Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

O Zéfiro Entre Nós
O Zéfiro Entre Nós
O Zéfiro Entre Nós
E-book347 páginas3 horas

O Zéfiro Entre Nós

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

O romance conta a história de Rico, um estudante de Psicologia que tinha quase tudo para ser o rapaz perfeito. Inteligente e bonito, embora um pouco desengonçado, vivia um terno relacionamento com Marina, moça conhecida pelo recato e postura maternal. A pacata rotina do jovem era, no entanto, interrompida frequentemente por desejos que o desviavam de uma conduta desejável. Era na escuridão do parque em frente ao seu prédio, durante a madrugada, que Rico se libertava dos valores que recebera de seu pai. Ali, o jovem procurava por algo que não sabia nomear, até conhecer Glauco, colega recém-chegado à faculdade. Inebriado de paixão por seu novo amigo, Rico começou a ser perturbado por estranhos sonhos remetentes ao mito grego de Apolo e Jacinto, revelando um terceiro elemento entre os dois garotos: Zéfiro.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento3 de jul. de 2014
O Zéfiro Entre Nós

Relacionado a O Zéfiro Entre Nós

Ebooks relacionados

Religião e Espiritualidade para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Categorias relacionadas

Avaliações de O Zéfiro Entre Nós

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    O Zéfiro Entre Nós - Leandro Zagui

    O Zéfiro entre nós

    O Zéfiro entre nós

    Leandro Zagui

    Copyright © Leandro Zagui

    2014

    1ª edição, 2014

    Printed in Brazil 2014

    Foi feito o depósito legal

    Sumário

    09

    Fora de contexto

    15

    Expectativas

    21

    Na faculdade não!

    33

    Sombras no parque

    39

    O engano

    51

    Apolo e Jacinto

    61

    Memórias

    69

    O elo

    77

    Amizade indesejada

    83

    Na balada gay

    95

    Entre lágrimas

    103

    Ciclos diários

    115

    Realmente a sós

    127

    Zéfiro, o vulto

    135

    Esse Rico que tanto odeio...

    141

    O Sol e o Garoto Lunar

    149

    Revelações

    157

    Passado não muito distante

    169

    Ressignificando

    181

    O penhasco

    189

    Nuvem cinza

    197

    A porta entreaberta

    205

    Desculpas mortais

    215

    Bingo, Fera, Lancelot

    223

    Fruto de um erro

    229

    O Zéfiro entre nós

    235

    Arrebentando as portas

    253

    Epílogo

    1

    Fora de contexto

    O céu anunciava um espetáculo. Uma enorme mancha rosada pare-

    cia brotar do topo do Morro dos Crocodilos e cobria grande parte

    de Campo Negro, uma cidade de seiscentos quilômetros quadrados

    de extensão e população de cerca de oitocentos mil habitantes, lo-

    calizada no interior de São Paulo. O espetáculo asseverava que há

    poucos minutos o sol estivera ali, mas agora, recolhia-se majestosamente a seus aposentos a oeste.

    Sobre uma pedra à beira da lagoa do parque botânico da cida-

    de encontrava-se sentado um jovem, beirando os dezenove anos,

    impaciente. Olhava ao relógio a cada minuto, como se esperasse

    ansiosamente por alguém. Sua companhia era indiretamente com-

    partilhada por três ou quatro senhores que jogavam truco, sentados em uma mesinha de concreto logo adiante. O garoto diferia dos outros pela sua aparência. Vestidos com roupas de quem não ia a lugar nenhum e camuflando-se àquela paisagem natural oculta dentro da

    metrópole, reforçavam a estranheza que caracterizava o jovem, ali, com sua calça jeans, sua camisa polo branca, recém-ganhada de uma 9

    tia no último Natal, o gel que tentava delinear seus cabelos curtos, castanho-avermelhados, o tênis novo e o excesso de perfume. É que

    não estava ali por estar: fazia hora para um compromisso.

    Sua pele branca, que mostrava fracos sinais de bronzeamento, só

    notáveis a ele mesmo, ganhava o tom rosado do céu. Seus olhos, de

    um azul-escuro e profundo, denotavam uma melancolia implícita

    em qualquer uma de suas expressões faciais. Parecia, realmente, o

    modelo errado na paisagem certa, ou vice-versa. Saiu de casa com

    pressa, mas sem rumo, e, vendo que tinha ainda uma hora, decidiu

    passar ali, mesmo que por quinze minutos, almejando um diálogo

    com a Natureza. E embora o vento lhe falasse ao pé do ouvido, ele

    não sabia decifrar tal linguagem.

    Olhou então pela vigésima vez em seu relógio e percebeu que

    estava na hora. Levantou-se, revelando seus exatos 1,75m de altura e seu corpo magro e desengonçado. Virou-se e contemplou, dessa

    vez ao leste, o azul, que à medida em que ia escurecendo, revelava mais claramente uma e outra estrela. Olhava para o alto, maravilhado. Enrico decidiu não mais tentar conversar com o que via,

    mas apenas assistir. Sim, Enrico era o seu nome. Odiava chamar-se

    assim. Sua mãe escolhera o nome durante a gravidez, quando assis-

    tia a um filme qualquer. Nele, o mocinho chamava-se Enrico e era um galanteador.

    Sorte sua que, desde pequeno, era chamado carinhosamente por

    todos de Rico. Tal hábito se estendeu até a faculdade. Rico era estudante de Psicologia e iniciava, no próximo mês, o segundo ano

    do curso. Não sabia muito bem por que escolheu a Psicologia, mas

    gostava de pensar sobre as coisas do mundo e, principalmente, sobre as coisas de dentro. Só não tinha ainda essa noção muito clara.

    Já estava saindo do parque quando resolveu certificar-se de que

    continuava impecável. Sacudiu a calça e ajeitou a gola da camisa,

    imaginando-se em frente a um espelho, e caminhou em direção ao

    novo cinema da cidade. No meio do caminho, o celular tocou. Era

    sua namorada, Marina.

    10

    Leandro Zagui

    — Oi, Marina!

    — Oi, Rico! Acabei de chegar. Onde você está?

    — Estou no caminho... Você chegou cedo!

    — É! Meu pai saiu com o carro, então pedi a ele que me

    deixasse...

    — Não, tudo bem! Cinco minutos e eu estarei aí! Beijo...

    — Beijo!

    Dez minutos depois, Rico a encontrou. Marina era linda, sem

    dúvidas. Estava recostada em uma das colunas que, suntuosa-

    mente, enfeitava a fachada do local. Seus cabelos negros e com-

    pridos, profundamente lisos, escorriam-lhe sobre os ombros, con-

    trastando com a blusinha agarrada em tom pastel, que realçava o

    volume de seus seios, perfeitos. Sua saia branca, com pequenos bordados, ameaçava a todo momento revelar as coxas brancas e car-

    nudas. No entanto, toda a expressão provocante de seu corpo era

    amenizada pela fala suave, mansa e despretensiosa. Marina estava

    longe de ser o tipo de garota que tira o sono dos homens e inspira inveja em suas colegas. Na faculdade, era tida por todos com respeito. Possuía o dom de repelir qualquer obscenidade com um olhar

    maternal. Era quase uma santa!

    Rico foi um dos primeiros com quem ela fez amizade no curso.

    Não demorou para que ele percebesse que se tratava de uma moça

    para namorar e casar. Era o tipo de garota que ele procurava, que o fizesse se sentir seguro do que estava fazendo. E o relacionamento discorria de forma pacata, resumindo-se a idas ao cinema, ao teatro e à vida acadêmica compartilhada. Embora completassem, naquele

    dia, quatro meses de namoro, ainda não haviam transado. Marina

    era virgem e nem tocava no assunto. Rico, por sua vez, parecia con-tentar-se com beijos demorados, sem nunca ter ido além dos limites impostos, implicitamente, pela personalidade da jovem.

    Cumprimentaram-se com um selinho espontâneo, principal-

    mente devido ao salto dos tamancos que Marina calçava, que a dei-

    xara quase do tamanho de Rico, e andaram em direção à bilheteria.

    Fora de contexto

    11

    Quem os visse ali, intuitivamente deduziria um casal com vários anos de namoro, isso se já não fossem noivos. Existia uma forte aura que os envolvia, mas que talvez fosse mais percebida pelos outros

    que por eles próprios.

    Durante o filme, Rico acariciava incansavelmente as mãos de

    Marina. Por duas vezes, trocaram beijos. Na volta, Rico saiu irrefle-tidamente, conduzindo a namorada ao ponto de ônibus.

    — Você já quer ir embora, Rico?

    — Ah, desculpa, pra onde iríamos? Pensei que você já quisesse ir...

    — Você vai pra minha casa também? Está cedo...

    — Eu não tinha pensado nisso, só estava indo com você ao pon-

    to. Você sabe, eu mesmo vou a pé, não estou longe. Estou um pouco

    cansado, hoje fui fazer compras com meu pai.

    Era mentira. Rico não sabia bem o porquê, mas às vezes queria

    ficar longe da namorada. De alguma forma, Marina percebia isso,

    mas não questionava muito. Sentia-se amada. E era.

    — Tudo bem, mas espere aqui comigo, depois você vai.

    Não demorou muito a chegar o ônibus de Marina. A despedida

    foi rápida e Rico partiu em direção à sua casa. No caminho, viu-se novamente em frente ao parque. A noite transformava o lugar em

    um ambiente fantasmagórico. Parou por um instante, na calçada.

    Olhou para o portão já fechado, mas estava decidido a ir para casa.

    O prédio onde morava era tradicional e antigo, um dos poucos à

    beira do parque que ainda mantinha o visual de pastilhas, brancas e azuis, revestindo toda a construção. Pequeninas e elegantes varandas abriam a visão dos apartamentos frontais à paisagem, agora verde-

    -escura, em cada um dos nove andares e sobre uma rampa circular,

    cercada por um jardim.

    Dividiu o elevador com um entregador de pizzas, o que o fez

    lembrar de que estava com fome. Para sua sorte, o rapaz levava a

    entrega a seu apartamento, devido a um pedido de seus pais. Ao

    saírem juntos no mesmo andar, Luiza, mãe de Enrico, aguardava

    com a porta aberta e o dinheiro na mão.

    12

    Leandro Zagui

    — Filho, já chegou?

    — Não, é uma ilusão de ótica! — respondeu alegremente Enrico.

    — Pizza, ótima ideia!

    A mãe de Enrico era uma senhora distinta, com seus quarenta e

    poucos anos. Introvertida, falava somente o necessário, o que não a deixava menos afetuosa. Ela falava com os olhos. Seus cabelos lisos acastanhados davam-na um ar jovial, que ela reforçava com as aulas diárias de ginástica. Luiza trabalhava em casa, fazendo doces e salgados para festas. Contava, para essa tarefa, com uma moça chamada

    Fabiana, que a ajudava na cozinha.

    Rico entrou na casa e deu de cara com o pai sentado no sofá

    assistindo a um jogo de futebol. Mal se cumprimentaram, já que o

    cheiro da pizza falou mais forte e o homem soltou um urro de fome, levantando-se para confirmar o que cheirava. O sofá ficou com uma

    marca, como se alguém tivesse sentado ali há horas.

    Paulo era um homem agressivo no jeito de se expressar. Era di-

    fícil de não ser notado. Falava sempre alto, com uma voz forte e retumbante. Fazia muitos movimentos bruscos, que faziam sua esposa

    levar vários sustos a todo momento.

    — Ah Paulo, deixa de ser grosso e pegue aqui o seu pedaço de

    calabresa — resmungou a mulher, devido a um arroto de cerveja

    manifestado entre a troca de olhares do homem e os discos de

    pizza.

    Paulo olhou com sarcasmo para a mulher. Por um tempo, Luiza

    contemplou o corpo conservado do marido, que malhava na mesma

    academia que ela. Apesar de quarentão, o supervisor de produção

    em uma indústria de eletrônicos situada na cidade não tinha ou-

    tra coisa que revelasse a sua idade fora certa calvície e uns cabelos grisalhos. O peito nu, definido e peludo, frequentemente exposto,

    provocava certa cobiça das vizinhas. Mas nada de tão inoportuno

    que provocasse a atenção de Luiza.

    Rico ajeitou dois pedaços de pizza de mussarela em seu prato e

    correu para o quarto. Sentou em sua cama, ligou a televisão e ficou Fora de contexto

    13

    procurando algo para assistir, deixando o controle remoto todo sujo de gordura.

    Após a refeição, foi à janela, que dava para um pedaço do par-

    que. Ficou por alguns minutos a contemplar a paisagem. Olhava

    para a vegetação do parque, que tinha cerca de quinhentos metros

    quadrados. Conseguia ver alguns morcegos com seus voos cegos.

    Um deles veio na direção de Rico, que recuou sem pensar, como se

    o animal fosse entrar pela janela.

    Voltou-se para o quarto e fitou suas paredes brancas por um ins-

    tante. Olhou para a cama e a prateleira logo acima, com alguns de

    seus livros preferidos, um dicionário inglês-português e um boneco do Homem-Aranha. A tv, ainda ligada, transmitia um telejornal

    de fim de noite. Pegou o controle e desligou o aparelho. Ligou o

    computador e verificou seus e-mails e sua página em um site de relacionamentos, enquanto ouvia The Strokes.

    Nada de novo. Queria que aquelas férias acabassem logo. Lem-

    brou do pessoal da faculdade e principalmente do barzinho ao lado

    dela, onde costumavam ficar depois das aulas. Lembrou de Marina,

    sentia ternura por ela, um carinho enorme. Pegou o celular e pen-

    sou em ligar para a namorada, mas acabou mandando apenas uma

    mensagem: Boa noite, amor!

    14

    2

    Expectativas

    A última semana de férias passou da forma mais monótona possível. O

    verão parecia não ir embora tão cedo. Os dias pareciam todos iguais, ensolarados pelas manhãs, com pancadas de chuva nos fins de tarde e finalizados com noites estreladas. Rico passou a maior parte do tempo com sua namorada. Assistiram a outros filmes em cartaz, passearam

    no shopping novo da cidade e ficaram muito um na casa do outro.

    Marina provocava no rapaz uma sensação de conforto, como se

    estar com ela fosse algo de que ele precisasse para ser feliz e alcançar seus objetivos na vida. Mas ele ainda não sabia muito bem quais

    eram os seus objetivos. A única certeza no momento era a de que

    estava no curso certo.

    Em casa, a situação não era fácil. Quando disse ao pai que que-

    ria estudar Psicologia, fora veementemente reprimido. Paulo queria que ele fizesse algo mais prático e objetivo. Psicologia era coisa de gente que não tem o que fazer. Rico percebeu que não teria apoio

    do pai para pagar os seus estudos e passou a procurar emprego para poder bancá-los. Logo percebeu que as oportunidades de primeiro

    15

    emprego que lhe apareciam não ofereciam remuneração suficiente para pagar o curso, um dos mais caros na cidade. Sua única opção

    era tentar uma universidade pública. Como não havia nenhuma

    com curso de Psicologia em sua cidade, pensou na capital.

    Quando percebeu o grau de decisão do filho em ir embora,

    Luiza resolveu intervir e acabou convencendo o pai a financiar a

    faculdade do filho em Campo Negro. Argumentava como ninguém

    sobre o fato do filho ter que fazer o que gosta. Paulo então mu-

    dou sua estratégia, disse a Rico que não precisava sequer procurar emprego, para que se dedicasse inteiramente aos estudos. Afinal, já que tinha escolhido um curso inútil, que estudasse muito para ser o melhor. Foi a forma que ele encontrou de continuar exercendo sua

    autoridade sobre o garoto e dar a palavra final sem maiores com-

    plicações e lamúrias depressivas de uma mãe que ainda não estava

    preparada para ter o filho fora do ninho.

    A semana teria sido um lago completamente parado, não fosse

    o casal ter combinado de rever os amigos no fim de semana. Deci-

    diram se encontrar para fazer uma prévia do ano letivo que estava

    por vir, conversar sobre as férias. Marcaram em um barzinho recém-

    -inaugurado na avenida mais badalada da cidade. Quando Marina e

    Rico chegaram, já estavam lá Isabella e Tom.

    Isabella era a típica baixinha invocada, uma garota expressiva

    que sempre transparecia o que sentia. Ria muito das palhaçadas de

    Rico e era a melhor amiga de Marina. As duas se conheciam desde a

    infância, fizeram o Ensino Fundamental juntas. No Ensino Médio,

    foram para escolas distintas, mas nunca perderam o contato e, nos

    últimos anos, foram descobrindo mais uma afinidade, o interesse

    pela Psicologia. A baixa estatura de Isabella era sua marca registrada.

    Os cabelos acobreados, na altura do pescoço, lhe davam um ar mais

    irreverente do que já era naturalmente. Era chamada de Sapequinha por Rico, título que lhe fazia jus.

    Já Tom era alto, magro, um rapaz que caíra no curso de Psicolo-

    gia por mero acaso. Tinha um perfil demasiadamente lógico e prá-

    16

    Leandro Zagui

    tico para a profissão. Sua matéria preferida na faculdade, até então, era Estatística. Seus amigos sabiam que, se ele não desistisse, seria um péssimo profissional, a não ser que fosse trabalhar com Recursos Humanos, o que faria dele um administrador e o faria esquecer de

    todo o conteúdo aprendido durante cinco anos. Mas ninguém se

    atrevia a dizer isso a ele. Queriam-lhe bem, mesmo com a chatice

    inerente a sua pessoa. Tom era chato, mas coerente.

    O bar possuía uma arquitetura rústica, todo de madeira, com

    mesas que simulavam troncos de árvores. Rico elogiou o aspecto do

    local, porém Marina o achou exagerado.

    Sapequinha, olhando pra você nesse cenário eu fico convencido de que estou em uma floresta de duendes — brincou Rico.

    — Ah sim, e você seria o quê? Um elfo, por acaso? — retrucou

    risonhamente a menina.

    — Ai gente, essas mesas não são nem um pouco confortáveis, va-

    mos combinar, né? — Marina interrompeu a brincadeira, insinuando

    que procurassem outro lugar para ficar.

    — Ah Marina, tenta entrar no clima da coisa! — ponderou o

    namorado.

    — Mas realmente, onde vou colocar meus pés? Vou ter de ficar

    com as pernas abertas — reclamou Tom.

    — Ui, que delícia!

    — É sério, Isabella!

    — Eu sei que é, mas se você for começar a reclamar eu te jogo

    por essa janela agora! — Enquanto dizia isso, a menina ameaçou

    descontraidamente tirar os tamancos e jogar no amigo.

    — Ah gente, ficamos um pouco aqui e depois vamos pra outro

    lugar! — sentenciou Rico. — Agora me falem, quais as expectativas

    de vocês para esse ano, hein?

    A pergunta não foi respondida devido a chegada dos amigos que

    faltavam: Luana, Ana Paula, Bernardo e Marco.

    Luana e Ana Paula eram amicíssimas! A primeira se destacava

    pelo olhar e expressão corporal que exalavam sexualidade, bem

    Expectativas

    17

    diferente de Marina. Luana costumava passar pelos corredores da faculdade provocando minutos de silêncio por parte dos rapazes.

    Seus largos quadris movimentavam-se harmoniosamente ao balan-

    çar de seus cabelos castanhos volumosos, fazendo do seu andar um

    com alguém.

    Ana Paula, em contrapartida, era rebelde. Suas feições agressivas, mais belo em Ana Paula era a personalidade, pois vinha de uma alma que parecia querer escapar a qualquer momento por seus cabelos escuros e crespos e expandir-se em direção aos seus objetivos. A pele negra lhe dava uma aura telúrica, firme, decidida. A amizade

    de Ana Paula e Luana era forte e transformadora, como o encontro

    do vento com a terra.

    Bernardo e Marco, da mesma forma que as garotas, tinham uma

    amizade marcada pelo contraste. Bernardo era tímido e raramente

    mostrava a voz. Possuía um tom cômico na face, que junto com o

    corpo leve e magro, lhe dava um ar caricato, o que tornava sua companhia divertida. Os cabelos castanhos, muito lisos, lhe escorriam pela testa, fato sempre repreendido pelas mãos do rapaz, que vivia a empurrá-los em direção à nuca.

    Marco, a seu modo, era um modelo de gentileza e simpatia. Alto,

    moreno e sutilmente popular, interagia com toda a sala, mas não era exatamente um sujeito expansivo. Era simplesmente respeitado por

    todos, pelo forte caráter e pela inteligência demonstrados em suas ativas participações em aula.

    O grupo era então constituído em sua maioria de pares de ami-

    gos, que trocavam juntos as experiências acadêmicas, com exceção

    de Marina e Isabella, que já mantinham uma amizade há muito tempo. Entretanto, Rico e Tom não formavam propriamente uma

    parceria, embora se juntassem diversas vezes em atividades em du-

    pla, na faculdade. Rico não tinha muita paciência com o jeito lógico 18

    do colega e muitas vezes preferia dividir a atenção da namorada e da Sapequinha.

    No fundo, embora inserido no grupo, o rapaz sentia uma soli-

    dão não expressa, como se houvesse algo dentro dele que ninguém

    fosse capaz de compreender, nem mesmo sua cúmplice namorada.

    O papo se desenrolou por horas, a ponto de o grupo ser convi-

    dado a se retirar do estabelecimento, já prestes a fechar.

    Todos saíram sorridentes e alegres do lugar, principalmente

    Isabella, que bebera além da conta e acrescentou ao seu modo es-

    pontâneo uma indecência na fala, que teria sido levada a sério por outros que não fossem seus amigos.

    — É bom que tenha algum bixo bem gato pra eu me divertir

    logo na primeira semana de aula — complementou a garota, ainda

    quando falavam sobre a faculdade, já pela calçada.

    — Ai, ou quem sabe algum aluno novo na nossa sala, pra você

    enjoar mais rápido! — brincou Luana, tentando entrar na brinca-

    deira da amiga.

    — Aluno novo? —

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1