Pensar o Impossível: A Borboleta é uma Cor que Voa
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Sobre este e-book
Toda pessoa interessada em Teologia, Filosofia, Poesia, que tenha um espírito investigativo e livre para duvidar, crente ou ateu, deveria ler este ensaio crítico. Está garantida uma leitura bastante informativa, com novidades e diversão. Theodor Adorno, em O ensaio como forma (2003), escreve que o ensaio espelha a disponibilidade de quem, como uma criança, não tem vergonha de se entusiasmar com o que os outros já fizeram.
Trata-se de uma bem-vinda retomada do diálogo inteligente e informado entre as religiões e a Filosofia, a Psicanálise e a Ciência. O uso arguto da poesia e da arte consegue superar o ambiente de agressivização crescente nessa matéria e ser inclusivo e informativo para aqueles que querem se reaproximar do debate, que fará todos crescerem para além das
polarizações preguiçosas.
Por exemplo, quando queremos saber sobre a natureza do inferno, somos surpreendidos pela afirmação de que "Jesus não é prosa, Jesus é poesia". Diante dos argumentos sobre a existência de Deus, Garcia recorre à licença da arte para pensar o impossível. Retomando um a um os pontos elencados por Russell em seu texto de 1927, ele rebate, circunstância, esclarece
e recoloca os termos da crítica. Quando Darwin é trazido à mesa, ele esmiúça as cartas que declaram zona de não confronto com a divindade. Quando o assunto é a guerra, Daniel recorre a Gandhi para aproximar o sabidamente pacifista Russell da mensagem cristã, encarnada no hinduísmo. Onde esperamos uma moral da consolação, reaparecem Adorno e Ricoeur a dizerem que ali onde o mal abunda a esperança superabunda.
Pensar o impossível é um brinde de valoração à dúvida. Para Jorge Luis Borges, em Filosofia, a dúvida é um dos nomes da inteligência (FILOSOFIA, 1979).
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Pensar o Impossível - Daniel Garcia
Pensar o impossível
A borboleta é uma cor que voa
Editora Appris Ltda.
1.ª Edição - Copyright© 2022 do autor
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Catalogação na Fonte
Elaborado por: Josefina A. S. Guedes
Bibliotecária CRB 9/870
Livro de acordo com a normalização técnica da ABNT
Editora e Livraria Appris Ltda.
Av. Manoel Ribas, 2265 – Mercês
Curitiba/PR – CEP: 80810-002
Tel. (41) 3156 - 4731
www.editoraappris.com.br
Printed in Brazil
Impresso no Brasil
Daniel Garcia
Pensar o impossível
A borboleta é uma cor que voa
Dedico este livro a meu pai, que veio de Minas:
Pai, pensei que maior fosse, confesso,
bem maior que o senhor. Eu levei tombos
enormes. Até hoje meus escombros
recolho e dor pior eu não conheço.
O senhor, sua doçura e sua bondade,
seu jeito flor de ser sempre ensinaram
que são gigantes os que conheceram
a derrota, os vencidos sem vaidade.
Pois assim livres ficam dos poderes
e influência daquele que, só, deste
mundo é o único chefe e governante.
A difícil lição que germinante,
em potência se encontra e se reveste
de semente. Perdão pai, se puderes.
Dedico este livro a minha mãe, que veio do Olimpo
A falta que a senhora me faz
Olá mãe! Quando penso na senhora
quase crer não consigo, pois te sinto
personagem de um filme! Pra mim minto.
Pouco a pouco sua imagem deteriora.
Eu engoli sua falta, café puro,
verdadeiro café, o sem açúcar.
Mascarar foi preciso, fiz com néctar,
tão imensa a saudade, um gosto duro.
E de tanto adoçar, teu rosto esqueço.
O teu querido rosto... já não vê-lo
me deixa em desespero, só e chorando.
Mesmo se te esquecer, sigo lembrando.
O esquecimento trato com desvelo,
Pois é memória, guardo-a com apreço.
(GARCIA, 2014)
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha amiga Alessandra Trigo, pela indispensável leitura crítica e pelas brigas e broncas.
Agradeço ao professor e amigo Álvaro Paulucci, pelas aulas e pela presença marcante em minha vida.
Agradeço à minha irmã Célia, pelas conversas e pelas pregações via WhatsApp.
Agradeço ao pastor e amigo Celso Eronides, pela leitura crítica
Agradeço ao querido e divãníssimo Christian Dunker. O que o Federer bailarino faz com o tênis, o Christian faz com a escrita e a fala. O homem escreve mais rápido do que conseguimos ler e fala de Psicanálise com uma propriedade de quem descreve os passos de como fazer seu bolo preferido. Agradeço pelo belo e revelador prefácio e pelas sugestões sempre bem-vindas.
Agradeço à minha amiga Danielle Zanato, pela presença, que foi sempre tranquilizadora.
Agradeço à minha amiga Denise Tavares, companheira de aulas e traduções há quase duas décadas. A sua leitura do bife da depressão causou-me a impressão de que eu estava no caminho certo.
Agradeço ao amigo e colega de profissão Eduardo Guimarães, pela disposição para uma leitura crítica muito bem-vinda.
Agradeço ao amigo Ivan Romualdo, pelas caminhadas em busca de mantimentos, pelas reflexões sobre espaço e tempo, e por sua leitura atenta e dicas preciosas.
Agradeço à caríssima Marina Graminha, por ter considerado sã minha insanidade. Pela apreensão, impressão e leitura de um pesadelo.
Agradeço ao pessoal da Editora Appris, pelo apoio seguro.
Minha sugestão é que todos vocês cristãos, missionários e todos,
devem começar a viver mais como Jesus Cristo.
(Gandhi)
Três paixões, simples, mas irresistivelmente fortes, governaram minha vida: o anseio de amor, a procura do conhecimento e a insuportável compaixão
pelo sofrimento da humanidade.
(Bertand Russell)
PREFÁCIO
Reatualizando a Conversa com a Teologia
Na obra que o leitor tem agora em mãos, ele encontrará uma espécie de reatualização teológica da crítica levantada por Bertrand Russell sobre as religiões. Lembremos que o prêmio Nobel de 1950, um dos mais diletos pensadores da Filosofia Analítica da Linguagem e do Positivismo Lógico foi impedido judicialmente de exercer a função de professor visitante no City College de Nova Iorque, sob a acusação de defender e difundir conceitos imorais
. Um ano antes, ele participara de um debate radiofônico sobre a existência de Deus com o padre F. C. Copleston da Sociedade de Jesus, na BBC de Londres. Ainda que tenhamos, pelo mundo, uma continuidade do debate da Teologia com as ciências e com a Filosofia, do qual Richard Dawkins, com o seu Deus um delírio¹, parece ser um digno representante, no Brasil, esse debate ficou esquecido por trás do que se disse sobre a ascensão neopentecostal que elegeu Jair Bolsonaro em 2018, no que se diz sobre a sua colusão com a retórica das armas e da violência e no que se ouve sobre o irracionalismo do catolicismo olavista.
Mais do que nunca, seria o caso de retomar a dignidade de um debate que historicamente esteve ligado desde a origem ao espírito das luzes, ou seja, o debate entre razão e fé, sobre o deus dos filósofos e sobre a necessidade de um fundamento transcendente ou transcendental da ética. Nele, agora, se adiciona a posição da Psicanálise como crítica das religiões, mas que, por outro lado, reconhece o papel das ilusões da consciência para a suportabilidade do sofrimento.
Daniel Garcia, com formação em Teologia, Letras e Psicanálise, enfrenta esse desafio de forma erudita e acessível. Retomando um a um os pontos elencados por Russell em seu texto de 1927, ele rebate, circunstancia, esclarece e recoloca os termos da crítica. Mas, o mais interessante é que as respostas dirigidas a Russell jamais conseguem realmente convencer o leitor, ou seja, elas servem mais para desdobrar o assunto e incluir outras perspectivas do que para estabelecer a vitória nos marcos da razão argumentativa. Isso se deve à consistente intrusão da literatura nos momentos mais dramáticos do embate. Por exemplo, quando queremos saber sobre a natureza do inferno, somos surpreendidos pela afirmação de que "Jesus não é prosa, Jesus é poesia. Diante dos argumentos sobre a existência de Deus, ele recorre à licença da arte para pensar o impossível...
Que tal mudarmos de assunto?", para logo depois voltar com Manoel de Barros, Robert Frost e Walt Whitman.
De novo, quando Darwin é trazido à mesa, ele esmiúça as cartas que declaram zona de não confronto com a divindade, sempre recuada para trás mais um pouco, sempre escondida na literatura. Se para um agnóstico todas as coisas são possíveis sem Deus, o ateísta avançará uma estação a mais na afirmação de que ele não é apenas não necessário, mas prejudicial. Quando o assunto é a guerra, Garcia recorre a Gandhi para aproximar o sabidamente pacifista Russell da mensagem cristã, encarnada no hinduísmo. Ali onde esperamos uma moral da consolação, reaparecem Adorno e Ricoeur a dizerem que ali onde o mal abunda a esperança superabunda.
Com admirável perícia exegética, vemos surgir passagens bíblicas defendendo o prazer, o direito ao casamento das viúvas. Assim como recupera de Kant os argumentos para a existência de Deus, sem o qual o conceito de liberdade ficaria prejudicado. Giramos assim em torno do problema da origem do mal, de Espinoza a Freud. Ademais, as aproximações com a Psicanálise são as que causam maior impacto, pelas torções que são postas à mostra:
Se para Lacan "o Real padece do significante, para Paulo de Tarso
eu não conheci o pecado senão pela lei; porque eu não conheceria a concupiscência, se a lei não dissesse: não cobiçarás e disso para Romanos (7:7-11)
Quando estava sem a Lei, eu vivia; mas sobrevindo o mandamento, a Coisa recobrou vida e eu morri, procedimento que termina com a paródica aproximação entre o
você está em Cristo para
você está em Freud ou que
os psicanalistas se fortalecem em Lacan". Crítica involuntária de como os psicanalistas podem se organizar ao modo religioso? Aposta real na identificação Cristo-Freud? Devolução ao remetente da tese freudiana de que é impossível amar ao outro como nos amamos a nós mesmos, desconhecendo que é preciso merecimento para o amor.
Que ética é possível em um mundo de consumidores da fé? Nesse ponto parece que Bertrand Russell ele mesmo incorporou o autor que estava a lhe fazer objeções. Também quando Russell afirma que talvez Sócrates ou Buda estivessem acima de Jesus, somos surpreendidos com o uso oportuníssimo
do mandamento de não julgarás o outro
. Também haveremos de saber por que um camelo é um camelo e uma corda é uma corda, diante da agulha que conduz não todos ao paraíso.
Chegamos assim ao exercício borgeano da prova de contemporaneidade que liga todos os autores citados no texto, de Paulo de Tarso e Agostinho, com uma descontinuidade, até a linha de continuidade de Espinoza até Alain Badiou.
A introdução do capitalismo, para responder à pergunta sobre por que os bons sofrem e os maus prosperam, soa como uma retomada do fio político perdido no Brasil, desde que a Teologia da Prosperidade tomou o cartão amarelo do cardeal brasileiro e o vermelho do papa. Se o pacifismo de Russell, Gandhi e Cristo enfrentasse o capitalismo como deveria, as empresas de segurança virariam parques de diversão temáticos.
O momento mais tenso do texto gira em torno da afirmação de que enquanto os ricos creem no capital, os pobres creem em Deus
, momento no qual parece que nosso autor virou de lado mesmo. Mas, tudo volta para seu lugar, quando descobrimos, lembrando de Benjamin (o Walter, não o irmão de José e filho de Jacó), que o capitalismo é apenas uma forma parasita do cristianismo. Ainda no plano da imanência dos transcendentais, aprendemos que o inferno era um vale periférico onde era queimado o lixo de Jerusalém, que o eterno pode ter a duração de uma vida (ainda