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Assim Falou Fernando Conceição
Assim Falou Fernando Conceição
Assim Falou Fernando Conceição
E-book533 páginas13 horas

Assim Falou Fernando Conceição

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Sobre este e-book

Este livro é um testemunho, em primeira pessoa, de um ator envolvido desde a adolescência, já por mais de três décadas contínuas, em conflitos sociais e políticos os mais diversos. A escrita abarca questões variadas. Sempre encaradas com o senso de autonomia de pensar que caracteriza a presença do autor no debate público de um Brasil carente de ideias ousadas. O geógrafo Milton Santos (1926-2001) o escolheu como seu biógrafo. Como pensador, jamais furtou-se a ir contra a maré do comodismo ou a de modismos intelectuais. A marca de sua trajetória são as dissidências. Confronta a noção do "politicamente correto" das boiadas. Aqui fala-se de artes. De movimentos sociais. De negros, de brancos. De entranhas da vida acadêmica em universidades. De descaminhos da micro ou macro política, inclusive em esfera jurisdicional. De crítica a poderes estabelecidos, armados ou não. De caminhadas feitas mundo afora. Também, não menos importante, de dúvidas. De conflitos existenciais que a todos engolfam.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento22 de jun. de 2021
ISBN9786500247954
Assim Falou Fernando Conceição

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    Assim Falou Fernando Conceição - Fernando Conceição

    Capa do livro, Assim falou Fernando Conceição. Autor, Fernando Conceição. Afirme-se Editora.livro, Assim falou Fernando Conceição. Autor, Fernando Conceição. Afirme-se Editora.

    Dedicado a Mel Jesus Conceição.

    Sumário

    Prefácio

    PARTE 1 - Diatribes

    O destino de cada qual

    O grande estimulante da vida

    Vade retro, Satana!

    Viva os canalhas gente boa e legalzinha!

    Sem vocação para santo

    Exu na cabeça

    A solidão do intelectual negro

    Thomas Skidmore: a culpa é dele

    Casamento é problema e religião, idem

    Minha mulher quer ser minha amante

    Hipocrisia gay na branquela Rede Globo

    Meninas sequestradas não leem Stuart Hall nem dançam no Ilê

    Resposta do ordinary people ao politicamente correto

    Faixa de Gaza ao nosso redor

    Dos homens bons...

    Tiro ou queda de avião?

    Shakespeare enxovalhado

    Tempestade de bom tamanho, apesar de equívocos bobos

    Ser macho e ser fêmea nos dias correntes

    Hoje minha mãe morreu

    A questão é só de dar, a questão é só de dor

    ‘Uma mulher não deve vacilar’

    Biscoitos finos, arte e combate

    O que há de patético nessa casta artística

    Fronteiras Braskem do pensamento antiético e cultural

    Vai passar?

    Jorge Amado jamais mereceu um Nobel

    Eu, viado

    Covid-19 e o cartel das farmacêuticas globais

    Quem não tem competência se declara vítima

    PARTE 2 - Política: cena nacional

    Bolsonaro, o imbecil-mor da República

    Moderação derrotaria Bolsonaro em 22

    Deixem Lula beijar na boca

    Plano de retrocesso institucional passa por assassínio moral de Sérgio Moro

    Voto em Marina é conquista civilizatória que o Brasil está a merecer

    Marielle: morta por Organizações Criminosas, assaltantes da República

    Esquerda iPhone, be aware!

    Fora Temer, prisão de Aécio: agora o PIG é ótimo

    Antonio Cândido, violência e luta armada: uma involuntária polêmica

    Patinhas às voltas com Angola

    Paulo Francis e os vagabundos que nos governam

    A justiça que vem do sul e surpreende o país

    Todos têm direito a ir pra balada em Berlin!

    Marina Silva, o PT tem medo do voto dos negros sem cangalha

    Bolsonaro é racista?

    Reflexões sobre um nada chamado Brasil

    Quem tem medo do Lula?

    Nem gigante nem anão

    E por falar em marolinha...

    Petrobras retém e sonega obras patrocinadas antes do impeachment de Dilma

    PARTE 3 - Relações raciais em movimento

    Engenharia de flexibilização nos contatos é a chave sociológica do racismo uso-brasileiro

    George Floyd e o Brazil

    Brancos pobres, coitados

    Faltam-nos cujones para fazer um filme sem macaquices sobre o escravismo no Brasil

    Racistas estão no lucro com babaquices do movimento negro de hoje em dia

    Os brancos têm algo a nos ensinar

    Esquerdismo, doença infantil da negritude

    Joaquim Barbosa: um barnabé revoluciona a República

    Em defesa de Zumbi

    Portugal, Sodré, cultura

    Baianas, inveja e ressentimento de classe

    Brazil´s murder capital, Salvador é cidade-túmulo

    Kabengele cita Milton Santos sobre negro não ter telefone e provoca FC: ‘Vai pendurar a chuteira?’

    Brasil, paraíso para sulistas dos U.S. derrotados na guerra de Lincoln

    Crônica do 20 de Novembro enlutado

    PARTE 4 - Papel jornal

    Alternativo, bem-humorado e gostoso

    A grande mídia contra as ações afirmativas

    A bela e a fera

    Jornalismo na Bahia, um epitáfio

    Moribundo, o ex-maior jornal da Bahia

    Ameaçar Veja é prática de velhacos

    Eu quero que tenha o impeachment de Dilma

    12 Anos de Escravidão e o opinionismo na Folha

    PARTE 5 - Política: cena local

    Cultura esmolé

    Wagner, analfabeto cultural, faz da Secult o cocô do cavalo do bandido

    Governo da Bahia paga €18 milhões a empresa que funciona em salão de beleza da sogra

    Empresa portuguesa que vendeu ferries não tinha caixa nem para uma passagem Salvador-Lisboa

    Quase dissolvida, quitanda de Portugal só faturou com ferries do governo baiano

    Morre o carlismo

    Chacina no governo petista: saudades da polícia da ditadura carlista

    Artilheiros da PM petista denunciados; e a comissão técnica e o governador?

    Pornografia do genocídio negro é assunto para a Academia e para a Polícia de hoje

    Para não dizer que não falei de Geddel

    Por que analistas políticos bajulam os poderosos?

    Justiça e Procuradoria em São Paulo são o azar de Maluf e, na Bahia, a sorte de dr. Mário

    Rosquinha de milho!

    Juíza rejeita censura de prefeiturável e manda reti­rar apenas o Chame o ladrão!

    Um (quase) governador cagão para um (quase) povo idem

    Bahia tem cocada, tem acarajé...

    O fantasma de ACM

    ACM Neto e Santa Casa vão ao circo. Negociar terrenos

    Acredite: ACM Neto e Yacht Club servem almoço grátis

    Aprendam com ACM Neto, meninas!

    Por um gay para prefeito de Salvador

    Por IPTU menor, com empurrãozinho da OAB, ricos derrubam qualquer prefeito

    Amarildo do Calabar e a falência do Pacto pela Vida

    PARTE 6 - Embates

    Juiz absolve réus de assédio moral na Universidade e diz que F.C. não sabe perder, é péssimo competidor

    Ivo viu a uva na UFBA

    Justiça inicia debate sobre a res publica na Universidade brasileira

    Prenda esse marginal, exigiu Nelson Pelegrino, do PT, à delegada

    De quando eu era favelado, criminoso, e não mais petista

    Era uma vez um racista, diz ex-mangangona da Secult

    Cultura quis censurar romance por conta de personagem ficcional com caráter duvidoso

    Falsa polêmica foge do tema central do romance, foi o declarado à Folha

    Nojo, diz sentir ex-editor do Correio co-criador do Jornalismo do Futuro

    Universidade exposta tal casa de mãe joana em negócio Facom-Rede Bahia

    Rede Bahia pagou $ 68.000 a professores do Jornalismo do Futuro; diretora da Facom respondeu por improbidade

    Assédio e estertores do lulopetismo na Universidade da Bahia

    Polícia Federal vai à Facom-UFBA apurar ataques orientados

    Depois de 1.697 dias de tortura moral, UFBA absolve este professor

    Diretora de faculdade na Bahia responde processo por abuso de autoridade sem precedentes

    Por que disputo ser Reitor da UFBA

    PARTE 7 - Pé na estrada

    Minha vida de cachorro. Em Nova York

    Visita por onde a escravidão negra na Europa teve início

    Moçambique: tragédias, pilhagens e hipocrisia (inclusive do Brasil)

    Où etês-vous, mon ami Augusto Mango?

    Experiência do paladar na Afrika austral

    Lições africanas de hoje

    Felicidade, Venezuela!

    Madiba Nelson Mandela: inigualável

    A culpa é dos brancos

    Tristes nórdicos (ou quase isso)

    Modi ki bu tchoma, Cabo Verde?

    Crônicas iranianas

    Lembranças do país de Hamlet

    China sem coronavírus

    Na Alemanha da mulher mais poderosa do mundo

    Quilombolas e indígenas recebem a Academia

    PARTE 8 - Poiesis

    Dois mundos

    Um poema de amor

    Poema de Mel, II

    Floricultura popular

    Esquecimento

    Notas

    Prefácio

    Aqui, estamos tratando de pessoas. Pessoas, massa e intelectual; o ho­mem, pensador. Vozes de pessoas em uma só boca, através da contro­vérsia; o caos, por assim dizer. Num espaço de debate de ideias virtual, guiei-me à viagem pelos textos do blog "fernandoconceição Literatura, jornalismo, bier e poeira", para encontrar – mas vejam só! – os mais áci­dos. Missão que me deu muita honra, mas deu trabalho para deixar algum de fora.

    As provocações trazidas pelo professor Fernando, meu mestre, não re­presentam uma simples metáfora dessa palavra. Suas mal traçadas linhas de escrevinhador não combinam com a simplicidade de uma qualidade como questionador, por exemplo, pois essa palavra não expressa a ex­plosão – discordante ou não – que sua escrita provoca. Não são poucas as vezes que temos que ler na companhia dum copo d’água. Certos pontos de vista queimam!

    Aqui, nós apresentamos uma seleção de textos ácidos, na maioria das vezes, demonstrando um pensamento independente, que se vê, saiu direto da cabeça do homem e foi postado ali naquele sítio; outros momen­tos, parece até louco, quando não aparece doce, em seus poemas, sonhos e desabafos.

    Assim falou Fernando Conceição traz impressões de um mundo caótico refletido naqueles olhos, nos olhos do homem. Um compilado de textos em diversos gêneros, sobre temáticas diversas, passeando pela vida pri­vada, mas, em sua maioria, o posicionamento político se sobressai. (Não vamos repetir aqui o clichê a política está em tudo que se faz e é uma parte importante da constituição do ser humano.)

    Para alguns, como o homem, o escrevinhador, o poder da política e as formas sutis de exercer poder sobre o outro é o que lhe interessa. Podemos caracterizar a escrita do homem como um espaço de exposição, discussão e a garantia de seus direitos, enquanto cidadão de um Estado Democrático de Direito.

    Os textos ao mesmo tempo em que informam e denunciam crimes, também vão delineando um cenário político de Salvador e do Brasil. Tra­ta-se de críticas, de uma construção de oposição que dialoga com os acon­tecimentos de bastidores da política baiana e nacional.

    Nessas mal traçadas, como diz o homem, não vou adiantar o que está por vir, colocando títulos neste prefácio. Desejo-te uma jornada que te conduza pelos inúmeros becos e vielas, nem sempre agradáveis, para te contar e te mostrar histórias de um ponto de vista único, que pensa fora da caixinha.

    Rebeca Silva Teles, do programa de Pós-Gradua­ção em Literatura e Cultura do Instituto de Letras da UFBA.

    PARTE 1

    Diatribes

    O destino de cada qual

    A psicanálise não existia naquele tempo. Se existisse o final da história seria outro. Adocicado, como nesses tempos frouxos – e de frouxos – con­temporâneos.

    Um vizinho pergunta-me, na dúvida, quem escreveu Édipo Rei. Sófo-cles, informo. Alguns quatro séculos antes de Cristo – acrescento. Para enfatizar que o nascimento da tragédia, enquanto drama vulgar, é anterior ao cristianismo.

    A psicanálise – que tenta nos tornar pessoas melhores – é que bus­ca edulcorar a pílula. Embuste, como as seitas.

    Não sou eu que devo me tornar uma pessoa melhor. As outras pes­soas, se quiserem, que se tornem. Prefiro químicos, cerveja preferencial­mente. Como diria minha amiga Mary McCarthy (1912-1989), bebo para tornar as pessoas melhores.

    Sófocles usa a arte dramática para afirmar o fatalismo da existência. Ao nascer, ninguém mais escapa do destino. Que nasce com o nascente.

    Não há fuga possível. Ninguém sabe do seu. Uma indústria de adivi­nhos fatura alto sobre tal mistério. Que mistério? Os deuses são deuses porque não se pensam (Ricardo Reis).

    O grande mistério é superar o tédio, preencher o vazio entre o nasci­mento e a extinção. Brigar ou fingir que se briga pelo que se deve, não levar tudo na ponta da faca, rir de si mesmo, não temer desafios nem solidões ou caras feias.

    Para o vizinho, Édipo enciumado teria intencionalmente matado o pai devido à atração sexual pela mãe. Se assim fosse seria ótimo, porque ato de vontade. Mas a coisa é muito pior. É aí que entra Freud (1856-1939) e suas psicanálise e neurose.

    Assisti recentemente (abril de 2015) a uma releitura da peça, em mon­tagem criativa, minimalista e muito bem feita pela Companhia do Chapi-tô, de Lisboa. Excelente trabalho de corpo, luz e sonoplastia. O resultado é interessante, para usar uma linguagem neutra. Apenas três atores, dois gajos e uma rapariga, tratam o texto pelo viés cômico, nuançando-lhe o foco trágico.

    No original, todos conhecemos a história. Quando Jocasta dá a luz, seu marido Laio, rei de Tebas, uma das cidades-Estado gregas, chama um adivinho (no Candomblé jogaria búzios). Que faz uma terrível profecia. Aquela criança ao crescer mataria o pai e desposaria a mãe, com quem teria filhos.

    O rei, depois de amarrar os pés da criança (daí édipo, pés grandes em grego), manda um criado matá-la numa montanha.

    Ao chegar à fronteira de Corinto (outra cidade-Estado) o criado en­contra um pastor da cidade vizinha, que o convence a doar-lhe. Por não poder ter filhos, o casal que reina em Corinto recebe, felizardo, o bebê. Que cresce, feliz e bem-amado, como filho legítimo desse rei.

    Eis que, já adulto, consulta um oráculo e fica sabendo que seu destino é matar o pai e casar com a mãe. Resolve, então, deixar Corinto e peram­bular pelo mundo a fim de evitar a profecia.

    Numa estrada, dá de frente com uma caravana de cavaleiros e tem início uma refrega para ver quem dava passagem a quem. No confronto, Édipo mata o ancião que comandava a caravana adversária. Este era Laio, antigo rei de Tebas.

    Tebas está sob ameaça de uma esfinge. Édipo segue em sua direção e sabe que se decifrar o segredo da esfinge será premiado. Então ele a derro­ta. Por recompensa, o povo o aclama novo rei. E ele casa-se com a rainha viúva, Jocasta.

    Tempos de bonança e paz advêm, até que a fome e a miséria começam a desolar a cidade-Estado. Consultado o oráculo, o irmão da rainha é in­formado de que a maldição de Tebas advinha do fato de existir na cidade um parricida incestuoso.

    Édipo, que é um rei justo, pessoalmente ordena e pessoalmente se em­penha na caçada ao pária. Promete ao povo que não ficará pedra sobre pedra e que não sossegará enquanto não extirpar, não banir aquele mal do convívio dos tebanos. Ai de quem transgredir a sua ordem!

    O diretor e crítico de teatro Flávio Rangel (1934-1988) escreveu certa vez que Sófocles discute nesse texto os limites que o homem deve impor à busca da verdade das coisas.

    A chave do seu entendimento está no último diálogo entre Édipo e Jo-casta, sua mãe e mãe de seus filhos. Momentos antes já chegara a notícia da morte natural do rei de Corinto.

    Ao ver se revelar todo o drama, Jocasta quer persuadir Édipo a abando­nar aquela busca desenfreada, prevendo o pior que se avizinha.

    Para que insistir tanto em descobrir a verdade? – ela lhe indaga, sôfre­ga. É bem mais fácil a vida para quem dessas coisas não cogita – cito de cor as palavras dela.

    Ou seja, a verdade verdadeira pode cegar os viventes. É o que acontece a Édipo. Antes da psicanálise que, mentirosamente, a quer sempre agra­dabilíssima.

    2/10/2015

    O grande estimulante da vida

    Acredito, como Nietzsche (1844-1900), que a arte exista para que a realidade não nos destrua.

    Nunca antes havia sido tomado por tanto arrebatamento, tanto tor­por, quanto naquela manhã de primavera enquanto, triste, acabrunhado e duro, fui paralisado diante de um quadro.

    É um Caravaggio (1571-1610). Pertencente ao acervo de exposições permanentes do Metropolitan Museum of Art, de Nova York – cujo maior mecenas é a família controladora do jornal The New York Times.

    À época em que morei na cidade (1998-1999), na rua 82 Leste com a Segunda Avenida, portanto próximo ao museu, costumava bater ponto ali. Dias e dias, às terças ou quartas, quando a entrada (acredite!) é de graça – o freguês deixa na bilheteria quanto quer, se quiser.

    Melancólico e vazio, percorria salas e corredores do museu, sentava num banquinho aqui e ali, seguia adiante até que – bum! Diante do chia-roscoro de Caravaggio minha alma – se é que possuo alma – como se foi transportada para fora das misérias do mundo. E suas mesquinharias, ciú­mes, dívidas, invejas e contas a pagar (sem drama, reconheço, estou agora sendo bem hamletiano).

    Pela primeira vez chorei, sem mais e profundamente, sem entender por que, perante um quadro. Não era o tema da obra, eu que não sou cristão nem católico nem nada.

    Aquele olhar de medo de Pedro, o dedo da denunciante apontado para ele, o movimento do centurião prestes a também crucificá-lo, tudo aquilo me comovia. A covardia, a vileza humanas sintetizadas numa pintura re­nascentista. No início daquela tarde, saí do museu um homem melhor do que o que havia ali entrado de manhã.

    A isso chamam de experiência estética. É de Friedrich Nietzsche: A arte e nada mais que a arte! Ela é a grande possibilitadora da vida, a gran­de aliciadora da vida, o grande estimulante da vida.

    26/11/2013

    Vade retro, Satana!

    Pelas estatísticas do IBGE, devo viver ainda mais vinte anos.

    Muito chão pela frente.

    Vinte anos, parceiro(a), é a idade média de 80% dos jovens assassina­dos no Brasil, entre os cerca de 60 mil assassinatos/ano. Como enfatiza o poeta Hamilton Borges Walê, militante da campanha Reaja ou Será Morta(o).

    Se fosse mulher, na Bahia, onde mulher vive quase 10 anos mais (IBGE), teria maior vantagem.

    Como homem, negro, oriundo de favela, há tempos estou na conta dos sobreviventes.

    Favelados e negros são, os homens, as categorias mais vulneráveis a mortes por causas externas.

    Leia-se vítimas de homicídios, da violência policial, choques, trauma­tismos, suicídios, AVCs.

    Já dobrei o Cabo-da-Boa-Esperança.

    No momento em que escrevo essas mal traçadas estou inteirinho da silva. Ainda.

    Superadas ameaças. Prisões nos estertores da ditadura. Ataques morais. Pressões. Ciúmes irracionais. Chantagens de toda natura.

    De poderosos empresários e ex-prefeitos, como Mário Kertèsz, a gentes medíocres entranhadas em estruturas institucionais totêmicas, como USP e onde hoje presto serviço.

    Firme, forte, seguindo em frente.

    Salvo por uma lombalgia que quase me aleija há duas semanas.

    E um ultrassom que mostra um grãozinho de areia nos rins: nada que um chá de Quebra-pedra não dê jeito.

    O urologista fez-me ontem exame de toque, descartando más notícias.

    Tudo o mais que vier desde a partir de ant’ontem agora é lucro. A questão é só de dar/ A questão é só de dor (Vinicius de Moraes, "Pra que chorar").

    Acabo de educadamente recusar a oferta de presidir no Estado um par­tido político que fará cem anos daqui a dois. Apesar da sedução quase convincente do emissário, tenho planos mais arejados.

    Nas duas décadas que restam-me neste curiosíssimo planeta, não sendo um Roberto Marinho que desse ponto em diante montou o império Rede Globo;

    Tampouco sendo um José Saramago, estreante a essa idade na literatu­ra reconhecida que lhe traria um Nobel e uma Pilar del Rio...

    ... restam-me projetos muito mais modestos, apesar de ambiciosos.

    Pela ordem: disputar e vencer em 2022 a Reitoria da Universidade Fe­deral da Bahia. Faria bem a meu ego leonino. Tornar-me o primeiro negro reitor qualificado dessa – vade retro Satana! – vetusta instituição acadê­mica.

    Oportunizar à filha responsável por minha atual sanidade a chance de experimentar outras relações culturais.

    Pretendo que esse ser de 7 anos acompanhe-me em período de pós-dou­torado previsto para Nova York, Estados Unidos, assim que a imunização contra a pandemia da Covid-19 permitir.

    Não tenho tempo a perder, martela na cachola o rock da Legião Ur­bana.

    Beber bons vinhos, ler bons livros, curtir viagens e mais viagens. Rir pra caralho: de mim mesmo, dos erros e enganos da vida. Manter a serenidade mas continuar arrombando portas a pontapés.

    O virílico Exu que vige aqui dentro impede-me prosseguir com digres­sões da libido, o safado!

    8/12/2020

    Viva os canalhas gente boa e legalzinha!

    Na maior parte da vez nós, primatas (fêmeas e machos), somos cana­lhas covardes e dissimulados. Ainda mais se convivemos em entranhas podres como ONGs e círculos acadêmicos e restritivos, como os universi­tários. Nestes, desde 1991 decidi investir.

    Adianto que menos por opção de vida que escassez mercadológica. De­pois de ver colegas muito mais velhos na Redação de A Tarde¹ tratados como lixo e ali prisioneiros, posto que não se deram conta a tempo de sua descartabilidade pelo patrão.

    Quando resolvi abandonar uma carreira de publicitário em marketing político, ganhando muito bem e cercado por hostess pagas por tercei­ros, numa das então entre as 10 maiores agências publicitárias do Brasil, a Propeg. Os donos, o xará Fernando Barros e seu sócio Rodrigo Sá Mene­zes, acho que não entenderam nada da minha atitude à época.

    Por tudo sempre tive em conta em minhas já fatigadas retinas (Drum-mond) a companhia de um Albert Camus n´O Estrangeiro, de um Jean -Paul Sartre d´A Idade da razão e, acima de tudo, o Fernando Pessoa do Poema em Linha Reta.

    Vicejam canalhas entre nós – tenham falo ou vagina entre as pernas –, as bem-intencionadas mentes iluminadas que tudo condenamos nos outros (O inferno são os outros). Canalhas e covardes, repito, que primamos por nossas carreiras em primeiro lugar, evidentemente dissimulando nossa egolatria com retórica socialista. Alguém já disse em outras palavras: na conjuntura atual eles, os canalhas e covardes, os medíocres, venceram. Ser medíocre é triunfar, digo eu.

    Acho, e peço desculpas por usar esse método comum de confirmação de nossas certezas: o achismo –, que é de um personagem de Tennessee Williams (1911-1983), em A Street car named desire (Um bonde chamado desejo), a frase dita em tom de constatação melancólica a uma altura da peça. Em minha vida de atribulações sempre tenho dependido da bondade de estranhos (aqui no sentido de desconhecidos).

    Sim, sei da maldade da natureza humana, que não escolhe gênero nem cor nem cultura. Mas também da possibilidade de ações generosas, o que redime aquele princípio original tendente ao egoísmo – isto é, o ego maior somente ultrapassado pelo uso de artifícios químicos.

    Discordo até de Santo Agostinho ou do Paulo das epístolas: nem o amor redime. O que redime é a humildade, mas quão duro é manter-se todo tempo em estado humilde, perante o sarcasmo permanente dos ad­versários.

    A grandeza humana não é coletiva, mas se exprime em gestos indivi­duais, particulares, silenciosos, sem alardes. É assim que jamais esquece­rei daquela madrugada de março de 2009 em Strasbourg, região Alsácia, fronteira da França e Alemanha, quando um mendigo de rua me socorreu.

    Era minha última de sete noites, antes de pegar o avião para a Bahia no aeroporto de Frankfurt, na cidade que hoje abriga uma das sedes do Par­lamento Europeu. Obriguei-me, com pouco mais de 150 euros, à estadia num hotel que barganhei preço uma semana antes, com o fito de levantar dados em arquivos e entrevistar pessoas que conviveram com o geógra­fo Milton Santos, do qual escrevo a biografia, que ali fez seu doutorado (1958-59). Eu era um pós-doutor na Freie Universität Berlin.

    Já com a passagem de ônibus ao aeroporto comprada com antecedên­cia, vaguei aquela tarde pelas ruas da cidade, aguardando a hora, dia se­guinte às 5h da matina. No bolso, apenas moedas que dariam para um ou dois cafezinhos. Era o fim do inverno e o vento frio e cortante. Ao anoitecer, mochila às costas, procurei abrigo na estação central de trem de Strasbourg, belo centenário edifício remodelado.

    Mudando de assentos, livro pregado nos olhos, alguns passageiros em trânsito puxavam conversa... Assim foi até que, depois das 23h, o movi­mento de trens e de pessoas foi se rareando. Então procurei um determina­do banco, onde um trapo humano, com trapos sujos por vestes, barbudo e faces enrugadas, dormitava. Sua pele era alva. Fiquei a seu lado, quieto, na grande estação vazia. E acho que também dormitei.

    Fomos despertados pelo sacudir do cassetete de um segurança fardado com quepe. Que nos disse que já era meia-noite e a estação iria ser fecha­da. Tínhamos que nos retirar. Nos arrastamos até a porta de saída e o frio lá fora havia aumentado.

    O farrapo humano sugeriu que procurássemos outro abrigo, ele que conhecia as ruas do centro da cidade já quase sem vida. Então eu o segui pelas pontes que cortam o rio, ligando uma parte a outra, massacrados pelo ar gélido.

    Depois de muito procurar o desconhecido sugeriu que nos aboletásse­mos no banco de uma parada de bonde (tram), deserta. Defronte havia um prédio. O mendigo, largando suas tralhas comigo, atravessou a pista escu­ra e começou a apertar ao léu botões de interfone. Do lado de cá eu ouvia fiapos da voz francesa dele fingindo-se morador que perdera as chaves e pedia que abrisse a porta. Após três ou quatro tentativas fracassadas, ele regressou para o meu lado.

    Já era mais tarde quando, de súbito, deu um pulo. Um morador che­gava ao prédio e ele correu ao encontro. Era um jovem que parecia ter chegado da farra, com o qual o mendigo trocou palavras. Então o mora­dor entrou e o estranho me fez sinal com uma das mãos, enquanto a outra segurava a porta. Eu peguei nossos trapos e entrei com ele no saguão do prédio, enquanto a segunda porta que dava acesso ao interior do edifício se trancava.

    Poderíamos ter congelado lá fora aquela noite, não fosse esse ser hu­mano jogado no chão desse prédio, enrolado em suas tralhas enquanto a manhã vem ao nosso encontro. Outros moradores esparsamente adentra­ram, em silêncio, com olhar curioso aos dois farrapos jogados ali um ao lado do outro, guardados do frio externo.

    Era 4 e meia da manhã quando cuidadosamente levantei, peguei minha mochila, olhei o sujeito quase querendo-o beijar naquele rosto vincado de sofrimento.

    O ônibus me levou a um dos mais movimentados aeroportos do pla­neta. De onde peguei meu voo para uma reunião com as gentes doutas, bacanas e legalzinhas da minha universidade.

    8/06/2014

    Sem vocação para santo

    Por dever de ofício todos os dias tenho de debater com alunos temas da atualidade política.

    Esta semana está em pauta, entre outros temas – soltura, em breve, do condenado Lula da Silva –, a canonização pelo Papa Francisco da baiana Irmã Dulce. Assista comentário em Ze de Noca.²

    Elogiei a freira por sua livre iniciativa. O importante é que ela investiu com denodo em sua vocação: praticar o assistencialismo. Com] isso, ga­nhou um lugar no céu.

    Ou seja, as pessoas devem se esforçar. Acreditar em si mesmas, ser guiadas por sua vontade.

    Vontade é potência, ensinou o filósofo. Infelizes os desafortunados de vontade, sempre pelos cantos se queixando disso e daquilo!

    Irmã Dulce Pontes (1914-1992) é exemplo de fé no que se dedica. Ape­sar, acrescentei, de seus subterrâneos. Seus incontáveis malfeitos.

    Uma aluna, das que mais provocam no presente semestre, aludiu:

    –Quem, humano, não os têm?

    Respirei. Aproximei-me. Olhei nos olhos dela e, segurando os meus demônios, disse:

    – Tem razão. Você mesma sairia daqui agora correndo em disparada de perto de mim se soubesse das minhas baixezas.

    Gargalhadas na sala. Mas eu falava sério. Como o Fernando Pessoa de Poema em Linha Reta.

    Cheguei até aqui, vivinho da silva, alternando boas obras e atos vis. Esmurrado na boca e devolvendo com socos e pontapés.

    Meus alunos, quando não se levantam, irados, viram as costas e batem a porta da sala para nunca mais retornar à aula, se divertem.

    Mesmo os (ou as, para ser politicamente correto) mais rabujent@s.

    Admitem algum fundo de grandeza da minha parte quando afirmo:

    – Antônio Carlos Magalhães, ex-mandatário absoluto da Bahia por três décadas, era mais merecedor de canonização que essa freira.

    Parecem desconfiar ser eu, no fundo no fundo, um justo. Embora pe­cador.

    15/10/2019

    Exu na cabeça

    Houve um tempo em que não havia qualquer distinção entre a vida ordinária, de escassez material, e a esfera do imaginário divino.

    Este era sincrético. Mas as matrizes da cosmogonia indígeno-africanas galvanizavam o cotidiano das relações sociais, em geral centradas nas mu­lheres, como se na favela do Calabar houvesse um matriarcado...

    No mundo de financialização absoluta no recôndito e no público do trato entre as pessoas e as coisas, agora aquelas divindades fugiram daqui.

    Todo um panteão de divindades incorporava sem aviso nas pessoas co­nhecidas, seja na mesa do café, durante os afazeres domésticos ou durante as tarefas cotidianas.

    Isso era mais comum quando das desavenças, dos desentendimentos dentro das casas das famílias e nas brigas de rua. O caboclo ou o san­to baixava, em geral para dar conselhos e tentar apaziguar as coisas. Já tão difíceis para aquela gente.

    Dona Maria de Breque, por exemplo. Marido, à época, não tinha, como a nossa mãe também – esta enviuvou com sete pirralhos às costas. Não havia dia em que Maria de Breque não manifestasse seu erê.

    O erê dela era uma Crispina, brincalhona. De forma alguma metia medo nas crianças, amedrontadas com aquela profusão de entidades mágicas sempre dispostas a interferir, ou interceder, na vida dos comuns mortais.

    Possuindo-os. Transformando suas feições, alterando o tom de sua voz, em advertências e rompantes geralmente – para nós, os pequeninos – ameaçadores. Crispina, como criança que é, fazia daquela senhora uma criancinha com estripulias.

    Maria de Breque (assim todos a conheciam, sem nunca saber-se a origem do apelido) morava defronte ao nosso casebre, daí ser íntima da vizinha viúva. E os seus filhos serem como filhos dessa – e vice-versa.

    Seu lar era um cacete-armado sem portas ou janelas (apenas buracos), onde tentava abrigar sua ninhada de crianças de diferentes biótipos. Do preto mais retinto e cabelos carapinha, ao branco de cabelos alourados e lisos.

    Sultão das Matas era useiro e vezeiro em nossa morada, baixando so­bre a cabeça da dona da casa para indicar a resolução de qualquer proble­ma mais difícil que aparecesse.

    Adivinhava se íamos bem ou mal na escola. Surpreendentemente, re­preendia-nos por algum ato reprovável que havíamos praticado e que pen­sávamos segredos só nossos. Depois, após um copo de água limpa, a mãe recobrava a linha do tempo.

    Havia duas ou três, mas a Yalorixá (sacerdotisa) mais considerada atendia pelo nome de Mãe Ivone. Era branca, infértil por um mioma, e seu marido uma espécie de príncipe azeviche.

    Saído de famosa família de linhagem Ketu que, a partir do bairro Nor­deste de Amaralina, até hoje influencia e comanda terreiros. Ele exercia o ofício de principal Ogã da casa. Era quem dava as ordens e organizava o terreiro.

    Frequentado por gente que vinha de longe, em automóveis de luxo que paravam em frente da comunidade. Principalmente em dias de festas e batuques para orixás. Mas não havia vias de acesso de veículos, no amon­toado de barracos e valas a céu aberto.

    Mãe Ivone, se lembro bem, tinha aquele serenidade, aquele olhar, aque­la voz mansa das pessoas sábias que entendem a miséria da vida.

    Gorda, mas não obesa, acolhedora, reinava com um séquito de filhas e filhos de santo, que lhe baixavam o olhar, pedindo a bênção e beijando sua mão. Pouco se a via na rua.

    Uma dessas filhas, à época com 14 anos, da viúva mencionada acima, foi a sua Dofona. Isso foi um anátema dentro de nossa casa, ao menos para este escrevinhador criança que nada entendia daquilo. Porque à Do-fona, até a dona do lar deveria prestar certa reverência.

    Até hoje sem nada entender, cético por opção, ainda assim levo a sé­rio o vaticínio que no decorrer dos anos gente do ramo, de Mãe Stella de Oxossi a Mãe Beata de Yemanjá, aos intelectuais Ivan Messias a Ana Célia Silva, fazem sobre quem manda na minha cabeça e no meu proceder.

    É Exu. O brincalhão. O fálico. Aquele que bagunça para lembrar aos humanos sua baixa estatura moral-carnal.

    Mensageiro: o comunicador entre o mundo de cima, superior (o Orum) e esse mundo terreno. Fica óbvio que confunde.

    O seu mister é incômodo. Até para quem é dele portador. A estreiteza da dicotomia judaico-cristã – que demoniza Exu – que o diga... Ele ri de tudo isso!

    [20/08/2016][.data]

    A solidão do intelectual negro

    Em um churrasco fevereiro passado prometi a colegas presentes que escreveria um artigo descompromissado sobre essa temática.

    Não conheço um intelectual negro ou negra que seja casado e esteja bem com uma intelectual negra ou negro.

    Casado ou junto e convivendo produtivamente bem. Não precisa ser exatamente um casal de intelectuais negros, homem e mulher. Ainda que sujeito a todas as injunções e problemas comuns da convivência sob o mesmo teto.

    Pode ser pretensos intelectuais. Digamos acadêmicos, com alguma in­teligência um pouco acima da média ou do ordinary people, a camada subalternizada de onde todos os negros do Brasil viemos.

    Mesmo no mundo das estrelas, do show business, dos esportistas e apresentadores de televisão, isso é raro. Na esfera política, alguém aponta um? Exceção não vale.

    Conclusão? Os negros no Brasil não têm exemplos de intelectuais ne­gros, homem ou mulher, que sejam modelos de casal harmonioso.

    Por que isso? Minha tese é a de que, por circunstâncias históricas moti­vadas pela brutalidade do escravismo, os negros no Brasil cultivam em seu ego o instinto de autodestruição. Estão propensos a relações conflitivas, de desconfiança. De desassossego, de competição destrutiva entre si.

    Em decorrência, o homem (ou a mulher) negro que ascende intelectual­mente encontra mais conforto e uma melhor socioambiência ao lado de uma mulher branca (ou homem branco) com qualificação similar. Esses não se vêem, assim, necessariamente como adversários.

    A recíproca é a mesma, tintim por tintim, com a mulher negra intelec­tual: o homem branco tende a lhe ser mais compreensível, mais adocicado. Mais companheiro.

    O que temos no Brasil como modelos de pensadores, ativistas, aca­dêmicos, empresários etc. negros, seja homem ou mulher, todos os que ascenderam a uma posição de melhor estabilidade socioeconômica leva­dos pelo investimento na ciência e no conhecimento, quase sem exceção optaram por constituir família com brancos.

    O intelectual negro, homem ou mulher, que não buscou ou não encon­trou essa alternativa, comumente transita entre a solidão e a ansiedade.

    Quer que cite-os? Não seria necessário. Basta um pequeno esforço de memória ou de olhar. Aliás, ativistas do Movimento Negro casados com branco(a)s em geral escondem o parceiro nas atividades públicas. Vai sa­ber por que!

    Na medida em que a solidez do conhecimento acadêmico ocorre em meia-idade, vemos esses seres em público afetivamente sozinhos. Nos ci­nemas. Nos teatros. Nos bares. Nos restaurantes. Nas festas. Estão sempre sós.

    São pessoas bonitas, interessantes, algumas financeiramente bem re­solvidas, que por trás da esfinge sorridente já devem ter se convencido, tristemente, do destino solitário. Os amigos ou os parentes estão aí ao seu socorro. Ou então um cãozinho ou gato de estimação.

    Ao analisar dados censitários da década de 1980, a demógrafa Elza Berquó publicou um artigo

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