas no minuto seguinte estão a chorar. Não possuem o distanciamento de observação que lhes permita ver que há algo de perpetuamente risível na natureza humana, algo que é inerente a homens e mulheres e suscita eternamente a nossa sátira. Elas não sabem que Lady Greville, que desdenha, e a pobre Maria, que é desdenhada, são figuras permanentes em todos os salões de baile. Mas Jane Austen sabia­-o desde o dia em que nasceu. Uma daquelas fadas que se empoleiram nos berços deve tê­-la levado consigo num voo de reconhecimento mal ela veio ao mundo. E quando foi de novo colocada no berço, não só já sabia como era o mundo como até já tinha escolhido o seu reino e concordado que, se pudesse reinar sobre esse território, não cobiçaria nenhum outro. Assim, aos quinze anos, tinha poucas ilusões sobre os outros e nenhumas sobre si mesma. Tudo o que ela escreve está pronto, acabado e resolvido na sua relação não com o presbitério, mas com o universo. Ela é impessoal e imperscrutável. Quando Jane Austen, a escritora, escreveu, na cena mais notável do livro, um pouco da conversa de Lady Greville, não há vestígios de raiva pelo desprezo de que a filha do clérigo, Jane Austen, um dia foi alvo. O seu olhar segue directamente para a marca, e nós sabemos precisamente onde está essa marca no mapa da natureza humana. Sabemos porque Jane Austen se mantinha fiel a si mesma, nunca ultrapassando as suas próprias fronteiras. Nunca, nem mesmo aos quinze anos, uma idade emocionalmente instável, ela se retraiu por vergonha, obliterou um sarcasmo num espasmo de compaixão ou rasurou um plano numa bruma de êxtase. Espasmos e êxtases, parece ter dito, apontando com a varinha, acabam ali; e a linha de fronteira é perfeitamente visível. Mas ela não nega que luas, montanhas e castelos existam — do outro lado. Tem até uma paixão. Pela rainha dos escoceses. Ela realmente admirava­-a muito. «Uma das primeiras personagens do mundo», assim se referia a ela, «uma princesa encantadora cujo único amigo era então o duque de Norfolk, e são agora Mr. Whitaker, Mrs. Lefroy, Mrs. Knight e eu própria.» Com estas palavras, a sua paixão é rigorosamente circunscrita e rematada com uma risada. É curioso lembrar o que escreveram as jovens Brontës, não muito tempo depois, no seu presbitério a norte, sobre o duque de Wellington.

    A menina recatada tornou­-se «a mais bonita, mais tonta e mais afectada borboleta namoradeira» que Mrs. Mitford jamais conheceria, e, além disso, autora de um romance chamado Pride and Prejudice, que, escrito às escondidas atrás de uma porta que rangia, passou muitos anos fechado na gaveta sem ser publicado. Pensa­-se que pouco depois começou a escrever uma outra história, The Watsons, mas por alguma razão a história não a satisfez e deixou­-a inacabada. Os produtos de segunda de um grande escritor valem a pena ser lidos porque nos oferecem a melhor crítica às suas obras­-primas. Aqui são mais visíveis as dificuldades da jovem Jane Austen, e o método usado para as ultrapassar não está tão habilmente dissimulado. Para começar, a rigidez e o despojamento dos primeiros capítulos provam que ela se encontra entre aqueles escritores que lançam os factos a seco para o papel numa primeira versão e depois voltam atrás vezes sem conta para os enquadrarem e revestirem com carne o esqueleto da história. Como teria isso sido feito no caso dela não podemos dizer — por meio de que supressões, inserções e hábeis artifícios. Mas o milagre teria acontecido; a história enfadonha de catorze anos de vida em família ter­-se­-ia convertido em mais uma dessas primorosas caracterizações, feitas aparentemente sem esforço, em que jamais seríamos capazes de perceber a quantas páginas de trabalho insano Jane Austen tinha sujeitado a caneta. Aqui percebemos que afinal ela não era mágica. Como outros escritores, tinha de criar a atmosfera em que o seu génio peculiar pudesse dar fruto. Aqui tacteia; ali deixa­-nos na expectativa. E, de repente, está pronto; agora as coisas podem acontecer como ela gosta que as coisas aconteçam. Os Edwards vão ao baile. A carruagem dos Tomlinsons vai a passar, ela pode contar­-nos que Charles «está a calçar as luvas e lhe recomendam que não as tire»; Tom Musgrave retira­-se para um canto com um barril de ostras e aí fica confortavelmente. O génio de Jane Austen está activo, à solta. De imediato os sentidos são convocados e os sonos adquirem aquela intensidade peculiar que só ela consegue transmitir. Mas em que consistia afinal tudo isto? Num baile numa cidade de província; meia dúzia de casais a conversar e a jogar cartas numa sala; comida e bebida; e, numa nota de catástrofe, um rapaz a ser desprezado por uma rapariga e tratado com simpatia por outra. Sem tragédia, sem heroísmo. No entanto, esta pequena cena é extraordinariamente comovente em contraste com a sua superficial solenidade. É­-nos dado ver que, se Emma agiu assim no salão de baile, que atenciosa, meiga e inspirada por sentimentos sinceros não se mostraria naquelas crises mais graves que, à medida que a observamos, inevitavelmente se prefiguram ante os nossos olhos. Jane Austen alberga, assim, muito mais emoção do que aparenta à superfície. Ela estimula­-nos a providenciar o que não está lá. O que ela oferece é aparentemente uma insignificância, mas contém, no entanto, algo que se expande na mente do leitor da mais duradoura forma em cenas da vida que são exteriormente triviais. A tónica é posta sempre na personagem. E então somos levados a pensar: Como se comportará Emma quando lorde Osborne e Tom Musgrave aparecem cinco minutos antes das três, precisamente quando Mary está a entrar na sala com um tabuleiro e o faqueiro? É uma situação deveras embaraçosa. Os jovens estão habituados a muito mais etiqueta. Emma pode revelar­-se mal­-educada, vulgar, um zero à esquerda. As voltas e reviravoltas do diálogo mantêm­-nos nas garras do suspense. Metade da nossa atenção está centrada no momento presente, a outra metade no futuro. E quando, no fim, Emma se comporta de modo a vingar as nossas mais ambiciosas esperanças, comovemo­-nos como se tivéssemos sido feitos testemunhas de uma ocorrência da maior importância. Nesta história inacabada e de um modo geral de qualidade inferior, encontramos na verdade todos os elementos da grandeza de Jane Austen — é uma história que tem a qualidade perene da literatura. Ponhamos de lado toda a agitação superficial, a semelhança com a vida, e o que fica e nos dá um prazer mais intenso é uma refinada discriminação dos valores humanos. Retiremos também isto do pensamento e poderemos deter­-nos com extrema satisfação na arte mais abstracta que, na cena no salão de baile, diversifica as emoções e equilibra os papéis de tal maneira que a apreciaríamos como se aprecia a poesia, por si mesma, e não como o elo que encaminha a história nesta ou naquela direcção.

    Mas, segundo os rumores, Jane Austen era perpendicular, precisa e taciturna — «um atiçador de quem todos têm medo». Também disto há vestígios; ela podia ser bastante impiedosa; e é uma das autoras satíricas mais consistentes de toda a literatura. Aqueles primeiros e angulosos capítulos de The Watsons provam que o seu génio não era prolífico; não lhe bastava, como a Emily Brontë, abrir a porta para se fazer notada. Humilde e alegremente, ia juntando os galhos e as palhas com que faria o ninho, entrelaçando­-os meticulosamente. Mas os galhos e as palhas já estavam um pouco secos e cobertos de pó. Havia a casa grande e a casa pequena; um chá, um jantar e de vez em quando um piquenique; a vida era pautada por valiosos contactos e rendimentos adequados; estradas lamacentas, pés molhados e uma tendência por parte das senhoras para se cansarem; assentava em pequenos princípios, era de pequena consequência e beneficiava da educação a que tinham acesso as famílias da classe média­-alta da província. Vício, aventura e paixão eram deixados de fora. Mas prosaísmo e pequenez à parte, ela não foge a nada e nada é ignorado. Com paciência e precisão, diz­-nos que eles «não fizeram qualquer paragem até chegarem a Newbury, onde uma refeição reconfortante, valendo por jantar e ceia, encerrou os prazeres e fadigas desse dia». Também às convenções não presta tributo apenas por palavras; e não só as aceita como acredita nelas. Quando está a descrever um clérigo como Edmund Bertram, ou um marinheiro, é como se a santidade do seu mister a impedisse de usar livremente o seu principal instrumento, a veia satírica, o que a leva a cair no panegírico decoroso ou nas descrições factuais. Mas estas são excepções; geralmente, a sua atitude evoca a tirada da senhora anónima que diz: «Um espírito brilhante, delineador da personalidade mas que não fala é realmente terrível!» Jane Austen não deseja reformar nem destruir; guarda silêncio, e isso é realmente terrível. Uns atrás dos outros, cria os seus parvos, os seus pedantes, os seus fidalgotes, os seus Mr. Collins, os seus Sir Walter Elliotts, as suas Mrs. Bennets. Envolve­-os em frases como chicotadas que, à medida que os atingem, lhes recortam para sempre as silhuetas. Mas eles ali ficam, sem desculpas, sem misericórdia. Nada resta de Júlia nem de Maria Bertram quando Jane Austen acaba com elas; Lady Bertram é deixada «sentada, a chamar por Pug, tentando afastá­-lo dos canteiros de flores» eternamente. A justiça divina é doseada; o Dr. Grant, que começa por gostar do ganso tenro, acaba por abrir caminho para «a apoplexia e a morte com três copiosos jantares institucionais numa só semana». Por vezes parece que as criaturas de Jane Austen nasceram meramente para lhe darem o supremo prazer de as decapitar. Ela está satisfeita; está contente; não alteraria um cabelo que fosse na cabeça de nenhuma delas, não moveria um tijolo ou uma folha se tanto num mundo que lhe proporciona tão requintado deleite.

    Na verdade, nós também não. Porque mesmo que as dores da vaidade ultrajada ou a chama da ira moral nos exortassem a melhorar um mundo tão cheio de despeito, mesquinhez e loucura, a tarefa está além das nossas capacidades. As pessoas são assim mesmo — a menina de quinze anos sabia­-o; a mulher madura prova­-o. Neste preciso momento há uma Lady Bertram a tentar manter um Pug afastado dos canteiros deflores; ela manda Chapman ajudar Miss Fanny um pouco tarde demais. A discriminação é tão perfeita, a sátira tão justa que, por muito consistente que seja, quase escapa à nossa observação. Nenhum toque de mesquinhez, nenhuma insinuação de despeito nos acordam da nossa contemplação. O deleite mistura­-se estranhamente com o nosso divertimento. A beleza ilumina estes parvos.

    Essa elusiva qualidade é na verdade composta muitas vezes de partes muito diferentes que só um génio excepcional consegue reunir. O talento de Jane Austen é acompanhado pela perfeição do seu gosto. O seu parvo é mesmo parvo, o seu snobe mesmo snobe, porque é criado a partir do modelo de sanidade e sensatez que ela tem em mente e inequivocamente nos transmite ao mesmo tempo que nos faz rir. Nunca outro romancista recorreu tanto a um exacto sentido dos valores humanos. É contra a natureza de um coração que não erra, de um bom gosto infalível e de uma moral quase austera que ela expõe estes desvios da bondade, da verdade e da sinceridade, que estão entre as coisas mais deliciosas da literatura inglesa. É inteiramente por este processo que ela cria uma Mary Crawford, com a sua mescla de boas e más qualidades. Deixa­-a arengar contra o clero ou a favor de um título de baronesa e dez mil libras por ano com todo o à­-vontade e espírito crítico possíveis, mas de vez em quando introduz uma das suas notas, com muita subtileza mas afinação perfeita, e logo a verve de Mary Crawford, embora continue a divertir­-nos, se esvazia. Nisto radica toda a profundidade, toda a beleza e solenidade das suas cenas. De tais contrastes nasce uma beleza, e até uma solenidade, que são não só tão notáveis como o seu talento, mas dele inseparáveis. Em The Watsons ela dá­-nos um vislumbre deste seu poder, levando­-nos a pensar por que razão um simples gesto de bondade, como ela o descreve, ganha tanto significado. Nas suas obras­-primas, este mesmo dom é levado à perfeição. Nada se desvia do seu curso; é meio­-dia no Northamptonshire; um rapaz pouco interessante está a conversar com uma rapariga de aspecto débil enquanto sobem as escadas para se irem vestir para o jantar e as criadas andam de um lado para o outro. Mas, de repente, as suas palavras fogem aos triviais lugares­-comuns e enchem­-se de significado, e aquele momento torna­-se para ambos um dos mais memoráveis das suas vidas. Vale por si só, brilha, resplandece, paira diante de nós, profundo, trémulo, sereno, por um segundo; depois a criada passa e esta gota, que conteve toda a felicidade do mundo, desfaz­-se suavemente para voltar ao fluxo e refluxo da existência comum.

    O que poderia ter sido então mais natural, ante este vislumbre da sua profundidade, do que Jane Austen decidir escrever sobre as trivialidades da vida quotidiana, as festas, os piqueniques e os bailes na província? Nenhumas sugestões vindas do príncipe regente ou de Mr. Clarke para «alterar o seu estilo de escrita» a poderiam tentar; nenhum romance, nenhuma aventura, política ou intriga poderiam fazê­-la ver a vida de maneira diferente. Na verdade, o príncipe regente e o seu bibliotecário tinham vindo chocar contra um obstáculo formidável ao tentarem interferir com uma consciência incorruptível, com uma infalível sagacidade. A criança que compunha tão magnificamente as suas frases aos quinze anos nunca deixou de as compor e nunca escreveu para o príncipe regente ou para o seu bibliotecário, mas para o mundo em geral. Ela conhecia exactamente as suas capacidades e sabia que material estavam habilitadas a tratar como ele deve ser tratado por uma escritora que se impõe níveis de qualidade muito elevados. Havia impressões que extrapolavam a sua área de competência; emoções que sem esforço nem artifício podiam ser adequadamente trabalhadas com os seus próprios recursos. Por exemplo, ela não podia pôr uma rapariga a falar entusiasticamente de bandeiras e capelas. Não podia lançar­-se de alma e coração num momento romântico. Usava todo o tipo de recursos para evitar cenas de paixão. Abordava a natureza e as suas belezas de uma forma oblíqua, muito sua. Descreve uma bela noite, mas sem mencionar a lua. Não obstante, ao lermos as suas poucas frases formais sobre «a luminosidade de uma noite sem nuvens e o contraste com as sombras cerradas do bosque», a noite torna­-se imediatamente tão «solene, calmante e encantadora» como ela, com toda a simplicidade, nos diz que era.

    O equilíbrio entre os seus dons era singularmente perfeito. Entre os romances que terminou não há fracassos, e entre os seus muitos capítulos poucos são os que ficam notoriamente aquém dos restantes. Mas, afinal, ela morreu com quarenta e dois anos, no auge das suas capacidades, numa idade em que ainda estava sujeita àquelas mudanças que tantas vezes fazem do final da carreira de um escritor o seu período mais interessante. Viva, irreprimível, dotada de grande vitalidade criativa, não restam dúvidas de que, se tivesse vivido mais tempo, teria continuado a escrever, e é irresistível pensar se teria escrito de maneira diferente. As fronteiras estavam marcadas; luas, montanhas e castelos ficavam do outro lado. Mas não se sentiria ela às vezes tentada a ultrapassá­-las por um minuto que fosse? Não estaria ela a começar, no seu estilo alegre e pleno de brilhantismo, a contemplar a hipótese de uma pequena viagem de descoberta?

    Tomemos como referência Persuasion*, o seu último romance completo, e imaginemos, a partir dele, os livros que ela poderia ter escrito se tivesse vivido mais tempo. Há em Persuasion uma beleza e uma monotonia muito próprias. A monotonia é a que tantas vezes marca a transição entre dois períodos diferentes. A escritora está um pouco entediada. Conhece bem demais o mundo que a rodeia, já não encontra nele novidade. Há nas suas passagens de comédia uma aspereza que indicia que deixou de achar graça às vaidades de um Sir Walter ou ao snobismo de uma Miss Elliott. A sátira é mordaz e a comédia desassombrada. Já não tem uma consciência tão fresca das diversões do quotidiano. A mente já não está completamente focada no seu objecto de análise. Mas, apesar de sentirmos que Jane Austen já fez o mesmo antes, e melhor, sentimos também que está a tentar fazer alguma coisa que ainda não fez. Há em Persuasion um novo elemento, talvez essa qualidade que levou o Dr. Whewell a clamar com veemência que esta era «a mais bela das suas obras». Jane Austen está a começar a descobrir que o mundo é maior, mais misterioso e mais romântico do que supunha. Sentimos que assim é quando diz a respeito de Anne: «Tinha sido obrigada a ser prudente na juventude, e aprendeu a ser romântica à medida que foi ficando mais velha — a sequela natural de um início pouco natural.» Detém­-se com frequência na beleza e na melancolia da natureza, no Outono, em que se tinha acostumado apensar na Primavera. Fala da «influência tão doce e tão triste dos meses de Outono no campo». Assinala «as folhas brunas e as sebes secas». «Não amamos menos um lugar por termos sofrido nele», diz a certa altura. Mas não é só nesta sua nova sensibilidade à natureza que detectamos mudança. A sua atitude perante a vida também mudou. Ao longo da maior parte do livro vê­-a através dos olhos de uma mulher que, sendo infeliz, sente uma afinidade especial com a felicidade e a infelicidade dos outros, que, até ao fim, é obrigada a comentar em silêncio. Assim, a observação incide menos nos factos e mais nos sentimentos do que é habitual. Há uma emoção expressa na cena do concerto e na famosa conversa sobre a constância da mulher que comprova não apenas o facto biográfico de Jane Austen ter amado, mas o facto estético de já não ter receio de o dizer. A experiência, quando era de cariz muito sério, tinha de penetrar fundo e ser completamente desinfectada pela passagem do tempo antes de ela se permitir tratá­-la na ficção. Mas agora, em 1817, Jane Austen estava preparada. Também nas suas circunstâncias exteriores estava iminente uma mudança. A sua fama tinha crescido muito lentamente. «Duvido», escreveu Mr. Austen Leigh, «que fosse possível mencionar algum outro autor de nomeada cuja obscuridade pessoal fosse tão completa.» Tivesse ela vivido mais alguns anos e tudo isso se teria alterado. Teria ficado a viver em Londres, teria começado a ir almoçar e jantar fora, a conhecer gente famosa, afazer novos amigos, a ler, a viajar e a levar para a tranquilidade da sua casa de campo um tesouro de observações para saborear paulatinamente.

    E que efeito teria tido tudo isto nos seis romances que Jane Austen não escreveu? Não teria escrito sobre crimes, paixões ou aventuras. Não teria deixado que a importuna pressão dos editores ou a lisonja dos amigos a levassem ao desleixo ou à insinceridade. Mas teria ficado a saber mais. O seu desejo de segurança teria sido abalado e o seu uso da comédia teria sofrido com isso. Teria confiado menos nos diálogos (o que já é perceptível em Persuasion) e mais na reflexão para nos dar a conhecer as suas personagens. Aqueles maravilhosos pequenos discursos que resumem em poucos minutos de conversa tudo aquilo de que precisamos para ficarmos a conhecer um almirante Croft ou uma Mrs. Musgrove, aquele método conciso, estenográfico, que encerra capítulos de análise psicológica, ter­-se­-iam tornado demasiado simples para conter tudo o que ela agora assimilava da complexidade da natureza humana. Teria desenvolvido um método — claro e contido, como sempre, mas mais profundo e mais sugestivo — para transmitir não apenas o que as pessoas dizem, mas o que deixam por dizer; não apenas o que as pessoas são, mas o que a vida é. Ter­-se­-ia mantido mais distante das suas personagens e tê­-las­-ia olhado mais como grupo e menos como indivíduos. A sua sátira teria sido mais dura e mais severa, embora não tão frequente. Teria sido a precursora de Henry James e de Proust — mas basta. São vãs estas especulações: a artista mais perfeita entre as mulheres, a escritora cujos livros são imortais morreu «precisamente quando estava a começar a sentir­-se confiante no seu próprio sucesso».

    Virginia Woolf

    1923

    * Persuasão / Jane Austen; trad. Rogério Casanova, Relógio D’Água, Lisboa, 2014.

    Capítulo 1

    É uma verdade universalmente reconhecida que um homem rico e solteiro precisa de uma esposa.

    Tal verdade encontra­-se tão firmemente implantada nas cabeças das pessoas que, independentemente dos sentimentos ou opiniões do cavalheiro a respeito do assunto, no momento em que ele chega a uma determinada terra, é imediatamente considerado propriedade legítima de alguma das filhas dos seus novos vizinhos.

    «Meu caro», disse um dia a esposa do senhor Bennet, «sabe que Netherfield Park foi alugada, finalmente?»

    O senhor Bennet respondeu que não sabia.

    «Mas foi», continuou ela. «A senhora Long esteve aqui há pouco e contou­-me tudo.»

    O senhor Bennet não disse nada.

    «Não quer saber quem a alugou?», exclamou a sua esposa, impaciente.

    «Já sei que você me vai contar, e não me importo de ouvir.»

    Esta sugestão foi o suficiente.

    «Bom, querido, tenho de lhe contar. A senhora Long diz que Netherfield foi alugada por um jovem cavalheiro de grande fortuna, do Norte de Inglaterra; diz que ele chegou na segunda­-feira, num coche de quatro cavalos, para ver a propriedade, e que ficou tão entusiasmado que fechou imediatamente negócio com o senhor Morris; a senhora Long diz que ele se muda antes do São Miguel, e que os primeiros criados chegam no final da próxima semana.»

    «Como é que ele se chama?»

    «Bingley.»

    «Casado ou solteiro?»

    «Oh, querido — solteiro, obviamente! Um homem solteiro e muito rico, com quatro ou cinco mil libras anuais. Que boa notícia para as nossas filhas!»

    «Boa notícia porquê? Que diferença faz para elas?»

    «Meu querido senhor Bennet», replicou a sua esposa, «não seja maçador! Deve saber que estou a pensar casá­-lo com uma delas.»

    «Foi com essa intenção que ele veio para cá?»

    «Intenção? Que absurdo, como pode dizer tal coisa? Mas é muito provável que ele se apaixone por uma delas, e portanto você tem de lhe fazer uma visita mal ele chegue.»

    «Não vejo razão para isso. Vá você com as meninas, ou talvez seja melhor elas irem sozinhas, ou o senhor Bingley ainda a escolhe a si, já que é tão bonita como qualquer delas.»

    «Meu caro, obrigada pelo elogio. Já fui bonita, sem dúvida, mas neste momento não me considero nada de extraordinário. Uma mulher com cinco filhas crescidas não pode pensar na sua própria beleza.»

    «A maioria das mulheres da sua idade não tem grande beleza em que pensar.»

    «Mas, querido, quero mesmo que vá visitar o senhor Bingley quando ele se mudar.»

    «Não prometo nada.»

    «Pense nas suas filhas. Pense no bom partido que o senhor Bingley podia ser para uma delas. Sir William e Lady Lucas estão decididos a ir, e justamente por esse motivo, pois não costumam visitar recém­-chegados, como você bem sabe. Se o meu amigo o não for visitar, como poderemos nós fazê­-lo?»

    «Não seja tão escrupulosa. Tenho a certeza de que o senhor Bingley ficará muito contente por vos receber; enviar­-lhe­-ei por si um bilhete a dizer que é de todo o coração que lhe dou a mão de uma das minhas filhas; mas vou aconselhá­-lo a escolher a Lizzy.»

    «Espero bem que não faça tal coisa. A Lizzy não é melhor do que as outras; não é tão bonita como a Jane, nem tão alegre como a Lydia. Mas você sempre teve uma predilecção por ela.»

    «Nenhuma tem muito que a recomende», respondeu o senhor Bennet; «são tão tontas e ignorantes como qualquer rapariga; mas a Lizzy é um pouco mais esperta do que as irmãs.»

    «Senhor Bennet, como é que pode insultar assim as suas próprias filhas? Você tem prazer em apoquentar­-me. Não tem compaixão dos meus pobres nervos.»

    «Engana­-se, querida. Tenho muito respeito pelos seus nervos. São como velhos amigos para mim. Há pelo menos vinte anos que a vejo referir­-se a eles com grande consideração.»

    «Ah, você não sabe o que eu sofro.»

    «Tenho a certeza de que isso vai passar, e que você viverá o suficiente para ver muitos cavalheiros de quatro mil libras anuais instalarem­-se na vizinhança.»

    «Mesmo que chegassem vinte deles, não nos serviria de nada, se você se recusa a ir visitá­-los.»

    «Querida, quando eles forem vinte, garanto­-lhe que os visito a todos.»

    O senhor Bennet era formado por uma tão viva mistura de humor sarcástico, reserva e fantasia, que os vinte e três anos de vida em comum não tinham sido suficientes para que a sua mulher lhe compreendesse o carácter. Já a mente da senhora Bennet, decifrava­-se com maior facilidade. Era uma mulher de fraca inteligência, escassa cultura e temperamento inconstante. Quando algo a desgostava, imaginava­-se doente dos nervos. O seu objectivo na vida era casar as filhas; e o seu refrigério era fazer visitas e saber novidades.

    Capítulo 2

    O senhor Bennet foi uma das primeiras pessoas a visitar Netherfield Park. Tivera sempre a intenção de apresentar os seus cumprimentos ao senhor Bingley, apesar de até ao último instante ter garantido à sua esposa que não o faria. E esta só soube da visita depois de a mesma ter sido feita. Soube­-o da seguinte maneira. Certa noite, ao ver a sua segunda filha a experimentar um chapéu, o senhor Bennet disse de repente:

    «Espero que o senhor Bingley goste dele, Lizzy.»

    «Não temos maneira de saber de que gosta ou não o senhor Bingley», disse a senhora Bennet, irritada, «uma vez que o meu amigo se recusa a visitá­-lo.»

    «Mas, mamã, está a esquecer­-se», disse Elizabeth, «de que o vamos encontrar na festa, e que a senhora Long prometeu apresenta­-lo.»

    «Não acredito que a senhora Long o faça. Ela própria tem duas sobrinhas. É uma mulher hipócrita e uma egoísta, e não tenho grande opinião a respeito dela.»

    «Eu também não», disse o senhor Bennet, «e alegra­-me que vocês não estejam dependentes dos serviços da senhora Long.»

    A senhora Bennet não se dignou responder; mas, incapaz de se conter, começou a barafustar com uma das raparigas.

    «Não tussas assim, Kitty. Por amor de Deus! Tem um pouco de compaixão dos meus nervos. Parece que mos despedaças.»

    «A Kitty não sabe tossir discretamente», disse o seu pai, «escolhe sempre mal o momento.»

    «Não tusso por diversão», resmungou Kitty. «Lizzy, quando é o teu próximo baile?»

    «De amanhã a quinze.»

    «Ai, pois é», exclamou a sua mãe, «e como a senhora Long só regressa na véspera, não vai poder apresentar­-nos o senhor Bingley, se ela própria não lhe tiver sido ainda apresentada.»

    «Nesse caso, querida, pode ter uma vantagem sobre a sua amiga e ser você a apresentá­-lo a ela.»

    «Isso é impossível, senhor Bennet, se eu própria não o conheço. Porque é que me atormenta desta maneira?»

    «Louvo a sua discrição. Uma amizade de quinze dias é de facto muito pouco. É impossível conhecer um homem em tão pouco tempo. Mas se não arriscarmos, outros fá­-lo­-ão por nós; e, no fim de contas, a senhora Long e as suas filhas têm de ter também a sua oportunidade. Portanto, e como sei que ela apreciará a gentileza, se você recusa o encargo, apresentar­-lhe­-ei eu o senhor Bingley.»

    As raparigas ficaram a olhar para o seu pai. A senhora Bennet limitou­-se a dizer: «Que disparate!»

    «Disparate? Que quer dizer com isso?», perguntou ele. «Está por acaso a insinuar que as fórmulas de apresentação, e a importância que se lhes dá, são um disparate? Nisso, discordo de si. Que dizes, Mary, sendo tu uma jovem tão reflectida, e de tão boas leituras, e tão dada a copiar excertos?»

    Mary quis dar uma resposta inteligente, mas não lhe ocorreu nada.

    «Enquanto a Mary alinha as suas ideias», prosseguiu ele, «voltemos ao senhor Bingley.»

    «Estou farta do senhor Bingley», exclamou a sua esposa.

    «Muito me pesa ouvir isso. Porque é que não me disse antes? Se eu soubesse, não o tinha visitado hoje de manhã. É muito azar; mas agora a visita está feita, e somos obrigados a dar­-nos com ele.»

    O assombro das senhoras foi exactamente o que ele esperava, com o da senhora Bennet ultrapassando talvez o das filhas. Uma vez passado, porém, o alvoroço de alegria inicial, ela apressou­-se a declarar que nunca esperara dele outra coisa.

    «Que bondade a sua, meu querido senhor Bennet! Mas eu sabia que acabaria por convencê­-lo. Tinha a certeza de que você ama demasiado as suas filhas para descurar este assunto. Bom, estou muito contente! E pregou­-nos uma bela partida, ao ir visitá­-lo esta manhã e só agora nos informar.»

    «Pronto, Kitty, já podes tossir à tua vontade», disse o senhor Bennet, saindo da sala, fatigado com o arrebatamento da sua esposa.

    «Que excelente pai vocês têm, meninas!», disse ela, depois de o senhor Bennet ter fechado a porta. «Não sei como é que vão poder agradecer­-lhe tanta gentileza; ou eu própria, se formos a ver. Na nossa idade, garanto­-vos que não é agradável fazer novas amizades todos os dias; mas por vós faríamos tudo. Lydia, minha querida, apesar de seres a mais nova, palpita­-me que o senhor Bingley vai querer dançar contigo no próximo baile.»

    «Oh!», disse a corajosa Lydia, «não tenho medo; porque embora seja a mais nova, sou a mais alta.»

    O resto do serão, passaram­-no a fazer conjecturas sobre quão cedo retribuiria ele a visita do senhor Bennet, e a determinar quando haveriam de o convidar para jantar.

    Capítulo 3

    Todos os esforços da esposa, coadjuvada pelas suas cinco filhas, não foram suficientes para arrancar ao senhor Bennet uma descrição satisfatória do senhor Bingley. Abordaram­-no de diferentes maneiras — com perguntas objectivas, suposições engenhosas ou comentários indirectos, mas ele eludiu toda essa sagacidade, e as damas acabaram por ter de se contentar com as informações de segunda mão providenciadas por Lady Lucas. O relatório desta foi altamente favorável. Sir William ficara encantado com ele. O senhor Bingley era um homem novo, maravilhosamente belo, muito bem­-disposto e, coroa de todas essas virtudes, tencionava ir à festa com um grupo de amigos. Melhor era impossível! Gostar de dançar era um caminho certo para o enamoramento; e vivas esperanças se depositavam na conquista do coração do senhor Bingley.

    «Se pudesse ver uma das minhas filhas instalada em Netherfield», disse a senhora Bennet ao marido, «e todas as outras igualmente bem casadas, não desejaria mais nada na

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