O Dia Que Me Encontrei
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Pré-visualização do livro
O Dia Que Me Encontrei - Eduardo Menteguiaga
O dia que me encontrei
Porque tudo é um começo, e num dia qualquer a vida se transforma,
e que foi nunca mais será.
2º edição
Eduardo Menteguiaga
Salvador
Edição do autor
2016
B512s Menteguiaga, Eduardo.
O dia que me encontrei: Porque tudo é um começo
e num dia qualquer a vida muda e o que foi nunca mais será -
Salvador - 2016.
ISBN em tramit
ação
1. Eduardo Menteguiaga, 2016.
1. Titulo
UNIPÊ / BC CDU -
658:004
Preparação de originais
Javier Meví
Projeto gráfico
Javier Meví
Revisão
Madalena Escobar
Ivone Simas Bessa
Designer da Capa
Javier Meví
Reservados todos os direitos em língua portuguesa de acordo com a
lei. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida total ou
parcialmente, ou transmitida de qualquer forma ou meio, incluindo
fotocopias, gravação ou informação computorizada, sem permissão
por escrito do autor.
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20 de Dezembro de 1907
Todos os direitos para língua portuguesa no Brasil reservado e
protegido pela lei 5.988 de 14.12.1974a.
Registro biblioteca Nacional Nº 673306 – 12/03/2015
Contato com o autor
eduardomenteguiaga@gmail.com
Printed in Brazil
Dedicatória
A minha mãe Catalina Vilches,
pela presença constante do seu amor.
A meus filhos
Victoria Soledad, Anna Camila e Cristhian Eduardo;
vocês iluminam todos os meus dias.
E a Leonor Assis,
Obrigado Leo,
com você foi tudo possível.
Palavras iniciais
O dia que me encontrei
trata de alguém que se
encontra com si. Da forma inesperada que uma utópica
possiblidade, torna-se realidade. Porque a vida se perpetua
em ciclos e assim, nessa sequência de começos e fins,
consegue manifestar seu maravilhoso potencial.
Esta obra representa um destes ciclos, o de extraviar
para recuperar. Porque o homem, naturalmente, só dá
valor e se questiona, sobre aquilo que perde.
Foi escrita em impulsos criativos ao começo e
sentimentais ao final; sem qualquer ideia premeditada
sobre seu desenlace. Mas logo nas primeiras linhas a obra
manifestou a pretensiosa intenção de que suas palavras
servissem para compreender os motivos pelos quais uma
vida chega finalmente a transformar-se em algo tão
diferente do que foi desde o começo.
Surgiu espontânea, livre de influências e intenções.
Por isso pode, sim, ser considerada misteriosa; mas não
inventada. Porque embora as personagens pareçam
especiais e a história, inverossímil, o conteúdo simbólico
de suas mensagens e os caminhos percorridos para o
desfeito da trama, são tão reais como centenas de tantos
outros fatos que acontecem no cotidiano de todas as vidas.
Se algum leitor se identifica com ela, é porque de
certa forma compreendeu que a sensação ao acordar pela
manhã nem sempre é consequência daquilo feito no dia
anterior. O amanhã, em circunstâncias muito mais
habituais das que se espera, pode revelar-se desconhecido
e diferente para os que supõem que nada vai modificar
suas existências.
Nem tudo está escrito, nem tampouco definido.
O autor
Introdução
Neste relato são os mesmos personagens que se
enganam a si. São eles os que pretendem ser alguém
diferente para fugir de suas velhas vestiduras que os
assustam, de seus pecaminosos defeitos que os
atormentam. A lógica necessidade humana de mudar para
melhorar e iluminar a alma, que recém se devê-la ao final
do relato, se manifesta ao começo e no percorrer do livro
através de um caminho mágico de conexões e
transmutações. A ideia é uma constante da vida de muitos
e está narrada com a clareza e pureza que o autor já nos
tem acostumado.
O ponto de vista do narrador é onisciente, mas
apesar de conhecer os íntimos sentimentos e interesses de
cada personagem que se apresenta, é capaz de manter uma
mirada imparcial da história que ajuda a preservar a
intriga. Este estilo também consegue lhe dar certa
agilidade ao texto que não seria logrado se o narrador se
colocasse sobre a perspectiva do personagem principal
sem afastar-se jamais dele. Em vez disso, o narrador vai
pulando alegremente e sem aviso prévio sobre todos
aqueles que tenham algo para contar a respeito da história
e o leitor não o percebe como uma descontinuidade, pelo
contrário, parece ser levado da mão pelo passadiço secreto
que o conduzira ao desenlace. É um relato fantástico que
apesar de tudo pode encontrar uma explicação fora do
sobrenatural na normalidade de nossas vidas terrenas.
Cada personagem deixa transluzir, em sua medida,
certa sabedoria que obtém ao refletir sobre seus atos
passados. Também certa resignação estoica que os torna
ainda mais humanos. É muito forte a presença poderosa
da palavra de Deus e como influência em todas as
personagens como se nenhuma tivesse dúvida de sua fé.
O leitor quisera que fosse concreta a possibilidade
de renascer como os personagens deste relato. E até
acredita que seria possível se sua fé o permitisse. A
história transmite uma mensagem de esperança para os
caídos, quase como se se tratasse de um livro de autoajuda,
mas com a poesia da palavra do autor.
O romance é tão bom que obriga ao leitor a lê-lo de
corrido. Em definitiva, o autor finaliza um ciclo ao
publicá-lo.
Madalena Escobar
Crítica e corretora
Índice
1 – Um dia especial
13
2 – Viagem reveladora
23
3 – Salomão, o primeiro amigo
27
4 – Primeiro sinal
31
5 – Tomada de consciência
35
6 – O começo da revelação
37
7 – Declaração de amor
43
8 – Madalena
47
9 – Emanuel e o desafio ao perigo
55
10 – Relato da odisseia
63
11 – Lembrança da mãe
69
12 – A visita inesperada
73
13 – Regresso ao lar
77
14 – O anjo Emanuel
83
15 – Valorizando a vida
87
16 – Acerto de contas
91
17 – O hospital
95
18 – Johana
105
19 – O poder dos astros
109
20 – O nascimento de Amílcar
113
21 – O filho visita a mãe
115
22 – O sonho do professor
121
23 – O centro de poder (A reunião)
125
24 – O instante de ansiedade
133
25 – Encontro com Carmen
135
26 – O porquê de tudo
139
27 – Amílcar e André
145
28 – Amílcar frente ao espelho
155
29 - Recuperando a família
161
30 – Amílcar e Johana
167
31 – Madalena e Johana
171
32 – A viagem astral
179
33 – A proteção do amor
189
34 – André e a liberação do passado
193
35 - A partida de Emanuel
197
36 – A primeira resposta
203
37 – O passado de Salomão
209
38 – O novo homem
215
39 – O retorno de Vieira
219
40 – As pontes
229
41 – A verdade de Madalena
235
42 – A compreensão do mistério
243
43 – Outro dia especial
249
Epílogo
253
Primeiro
livro
1
Um dia especial
"Era um domingo como muitos,
monótono e sem novidades.
Só que num piscar de olhos
tudo pode acontecer.
De repente a vida se transforma,
e o que foi; jamais volta a ser"
O homem se olhou no espelho, naquele em que cada manhã,
efetuava a rotina de barbear-se. O fez por impulso, ao passar e ver a
porta do banheiro aberta. Mas quando chegou à sala, depois de
atravessar o corredor, uma sensação inusitada o deteve com a mão
suspensa no ar, justo quando pegava na pasta do escritório sobre a
mesa; haveria visto bem?
A pergunta surgiu irônica, como se a dúvida fosse uma piada
e a sensação desconhecida a risada. Porque o diferente nessa manhã,
era que a imagem que viu refletida no espelho, não era a dele.
Seria isso possível?
Com um movimento instintivo, se acariciou o rosto para
certificar-se que fosse o de todos os dias e o mesmo que o
acompanhava na vida há trinta e cinco anos. E ao perceber que a ideia
era mais absurda que anormal, voltou ao banheiro a olhar-se no
espelho e terminar de vez com essa sensação que começava a pô-lo
nervoso.
Como explicar o grito de espanto deste homem que ao olhar-
se no espelho não se reconheceu, porque a imagem refletida não era a
de ele?
O medo o paralisou e a desesperação transfigurou sua
fisionomia tentando encontrar sem sucesso o gesto apropriado para a
inexplicável situação. Os segundos se sucederam indiferentes e sua
13
imaginação procurava enlouquecida, motivos que o ajudassem a
justificar essa absurda transformação.
Pararia de beber tanta cerveja. Ele sabia que cedo o mais
tarde, acabaria com problemas por causa da maldita bebida que lhe
causava inúmeros problemas, além de saquear-lhe a conta bancaria.
Também faria o mesmo com esse costume descontrolado de comer
todo tipo de alimento que vendiam pela rua. Seu fígado melhor que
ninguém sabia os esforços que fazia para manter-se equilibrado depois
da tortura á que era exposto por esse descontrole. Por isso em repetidas
ocasiões o castigava com dores que pareciam matá-lo. Até era
provável que a sensação de ver seu rosto diferente no espelho não fosse
mais que uma reação pelas frituras que comera a noite anterior. Isso
explicaria a imagem desconhecida que o observava no espelho do
banheiro... dentro de sua casa?
Sua casa? Ele estava em sua casa! Que outro lugar lhe
ofereceria maior segurança que o interior dela? A consciência desta
realidade serviu para tranquilizar-se e começar a pôr as ideias em
ordem. Dali que primeiro avançou lentamente até o espelho, se
esforçando para vencer os temores, enquanto a imagem refletida, fazia
o mesmo.
Não dava para acreditar, era verdade, o espelho não mentia.
Sua aparência não era a mesma, era outro homem. Os olhos, a boca, o
cabelo; tudo era diferente. Seria o espelho? Não, não era. Porque
quando abriu o guarda-roupa para ver a imagem refletida no outro
espelho, descobriu que era idêntica ao do banheiro. Seguramente
haveria uma explicação, e ele devia encontra-la, era importante, seja
como for e o mais rápido possível; antes que Andreia chegasse. Sua
esposa não podia vê-lo com essa aparência. O primeiro que diria era
que tudo não passava de outra desculpa para evitá-la. Que fazia isso
para que ela não mencionasse que nos últimos dias, não a procurou
para ter relações. Lógico, ela não poderia saber que o distanciamento
fora causado por sérios problemas que o atormentavam e não por falta
de desejo.
Tampouco descartava a possibilidade que justamente a falta
de sexo fosse o motivo de ver uma imagem que não era a própria
naquele espelho. Ou que também fosse consequência da discussão de
ontem á tarde com Vieira, seu colega de trabalho. Lhe diz tantos
14
palavrões ao coitado, que nem sequer ouviu as desculpas que
argumentava para justificar-se. Mas que motivos teve, justo quando
mais necessitou, para descontar os dias que faltou ao trabalho? Logo
ele que sempre soube estar disposto para ajudá-lo; desta vez negar-se.
Parecia tudo feito de propósito com intenção de prejudicá-lo. Por isso
reagiu da pior maneira, dizendo de tudo, menos uma palavra de
compreensão. Por que de cúmplice, se transformara em delator?
Depois de tanta pressão, era até natural que com os nervos de
ponta pelo acontecido, seu dia começasse desse jeito, vendo uma
imagem refletida que não lhe pertencia. Devia tranquilizar-se, dar um
tempo e esperar que com um pouco de calma tudo regressasse à
normalidade.
O importante era analisar a situação com calma utilizando a
razão, mas casualmente quando esta ideia começava a trazer-lhe paz,
por outro mistério, não menos insondável que o anterior, a lembrança
de ter uma conta que pagar nesse mesmo dia, surgiu de algum canto
escuro, com a força de um pensamento impossível de conter. Por
instinto, procurou na carteira o boleto do pagamento e encontrou o que
não esperava. O nome do titular da conta não era o seu; figurava o de
Amílcar Abreu.
A reação foi instintiva, sorriu, mas quando percebeu que a
identidade também pertencia à mesma pessoa, o tom da pergunta que
se fez foi trágico. Isso significava que seu nome não era mais André?
Confuso, sem compreender o acontecido, regressou à sala
para descansar um pouco de toda essa angustia tão intensa. Jogou-se
sobre uma das poltronas, fechou os olhos e tentou fazer o que parecia
impossível, relaxar e tomar o controle das emoções.
Estarei sonhando? - Pensou - por que acontece isto comigo?
Logo hoje que o diretor da empresa convocou uma reunião no
trabalho; com que cara vou chegar? Ninguém vai me reconhecer.
As perguntas surgiam uma detrás da outra e as respostas se
negavam aparecer para facilitar a compreensão. Observou pela janela
o jardim, e ficou abstraído pela grandiosidade das verdes tonalidades
da vegetação e desejou que a beleza dos gerânios e crisântemos o
ajudassem o ordenar as peças desse quebra-cabeça de incógnitas e
terminar de vez com o mistério que ocultavam. Embora tivesse certeza
que a chance de isso acontecer, era ínfima, já que tudo não passava de
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um irracional desejo causado pela angustia. Porquanto a realidade só
consegue harmonizar-se através da natureza quando as emoções não
interferem e a pessoa está em harmonia com o todo.
O único que vislumbrava como verdade era comprovar o que
já sabia, que algo muito estranho acontecia; sem saber como, nem por
que.
Nunca mais voltaria a ver seu rosto?
Eram quase às nove da manhã quando percebeu que com a
confusão do espelho, esquecera o ônibus que passava ás oito para levá-
lo à empresa. Embora chegar ao escritório com esse rosto, seria uma
loucura. Ninguém aceitaria sua história, nem menos permitiriam que
ingressasse ao prédio. A solução era telefonar a Susana, a chefe de
pessoal, e justificar sua ausência. Diria que estava doente, sem
condições de sair de casa ou qualquer outra mentira parecida, que
amanhã se apresentaria como de costume; isso faria.
Isto tentou fazer, porque ao digitar o número para se
comunicar com a empresa, a voz metálica do outro lado da linha lhe
disse que o número discado não existia. Tornou a ligar e ouviu a
mesma resposta. Haveriam mudado os números? Era preciso conferir
com a lista telefônica, por isso procurou dentro da peça de madeira, ao
lado do televisor e ao olhar de soslaio os enfeites das estantes, viu algo
que contrastou com os objetos que já conhecia. Um pequeno quadro
com uma foto que surpreendia pela imagem que mostrava.
Na foto, sua esposa abraçava sorridente ao homem que, era
exatamente idêntico ao da imagem vista no espelho. Isso significava
que era um retrato de ele? Quem era, ao final das contas, esse homem?
As respostas continuavam ocultas e o imponderável de enfrentar-se a
fatos desconcertantes, colocava estradas intransitáveis entre ele e a
verdade. O número do telefone da empresa onde trabalhava era a única
saída para encontrar o caminho de volta à realidade. Dali que continuo
à procura da lista telefônica. Busca que foi inútil, a empresa Tobias
Neto, não apareceu em nenhuma página, só um colégio existia com
esse nome.
André procurava ansioso naquela lista, quando alguém abriu
a porta da rua e entrou na casa caminhando em sua direção.
– Cadê você? Já acordou?
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Era a voz de Andréia, sua esposa; não devia vê-lo com esse
rosto; não o reconheceria. Confundi-lo-ia com um marginal invadindo
a casa e gritaria por socorro ou correria apavorada até à rua em busca
da polícia. Devia esconder-se rápido, até decidir o que fazer, e dada à
urgência do momento, a cozinha, pela proximidade, se mostrava o
lugar mais apropriado. Por isso correu, ocultando-se atrás da estante
das mercadorias.
– Para de brincadeira; você acha que não vi sua pasta na sala?
Merda, esquecera a pasta. E agora? Tinha que pensar rápido,
não devia permitir que Andreia o visse. A ideia surgiu como
relâmpago; o banheiro. Esse era o lugar. Correu sem deter-se pelo
corredor e num pulo se trancou em seu interior; fechando a porta por
dentro.
A voz de Andréia se aproximou com rapidez em sua direção
e se ouvia cada vez mais forte. Ele por trás da porta fechada lembrou-
se do espelho e pensou se ainda continuaria refletindo a imagem do
desconhecido em lugar da sua. O jeito era averiguá-lo olhando-se de
novo.
Girou com lentidão sobre si e observou de relance,
atemorizado e esperançoso. Desejando com todo seu ser reencontrar
seu verdadeiro rosto; mas não. A imagem continuava desconhecida,
insistindo em afronta-lo com expressão desafiante como se ele olhasse
o que não devia. Esse desconhecido se mostrava arrogante, embora
via-se um rapaz lindo, de traços distintos e aparência varonil. Olhos
azuis cor céu, lábios finos, nariz reto, dentes brancos e todo o conjunto
em harmonia se coroavam com o brilho ouro dos cabelos que naturais
se cacheavam sobre a fronte. Sim, como negar? Esse Amílcar era
muito mais bonito que ele. Se tivesse essa pinta saberia aproveitá-la.
– Está ouvindo? Por que não responde?
De fora do banheiro sua esposa exigia respostas, mais
insistente a partir do momento que descobriu a porta fechada por
dentro. E pelo tom de sua voz, não parecia que desistiria até saber o
que acontecia. Queria entrar ao banheiro de qualquer jeito, enquanto
ele rogava, em pensamentos, que desistisse de querer vê-lo e assim
ganhar tempo para pensar o que fazer. Para piorar a situação o denso
silêncio com que ele respondia, levantava suspeitas ainda piores. Mas
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não devia falar... Ou sim? Se o seu rosto mudou, teria acontecido o
mesmo com sua voz?
– Diz alguma coisa; por favor - clamou Andreia.
A insistência da esposa confundia ainda mais André que
impossibilitando de raciocinar, tinha maior dificuldade para decidir o
que fazer. Se demorasse em dar resposta, Andreia, que a esta altura
teria perdido a paciência, desconfiaria de problemas sérios e entraria
em pânico. Por outro lado, se optasse por falar, quando ela não
reconhecesse sua voz, de igual modo se assustaria. Não tinha saída,
devia responder.
– Estou bem Andreia; já saio.
Silêncio. Respondeu ao pedido com receio e o vazio que
ouviu do outro lado da porta, cobrindo com um manto de mistério a
cena do lugar, confirmou a suspeita de que algo acontecera. Com
certeza sua esposa corria para fora da casa em busca de ajuda para tirar
o estranho do banheiro ou digitava o número da polícia pedindo
socorro. Nestes pensamentos enlouquecidos sua imaginação
rodopiava quando Andreia tornou a falar.
– Vai; deixa entrar. Estou apertada.
Entrar? Agora sim que tudo iria por agua abaixo. Que faria
Andréia quando descobrisse que ele era outro? Não entenderia nada,
obviamente; e seria até natural. O único jeito era tentar se explicar sem
criar maiores intrigas. Se ela ainda estava do outro lado da porta
querendo entrar ao banheiro, depois de ouvir sua voz, isto significava
que não percebeu diferença alguma e que para ela tudo continuava tão
normal como antes. Então seria até muito provável que nem reparasse
em sua aparência. Pensando com calma, não seria sua imaginação que
inventou essa história de ele achar que tinha um rosto diferente?
André sabia que não dispunha de tempo para avaliar todas as
possibilidades e que por mais difícil que fosse controlar seu
nervosismo, devia tranquilizar-se e administrar a situação de forma
prudente. Igual a como reagira ao ver refletida a imagem desconhecida
no espelho do banheiro, e que contrariando seu habito de tornar tudo
tragédia, enfrentara sem desespero. Por isso surpreso pela frialdade
com que enfrentou aquela situação, e ciente de que seus próximos
passos poderiam modificar para sempre a relação com Andréia; fechou
os olhos e abriu a porta.
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Primeiro. Escuridão total. Depois segundos intermináveis
numa espera que parecia não ter fim. E, finalmente, o denso silêncio
confundindo seus sentidos pela ausência do grito que Andréia não dera
ao vê-lo. Estaria muda de medo? Vencendo seus inúmeros temores,
numa ansiedade insuportável, lentamente abriu os olhos e descobriu
que Andréia, em pé a centímetros dele, o observava como se não o
reconhecesse. Pensou em inventar infinitas desculpas, mas o olhar da
esposa percorrendo seu corpo na atitude suspeita de quem procura
algo; o deixou apavorado. Ela deteve a mirada nos seus olhos, depois
observou seu corpo de cima para baixo e tornou a se deter no seu rosto.
Permaneceu uns segundos pensativa, como se esforçando por
compreender, para depois se aproximar, beijá-lo e perguntar:
– Posso saber, se não for muito incomodo, aonde é que você
vai de terno e gravata, se hoje é domingo?
Domingo? Deus santo! Era domingo? Como fora tão
atrapalhado? Não era dia de trabalho! Agora sim, tudo começava a ter
sentido. Numa semana cheia de complicações, nervos à flor da pele,
onde também discutira com Vieira, era lógico que após dormir duma
jornada tão tensa, totalmente estressado, acordasse acreditando que era
segunda feira. Tudo esclarecido.
– Algo errado? - Perguntou Andréia quando o silêncio do
marido começou a parecer estranho.
– Sim, algo incrível; quase fico doido. Se você não
perguntasse o que faço de terno e gravata hoje que é domingo, ainda
estaria sem entender. Agora me sinto mais tranquilo. Sabe o que foi?
Nenhum gesto de Marcela interrompeu o que estava por ser
dito.
– Ia trabalhar - continuou André - pensando que hoje era
segunda-feira e ao passar pelo banheiro, não me reconheci no espelho.
Vi a imagem de outro homem; dá para entender?
– Olha Amílcar - atinou Marcela pela urgência de ocupar-se
de outro assunto - você não acha que já foi suficiente com esconder-
se pela casa toda e se trancar no banheiro feito criança, para ainda
continuar falando maluquices? Faz favor, vai se trocar que temos que
ir à casa de meus pais e saia do caminho que preciso entrar; por favor.
Amílcar? Ele não era Amílcar, seu nome era André e não
tinha sogros, Andreia era órfã. Mexendo o corpo feito autômato deixou
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que sua esposa fechasse a porta por trás dele e se encaminhou, sem
reação, até o quarto a descansar. Talvez imaginando que ao deitar-se
recuperaria a tranquilidade, e que a sensação de acreditar ter visto
outra imagem no espelho, desapareceria.
Sobre a cama ainda desarrumada da noite anterior, caiu
extenuado, como se houvesse passado longas horas de insônia sem
conseguir dormir, sequer um único segundo. Nessa posição, não se
decidia se tinha que aceitar que tudo não passava de um sonho ou