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Uma Bolha Fora Do Tempo
Uma Bolha Fora Do Tempo
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E-book245 páginas3 horas

Uma Bolha Fora Do Tempo

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Sobre este e-book

E se for verdade que todos nós vivemos mais de uma vida? E se crescêssemos com a certeza de lembrarmos de uma vida anterior? Katherine, conhecida por todos como Kate, é uma jovem mulher ítalo-americana que vive em Nova York. Muitos estão convencidos que ela tem problemas mentais, inclusive sua família de origem. Mas não é isso: a sua particularidade é que parece recordar com completa nitidez os detalhes de uma vida sua passada, uma vida vivida em um lugar distante da sua cidade natal. Hoje, com trinta e cinco anos, decide voltar a Joseph, no condado de Walowa, Oregon, onde estar certa de ter vivido. Busca o seu passado, aquela que foi sua alma presa a um corpo de uma mulher de uma outra época. Forçada a fazer uma parada em Portland por causa de uma tempestade, conhece John, com quem sente uma estranha afinidade. Ele se encarregará de ajudá-la a encontrar pistas deste passado que não para de assombrá-la. Um quadro, um beijo, uma casa e um diário escrito por ela mesma na segunda metade dos anos de mil e oitocentos, tudo converge para uma revelação de tirar o fôlego guardada por um mal capaz de tornar este romance inesquecível. 
IdiomaPortuguês
Data de lançamento17 de jul. de 2020
ISBN9781071556030
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    Uma Bolha Fora Do Tempo - Andrea Calo'

    2013

    ROMANCE

    UMA BOLHA FORA DO TEMPO

    Primeira Edição – janeiro de 2013

    Esta é uma obra de ficção. Os personagens e fatos são de criação do autor ou se destinam a dar veracidade à narração. Qualquer analogia com fatos, eventos, lugares e pessoas, vivas ou mortas, é mera coincidência.

    © Copyright 2013 – Andrea Calò

    ISBN: 978-1-291-26433-3

    @ e-mail: andrea.calo_ac@libero.it

    Andrea Calò

    UMA BOLHA FORA

    DO TEMPO

    ۩

    Romance

    Edições LULU

    A todos aqueles que sabem

    existir pelo menos um anjo

    no Paraíso.

    AGRADECIMENTOS

    Escrever um livro é como partir para uma viagem. Você faz as malas, sai de um ponto específico e segue os procedimentos procurando chegar ao ponto de chegada, a meta desejada. Mas, como acontece muitas vezes durante uma viagem, armadilhas, equívocos, receios e imprevistos estão ali, prontos a nos surpreender, a nos fazer parar, às vezes até ao ponto de nos fazer desistir de continuar. Com a ajuda das pessoas que estão ao nosso lado ou daquelas que encontramos ao longo da estrada, conseguimos, entretanto, nos safar, às vezes com facilidade, outras, muito penosamente; mas você nunca deve se fixar no problema para não perder o investimento feito. Durante essa viagem tive várias pessoas ao meu lado, todas me incentivaram e encorajaram a continuar a trajetória, a realizar este sonho, guardado há muitos anos na gaveta, permitindo abri-me completamente para ele, para o meu projeto.

    Agradeço a minha mulher Sonia, que mais do que qualquer um, acreditou em mim desde sempre, pela paciência de ler os rascunhos feitos desde as primeiras fases de preparação do texto, e pelas férteis discussões que levaram à criação da trama deste romance.

    Agradeço aos meus pais, que me doaram a vida, me criaram e educaram, permitindo que tudo isto se transformasse em realidade.

    E, por fim, mas não menos importante, obrigado a você, Elena, por haver ensinado meu coração a guiar minha mente ao longo dessa jornada: aqui dentro está, seguramente, uma enorme parte de você.

    CAPÍTULO 1

    ––––––––

    Acredito que uma história assim como a minha não tenha sido ainda contada. Talvez por receio do julgamento dos outros, ou talvez por aquele sutil véu de loucura que a acompanha.

    Me chamo Katherine, ou para encurtar, Kate. Dizem que eu nasci há trinta e seis anos atrás em Nova York, onde vivo atualmente, filha de pai italiano e mãe inglesa. Portanto, meu sangue não é americano. Minha data de nascimento está gravada no meu passaporte, ao lado da minha imagem, e está gravada com tinta nas fotos amareladas pelo tempo que minha mãe tirou quando eu era criança. Eu, porém, estou convencida de ter vivido mais que isso, muito mais. Talvez o dobro da minha idade, se eu for considerar também os anos que acredito terem sido vividos pela mulher que eu era na minha vida passada. Conservo as recordações muito nítidas, claramente ordenadas na minha mente como se fossem da minha vida atual, e as visito quando tenho vontade ou sinto necessidade. Vocês poderão pensar que sou uma pobre louca em meio a uma crise de identidade e, talvez até tenham razão. Minha mãe pensava assim também quando, desde pequena, lhe contava as histórias dos meus amigos grandes, com os quais conversava e compartilhava experiências e sentimentos que só podiam fazer parte da vida de uma mulher, nunca de uma criança. Falava de pessoas que minha mãe sustentava existir só na minha mente de criança. Nos primeiros anos da minha vida ela lidava com a minha forma de ser, a minha dupla identidade, associando-a à minha imaturidade e à natural importância que eu dava às brincadeiras. Acreditava, de fato, que eu estivesse brincando, que procurava interpretar papeis de personagens criados por uma fantasia e que estes ganhavam forma através das minhas palavras e atitudes. Se sentia até orgulhosa porque aos seus olhos maternais, eu lhe demonstrava toda minha singular personalidade. Estava segura, porém, que com o tempo essa brincadeira acabaria por si própria, da mesma forma que começara, e permitiria assim ceder aos poucos, à minha transformação como mulher. Mas não foi assim, porque aquilo para mim não era de fato uma brincadeira. Eu conhecia muito bem as pessoas com quem falava e que descrevia à minha mãe em mínimos detalhes, sonhava com elas frequentemente durante a noite. Uma brincadeira não deixa sentimentos tão fortes ou feridas abertas na alma, o que contrariamente acontecia no meu caso. Minha mãe me levou à renomados médicos da mente, generosamente bem pagos apenas para confirmar, no final, o que ela já pensava. Se sentia confortada pelas confirmações deles, mas sobretudo, pelas garantias de uma cura iminente. É só uma questão de tempo dizia o douto médico a seu turno. E ela prontamente acreditava, sem nunca se privar das lágrimas de alívio que lhe inundavam os olhos todas as vezes. Para todos, eu vivia uma dupla identidade. Só nesta vida pensava eu de vez em quando. Sempre me proibiram de fazer qualquer coisa que pudesse me remeter a voltar a discorrer sobre meu passado, aquele distante, extinto pelo tempo. Talvez mais por receio de um belo dia revelar à minha mãe a sua filha doida tinha tido sempre razão, e não propriamente para proteger-me. Enquanto a observava, imóvel, sobre seu leito de morte, rosto sereno para o repouso eterno que tinha acabado de lhe acolher, senti que eu também já devia ter passado por aquele estágio, mesmo que me sentisse totalmente incapaz de visualizá-lo, descrevê-lo e, assim, contar para os outros, além de mim mesma.  Não podia, porém, magoá-la mais expressando meus pensamentos, com o desejo que eu tinha de descobrir a outra versão de mim já extinta há muito tempo.

    Estou presa a um tempo eterno, prisioneira de uma bolha transparente. Milhares de outras esferas de celuloide levitam pelo ar, envolvendo outros tantos indivíduos que, como eu, se movem, desajeitados, dentro delas. Por todo o lado, como uma matilha confusa de animais, uma massa de pessoas se coloca à frente das grandes bolhas: procuram um ponto de apoio para agarrar-se e, com olhos suplicantes, movem os lábios e dizem palavras que não consigo compreender. Vagas, mas lúcidas são as recordações, como sonhos esquecidos assim que se acorda, mas que foram nítidos um momento antes. Eles afloram em minha mente, confundindo-a: eu também, por muitos anos, devo ter estado lá fora, mas não consigo unir o tempo com as imagens e tudo permanece num nível de impressões flutuantes.

    A minha memória é um vazio que de vez em quando se enche de imagens em preto e branco. E não há espaço nem mesmo para uma recordação neste vazio, quando ela é procurada pela minha vontade. Tento alertar as pessoas sobre as sensações que sinto, é para afastá-las, mas elas não parecem me ouvir ou me ver. Estou completamente isolada. Aqueles que estão lá fora, mesmo sem poder me ver, apontam para mim de maneira estranha. Alguns acariciam as esferas, outros inclinam suas cabeças contra elas, procurando captar qualquer mínimo movimento, enquanto outros sorriem sem um motivo aparente. Dentro de mim, aumenta a suspeita de assistir a um espetáculo encenado por criaturas imaginárias: transposições da mente para a consciência passada, presente e futura, esquecidas, mas não desconhecidas, e voltadas para um futuro incerto. Não sei o significado das palavras que penso, talvez sejam só conhecimentos atávicos, permanecidos por séculos a nível do inconsciente, mas parecem os mais adequados para expressar aquilo que sinto.

    Mesmo que eu não esteja segura de que lá fora seja melhor, a vontade de sair cresce dentro de mim, e vai se abrindo espaço com prepotência: estou cansada do calor morno e da triste segurança da bolha. Começo a procurar uma fenda dentro da cela, mas ainda custo a encontrá-la. A volta das visões antigas, quase atávicas, mas por isso mesmo, seguras, me impedem de ver o meu último suspiro. O último anseio de vida queimado pelo fogo do meu desaparecimento se elevou acima de tudo e de todos, formando uma nova bolha na qual o corpo se recompôs. Porém, ninguém foi capaz de vê-la. Daí, perderam todos uma boa ocasião para entender, inclusive eu. Provavelmente não entenderemos nunca: a novidade traz ignorância e medo, enquanto que a recordação conforta com a certeza e a segurança.

    Alguma coisa nova parece se formar em minha mente. São aquelas imagens confusas e sobrepostas alimentadas por um corpo que me leva de um lado para o outro, mas que, no final de tudo, sempre me abandona aqui. O tempo e as imagens sozinhos não se conjugam e tudo some mesmo antes de começar. Quero sair! Bato com os punhos, grito e choro. Não serve para nada, ninguém me escuta, só a minha consciência.

    Provavelmente a bolha é transparente apenas do meu lado e aqueles que estão do lado de fora parece que começam a perceber meus movimentos. Se aproximam, curiosos, para entender, exatamente como fazia minha mãe. Fixam os olhos na esfera com ar embevecido que parece os levar para trás no tempo comigo. Repetem palavras que ainda não consigo entender, mas pelas suas expressões parece que quase me invejam. Volto a procurar uma saída. Foi inútil até agora a procura porque o tempo devia fazer o seu curso natural e o conhecimento precisava ainda se completar. Só agora sinto a aproximação do momento do meu novo nascimento, não posso faltar a esse encontro para mim tão importante. A luz de fora é filtrada por uma pequena fenda que tende a alargar-se, e é assim que entendo que dali sairei.

    Por um espaço de tempo demasiado, começo a compreender as palavras que dizem aqueles de fora, graças também à ajuda e à presença constante da minha mãe na minha vida. Devemos entrar para sair com você, repetem eles infinitamente com os rostos impetrantes e tensos por causa da espera inútil. Vislumbres de vidas passadas e futuras abalam minhas expressões, sentimentos passados, presentes e futuros são as capas pesadas das minhas e das existências deles. Leio nas suas mentes medos infantis, agigantados por anos e experiências. Lugares escuros e sótãos decrépitos se apendem em seus cérebros e ocupam a maior parte das suas recordações, cintos de couro manuseados por mãos calejadas, rostos deformados pela raiva e pela desilusão que vivem indeléveis, em suas pupilas, gritos e ameaças ecoam nos tímpanos. Devemos entrar para sair com você! . A materialização das obsessões recorrentes e dos costumes mais absurdos são inculcados em meu cérebro por pais não escolhidos por mim. Dizem que querem entrar para sair comigo para eliminar o tormento dos medos passados e, consequentemente, sem os medos presentes ou futuros também; mas precisam ter cuidado, porque onde o tempo perde por completo o valor, o passado é facilmente confundido com o futuro e toma seu lugar.

    A fenda se abre cada vez mais, tento sair, empurro, faço força com meus pequenos ombros e, caio num chão frio e nu. Depois, me recomponho e descubro ter voltado aquela anterior. Nada mudou e nada mudará. De improviso, um estalo repentino e desesperado, centenas de pessoas caminham em direção à bolha: talvez, pela fenda que já havia sido fechada de novo, alguém conseguiu entrar. Para mim, a esfera se mostra transparente mesmo estando do lado de fora, só que as pessoas apinhadas em torno dela me impedem de ver lá dentro. Mas se um deles tivesse conseguido entrar, teria que percorrer todo o caminho, só completará o ciclo se transformar sua memória em um vazio.  Não há espaço para encher o vazio. Olho em torno de mim e, mesmo que eu não me lembre, sei que já estive aqui neste mundo. Melhor assim: sem lembranças, o meu passado não poderá nunca mais ser também o meu futuro. Simplesmente porque não o relembro. Simplesmente porque não me lembro. Só sei que o momento da minha morte coincidiu com a formação da bolha. O começo do meu renascimento. Vida e morte se confundem, passado e futuro se sobrepõem e o tempo não existe mais. Quem perdeu a esperança e não entendeu que o fim não passaria do começo, nunca poderia entender quem já ultrapassou os limites do tempo e das lembranças, como eu. Ficarão para sempre prisioneiros das próprias memórias, das próprias obsessões e das próprias angústias.

    O tempo perdeu todo o seu significado, ele será o nosso pai. Me viro um instante para trás, os outros não nos seguem mais. Até mesmo minha mãe. Todos voltaram às suas esferas. Nunca mais nos veremos. Talvez nunca nos tenhamos visto como realmente somos.

    Reuni todos os vestígios de coragem que ainda me restavam, sacudi do meu corpo e da minha mente todas as proibições que me foram impostas durante todos aqueles anos, deixando-as cair e, ali, percebi que havia chegado o momento de recriar meus passos, um após outro, sequencialmente. Eu deveria ter superado a barreira daquele período sombrio, indefinível, entre minhas duas vidas e da qual eu não tinha, e ainda não tenho, nenhuma lembrança, nenhuma imagem nítida. Quando revejo o meu passado, perco o contato com a realidade presente, me desconecto, e a minha mente começa a viajar, acompanhada do meu corpo... 

    Vivo em Joseph, no Oregon, em uma casa de madeira com vistas para as margens do lago Wallowa, um esplêndido espelho d’água esculpido entre as montanhas de mesmo nome e que o rodeiam. A casa está situada sobre uma pequena falésia que abarca toda a extensão do lago, assim como as outras poucas casas que se encontram nesta zona, na maior parte, habitadas por pastores e agricultores. O Monte Sacajawea é claramente visível do jardim e dos quartos, com toda a sua grandeza e a brancura da neve que o cobre durante a maior parte da estação fria. A casa é bastante grande, talvez muito grande para uma pessoa, provavelmente. Os espaços de dimensões majestosas, se dispersam e moldam tudo que se vê por esses lados. A fachada está pintada de um vermelho intenso, intervalado por janelas brancas que contrastam com o telhado feito de uma elegante ardósia, já levemente desbotada pelo sol e manchada por colônias de musgos verdes que vivem no lado mais frio e úmido da casa. E esta, é bem visível de longe, sobretudo quando a pintura está fresca e luzente ao ponto de refletir bem os raios de sol. No interior, entretanto, impera a madeira crua, com sua cor natural.  Nunca a quis alterar, e foi mesmo por escolha minha, apesar dos conselhos de outras pessoas. Eu vivo isolada, como uma eremita vive, longe do mundo, da comunidade. Sempre desejei a paz e odiei o conflito. Nenhum barulho diferente dos sons produzidos pela natureza perturba o meu tempo, as minhas noites, assim como os meus dias. Nas noites de lua cheia, a luz penetra com prepotência nos aposentos, se estendendo até ao meu lado, acompanhando meus pensamentos, brincando com as cortinas que cobrem as janelas, iluminando-as completamente. As velas não são necessárias, mas eu as acendo assim mesmo, porque adoro o perfume da cera derretida pela incontestável força do fogo. Com elas, acendo também o fogo da lareira nas noites frias de inverno. Amo o fogo e o calor que ele libera com sua energia, as toras de pinho perfumadas, ainda úmidas de resina, queimando lentamente e o crepitar produzido pelas chamas que as atravessa. Escrevo meus pensamentos em um diário, para que com a minha morte eu não possa desaparecer por completo. Derramarei ali o conteúdo das minhas jornadas e todas as minhas emoções em suas páginas, traduzindo-as em linhas de tinta preta que alguém um dia poderá, talvez, ler, se tiver vontade ou curiosidade de descobrir algo sobre mim ou mesmo, quem sabe, me reencontrar.

    Colocara as coisas mais importantes numa mala suficientemente grande, sem prestar muita atenção a isto. Previa que seria uma viagem bem longa. Pelo menos era o que havia previamente fixado antes de partir. Minha mala continha roupas pesadas e quentes, estando a estação já bem próxima de um inverno que, diziam, seria bastante rigoroso. Os dias quentes de verão eram já uma distante recordação, entretanto, o frio nunca me desagradou. Ele me ajudava a pensar, enquanto me sentava despreocupada no divã da minha aconchegante sala de estar, com uma xícara de chá de jasmim fumegante mantida bem estreitada entre as mãos. Renovado o passaporte, reservei o voo American Airlines para Portland, saindo do aeroporto J.F.K. às cinco da tarde do dia seguinte. Durante a semana se podia encontrar um lugar com relativa facilidade, até mesmo no último minuto, e com preços não exorbitantes.  Mas o aspecto econômico não me interessava minimamente, as minhas prioridades eram bem outras. A chegada à Portland estava prevista para às oito da noite. Não encontrei voo direto para Joseph, por isso percorreria o trajeto de Portland até Wallowa com transportes públicos. Não seria propriamente um passeio, a distância de 343 milhas que deveria cobrir, exigiria pelo menos umas setes horas de viagem. Pediria informações direto no aeroporto, quando lá chegasse. Esperava encontrar um ônibus de partida naquela mesma noite à fim de fazer aquele percurso dormindo. Assim sendo, deixei a cidade sem dizer nada a ninguém. Gravei só uma mensagem de voz na secretária eletrônica. Não queria que me dessem por desaparecida ou que corresse o risco de ver meu rosto em destaque na televisão, ou na coluna dedicada a pessoas desaparecidas ou mesmo nas páginas dos jornais de notícias. Seria um problema para mim, estaria me sentindo observada onde quer que fosse, nos Estados Unidos ou em qualquer outra parte do mundo. Porém, não queria também dar muitos detalhes a respeito desta viagem, por isso, me limitei a informar a minha ausência temporária com a promessa de um futuro contato. A mensagem dizia:  

    Desculpem, mas não estou em casa. Parti em viagem, falamos quando voltar.

    Logo após o sinal que anunciava o início da gravação.

    Já haviam passado muitos anos desde a minha última espera na fila do check-in no aeroporto J.F.K.  A última vez que isso aconteceu, foi numa viagem organizada por minha mãe, para me levar à um psicólogo que atendia num local que não me lembro, na fronteira com o México, e ele me faria um novo exame de cabeça. Ela dizia que ele era muito bom, e, com certeza, capacitado para pôr um fim ao meu problema. Óbvio que não foi assim, pois nunca vivi a minha situação como um problema. O

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