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A longa noite de Cristal
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E-book125 páginas1 hora

A longa noite de Cristal

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Sobre este e-book

Cristal é o apelido de Celso Almeida Gagliano, locutor radiofônico que no passado se tornara famoso por seu timbre cristalino de voz. Trabalhando agora como apresentador de um telejornal, ele é incapaz de compreender as pressões do regime militar sofridas por seu colega Murilo, chefe do Departamento de Pesquisa da emissora. Apegado ao sistema de trabalho vigente nos tempos pioneiros do rádio, quando furos de reportagem eram dados com base em fatos testemunhados individualmente e in loco pelos jornalistas, Cristal noticia no ar um acontecimento que presenciara e que, embora verdadeiro, contraria os interesses dos patrocinadores. Assim, a crise desencadeada na emissora será também, para ele, uma crise existencial que o colocará diante de vários enfrentamentos. Por meio de elipses de tempo e de espaço, "A longa noite de Cristal", de 1969, aborda em chave crítica o papel da televisão, já então transformada no principal veículo de comunicação de massas do país.

No ano de sua estreia, a peça ganhou Prêmio Coroa de Teatro por concurso e, em 1970, o Prêmio Molière (SP) — Melhor peça do ano.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento1 de set. de 2020
ISBN9786587243061
A longa noite de Cristal

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    A longa noite de Cristal - Oduvaldo Vianna Filho

    Capa

    Rosto

    Apresentação

    Maria Sílvia Betti

    A longa noite de Cristal

    Primeiro ato

    Segundo ato

    Posfácio

    Maria Sílvia Betti

    Anexos

    Fichas técnicas das apresentações

    Sugestões de leitura

    Notas

    Sobre o autor

    Sobre a organizadora

    Créditos

    Editora

    Landmarks

    Cover

    Title Page

    Table of Contents

    Foreword

    Afterword

    Rear Notes

    Copyright Page

    Apresentação

    Maria Sílvia Betti

    A longa noite de Cristal, peça em dois atos escrita por Oduvaldo Vianna Filho em 1969, coloca em foco questões ligadas à consolidação da televisão como meio de comunicação controlado pelo Estado e atrelado aos interesses mercadológicos de patrocinadores. Na segunda metade da década de 1960, a televisão havia se tornado o veículo principal de informação e de entretenimento de um grande contingente da população. Seu papel era crucial para a veiculação do ideário do regime militar e para a difusão de uma cultura de massas e de consumo em expansão. Dentro da TV, o telejornalismo tinha passado a exercer papel central como mediador de conteúdos informativos.

    Desde os primeiros anos da ditadura, com o abortamento do projeto épico de teatro e cultura do Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC da UNE), Vianna vinha colocando em foco a classe média, por um lado sufocada pelos mecanismos coercitivos do regime, e por outro cooptada pelos atrativos que este lhes estendia de uma suposta ascensão social e profissional no escopo do assim chamado milagre econômico.

    No âmbito do teatro profissional, diante das novas circunstâncias do país, tratar da classe média era a perspectiva que se apresentava. Era, ao mesmo tempo, um desafio dramatúrgico, pois trazia a necessidade de tratar de questões do presente imediato dentro do quadro político e cultural vigente. A longa noite de Cristal é um texto surpreendente e único na dramaturgia brasileira por abordar, de forma econômica e densa, aspectos centrais desse contexto de rápidas e drásticas transformações.

    O protagonista da peça, Celso Gagliano, é um veterano locutor de telejornalismo cujas origens de trabalho se ligam ao rádio. Seu apelido, Cristal, descreve a qualidade sonora do timbre que o havia consagrado no mundo radiofônico. Por analogia, o título da peça faz também uma remissão implícita à chamada Noite dos Cristais (Kristallnacht), na madrugada de 9 para 10 de novembro de 1938, quando sinagogas e estabelecimentos comerciais de judeus em toda a Alemanha e na Áustria foram destruídos num pogrom moderno organizado por forças nazistas paramilitares e civis sob o estímulo do governo.¹

    O protagonista Cristal construíra sua tarimba de locutor noticioso no rádio numa época em que era possível dar furos de reportagem após contato direto com muitos dos acontecimentos que iam ao ar. Profissional da voz e da informação dentro dos novos tempos que agora se apresentam, na TV, Cristal está diante de mudanças consideráveis na estrutura de trabalho da emissora, no país e até em sua própria vida pessoal, pois se encontra recém-separado da esposa, Lise.

    De forma indireta mas marcante, A longa noite de Cristal faz lembrar também do episódio envolvendo a demissão, dos quadros da Rede Globo, do consagrado locutor Luiz Jatobá (1915–1982), vítima de perseguição política severa durante a ditadura. Nas décadas precedentes, Jatobá destacara-se não só na primeira edição do noticioso oficial A voz do Brasil, que estreara em 1935 durante o governo de Getúlio Vargas, mas também no Repórter Esso, famoso programa de radiojornalismo (depois levado também à TV), e ainda no primeiro formato do programa telejornalístico Jornal da Globo, que estreara em 1967 e que permaneceria no ar até o mesmo ano de criação da peça por Vianna, 1969, quando foi substituído pelo Jornal Nacional.

    A TV havia deixado para trás sua fase heroica, quando ainda se apoiava numa concepção de telejornalismo muito próxima ao modelo radiofônico de redação e de transmissão de notícias: agora, em plena ditadura, começavam a se organizar departamentos de telejornalismo para reger, de forma coesa e sob um controle central, as elaborações de conteúdos noticiosos. Ao mesmo tempo, com a crescente popularidade das telenovelas, os programas telejornalísticos iam procurando adaptar-se a novos horários e formatos dentro da grade de programação.

    Vianna registra, na peça, essas tensões e contradições histórica e politicamente novas no país, e para cuja abordagem não existia, dentro do debate cultural da época, discussão acumulada ou reflexão crítica previamente constituída. Tratar da televisão no campo da dramaturgia é desafiador e requer familiaridade não apenas com os expedientes técnicos que a caracterizam como veículo, mas também com os processos por meio dos quais o trabalho é organizado e viabilizado em seu interior.

    O rádio fora desde sempre familiar a Vianna pela própria história de trabalho de seus pais, Oduvaldo² e Deocélia,³ radionovelistas experientes e consagrados. Mas é com a TV que ele irá estreitar laços nesses difíceis anos após o golpe, já que suas peças tinham passado a ser sistematicamente proibidas pela censura política do regime e impedidas de chegar aos palcos.

    Desde seus primórdios no país a TV se mostrara um campo fértil para adaptações de peças teatrais e para originais de teledramaturgia, uma área nascente que havia passado a atrair nomes expressivos originalmente ligados ao teatro, tanto no âmbito da criação como no da interpretação. Com a ditadura, os espetáculos teatrais em geral tinham se tornado alvos constantes de vetos e de cortes pela censura, o que levou Vianna a escrever, num artigo de 1968, para a Revista Civilização Brasileira: na verdade, cada vez que um pano de boca se abre neste país, cada vez que um refletor se acende, soam trombetas no céu – trata-se de uma vitória da cultura, qualquer que seja o espetáculo.

    Nesse contexto, a absorção de profissionais do teatro e do rádio por emissoras de TV representava uma estratégia de sobrevivência. Com o gradual amadurecimento e a ascensão do gênero da telenovela, foi se tornando comum a participação de atrizes, atores e diretores que vinham de trabalhos consagrados no teatro nas décadas precedentes.

    Ao colocar em foco a TV, o telejornalismo e os dilemas profissionais e existenciais de um veterano radiofônico em seu interior, Vianna realizou uma escolha temática que lhe permitiu não só abordar a crise que passou a se abater sobre as consciências pensantes da época, mas também tocar em pontos centrais do veículo que mais diretamente representava o regime autoritário e a sociedade de massas.

    Cristal, o protagonista, não tem visão crítica sobre as condições de trabalho na estrutura da emissora sob a ditadura. Um furo noticioso que dá no ar por iniciativa própria

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