Do que eram feitos os cabelos da Barbie
De Lucas Contt
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Do que eram feitos os cabelos da Barbie - Lucas Contt
CAPÍTULO 1
INFÂNCIA
Sinto o cheiro de milho. É infantil e caloroso.
Minha mãe sempre costumava fazer milho quando chegava a época do São João. O tempo frio do mês de junho é a época dos milhos, amendoins, laranjas, e o lugar certo para se comprar, ainda hoje, são as feiras e ela sempre me levava para comprar tudo. Para uma criança pequena, ver aquele amontoado de pessoas da roça gritando e vendendo, podia parecer confuso, mas eu gostava, sempre tomava um picolé de leite condensado na volta para casa e isso me enchia de felicidade.
A cidade toda transbordava uma alegria que somente o São João poderia passar. O São João do interior da Bahia é um evento que as pessoas amam e sentem nele suas raízes mais profundas, raízes que muitos nem sabem de onde vêm.
Foi no interior da Bahia, na cidade de Cruz das Almas, que entrei na minha primeira escola e como não era uma menina quieta, as professoras pegavam no meu pé o tempo todo.
— Vânia! Vânia!
Eu corria mais que elas, sempre. Na minha sala havia todos os tipos de pessoas, tinha Lincoln... Lincon... Lincou? Tinha um nome que eu nunca soube escrever, ele usava óculos enormes, era um cara divertido. Tinha Isabela, com quem eu falava muito, mas nunca tive muita amizade, tinha João, Paula, Alberto, Régis, Leozinho, tinha tanta gente de quem lembro pouco, também, a última vez que eu vi qualquer um deles, deve ter mais tempo de vida do que tem a maioria das pessoas. Mas uma pessoa eu lembro bem e lembro como se fosse hoje, Victória. Ela chegou no meio do ano e era uma menina linda de cabelos bem amarelos e lisos. Ela não dava muita atenção para as outras crianças, mas num dia de verão, enquanto brincávamos todos no pátio com nossos brinquedos, ela brincava com uma boneca que chamou muito a minha atenção.
Nunca tinha visto uma boneca Barbie na vida e aquela era a primeira, que boneca linda. Seus cabelos loiros e sedosos, sua pele branca, seu rosto fino e seu corpo magro, sem defeitos. Como que eu queria ter os cabelos daquela boneca. E foi percebendo que eu olhava incessantemente para aquela boneca, que Victória falou comigo a primeira a vez.
— Quer brincar?
Ela perguntou e eu:
— Claro.
Rapidamente mexi nas pernas e nos braços daquela boneca ansiosa para saber todos os seus segredos e o que ela poderia me contar. Victória achou engraçado, ela brincou comigo a tarde toda, até a hora que devolvi sua boneca, minha cara de choro entregou tudo, não queria de jeito algum me desfazer daquela boneca, e agora? Victória me perguntou o que houve, por que eu estava chorando?
Respondi a ela a verdade. Eu queria ter os cabelos loiros daquela Barbie. O que recebi em troca foram risadas. Victória era muito engraçada e não deixava uma piada escapar, ela tomou a boneca de minha mão e enfiou os cabelos nos dentes, de uma puxada só ela arrancou o tufo de cabelos com a boca e me deu. Pronto, ela disse, são seus. Eu não sabia naquele momento, mas acabara de me apaixonar.
Nossa amizade cresceu muito rápido. Ela gostava de novelas e eu adorava os filmes. A gente passava tardes e tardes assistindo filmes na TV antiga de meu pai. Toda vez que víamos as mais lindas atrizes, eu dizia que queria ser atriz, mas todas as atrizes tinham várias coisas que eu não tinha, a começar pelos cabelos loiros e sedosos, pelo nariz reto e empinado. Victória sempre achava graça e me incentivava, hoje vejo que ela era uma criança ótima e sem inveja no seu coração. Ela realmente queria que eu fosse uma atriz. Talvez, na cabeça dela, ela pudesse assistir meus filmes e pensar, olha, é minha amiga.
Desde que conheci sua mãe, eu pensava que a vida de Victória seria fabulosa. Sua casa era enorme, uma casa de gente rica, seu pai era delegado da cidade e quase nunca estava em casa, lembro pouquíssimas vezes