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O Evangelho De Khanagem
O Evangelho De Khanagem
O Evangelho De Khanagem
E-book967 páginas4 horas

O Evangelho De Khanagem

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Sobre este e-book

Após passar por uma situação de quase morte, comecei a imaginar, tomando como base o modo de pensar judaico-cristão, haver toda uma burocracia celestial, em que um Arcanjo cuidaria do reenvio de almas daqueles que já morreram. O problema, entretanto, é que a raça humana não é bem a preferida de nosso protagonista, que luta para sempre lhes dar um destino não tão nobre. As histórias do Arcanjo Khanagem não são para todos. Para aproveitar completamente esse universo, o leitor tem de se despir do manto religioso que estipula castigos eternos a críticas e zombarias; da visão de medo e vingança que as religiões impõem; do preconceito contra quem ousa levantar a voz contra elas. Sem isso em mente, os textos parecerão apenas mais um escárnio blasfêmico e nada mais. A maior parte deste trabalho é inédita. Aqui, o Arcanjo Khanagem trata da criação do universo, dos seres celestiais e dos orgânicos - aqueles de quem ele adora judiar. Na segunda parte do livro, há a coletânea das melhores histórias do site: http://khanagem.blogspot.com.br. Portanto, como diria o Anjo Auxiliar: Leia Khanagem! Ouça Khanagem!
IdiomaPortuguês
Data de lançamento21 de jun. de 2016
O Evangelho De Khanagem

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    O Evangelho De Khanagem - Rodrigo Darini Valente

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    O EVANGELHO DE

    KHANAGEM

    Rodrigo Darini Valente

    Arte da capa: Adriana Ery

    1

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    2

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    Sobre o autor

    Rodrigo Darini Valente nasceu em São Paulo, no

    longínquo ano de 1978. Formado em Letras, tem em seu

    repertório:

    Liber Mortis: Trata-se de 27 contos (o último,

    propositalmente, encontra-se em branco) que fazem refletir

    sobre os aspectos da morte e, consequentemente, sobre a

    vida.

    Miscelâneas Linguísticas: Esta é uma obra para quem gosta

    de estudar a Língua, seus aspectos, mudanças e fenômenos.

    Principais assuntos abordados: a) Morfemas (Raízes e

    Afixos); b) O Português Arcaico, em que mostra as

    principais mudanças da Língua Portuguesa desde o século XI

    até hoje; c) O Latim; d) Análise da "Canção dos

    Nibelungos", que foi o primeiro documento escrito em

    Alemão; e) Demais análises Linguísticas, num vocabulário de

    fácil entendimento e acessível a todos os públicos.

    O Cavaleiro Razar e os Medalhões de Chamak: História

    em que cavaleiro deve encontrar duas partes de um medalhão

    para salvar o reino em que vive.

    A Escolha de Gisele: Daniel, um adolescente, começou a se

    viciar em drogas, causando grande sofrimento a seus pais e,

    principalmente, a sua namorada, Gisele, pois esta deveria

    escolher entre salvar a vida de seu amor ou arriscar-se num

    outro relacionamento amoroso ainda mais incerto do que o

    anterior. A decisão que ela tomar será fundamental para a

    recuperação de Daniel e sua volta ao lar.

    3

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    As Aventuras de Cantão e Carminha: Variadas histórias de

    Cantão e Carminha - O casal sem noção. São 13 episódios em

    que eles vivem confusões nos mais variados lugares: seja no

    restaurante, na farmácia ou no velório, até chegarem ao

    extremo de viajarem para o futuro (sem antes dar uma

    passada pela Divina Comédia de Dante).

    Humor inocente e sem compromisso, acompanhado de

    algumas pitadas de crítica.

    Oniricíssimo: Assim como um sonho, Oniricíssimo é rápido,

    curto e ilógico. É, como o próprio nome diz, onírico. É

    penetrar no estranho mundo dos sonhos, deixando-se levar

    pelas loucuras que a mente humana é capaz de criar. É viver

    mentiras e fantasias que o subconsciente faz questão de

    inventar para nos deixar insanos.

    A Vela Sacra: Luca tinha tudo para ser uma criança feliz,

    mas seus pais negaram-lhe esse direito, ao se separarem. Sua

    mãe, Isabel, levou-o, juntamente com sua irmã, para uma

    cidade do interior, onde se hospedaram na casa de Kerstin,

    uma amiga da família.

    Entretanto, isso não impediu que o garoto continuasse a fazer

    o que mais gostava na vida: sonhar. Acreditando que todos os

    seus desejos poderiam se tornar realidade, Luca recebe a

    visita de Gimmos, um ser de outra dimensão que o levará

    para um lugar totalmente diferente e mágico.

    Assim, enquanto os adultos não resolvem sua situação

    no mundo desta dimensão, Luca terá de ajudar Gimmos a

    resolver a de um planeta ameaçado por uma guerra milenar.

    O pequeno Luca, com esperteza, deverá mostrar que até

    mesmo o maior dos problemas pode ser vencido, mesmo que,

    para isso, a morte tenha de estar sempre ao seu lado.

    4

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    Também tem os blogues:

    http://darini.blogspot.com

    http://khanagem.blogspot.com

    http://cantaoecarminha.blogspot.com

    Contatos: rdarini@gmail.com

    5

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    6

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    ÍNDICE

    PREFÁCIO

    CAPÍTULO 1 – GÊNESIS

    CAPÍTULO 2 – A BUROCRACIA CELESTIAL

    CAPÍTULO 3 – AULA PRÁTICA: A DIVERTIDA ARTE

    DE JULGAR HUMANOS

    CAPÍTULO 4 – FILOSOFIA PROFUNDA E DEFINITIVA

    CAPÍTULO 5 – A CRIAÇÃO DOS IDIOMAS E

    SISTEMAS DE COMUNICAÇÃO

    CAPÍTULO 6 – PASSANDO PELO REDONDINHO

    CAPÍTULO 7 – COMO SER ONIPRESENTE,

    ONIPOTENTE E ONISCIENTE

    CAPÍTULO 8 - SOBRE A INTERVENÇÃO CELESTIAL

    EM ASSUNTOS HUMANOS

    CAPÍTULO 9 – INSERÇÃO DE CONSCIÊNCIA, CULPA

    E CATARSE NAS CRIATURAS HUMANAS

    CAPÍTULO 10 – COMO CONVENCER OUTRAS

    ESPÉCIES A CONVIVER COM HUMANOS

    CAPÍTULO 11 – O SISTEMA DE INFORMAÇÃO

    CELESTIAL

    CAPÍTULO 12 – O KLUSBERINTIANO (OU "SOBRE AS

    ESPÉCIES MAIS AVANÇADAS DO UNIVERSO")

    CAPÍTULO 13 – O ELFO

    CAPÍTULO 14 – A CRIAÇÃO DE SERES

    MICROSCOPICAMENTE MICROSCÓPICOS

    7

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    CAPÍTULO 15 – A CRIAÇÃO DE SENTIMENTOS

    CAPÍTULO 16 – CURSOS OFERECIDOS PELA ESCOLA

    CELESTIAL

    CAPÍTULO 17 – O TEMPO

    CAPÍTULO 18 - O NASCIMENTO DE TANÁS

    CAPÍTULO 19 - A FORMATURA

    EPÍLOGO – HÁ POUCA LIPSE!

    PÓS-EPÍLOGO – APRESENTAÇÃO HUMORÍSTICA

    COM O G.E.D.U. E SUA CONSEQUENTE CRIAÇÃO DE

    UM NOVO MULTIVERSO

    PARTE 2 - AS MELHORES HISTÓRIAS DO

    ARCANJO KHANAGEM

    HISTÓRIA 1 – OS ANJOS DA GUARDA

    HISTÓRIA 2 - A VISITA DE GUERMINOLÁVSIO

    HISTÓRIA 3 - O REPRESENTANTE DA

    FARMACÊUTICA

    HISTÓRIA 4 - O FUNKEIRO IGNORANTE

    HISTÓRIA 5 - A MARRETA SACROSSANTA

    HIPERCELOIDAL CELESTIAL

    HISTÓRIA 6 - O PLANETA KEPLER-452B

    HISTÓRIA 7 - AMIGOS DE LONGA DATA

    HISTÓRIA 8 – O ANIVERSÁRIO DE TANÁS

    8

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    HISTÓRIA 9 - O PARAÍSO GAY

    HISTÓRIA 10 - A FEMINISTA

    HISTÓRIA 11 - O FIM DO PLANETA TERRA

    HISTÓRIA 12 – A BANCADA EVANGÉLICA

    HISTÓRIA 13 - KHANAGEM RECEBE ARIEL SHARON

    HISTÓRIA 14 - FOFOQUEIROS CELESTIAIS

    HISTÓRIA 15 - O BABACA E A BISCATE

    HISTÓRIA 16 - O PRESIDENTE DO STJ

    HISTÓRIA 17 - CONFLITOS INTERSETORIAIS

    HISTÓRIA 18 - O JOVEM DINÂMICO COM ESPÍRITO

    DE LIDERANÇA

    HISTÓRIA 19 - O PILOTO SUICIDA

    HISTÓRIA 20 - O BABACA MACHISTA

    HISTÓRIA 21 - O BABACA DO NEXTEL

    HISTÓRIA 22 - KHANAGEM E A FARRA

    PRESIDENCIAL

    HISTÓRIA 23 - O ATEU

    HISTÓRIA 24 - O CONTRATO DE COMPRA

    HISTÓRIA 25 - O AUDITOR FISCAL

    HISTÓRIA 26 – A REUNIÃO DE METAS

    GLOSSÁRIO

    9

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    10

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    Licença da Santa & Geral Inquisição

    Vi por mandado da santa & geral inquisição estes

    vinte & um capítulos do Evangelho de Khanagem de Rodrigo

    Darini Valente, dos valerosos feitos que os seres celestiais

    fizerão no paraíso, e não achey nelles cousa algűa

    escandalosa nem contrária â fe & bõs custumes, somente me

    pareceo que era necessario aduertir os Lectores que o Autor

    pera encarecer a difficuldade da entrada dos humanos no

    paraíso, usa de hűa fição dos Deoses dos Gentios. E ainda

    que sancto Augustinho nas sas Retractações se retracte de ter

    chamado nos liuros que compos de Ordine, aas Musas

    Deosas. Toda via como isto he Poesia & fingimento, & o

    Autor como poeta, não pretende mais que ornar o estilo

    Poetico não tiuemos por inconueniente yr esta fabula dos

    Deoses na obra, conhecendoa por tal, & ficando sempre salua

    a verdade de nossa sancta fe, que todos os Deoses dos

    Gentios sam Demonios. E por isso me pareceo o liuro digno

    de se imprimir, & o Autor mostra nelle muito engenho &

    muita erudição nas sciencias humanas. Em fe do qual assiney

    aqui.

    - Frei Bertholameu Ferreira

    11

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    12

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    Aviso Legal (ou chato. Depende do ponto de vista)

    Caso você não tenha percebido, esta é uma obra de

    ficção. Todos os locais, nomes, personagens, histórias e

    milagres que aqui aparecem foram ditados a mim pelo

    Arcanjo Khanagem, que, fatidicamente, é fruto da

    imaginação humana.

    Mais ou menos como a sua bíblia.

    13

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    14

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    PREFÁCIO

    (não, não pule esta parte!! É legalzinha; juro!)

    Parte 1 – Para Entender Bem o Inferno

    Já disse aqui que eu sou viciado em videogames? Juro

    que sou, desde moleque. Lembro-me do primeiro que ganhei,

    em meados dos anos 80, quando tinha mais ou menos uns

    cinco ou seis anos de idade, e não tinha ideia do que era um

    game. Foi um Odyssey, que, aqui no Brasil, era concorrente

    direto do Atari, o então adotado (e adorado) pela maioria da

    molecada. Aqueles bons tempos eram uma época em que

    adultos usavam tais aparelhos bem casuisticamente, quando

    nem sequer se imaginavam coisas como "Nossa, quanta

    violência nesse jogo! Depois de jogar isso, meu filho vai sair

    atirando na rua! ".

    Viajando algumas décadas no futuro, chegamos a

    2013. Um dos jogos por que mais esperei naquele ano foi um

    de Playstation 3, chamado "The Last of Us". Não sei se por

    causa da propaganda exacerbada da empresa japonesa (que o

    jargão chama pelo anglicismo "hype") ou pela real qualidade

    do jogo, lembro que eu fiquei, por semanas, pensando em

    adquiri-lo. Acabei comprando, principalmente depois de ler a

    palavra "EPIC" (épico), na análise da EGM, uma das maiores

    publicações do mundo sobre games.

    Enfim... já disse aqui que eu sou viciado em

    videogames? De criança, no meu Odyssey, eu jogava muito

    um tal de Cryptologic, que misturava e brincava com as

    palavras. Naquele tempo, mal sabia eu que {cript} vinha do

    grego {krypt}, significando oculto, e que essa se tornaria uma

    15

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    de minhas raízes linguísticas preferidas. Nos dias de hoje,

    qualquer jogo com essa raiz no título teria a ver com TUDO,

    menos com misturar palavras. Imagina que os nerds machões

    fariam fila pra jogar algo assim, tão bobinho, sendo que o

    novo Call of Duty espirra sangue no tapete da sala. Acho que

    "Cryptological Death" daria um bom título. Ou não. Bom,

    vai saber... não nasci mesmo para ser marqueteiro.

    Falando em criança, veja você, eu cresci numa rua

    movimentada, numa vizinhança cheia de gente velha. Sem

    crianças

    no

    entorno,

    claro,

    não

    saía

    de

    casa.

    Consequentemente, não me arriscava e nunca quebrei

    nenhum membro do meu corpo, tampouco tive de ficar dias e

    dias internado na ala infantil de algum hospital mequetrefe.

    Mantive esse recorde por 34 anos, 11 meses e 1 dia.

    Outra paixão que tenho é viajar. Entretanto, quando

    estou num avião, é impossível não pensar em algo como "e se

    cair? ; o que será que se sente, quando ele cai ou bate em

    alguma coisa? Será que dói? ". Até agora, não obtive essas

    respostas, principalmente pelo fato de ignorar veementemente

    os especialistas que aparecem após cada desastre aéreo.

    Não, não acredito neles, pois aparecem sempre depois do

    ocorrido, quando a distribuição de palpites abunda. Abunda

    demais. Em todo caso, sempre torço para que, se o bicho tiver

    mesmo de cair, que seja na volta da viagem. Pelo menos,

    teria aproveitado o passeio e não teria que me preocupar com

    as parcelas no cartão.

    Já disse aqui que sou um grande falador de palavrões?

    Deveriam fazer um concurso disso; seria muito legal. Claro

    que o palavrão nada mais é do que o resultado de uma

    convenção social: há 30 anos, ninguém ousava falar bunda

    na TV. Hoje, não só falam como mostram o dia inteiro. A

    16

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    regra de ouro é: nunca confie em quem NÃO fala palavrão.

    É sério, não se pode acreditar nessa gente.

    Veja que legal: a palavra puta, por exemplo, vem da

    raiz {putr}, origem de palavras como putrefação e podre. Por

    que algumas, então, se tornam baixo calão e outras não? Pura

    coisa de convenção! Em Portugal, chamam criança de puto!

    Deveria ser uma cláusula pétrea na constituição:

    pessoas que falam muito palavrão deveriam ganhar um

    adicional salarial vitalício. Se seus herdeiros também forem

    da turma boca suja, a grana recebida dobraria! Tudo, é claro,

    às custas dos contribuintes do tipo "ninguém em casa fala

    palavrão".

    A cena é clássica: certo dia, você encontra aquela

    família perfeita, com um pai/marido perfeito que ajuda em

    casa, cuida bem dos filhos, ajuda nas tarefas domésticas, é só

    um pouco ciumento (mas quem não é, não é mesmo?), é

    trabalhador... porém, só lhe restava um defeito: não falava

    palavrões, tampouco deixava os filhos falarem. "Ah – você

    pensa – "isso é uma pista de que isso tudo não é tão perfeito

    assim".

    Falando em ciúmes, às vezes eu me perguntava por

    que homossexuais se autodenominavam "gays", palavra que,

    no inglês, quer dizer alegre. Foi quando me dei conta das

    estatísticas de violência doméstica contra mulheres (casais

    heterossexuais) e contra gays, aí comecei a entender o

    porquê.

    17

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    Parte 2 - Videogames e afins

    Já disse aqui que sou viciado em videogames?

    Sempre achei que videogames fossem um ótimo escapismo

    deste mundo tão estúpido e ridículo; mais do que num filme

    ou um livro, nos jogos você vive aquele mundo e interage nas

    ações que acontecem nele. Como já disse, eu estava

    empolgadíssimo com o lançamento do The Last of Us. Tão

    empolgado, que, um dia antes do lançamento, pedi pro cara

    da loja de jogos reservar o meu; disse que, no dia seguinte, eu

    estaria lá sem falta - repito – sem falta para retirá-lo. Ledo engano…

    Parte 2.1 – Um dos meus jogos preferidos

    Já disse aqui que sou fã de videogames? Sim, e um de

    meus jogos preferidos, daqueles que marcam a gente, foi

    Journey, título do Playstation 3, produzido por uma empresa

    chamada Thatgamecompany e lançado em 13 de Março de

    2012. Ele é a prova cabal de que jogos de videogames podem

    SIM ser considerados obras de arte. Nele, o jogador é imerso

    num mundo instintivo, em que já pelo início percebe qual seu

    objetivo: alcançar o topo de uma montanha.

    A princípio, Journey é uma experiência solitária: você

    é um personagem monacal de simples controle (anda e pula)

    que viaja por belos e variados cenários. Se conectado à PSN,

    você pode cruzar com outro jogador errante, mas qualquer

    interação entre os dois é facultativa às partes e não influencia

    no andamento da história.

    18

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    Trata-se de uma história de superação: para cumprir

    seu objetivo, o personagem deverá enfrentar desertos, neve e

    água. Se preferirem fazer o percurso em dupla, não há muito

    em que um jogador auxiliar o outro, a não ser servir como

    guia, caso o outro esteja perdido. Ao encontrar esse parceiro,

    a sensação de solidão se perde um pouco, mas causa até certo

    alívio em saber que há mais gente no mesmo barco.

    Em Journey, você não é um herói com superpoderes

    capaz de eliminar inimigos com um só golpe; tampouco, um

    soldado com enorme e sofisticado armamento que dizima

    dezenas de rebeldes ou terroristas. Muito pelo contrário,

    diferente dos grandes sucessos do mercado, aqui você não

    luta contra nenhum inimigo, apenas desvia deles. É um jogo

    em que o personagem identifica-se totalmente com o jogador.

    Quer seguir seu caminho de modo solitário ou prefere

    acompanhar outro jogador? Quer explorar todo o cenário ou

    prefere seguir de modo mais linear? Quer dar seu nome ao

    monge? Tudo bem, a partir de agora ele é você.

    Fugindo ainda mais dos clichês, Journey não dá

    nomes aos personagens e não os deixa emitir qualquer tipo de

    comunicação verbal, seja na relação personagem-jogador,

    seja na relação jogador-jogador. Apenas após os créditos

    finais é que somos capazes de ver os nomes dos usuários que

    passaram por nosso caminho.

    Journey é lúdico, místico (afinal de contas, você é um

    monge). Aos poucos, você se sente fazendo parte daquele

    mundo. Nunca lhe explicam o porquê de ter de subir àquela

    montanha, mas, instintivamente, você sabe que aquilo é o que

    deve ser feito. Como uma criança, você pode escorregar nas

    dunas das fases do deserto. Com um sentimento de abandono,

    19

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    você pode ser deixado de lado por outro jogador que prefira

    viver a experiência sozinho.

    Ao terminá-lo, o gosto de quero mais é inevitável.

    Pena que a experiência ao jogá-lo novamente (e de novo, e de

    novo, e de novo) nunca é igual àquela da primeira vez.

    Parte 3 - Nerds, sua cultura e afins

    Pode ser que, para muita gente, eu seja um nerd.

    Entretanto, não me considero um. De verdade. Devo

    corresponder a apenas uns 5-6% do que a cartilha nerd exige.

    Se eu sei a cronologia de tal história em quadrinho de tal

    personagem? Querida/o leitora/o (leitoro?), não lembro nem

    o que comi ontem - só sei que não tinha carne no prato.

    Nem de longe tenho o estereótipo nerd / geek: aquele

    cara de óculos, estudioso, craque em tecnologia, ciências

    exatas e fã de mitologias e literatura de fantasia. Mea culpa,

    sempre preferi escrever a ler; acho que minha ansiedade não

    permite que eu devore 500 páginas de um livro, embora eu já

    tenha me forçado a fazer algo assim. Mea culpa 2: nunca li

    todos os livros do Senhor dos Anéis – assim que terminei o

    primeiro, A Sociedade do Anel, saiu o filme. Aí, cometi o

    sacrilégio de não ler os demais, contentando-me apenas com

    os filmes. Em compensação, não li nem assisti ao Hobbit

    como protesto pela quantidade de cavalos que morreram nas

    filmagens. Se conseguem fazer um elfo montar um grifo, via

    efeitos de computador, por que esses malditos precisam de

    cavalos reais no filme?

    20

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    Lembro que passei algum tempo, no início de meus

    vinte e poucos anos, jogando RPG de mesa. Se você não

    sabe, RPG é um jogo em que você incorpora um personagem

    e tenta agir conforme a raça / personalidade dele. Portanto, se

    você for um elfo, terá de agir diferentemente de quando for

    um anão. Ou um ogro. Um dia, lembro de ter visitado uma

    convenção de RPG e participei de uma live, ou seja, você

    age numa área aberta, fazendo também fisicamente as ações

    do personagem. Um dos maiores momentos de vergonha

    alheia por que passei.

    Eram tempos em que eu mais me aproximava do

    perfil: estudava e trabalhava com informática, só ouvia heavy

    metal (melódico ou speed, de preferência), jogava RPG de

    mesa e, claro, era virgem. Se você não for mais, que então me

    desculpe, mas perdeu 25,71% da condição de nerd.

    Analisando a mim mesmo... devo já ter perdido

    95,64% dessa condição.

    Parte 4 – Uma Surpresa Inesperada

    Um

    dia,

    um

    rascunho

    de

    lixo

    humano

    subdesenvolvido, achando que eu compartilhava do mesmo

    mau gosto dele, tentou me matar. Foram cinco facadas em

    pontos vitais, que mandaram uns bons mililitros de sangue

    espirrados ao chão. Segundo o pessoal mais religioso, por

    algum motivo que eu não sei (e, convenhamos, nem eles

    sabem), Deus me salvou, dadas as circunstâncias em que as

    coisas aconteceram, como fui socorrido e a quantidade de

    sangue que perdi.

    21

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    Isso já deve ter ocorrido com todo mundo: às vezes,

    não temos a sensação de que não deveríamos estar em

    determinado lugar, em determinada hora? Chame isso de

    aviso divino, consciência coletiva, universo conspirando… só

    sei que, de vez em quando, alguma coisa quer nos puxar para

    fora de tal situação. Tem gente que entende esse sinal

    claramente; outros, por outro lado, acham que é só mais um

    sentimento estranho e o ignora. Às vezes, vale à pena ouvir

    seu eu interior, não?

    Em meados de Junho daquele ano de 2013 (na

    verdade, foi no dia 13. Obviamente, dependendo do ponto de

    vista, tudo o que ocorreu foi azar… ou sorte… vai saber...),

    senti essa coisa estranha, mas não dei muita bola. Era

    exatamente o dia em que, como disse na parte 3, eu pegaria o

    The Last of Us, jogo que pedi pro gerente de minha então loja

    preferida de videogames reservar. Era mais ou menos na hora

    do almoço e meu (in?)consciente gritava "Sai daqui, vai

    buscar o jogo! Sai daqui, vai buscar o jogo! Sai daqui, vai

    buscar o jogo!"

    É bem provável que Einstein, que tinha uma estranha

    relação com o universo e via coisas que o resto das pessoas

    não podiam ver, se estivesse no meu lugar, ouviria esse

    recadinho e daria no pé no exato momento da mensagem.

    Mas eu não fui. E tudo aconteceu mais ou menos assim:

    Primeira – no pulso esquerdo

    Segunda – na nuca

    Terceira – no peito

    Quarta e Quinta – nas costas

    22

    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    Antes que me perguntem, já respondo: não, na hora

    não dói. Juro, não dói mesmo. O problema é o depois.

    Bem mais tarde, depois de umas duas ou três bolsas

    de sangue, eu já tinha perdido minha cor branco-lagartixa-

    transparente e recuperado minha cor branco-leite-azedo.

    Uma noite inteira ouvindo o bibibi dos aparelhos na

    UTI e mais cinco outras num cômodo, mas vagabundo quarto

    de um hospital municipal acabaram enchendo minha cabeça

    de porquês, além de ter transformado meu agnosticismo

    básico em um agnosticismo avançado. Afinal, se existe uma

    força regente no universo que decide nossos destinos, o que

    torna algumas pessoas mais afortunadas do que outras? São

    questões que eu nem sequer procurava fazer na igreja, em

    meus tempos de coroinha; seja porque eu apenas tivesse "fé

    nos inquestionáveis desígnios de Deus, seja porque pensar"

    e fé religiosa são elementos incompatíveis per se.

    Foi quando, tomando como base o modo de pensar

    judaico-cristão, imaginei haver toda uma burocracia celestial,

    em que um Arcanjo cuidaria do reenvio de almas daqueles

    que já morreram. Apreciador de trocadilhos que sou,

    imaginei também um Anjo Auxiliar que serviria mais para

    dar palpites e organizar a imensa fila de almas na entrada do

    céu. Ele diria, vez ou outra, "Quero que cada um de vocês

    ouça Khanagem! " – e assim nasceu o Arcanjo Khanagem.

    Seria, creio, muito simples, se ele seguisse o

    estereótipo que todos imaginam de um ser celestial:

    imponência, formalidade e trombetas; ao contrário, ele tinha

    de ser um grosseirão ríspido e que, sobretudo, odiasse a raça

    humana, a quem considera a mais baixa e insignificante de

    todas as criaturas orgânicas do universo. Por isso mesmo,

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    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    quando do dia do julgamento, imaginei o modo que ele

    deveria tratar os mais variados tipos humanos que acabamos

    por encontrar no dia a dia, com seus defeitos, manias e

    dizeres.

    As histórias do Arcanjo Khanagem não são para

    todos. Para aproveitar completamente esse universo, o leitor

    tem de se despir do manto religioso que estipula castigos

    eternos a críticas e zombarias; da visão de medo e vingança

    que as religiões impõem; do preconceito contra quem ousa

    levantar a voz contra elas. Sem isso em mente, os textos

    parecerão apenas mais um escárnio blasfêmico e nada mais.

    Quanto aos antagonistas, seria normal que o Satanás

    fosse o maior inimigo do Arcanjo Khanagem, pois, segundo a

    crença cristã, o primeiro era um anjo orgulhoso que se voltou

    aos seus e, como castigo, fora colocado longe de sua

    presença. Entretanto, a relação entre os dois é sempre um

    tanto harmoniosa, pois, no fundo, têm funções parecidas –

    enquanto Khanagem trabalha no RH do céu, Tanás ("ouça,

    Tánas,..." – inspirado pela descriatividade de "ouça

    Khanagem!") faz o mesmo trabalho no inferno, que,

    curiosamente, não é o local para onde vão os piores seres – lá

    é bem mais divertido e interessante do que imaginam por aí.

    Para não estragar a surpresa, não direi aqui qual o

    maior rival do Arcanjo Khanagem. Já adianto, porém, que

    não se trata do G.E.D.U., o Grande Encarregado do

    Universo, denominação inspirada na divertida sigla

    G.A.D.U. dos maçons. Ele, ao contrário de seu colega

    bíblico, é um tanto quanto quieto e tranquilo; não é do tipo

    falante.

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    O Evangelho de Khanagem Rodrigo Darini Valente

    Exponho, nas próximas páginas, um trabalho dividido

    em duas partes: na primeira, vem a mitologia acerca da

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