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As Visitas de Veridiana
As Visitas de Veridiana
As Visitas de Veridiana
E-book141 páginas1 hora

As Visitas de Veridiana

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Sobre este e-book

Você sabe qual a grande força da obra de Marx, Freud, Darwin e outros que tais?É a sua irresistível capacidade ficcional e narrativa, que fez com que se constituíssem nestes séculos por aqui saberes e ciências do ser humano que o amesquinham e apequenam, que o coisificam como máquina química fabricada pelo acaso das forças materiais.Não estou dizendo que eles estão errados... nem que estão certos. Estou falando que, grandes romancistas que foram, usaram o poder encantatório da linguagem para amesquinhar as pessoas.A sua obra, minha amiga, faz justamente o contrário disso. Mais que fenomenologia, mas coerente com a mestria dos escritores que desde a antiguidade nos dão acessos às nossas próprias costas, a aquilo em nós que não conseguimos ou com muita dificuldade conseguimos ver. Enxergar.É sempre uma delícia e uma libertação ler os seus romances.As visitas de Viridiana nos mostram uma nova e genial dupla quixotesca: a curta visão e razão da dona do título do livro, mas o seu grande e amoroso coração, que se junta ao sobrinho Jonas, seu escudeiro, estudo profundo do pensamento de um portador de Síndrome de Down, de um “especial”, e que escaneia como nenhum psiquiatra, psicólogo ou neurologista já fez sua grandeza, sua inteligência e suas nuances.Como nas obras anteriores, Cláudia Tavares nos traz e demonstra a mais abjeta miséria humana como ponta de um arco que vai até o céu, com as sete cores do nosso ser, e que nos liga sempre ao mundo divino.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento30 de mai. de 2020
ISBN9786599061028
As Visitas de Veridiana
Autor

Cláudia Tavares

Cláudia Tavares diplomou-se em Direito e português- literatura pela UERJ. Publicou em 2017 os livros “As três faces da moeda” e “Coisas de Amor”. Em 2018 reeditou “A volta da Gata” e editou o livro “O mistério dos dinossauros” sendo este uma parceria com os amigos Luís Carlos de Morais Junior e Eliane Colchete. Para sua surpresa ambos os temas estão atualissimos apesar dos anos que se passaram. Espera que o mesmo aconteça com suas novas edições e com este que agora lança “O despertar chamou Raul” ode à temática masculina depois de seus anos vividos e divididos com Reinaldo Bertonceli. Ainda tem o projeto de plantar um bilião de árvores brevemente. Não duvidem.

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    As Visitas de Veridiana - Cláudia Tavares

    As visitar de vridianas - capa interna.jpg

    Cláudia Tavares

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    Copyright© 2020 by Cláudia Tavares

    Direitos em Língua Portuguesa reservados à autora através da

    QUÁRTICA® EDITORA.

    Capa: Flávia Tavares

    ISBN - 978-65-990610-2-8 (2020)

    ISBN - 978-65-990610-1-1 (versão impressa)

    Conversão: Cevolela Editions

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    QUÁRTICA® EDITORA

    CNPJ 32.067.910/0001-88 - Insc. Estadual 83.581.948

    Av. Marechal Floriano, 143 sala 805 - Centro

    20080-005 - Rio de Janeiro - RJ

    Tel: (21)2223-0030/ 2263-3141

    E-mail: litteris@litteris.com.br

    www.litteris.com.br

    www.litteriseditora.com.br

    www.livrarialitteris.com.br

    APRESENTAÇÃO

    Você sabe qual a grande força da obra de Marx, Freud, Darwin e outros que tais?

    É a sua irresistível capacidade ficcional e narrativa, que fez com que se constituíssem nestes séculos por aqui saberes e ciências do ser humano que o amesquinham e apequenam, que o coisificam como máquina química fabricada pelo acaso das forças materiais.

    Não estou dizendo que eles estão errados... nem que estão certos. Estou falando que, grandes romancistas que foram, usaram o poder encantatório da linguagem para amesquinhar as pessoas.

    A sua obra, minha amiga, faz justamente o contrário disso. Mais que fenomenologia, mas coerente com a mestria dos escritores que desde a antiguidade nos dão acessos às nossas próprias costas, a aquilo em nós que não conseguimos ou com muita dificuldade conseguimos ver. Enxergar.

    É sempre uma delícia e uma libertação ler os seus romances.

    As visitas de Viridiana nos mostram uma nova e genial dupla quixotesca: a curta visão e razão da dona do título do livro, mas o seu grande e amoroso coração, que se junta ao sobrinho Jonas, seu escudeiro, estudo profundo do pensamento de um portador de Síndrome de Down, de um especial, e que escaneia como nenhum psiquiatra, psicólogo ou neurologista já fez sua grandeza, sua inteligência e suas nuances.

    Como nas obras anteriores, Cláudia Tavares nos traz e demonstra a mais abjeta miséria humana como ponta de um arco que vai até o céu, com as sete cores do nosso ser, e que nos liga sempre ao mundo divino.

    Luis Carlos de Morais Junior

    I

    AS VISITAS DE VIRIDIANA

    Viridiana e o marido Saul já não eram mais casados. Ele morrera há três dias. No momento, Viridiana conta as baratas do teto da enfermaria do hospital Souza Aguiar, perdendo assim os minutos indesejáveis de sua vida, pensando na hora fatídica que tentou se jogar da ponte e simplesmente desmaiou antes de sair do automóvel. Eram dez horas da noite quando estava voltando do enterro, sozinha… parou no meio da ponte, tentou sair do Toyota e não conseguiu... Como uma mulher, sem filhos, pode ficar viúva daquele que tanto amou… Logo ela... Com quarenta e dois anos de idade?

    Há tempos atrás, a vida era uma alegria sem fim. Ela e Saul viajavam todas as férias, vivia comprando coisas no exterior e enchendo os armários de lembranças. Alguém insistia que eram acumuladores. Só se fossem acumuladores de alegria. Lembra-se da pequenina imagem de gladiadores romanos em posição de luta, toda colorida. E adivinha onde compraram? Não, não foi na Itália e sim numa lojinha da cidade de Jerusalém. Uma daquelas lojas de lembranças que mais tarde desapareceu num bombardeio. A guerra é assim, desaparece com a estória das coisas mais sublimes. Nem sabia o nome da loja, recorda-se do senhor moreno de bigodes brancos cuja religião nunca ficou clara. Ele falava uma mistura de hebraico com árabe e inglês. Foi Saul que conseguiu entendê-lo. Viram-no mais tarde lá no Amazonas, falando um portunhol esquisito, com sotaque de Lisboa. Ao vê-los, abraçou-os fortemente e chorou. Dessa vez foi Viridiana que o entendeu. A bomba tinha matado o seu filho mais velho. A mulher dele veio compactuar com suas lágrimas e confirmar o que ele relatava. Venderam para o casal uma árvore de ametistas que diziam dar muita sorte. Ah! E lá se vão quinze anos. Saul iria adoecer dez anos mais tarde e partir em cinco. Viridiana contou trinta pequenas baratas e uma grande, gorda e cascuda. O que está fazendo naquele hospital? Só porque desmaiou?

    A doutora veio vê-la na rotineira visita dos médicos estagiários.

    – A senhora se lembra de alguma coisa? Seu carro engarrafou a ponte por cinco minutos e quase causa um acidente. Os socorristas disseram que a senhora teve um ataque cardíaco, mas o eletro não deu nada. Eu escutei o seu coração e tudo parece normal. A senhora vai ter de fazer uma ressonância e um monte de exames que não dá para fazer aqui. A Dra. Julie liberou-a e passou os pedidos dos exames para a senhora fazer no hospital de sua preferência ou no posto de saúde. A senhora está de alta. Aqui estão os pedidos e a receita de um remédio que a senhora deve tomar de doze em doze horas.

    Sem ser ouvida, sem dizer uma palavra, Viridiana sai do hospital. Joga todos os papéis que lhe tinham dado na primeira lata de lixo, para não sujar a cidade, pega um táxi e vai para casa, no Silvestre. A empregada Lourenza não vem atender a porta que, aliás, está entreaberta. Por um momento pensa que topará com Saul. Que ilusão!

    Lourenza acordou com a água que jogou em seu rosto. Há garrafas de cerveja no chão. Ela estava dormindo no sofá, embriagada.

    – Foi uma festa e tanto, Lourenza. A morte de seu patrão foi motivo de alegria?

    – Sabe de uma coisa, D. Viridiana, eu estou festejando o meu emprego na casa da vizinha do 111. Aquilo que é patroa boa. Me convidava sempre como passadeira e acaba de me efetivar. Vou ser governanta e ganhar cinco salários mínimos, com carteira assinada.

    – Mas eu lhe pago três salários na carteira e nunca discuto as gorjetas, os adiantamentos…

    – E vai ser assim, agora? O patrão foi embora.

    Viridiana descalça os sapatos. Dá um suspiro. Está aposentada há um ano por causa de um advogado que arranjou esta vantagem para ela, desde que a doença de Saul começou a exigir sua presença integral. Se Loureza quiser ir embora, pode ir. Não havia ninguém no enterro, exceto os coveiros. Saul ficou um arraso com o mal que se abateu sobre seu corpo. Ninguém os visitava. Nunca foram de muitos parentes, nem de amigos do peito… Meu Deus, como a situação chegou àquele ponto? Ficou trabalhando como professora desde os dezenove anos e não recebeu um telefonema sequer de alunos ou conhecidos. Nem dos irmãos! Saul era cientista pesquisador. Andou trabalhando para o setor de meteorologia e até para o departamento de polícia. Agora… eram coisa nenhuma. Em cinco anos todos te esquecem.

    Lembra-se da última festa. Um não acabar de luzes, flores, risos, bebidas… orgias. Um dia depois, Saul sentiu a primeira indisposição intestinal Não conseguia evacuar. Ficou cinco dias sem ir no banheiro. Depois de quinze dias de sondas, exames e muito sofrimento, veio o laudo de um tumor no intestino. A cirurgia detectou malignidade. Meu Deus, quanta tormenta! No último ano, Viridiana pensou que ele fosse sobreviver. Não sabia o porquê, mas cismou que ele estava bom. Trouxe-o para casa e começou uma terapia em ritmo alucinante de comidas maravilhosas, massagens, shiatsu e tudo o que o aliviasse das dores. Foi tudo calmo. Ele parecia bem mesmo. Programaram uma viagem ao Sul, para ver as cataratas. E ele morreu em seus braços, agradecido. Naquele mesmo apartamento, naquela mesma cama enorme. Ela fizera promessa para S. Sebastião. Não podia se queixar… ele partira serenamente, sem sentir as dores terríveis, sem precisar de morfina. Este foi o milagre. Morrer? Quem nasceu...

    – D.Viridiana...A senhora vai querer o quê pro jantar?

    – Lourenza? Você não vai embora?

    – Não, eu resolvi ficar até a senhora arranjar outra.

    – Mas e a vizinha…do 111?

    – Ela é muito má! Que vá se catar!

    Viridiana comeu todo o jantar e, depois de uma breve meditação para não vomitar, põe-se a ver televisão. De repente, se dá conta que se puserem a tv de cabeça para baixo, não fará diferença. As imagens e as vozes não lhe dizem mais nada.

    Dormiu e sonha com o marido. Tão bom sonhar assim, parece que está vivo... parece que ela se foi também… acorda e vê que o dia já clareou.

    Lourenza pôs a mesa do café, jornal e cartas junto com a xícara grande de café com leite e as torradas com manteiga. Ela não faz a menor ideia de como está frustrada e deprimida.

    Uma carta chama sua atenção.

    É a carta de seu sobrinho Jonas, de dezenove anos, o mais velho filho de sua irmã Norberta. Fica surpresa porque nunca recebeu cartas dele, mesmo porque ele tem Síndrome de Down e não tem a menor possibilidade de escrever-lhe!

    "Cara tia Viridiana

    Como vai a senhora?

    Venha me ver!

    att Jonas."

    Junto com a carta, vem um cartão de Natal com figuração pintada por artistas mutilados. Alguns sem os quatro membros. Viridiana não coube em si de contente. Ama aquela criança. Meu Deus! Já se passaram dezenove anos. Era a única carta pessoal, todas as outras eram contas ou pedidos de doações. Levantou-se da mesa e foi para o quarto se vestir. É claro que ela iria vê-lo e imediatamente.

    Lourenza fica intrigada.

    – Aonde a senhora vai?

    – Vou fazer uma visita a alguém muito importante! Lá no Rocha. Sabe onde é o Rocha? Há duas décadas quase que eu nem sei!

    – Faço o almoço?

    – Sim!

    II

    Visitando Jonas

    Jonas é um rapaz já de dezenove anos. Viridiana não o via desde quinze anos atrás, depois da doença de Saul. Os reflexos da síndrome no rosto dele estão menos acentuados, mas não enganam. Ela pensa uns minutos: ele veio abraçá-la com afeto, o único que fez isto desde que todos desapareceram. Norberta jamais foi visitá-la, talvez porque não tivesse coragem de enfrentar o câncer do cunhado. A doença do seu filho já lhe bastava. Mas a situação é irreal: o marido adoece, todos a esquecem, nem vão no enterro…

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