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Pseudônimo
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E-book184 páginas2 horas

Pseudônimo

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Sobre este e-book

O jovem José Viegas sai do seu povoado natal e segue de ônibus para a cidade. É lá que ele aprende a indiferença, mas também o amor, o trabalho e a amizade. Com a solidão que chega pela lonjura da família, José começa a escrever sobre tudo aquilo que o incomoda. Ao descobrir uma rede de corrupção comandada pela prefeitura, José Viegas se une a alguns amigos e, sob outro nome, escreve tudo o que descobre em uma página de internet que chamaram O poeta capital. Em pouco tempo, o prefeito imagina uma forma de descobrir o autor por trás dos textos que o atacam: através de uma premiação em que o autor do site ganhador deverá se apresentar. José Viegas fica entre a cruz e a espada: apresentar-se e ganhar o prêmio, revelando-se perigosamente, ou preservar sua vida e a liberdade de continuar a escrever seus textos sob as sombras? É com esse suspense e a dúvida entre apresentar sua real identidade ou preservar-se das responsabilidades que chegam da revelação de sua autoria, que Kito Ferraz - o próprio autor um pseudônimo - apresenta seu primeiro romance no espaço digital.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento31 de mar. de 2022
ISBN9788556621948
Pseudônimo
Autor

Kito Ferraz

Kito Ferraz tem 23 anos, nasceu e reside na cidade de Abaetetuba – PA. Formado em Letras pela Universidade do Estado do Pará, foi professor de Inglês e Redação. Já publicou contos em antologias e ganhou menção honrosa em um concurso nacional de poesia. Escreve nos mais variados gêneros literários. 'Pseudônimo' é o seu primeiro livro publicado.

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    Pseudônimo - Kito Ferraz

    Prefácio

    O homem, desde que é homem – se por Adão ou por primatas –, tem uma necessidade extrema de se estender. Todo ser humano precisa de um pouco de extensão para alcançar o que nossa carne limitada é incapaz de fazer. E assim surge a escrita.

    Até mesmo antes da fala, foi necessário que uma parede em uma caverna qualquer no período paleolítico registrasse a comunicação. Ainda não era de fato a escrita, mas eram rabiscos compreensíveis que não precisavam de uma boca para representar um pensamento. Dessa forma, a extensão, há pouco mencionada, foi criada; o homem conseguiu se desprender da jaula mundana na qual estão todos fadados a viver: o próprio corpo.

    Não é propósito único neste momento dizer sobre a história e evolução da escrita (ou das línguas). Isso gastaria minha rala memória sobre as poucas aulas a respeito de Sânscrito que tive na universidade. Não. Estamos muito longe de discorrer aqui sobre teorias e ideologias acadêmicas ou científicas. O que devemos atentar é que escrever é tão importante quanto respirar. Quem é analfabeto, vive somente a vida biológica. E isso me entristece tão profundamente que nem sei explicar. Pois permitir que muitos vivam sem escrever (consequentemente ler) é como ordenar uma chacina ideológica, matando todos os dias a mesma mente pobre. Além disso, há os quais nem amor sentem por escrever – sequer o mínimo do tesão. Apenas a maldita e corriqueira preguiça. Esses sãos os suicidas. Matam-se, porque suas marcas no mundo deixam de existir, e a existência biológica é a única que resta. Ninguém quase nem nota.

    Eu não me apresento, porque não tenho nome. A minha vida biológica não tem significação para mim. Quando as máquinas do meu corpo sutilmente pararem, não haverá muita diferença. Eu apenas sou. Existo somente. A quem ler, eu existo; a quem não ler, sou nada. Eu sou, porque a escrita é sempre presente, não há outro tempo. E é aqui onde vivo. Nela.

    Entre as ramificações das inúmeras maneiras de escrever, está a poesia. Coisa esquisita e imaterial que dilata o que foi circunscrito em um papel ou uma tela. O texto é o corpo e a poesia é a alma, esta não pode existir por si só. Quem a criou? Eu indago, sim. Teria sido Deus, no descuido de tanta graça e glória na criação do mundo deixando escapar um feixe de luz que continha seu próprio pensamento? Pois a poesia é quase tão imaterial e intocável quanto o Criador.

    Mas, mesmo sendo tão bela, não é coisa fácil. É como carregar sobre si a glória e o pecado do mundo.

    Atrevo-me ainda a dizer, sem verdades absolutas ou designações conceituais, somente por capricho, que os versos de um poema são pequenas tiras da alma de quem os escreve. Ser poeta – ou até mesmo nascer, quando se acredita ser natural – é mais um fardo do que um dom, pois a tinta do poema é a caneta, a da poesia, é o sangue. Quando se é poeta, grita-se sendo mudo, bate-se sem ferir, dão-se lições sem ensinar. O ódio e o amor, a tristeza e a felicidade, a inovação e nostalgia moram no mesmo lugar; desafiam a física e ocupam o mesmo espaço, o mesmo corpo, a mesma alma...

    Quem vive de poesia é o mesmo que se alimentar da própria fome. E o poeta, insistente, morre por teimosia.

    Não cumpro outro papel senão me desenvolver pelas folhas seguintes desta história. Agora, eu me despeço em primeira pessoa. E aviso a todos: nada mais faço eu aqui do que viver. E quando a morte vier até mim, saibam que eu já não existo mais desde o ponto final. Porque ser escritor não é apenas escrever, é ser aquilo que se escreve.

    PARTE 1

    Transtorno

    À beira de uma cidade no norte do país, distante do centro, onde o sol beijava a terra com o frescor do inferno e a noite abraçava o solo com o aconchego da solidão, morava José Viégas, um jovem homem comum como Cristo desconhecido. Vivia em uma cidade pouco povoada e inevitavelmente irritante. Na verdade, não se tratava da cidade, o que mais o incomodava mesmo era a vida, as pessoas imutáveis que existiam sem o verdadeiro espectro da existência. Ele gostava daquele lugar, mesmo se sentindo sufocado. Era como estar pendurado em uma forca sem poder morrer.

    Por isso, durante algum tempo, com ajuda de seus pais, juntou dinheiro em uma conta-poupança que abrira no banco justamente para um único propósito: morar uns tempos na capital. Buscar por um emprego, conhecer gente nova. Com o jeito tímido que José tinha, mais vale dizer: para gente nova o conhecer. Pois não possuía iniciativa para se aproximar das pessoas, torcia no seu âmago para que elas se aproximassem. Ele nem mesmo tinha certeza se queria sair do conforto de sua casa. Mas, para ele, certeza era somente um acessório, podia usar quando achasse necessário.

    Aos vinte e um anos de idade, José se mudou para a capital, não muito distante da cidade natal. Deixou seus pais e a irmã mais velha. Esta era advogada. Ele, professor recém-formado, ainda não tivera chance de lecionar. Quem sabe na nova cidade pudesse exercer sua profissão. Mas não era essa sua maior ambição. Queria, apenas com um instinto que ele não sabia de onde vinha, reexistir. Tornar-se novamente uma pessoa, pois aquela construída na casa de seus pais tendeu ao fracasso. Agora, também, seria melhor para escrever. Sim, era escritor. Ou melhor, escrevia. Nomeia-se escritor aquele que o tem como profissão, ofício ou até mesmo se autodeclara. Ele produzia poemas frequentemente. Não os mostrava, era tímido e a crítica vinha sempre recheada de estupidez. José sabia que apenas grandes escritores é que são devidamente apreciados, compreendidos, fazem bons poemas. Por mais que criasse uma ótima poesia, seu nome não era o suficiente para torná-la apreciável. Mas, por outro lado, se um famoso espirrasse, havia de se tirar muitas interpretações e inspirações disso.

    Então, ele usava a arte da palavra porque necessitava disso, era seu refúgio, sua arma mais poderosa para consigo mesmo. E, se não pudesse mais escrever, explodiria em milhões de pedaços, porque seu corpo nunca seria capaz de suportar sua alma.

    José pouco ligava, rótulos são apenas rótulos, podem ser deliberadamente trocados. Mas o verdadeiro produto é imutável. O importante era ele poder ser aquilo que queria ser, mesmo que para isso tivesse de deixar sua cidade e família. O jovem sabia que família apoia, mas sempre com um ar de ameaça. Então sua enfadonha vida tornou-se a certeza de se mudar. O medo é sempre presente, havia de se acostumar com ele.

    Quando chegou à rodoviária da capital, carregava duas malas de mão e uma mochila abarrotada de coisas importantes e outras futilidades. Não precisava de móveis. Pela internet, alugou uma pequena casa em uma vila por um preço razoável. Não era coisa de alta categoria, porém havia de se acomodar com eletrodomésticos e móveis à disposição do novo inquilino, tudo incluso no valor do aluguel.

    Ao olhar para baixo, José notou o cadarço desamarrado, foi até um dos bancos, posicionou suas bagagens e se sentou. Bem ao lado dele havia um homem branco, ruivo, com uma barba cheia e laranja que saltava alguns centímetros do rosto, vestia calça jeans e uma camisa social azul, para combinar com a cor dos olhos. O jovem rapaz sentia o cheiro adocicado dele. Também, numa visão rápida e um tanto periférica, notou umas sardas salpicadas em torno do nariz, mas não eram muitas e nem escuras. Parecia nada demais, se não fosse a sensação estranha que José sentia naquele momento. Ele não sabia explicar, não havia palavras para aquilo; uma sensação nunca sentida.

    Terminou de amarrar o cadarço. Respirou fundo para descansar um pouco o corpo já exausto, além de recuperar o fôlego, é claro. Olhou os passageiros indo e vindo dentre as plataformas de embarque e desembarque. Pensou nesse instante que aquele lugar era o mais perfeito para se conhecer pessoas, mesmo que fossem somente as aparências. Podia até ser uma terapia imaginar a vida de cada passageiro. Quais iam amar? Quais iam trabalhar? Quais iam estudar, viver, encontrar-se, morrer? Uns apressados demais para a morte. Outros lentos demais para vida. Se o ser humano soubesse sempre qual ônibus pegar, como aqueles identificados nas plataformas, não acabaria em tantos destinos errados.

    Não era hora para tanta filosofia. Ele tinha de ir embora e conhecer sua nova morada, depois teria tempo suficiente para descansar.

    Tomou no braço novamente toda sua bagagem e se direcionou para o portão de saída da rodoviária.

    Agora só precisava de um táxi.

    Como ele não estava mais na cidade pequena em que se criara, e sim na capital, levou consideráveis minutos para chegar à nova casa.

    José olhava todos aqueles prédios, casas, ruas extensas, trânsito farto e caótico, volumoso número de pernas apressadas tricotando as calçadas. Uma rotina completamente diferente do que estava habituado. Ele já estivera muitas vezes na capital, mas com a noção de que sempre retornaria para casa. Agora era diferente, estava no seu novo lar, aquela cidade com um leve cheiro de enxofre seria seu aconchego.

    Chegou. Ao sair do táxi, pagou a corrida e desejou ao motorista um bom dia.

    – Valeu! – disse o homem meio gordo e bigodudo.

    Valeu?, pensou ele. Isso não é resposta para bom dia. Devia estar com tanta pressa que nem reparou na fala de José. Ele se sentiu meio estranho, esperava uma reciprocidade por conta da educação. Sentiu-se um besta, isso sim. Lembrou-se de seu pai, que por muitas vezes questionava o comportamento não muito másculo do filho. Mal sabia o pai que a integridade e a essência viril de José estavam longe de seus comportamentos, e que estes nada diziam sobre ele. Mas, talvez, naquele clima inóspito da cidade grande, o jovem devesse agir diferente. No lugar de Tenha um bom dia, poderia engrossar um pouco mais a voz e ter dito Valeu, patrão!. Assim não se sentiria mal. Será que seu pai estava certo? É provável que não. Ele quase nunca concordava com o pai.

    Bem à frente de José, um arco feito de ferro um pouco velho, uma tintura nova cobria a oxidação do metal já meio corroído. Em cima, com finos cabos de luzes neon, havia um nome: Vila dos Sonhos. José certificou-se do endereço e estava certo. Em nenhum momento fora informado que a casa alugada ficava dentro de uma vila. Isso significava vizinhos muito próximos.

    Não havia espaço para lamentações. Sua vida de adulto começara, tinha de saber lidar com essas situações. Quem sabe não seria tão mal assim. Entrou. Viu seis casas, uma ao lado da outra. Havia uma sétima, estava em construção. Uma mulher magra, de cabelos alvoroçados e grisalhos aproximou-se.

    – Está procurando alguém? – perguntou ela com os olhos meio cerrados por conta da ausência dos óculos.

    – Na verdade eu aluguei uma casa aqui...

    – Qual seu nome?

    – José. José Viégas.

    – Ah, sim. Tu que és o José Viégas. Eu esperava um homem grande já. Não um moço – ela sorriu.

    Ela o direcionou para outra casa afastada, a qual não pôde ver quando chegou. Descobriu ali que aquela mulher era a senhoria da Vila e que aquela residência afastada era a dela. Diferente das outras, obviamente. Lá, ele assinou um papel mal formulado, ouviu sobre algumas normas e comportamento a respeito da convivência. Nada que para ele pudesse ser extraordinário.

    Benedita. Assim se chamava a mulher. Descobriu de forma retardatária, mas descobriu, foi logo após de assinar o papel. Pegou as chaves. A casa que ficaria era a de número quatro, bem no centro. A senhoria disse que ali acabara de ser desocupado, então não havia outro lugar. A sétima casa ainda estava em construção, sendo assim, José teria de estar bem no meio dos vizinhos.

    Abriu a porta do novo lar. Largou suas bagagens. Faltava apenas uma coroa, um trono e um cetro para o novo rei. A sua própria vida era o seu reino.

    E agora? Ele acabara de sair do banco de trás do carro e passou para o volante. Isso, na verdade, não era uma pergunta que atormentava o jovem. E agora? Agora as coisas seriam como ele achasse melhor ou como, por natureza ou fluidez do universo, elas tivessem de acontecer. A partir de então a hora do almoço seria a de dormir, a hora de dormir seria a de comer. Talvez o tempo nem mais precisasse caber dentro de um relógio. No interior daquela pequena casa, a vida teria outra forma, uma forma esquisita, diferente, estranhamente seria a própria vida.

    As pessoas se prendem em um círculo vicioso por procurar coisas que as façam felizes, quando, na verdade, estão perdidas, não sabem nem do que se trata a existência. Nunca se encontram. Às vezes, quando se encontram, morrem por certa rejeição. E a felicidade apenas é saber viver aquilo que se deve por ordem do destino, da natureza ou da vontade própria.

    Quando a noite acobertou o céu, José ouviu uma música aparentemente antiga envolvida por arranjos de violas, piano e um leve soar de saxofone. A canção era entrecortada por chiados. Logo percebera que se tratava de um rádio. Foi até a janela lateral de sua casa, abriu vagarosamente o trinco e espiou. Era um homem, cabelos ralos e grisalhos, a pele levemente enrugada. Ele escutava música em um radinho de pilha na janela, que ficava bem ao lado da casa do novo inquilino.

    José não tinha muito jeito para lidar com pessoas novas, gostava

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