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O pretérito do futuro é imperfeito?: análise da fusão do futuro no presente em "Minority Report – a Nova Lei"
O pretérito do futuro é imperfeito?: análise da fusão do futuro no presente em "Minority Report – a Nova Lei"
O pretérito do futuro é imperfeito?: análise da fusão do futuro no presente em "Minority Report – a Nova Lei"
E-book127 páginas1 hora

O pretérito do futuro é imperfeito?: análise da fusão do futuro no presente em "Minority Report – a Nova Lei"

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Sobre este e-book

O futuro já chegou?
Esta é uma questão aparentemente simples, porém de extrema complexidade quando analisada frente a fatores culturais, antropológicos e sociológicos quanto à própria definição de passado, presente e futuro. Afinal, se ao futuro são reservados as novidades e o produto das ações do presente, então o atual comportamento imediatista e os discursos de novidade atrás de novidade da tecnologia e cultura contemporâneas acabam por trazer o futuro para mais perto do presente, em um termo cunhado como o "presente extenso" por Hans Gumbrecht em 2005.
Em um mundo cada vez mais indiferente às novidades tecnológicas, o próprio papel da ficção científica se vê sob a necessidade de se reinventar, uma vez que o "maravilhamento" esperado pelas obras que tratam de tecnologias futurísticas se esvai assim que uma obra deixa de ser popular porque uma nova obra de ficção científica está em voga. Em busca de uma compreensão mais aprofundada sobre o papel da ficção científica em um presente extenso apático às novidades, este livro analisa a obra cinematográfica Minority Report – A Nova Lei, de Steven Spielberg e inspirada na obra literária homônima de Philip K. Dick.
Através da análise desta obra cinematográfica quanto às suas camadas narrativas, bastidores da produção, comparação à obra original de Philip K. Dick e o mundo em que vivemos, este livro busca compreender uma sociedade atordoada pelo fato de que, quando tudo é divulgado como novidade, nada mais é uma novidade na prática.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento31 de ago. de 2021
ISBN9786525208503
O pretérito do futuro é imperfeito?: análise da fusão do futuro no presente em "Minority Report – a Nova Lei"

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    O pretérito do futuro é imperfeito? - Henrique M. dos Santos

    MODERNIDADE DO EXTENSO PRESENTE

    PERCEPÇÃO TRADICIONAL DE PASSADO, PRESENTE E FUTURO

    Por décadas, ou séculos, a percepção do homem quanto à passagem do tempo se mostrou sempre linear, como uma cadeia inflexível de eventos que, quando já tinham ocorrido, estavam no tempo passado; quando ainda em ação, no tempo presente; e quando ainda nem tinham acontecido, no tempo futuro. Arendt (1997, p. 37) clarifica a passagem destes tempos a partir da inserção do homem, de maneira que

    (...) apenas porque o homem se insere no tempo, e apenas na medida em que defende seu território, o fluxo indiferente do tempo parte-se em passado, presente e futuro; é essa inserção (...) que cinde o contínuo temporal em forças que, então, por se focalizarem sobre a partícula ou corpo que lhes dá direção, começam a lutar entre si e a agir sobre o homem.

    Esta clara separação dos tempos gerava no imaginário humano suas análises sobre o que passou, para auxiliar em decisões do presente e, então, permitir especulações sobre o futuro. Em outras palavras, apostávamos na possibilidade de adaptar ao respectivo presente de tal modo as experiências extraídas do passado que elas se tornavam pontos de orientação para a escolha do futuro (Gumbrecht, 2005).

    Gumbrecht (2005) complementa seu próprio pensamento quando levanta a questão de que o passado, ou experiência histórica, apresenta eventos e fenômenos que se conformam no presente e, assim, permitem estimar o futuro.

    Dentro desta definição de Gumbrecht (2005), Groys (2010, p. 120) traz à tona um importante dado:

    (...) o presente como tal era visto no contexto da modernidade em geral como algo negativo, como algo que deveria ser superado em nome do futuro, algo que desacelera a realização dos nossos projetos, algo que atrasa a chegada do futuro.

    Mariuzzo (2010, p. 1) reitera ao afirmar que a Modernidade

    (...) associa tradição com atraso. Abrir as portas da Modernidade significava destruir as marcas do passado, suas igrejas e seus museus em um processo de destronamento de toda tradição. Era como se a história tivesse que ser emancipada de si mesma. O moderno deve se livrar das amarras do passado.

    Assim, temos um tempo presente que fere o progresso por atrasar a realização dos projetos voltados ao futuro, e este futuro como um tempo de concretização – estar no presente é estar constantemente defasado e incompleto.

    Uma metáfora capaz de explicar sucintamente a percepção do homem da Modernidade em luta contra seu passado e seu futuro está em uma das obras de Kafka, que Arendt (1997, p. 36) relaciona à passagem do tempo histórico:

    A cena é um campo de batalha, no qual se digladiam as forças do passado e do futuro; entre elas encontramos o homem que Kafka chama de ele, que, para se manter em seu território, deve combater ambas. Há, portanto, duas ou mesmo três lutas transcorrendo simultaneamente: a luta de seus adversários entre si e a luta do homem com cada um deles. Contudo, o fato de chegar a haver alguma luta parece dever-se exclusivamente à presença do homem, sem o qual suspeita-se – as forças do passado e do futuro ter-se-iam de há muito neutralizado ou destruído mutuamente.

    Neste contexto da Modernidade é que os prisioneiros do presente elaboram os vanguardistas manifestos, materializações do que se percebe como insatisfatório e incompleto – é a natureza ‘não-construída’ ou em construção do futuro que guia os manifestos (Obrist, 2010). Sob esta égide ideológica, os manifestos declaram sua ansiedade pelo progresso e pela evolução, reservando unicamente ao futuro (inatingível aos indivíduos presos ao presente) a efetivação de seus objetivos, embora sob a ciência de que o tempo vindouro será sempre incerto:

    (...) o problema de quaisquer escrituras sobre o futuro [é que] ele é desconhecido. Sabemos do que não gostamos sobre o presente e o porquê, por isso todos os manifestos são os melhores em denúncias. Quanto ao futuro, só temos a certeza que o que fizermos terá consequências imprevistas (Obrist, 2010).

    Enquanto a Modernidade supracitada tinha o presente como um estágio negativo na realização dos projetos, a Pós-Modernidade traz o antagonismo a esta percepção – agora, o dogma funda-se em uma retórica da ruptura radical com o passado e da novidade absoluta (Felinto, 2011, p. 43).

    Este novo pensamento torna o presente não mais um ponto negativo, mas sim o verdadeiro espaço onde ocorrem as revoluções e as experiências, sem um necessário passado que seja objeto de ponderação para as decisões do presente, e sem um futuro onde os projetos do presente se consolidam. Em outras palavras:

    (...) enquanto na Modernidade o mundo melhor que se buscava era sempre outro mundo – do futuro, da revolução, do romantismo – hoje, esse idealismo projetado para fora do mundo que conhecemos foi abandonado (Mariuzzo, 2010, p. 1).

    Porém, desde que o passado deixou de lançar sua luz sobre o futuro, a mente do homem vagueia em trevas (Arendt, 1997, p. 32), de forma que Felinto (2011, p. 44) aponta esta ruptura com o passado principalmente quando cita a ainda misteriosa cibercultura, que apresenta também uma forte tendência ao apagamento de sua dimensão histórica. Para este teórico, a cibercultura se mostra como um evento sem precedentes ou causas, tendo surgido puramente do momento tecnocultural em que a humanidade se encontra – assim como nos discursos da cibercultura, os discursos da inovação tecnológica (...) partem frequentemente de uma ‘tábula rasa’ do tempo. Nada existia antes do novo e nada existirá depois, senão ele mesmo (Felinto, 2011, p. 44).

    Desta maneira, percebe-se uma massiva percepção de que não há mais uma ligação inseparável entre os três tempos, e que apenas o presente é importante para o desenvolvimento e a experiência humana, o que Felinto (2011, p. 46) declara como um decidido repúdio do tempo, enquanto Arendt (1997, p. 31) diagnostica que

    (...) parece não haver nenhuma continuidade consciente no tempo e, portanto, humanamente falando, nem passado nem futuro, mas tão-somente a sempiterna mudança do mundo e o ciclo biológico das criaturas que nele vivem.

    A partir desta nova noção do tempo e da frágil ligação do passado e do futuro ao presente, até mesmo os discursos ideológicos se modificam – os famosos manifestos da Modernidade poderiam ser encarados como um acessório démodé de um passado que não sabia viver a plenitude e as ininterruptas novidades do presente –, de forma que esse sentido de inovação permanente repousa numa percepção de que o modernismo estaria agora completo, e nossas sensibilidades temporais familiares, próximas de seu fim (Felinto, 2011, p. 51).

    REESCRITURA DO PRESENTE FRENTE À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

    Com o Pós-Modernismo, a percepção do tempo se modifica na forma de

    (...) um tempo fracionado pelo advento de uma era digital que representa e simboliza um tempo descontínuo, que resulta em uma percepção de que agora ele passa aos saltos diante de nós, despedaçado, como nos relógios digitais e nos tantos outros aparatos resultantes das novas tecnologias da informação (Vogt, 2010, p. 2)

    Revisando o significado da contemporaneidade que, nas palavras de Vogt (2010, p. 2) é um conceito agora ligado à velocidade da inovação tecnológica desenvolvida também de forma acelerada, para manter a sociedade consumindo, Mariuzzo (2010, p. 2) cita que o (indivíduo) pós-moderno não acredita na ideia de progresso inexorável ou na evolução para um mundo melhor e inaugura o tempo do presente plano, contínuo, da eterna repetição e da monotonia.

    Uma vez que o confinamento no presente resulta do eclipsamento do futuro, da ideia de promessa (Mariuzzo, 2010, p. 2), não é necessário e nem possível rumar ao futuro para inovar, revolucionar e despedaçar paradigmas, e então, os olhos pós-modernos se voltam à sobreposição e anulação do recente, com indivíduos que realizam suas (r)evoluções sem saírem de seu próprio presente. Nas palavras de Obrist (2010) ser contemporâneo significa retornar a um presente onde nunca estivemos, resistir à homogeneização do tempo através de rupturas e descontinuidades. Benjamin (1994, p. 226) usa a obra "Angelus Novus", de Paul Klee (1920), em uma forte metáfora para este

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