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Ultraviolet
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E-book474 páginas5 horas

Ultraviolet

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Sobre este e-book

Daisy e Noah são jovens, estão no colegial, tem amigos, e passam por todas as fases típicas de qualquer pessoa com a idade deles. O contraponto: Eles não são jovens comuns! Daisy e Noah sofrem dos mais altos graus de depressão. Logo, os dois garotos têm de lidar com todas as vicissitudes específicas da juventude, equilibrando-as com suas dores e questionamentos.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento13 de out. de 2017
Ultraviolet

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    Pré-visualização do livro

    Ultraviolet - Sara Ohnesorge

    PROLÓGO

    Esqueça o amor da forma que conhecemos. Vejamos o de forma

    madura, mesmo que seja com os olhos de uma menina de 14 anos!

    Daisy e Noah são jovens, estão na faculdade, tem amigos, e passam por

    todas as fases típicas de qualquer pessoa com a idade deles. O

    contraponto: Eles não são jovens comuns! Daisy e Noah sofrem dos mais

    altos graus de depressão.

    Logo, os dois garotos têm de lidar com todas as vicissitudes específicas

    da juventude, equilibrando-as com suas dores e questionamentos.

    Tudo, porém, torna-se mais fácil quando os dois se encontram e se veem

    com as mesmas dificuldades e com os mesmos interesses em comum.

    O relacionamento de grande amizade de nossos protagonistas, contudo,

    é abalada pela presença de Brandon, rival de Noah, que guarda um

    grande segredo do rapaz que pode abalar toda a confiança de Daisy por

    ele e que, por fim, pode desencadear uma grande tragédia.

    Esqueça o amor da forma que conhecemos. Talvez ele nem exista. Mas

    depois de acompanharmos toda a estória de Daisy e Noah – quem sabe

    – ele não tenha uma nova face?

    Com uma visão pouco usual do amor e de relacionamentos, similares a

    romances como Se eu ficar, A culpa é das estrelas, Para sempre e Como

    eu era antes de você, Ultraviolet mostra como o amor e o respeito pode

    existir mesmo diante das maiores tempestades.

    Capítulo 1

    O amor pode ser algo delicado e lento, como o dedilhado de uma

    música. Ou rápido e forte, como a passagem de uma nota para outra.

    Mas o fato é que ninguém está realmente preparado para sofrer por

    causa dele. É isso que acontece quando se ama; você dá o poder para as

    pessoas te destruírem. Mesmo quando o juramento do casamento

    parece algo forte e duradouro, infinito e promissor, o amor esfria. Mas,

    se o amor é uma chama que nunca apaga, como pode esfriar? Então

    nunca houve amor. Nem quando os pensadores de época tentavam

    descrevê-lo. O amor é como você tentar colocar água em um buraco

    escavado na areia; nunca encherá. A mente humana não suporta o

    amor, porque nunca houve amor. Ou ele existe e só não sabemos o que

    é.. Ninguém sabe. A complexidade das quatro letras revela a existência

    de bilhões de perguntas espalhadas por essas estrelas. Se o amor fosse

    como o céu, seria tão colorido quanto um arco-íris ou um desenho de

    uma criança. Isso é o que penso.

    Eu nunca fui de pensar muito nessas transições. Até que vi um vídeo de

    quando era criança. Sem saber o que poderia ocorrer quando eu

    estivesse na pior fase que alguém passa, a adolescência. É tudo tão novo

    e tão entediante, como se você não tivesse tempo para experimentar e

    nem quisesse. É quando você é pressionado para escolher o melhor para

    não sofrer no futuro. Mas, o que as pessoas não sabem mesmo é como

    a mente jovem é confusa. Como um milhão de respingos em uma tela

    lisa ou um chiado na televisão. Irritante e inquietante.

    Eu não lembro de quando minha mente mudou drasticamente. Num

    momento, eu me preocupava com a roupa para ir à escola e se eu

    poderia levar uma boneca na mochila estufada de livros. E na outra, eu

    estava pensando em como sobreviveria a paixões insuportáveis e

    amizades peculiares.

    Estudo na mesma escola a pouco tempo, mas nada mudou. Exceto

    quando você cresce. Você consegue perceber as diferenças. Você nunca

    olhou para ninguém dessa forma; você nunca foi tão confusa; você

    nunca teve tanta responsabilidade. Mas, começa a ter. Todos os meus

    amigos parecem felizes por serem adolescentes; eu não.

    Quando vi aquele vídeo de quando era criança, mais um fio de luz entrou

    na minha bagunçada mente: Eu mudei muito. Meus amigos mudaram.

    Meus pais mudaram. O mundo mudou. Mas, ao mesmo tempo, pareço

    presa no tempo. A inocência e a diversão são as únicas algemas que me

    prendem. Eu não consigo ser jovem como as pessoas que estão ao meu

    redor. Ainda estou presa nesse estado mental que pode sugerir algo

    promissor sobre minha sanidade.

    O que isso tem a ver com amor? Bem, desde que comecei a tentar

    pensar sobre o assunto, estava começando a encher o balde para jogar

    no buraco de areia. Meu nome não foi algo escolhido por acaso. Daisy,

    como a flor cheirosa e simples. Porque era para ser assim a minha vida.

    Mas não foi. Está tudo de cabeça para baixo.

    Meus amigos são as melhores pessoas do mundo. Não consigo gostar

    de só um, pois todos complementam a mim a eles mesmos. Mas ainda

    assim; nunca contei com eles. Mesmo eu sabendo que posso. Eles não

    contam comigo também. Isso é bom.

    Eu estava no intervalo da aula quando resolvi sair para dar uma volta.

    Mesmo ouvindo a gritaria atrás de mim, eu continuei. E eu percebi algo

    que nem sabia que poderia existir.

    Segui um olhar de um garoto que olhava sugestivamente para mim.

    Como eu não sabia o que poderia ser, eu não liguei. Continuei andando

    e não vi mais o garoto.

    Mais tarde, algo apareceu de supetão na minha mente; os olhos do

    garoto. Estranhos, como se alguém tivesse encravado duas esmeraldas

    em suas órbitas. Mas a cor não me interessou, e sim o olhar. Depois do

    garoto, eu passei a encarar as pessoas para ver se tinham o mesmo

    olhar. Mas era a diversidade em cada pessoa. Olhares tristes, cansados,

    felizes ou simplesmente entediados. Mas nunca o mesmo olhar.

    Pouco tempo atrás, tive a má reputação de ser caçoada por meus

    amigos por começar a gostar de, como eles falam, qualquer um. Não

    posso reclamar, mesmo não sendo verdadeiro. Eu acabei usando

    demais meu coração ao invés da razão, e pintei coisas certas em pessoas

    erradas. Pessoas que mais tarde, me magoariam e me irritariam. Então

    eu passei a mascarar essas confusões por alegria. Praticamente, eu sou

    a palhaça do grupo. Sempre falo alguma besteira ou rio intensamente

    para melhorar o clima. Mas, dentro de mim, a mesma coisa. Milhares de

    pontos de interrogações. Talvez um dia eles virem pontos de

    exclamações.

    Depois de meses, eu vi o garoto novamente. Mas, não parecia ele. Os

    olhos dele estavam inchados e vermelhos, e parecia que ele tinha

    tomado uma surra. Eu ainda estava observando ele quando descobri

    quem era seus amigos. Eles eram da classe anterior da minha, então

    tínhamos a mesma idade. Mas, ele parecia incrivelmente mais velho. E

    ele olhava com raiva para um garoto maior, que parecia ter o dobro do

    seu tamanho. Ele parecia prestes a bater nesse garoto, mas seu amigo,

    se colocou na sua frente e balançou a cabeça. Advertindo-o.

    O engraçado é que, mesmo o garoto sendo muito maior do que o amigo,

    ele obedeceu e relaxou. O nome do amigo era Nicolas, e eu conhecia ele

    muito bem pois ele namorou minha amiga, Isys. Foi o namoro mais

    ridículo que eu já vi, porque parecia extremamente artificial. Mas eu

    sabia, que com o término, Isys tinha ficado despedaçada. E eu fiquei

    com medo de isso acontecer comigo. Essa dor que parece um soco no

    seu estômago, repetidas vezes.

    Mas, eles voltaram a se falar. E mesmo com as outras pessoas olhando

    torto cada vez que eles passavam, voltaram. Ela me contou no dia que

    antecedeu a volta. Eu não me importei, pois parecia algo inofensivo a

    olhos externos. Mas, nunca é possível saber o que realmente acontece.

    O que eu não tinha percebido era que a volta deles traria o garoto

    estranho para perto de mim. Como Nicolas agora tentava ser melhor

    para Isys, ele vinha passar o resto do intervalo conosco. Então, ele veio

    com o amigo. Nicolas apresentou ele gentilmente para nosso pequeno

    grupo, e em voz baixa ele cumprimentou a todos. Ele só passou os olhos

    quando meus amigos responderam, e de reflexo se virou para mim.

    Aquilo me assustou, porque parecia que eu poderia ver a quilômetros

    dentro de seus olhos. Ele se assustou também, porque desviou o olhar.

    Ainda bem que ninguém percebeu.

    Quando estava voltando para casa, minha mente já estava cheia. Cheia

    do garoto estranho, do olhar indagador e da forma como aquilo poderia

    atingir um ser humano como eu. Não tenho nenhuma experiência

    nessas coisas, mas nunca passou na minha cabeça em um primeiro

    momento que aquilo poderia ser uma paquera. Era tão ridículo na

    minha mente, seria ainda mais se eu pronunciasse as palavras.

    Decidi então, começar a ignorá-lo, talvez porque seja intimidador

    alguém te encarar, mesmo eu fazendo isso. Não consigo deixar de olhar

    fundo nos olhos de qualquer pessoa para ver se o resto tem a mesma

    intensidade daquele olhar. Mas não tinha.

    No outro dia eu já estava decidida a deixar ele de lado e focar nas coisas

    mais importantes, como uma entrevista que tinha que fazer naquele

    dia. Estou na equipe do jornal da escola, e fui selecionada para

    entrevistas os alunos sobre assuntos categóricos ou relevantes. E, por

    um acaso, acabei esquecendo minhas perguntas que teria que fazer

    para a outra classe. Teria que bolar na hora, já que sou boa nesse

    quesito. Também sou boa em saber se a pessoa está sendo sincera em

    sua resposta ou não, o que é conveniente em algumas horas. Antes que

    eu pudesse subir as escadas, ele estava parado no meio do caminho,

    olhando para a direção oposta. Eu hesitei, porque o que eu menos

    queria era ver aqueles olhos acusadores, mesmo eu não sabendo se era

    isso. Então, eu passei por outro caminho, e Nicolas apareceu correndo

    atrás de mim, perguntando quando seria a entrevista, e me explicando

    que o outro garoto estava doente, e não poderia comparecer. Então ele

    perguntou se poderia substituir o garoto por um amigo seu que talvez

    teria boas respostas diante de minhas perguntas. Eu aceitei, mais por

    necessidade do que por vontade.

    Depois da aula, eu já estava decidida a sair correndo para pegar minhas

    perguntas, até que vi ele novamente. Como se estivesse me seguindo.

    Tentei parecer normal ao passar do seu lado e ir ao meu armário pegar

    minhas coisas. Mas ele não me notou, porque estava ocupado

    sussurrando com outro garoto. Tentei acompanhar metade da sua fala,

    mas ele parecia estar tentando falar o mais rápido possível. O que

    consegui ouvir era que ele não queria participar de alguma coisa,

    parecia uma aposta. Fechei meu armário com força, e ele se virou

    lentamente para mim, com uma expressão aborrecida. Baixei a cabeça

    e rumei para fora, satisfeita de que ele não conseguisse ver minha

    expressão.

    Voltei a escola para editar algumas partes do jornal e inserir minhas

    perguntas na aba de questionário, quando Nicolas apareceu. Ele me

    chamou para ir pegar uns papéis para o jornal, pois ele é o editor-

    principal, e quando decidi sair, o garoto simplesmente se materializou

    na minha frente. Dei um encontrão nele, o que resultou em uma queda

    e metade de minhas perguntas misturados a edições anteriores de

    jornais. Espumando de raiva, abaixei para pegar a montoeira de papéis,

    mas ele já havia empilhado para mim. Simplesmente me entregou e

    sussurrou um pedido de desculpas, e entrou dentro da sala de edição.

    Foi aí que eu entendi.

    Eu teria que entrevistar ele, naquela sala apertada e tendo que encarar

    aqueles olhos acusadores o tempo todo. Enquanto ponderava sobre

    isso, ouvi ele cochichar com Nicolas a respeito de como seria fácil

    vencer, só que eu não consegui entender o motivo da vitória, então fui

    pegar os papéis e pensei sobre como eu deveria ter ficado em casa.

    No dia seguinte, eu deveria ir a direção geral de jornalismo para

    apresentar minha entrevista, mas eu ainda não tive a oportunidade de

    conversar com o garoto. Mesmo Nicolas falando que ele iria vir, já se

    fazia uma hora de seu atraso, então me levantei, impaciente, e fui em

    direção ao refeitório, que era ao lado.

    Quase me virei e voltei para a sala. Ele estava ali, quieto, mas diferente.

    Os olhos estavam vermelhos e inchados, como se estivesse chorando.

    Mas eu não percebi. A única mudança que refulgiu em minha mente foi

    seu olhar. Um olhar devastador, como o olhar de uma presa antes do

    predador a dilacerar. Um olhar que pedia socorro.

    Somente quando ele passou por mim, eu percebi que estava paralisada.

    Voltei a mim na mesma hora que Nicolas vinha correndo me falar que

    ele tinha chegado. Não achei propício encará-lo, então entrei com a

    cabeça baixa. Fiz algumas perguntas sobre o que ele pensava sobre a

    escola e outras insignificantes no momento. Eu queria mesmo perguntá-

    lo o porque de seu choro silencioso. Ou dos olhares raivosos.

    Mas não fiz. Nicolas me deu um tapinha nas costas quando a entrevista

    se encerrou e saiu correndo para acompanhar o garoto, que saiu

    efusivamente da sala.

    Ele tinha uma voz diferente, como se fosse grave demais para um garoto

    mas suave para um homem. Não pareciam forçada, parecia quase

    estrangulada. Ainda sim, era a entoação de voz mais peculiar que eu já

    havia ouvido. E seu nome, finalmente descoberto, me deixou com mais

    dúvidas ainda sobre seu caráter: Noah. Como as flores selvagens que os

    supermercados vendem em vasos bonitinhos. Elas eram cheirosas, mas

    possuíam um veneno quase letal para quem se aventurasse colhê-las.

    Assim como meu nome, Daisy. Esperava que não houvesse nenhuma

    conexão entre nossos nomes.

    No outro dia na escola, ele não estava em lugar algum. Eu já havia

    percebido a diferença em mim. A mudança crescendo; minha pior

    inimiga. Eu já estava me preocupando o bastante com ele. Mas eu não

    o conhecia direito, ele me parecia mais alguém desagradável que possui

    tudo o que quer. Mas havia algo obscuro nele. Não como os dramas

    adolescentes que meus amigos fazem; algo mais escuro do que as

    próprias trevas, algo que adultos sofriam também. Mesmo eu vendo os

    amigos dele ali, sem se preocupar, eu senti medo. E se ele tivesse se

    mudado? Eu não deveria me importar, porque eu mal o conhecia. Mas,

    aquele sentimentos estava me sufocando. Pior do que uma asfixia, ela

    estava em minha mente. Vagando e pressionando meu cérebro. Então,

    tomei a única decisão plausível no memento: fui perguntar a Nicolas.

    Quando fui me aproximando, vi que seus amigos estavam cochilando e

    rindo de mim. Apertei os olhos para eles, do jeito que eu fazia quando

    tentava entender uma equação complicada. Nicolas porém, estava

    distraído, parecia meio tenso. Chamei ele e perguntei se estava tudo

    bem entre ele e Isys.

    -Qual é o problema Nicolas? Não terminou com a Isys de novo né?- dei

    um risinho nervoso.

    -Graças a Deus não- ele sorriu. Mas o sorriso não chegou em seus olhos.

    Ficou pairando em seu rosto até que ele fechou a cara.

    - Poderia me falar aonde o Noah está? Tenho que acertar umas coisas

    do jornal que não terminaram.

    - Desculpa Daisy, mas o Noah está…doente- ele hesitou, me olhando

    meio apreensivo. Fácil de detectar: Ele estava mentindo.

    - Tem certeza? Eram coisas bem importantes e que não posso adiar.

    - Vou ligar para ele mais tarde e te falo tudo bem?- ele parecia meio

    triste.

    Aquilo me deixou curiosa. Doente ele não estava. Talvez o motivo pelo

    qual ele estava chorando ontem é o motivo do sua falta no presente. Eu

    que sempre estava tentando decifrar as pessoas, achei propício.

    Quando achei que algo poderia estar diferente, nunca pensei que

    poderia ser para pior: Noah voltou, e definitivamente não era mais o

    mesmo!

    Capítulo 2

    Quando Noah voltou a escola uma semana depois, eu tinha certeza de

    que tudo estava errado. O olhar dele parecia de um cadáver ambulante;

    seu andar pior do que de um sonâmbulo. Nicolas olhava-o preocupado,

    mas não disse nada. Era como se seus amigos estivessem tendo cautela

    perto dele, mas ele estava morto demais para se importar.

    Eu estava curiosa e com medo. Percebi que quando vi ele novamente,

    parecia que tinham batido em meu estômago com uma barra de ferro

    em brasa. Ele olhou para mim, mas seus olhos não diziam nada. Como

    se as portas estivessem fechadas e ele mais recluso do que o normal. Eu

    queria saber o que estava acontecendo, mas era covarde o suficiente

    para não dirigir nem olhares mais para ele. Nicolas e Isys estavam

    ocupados na biblioteca procurando artigos para a nova edição

    jornalística, e fui atrás deles para registrar um romance qualquer. Mas

    quando cheguei a pratileira, um livro estava na beira de cair. As letras

    pretas sobre o branco gritante foi o que mais me chamou atenção:

    suicídio mental. Não sabia que poderia existir isso, mas a mente era

    como uma vasta floresta; é muito fácil atear fogo na beleza imensa e

    danificar toda a flora e fauna. Quis ler o livro por vontade e não por

    hábito. Quando cheguei na bibliotecária distraída, ela logo abriu um

    sorriso para mim; era costume em quase viver no ambiente. Porém, ao

    ler o título, ela me olhou preocupada.

    -Está tudo bem querida? - Ela me fitou de olhos arregalados.

    -Sim Sra. Ganger, qual o problema?- respondi aflita.

    -Esse livro não parece ser um de seus romances. O garoto que o deixou

    aí parecia uma má-influencia social- ela tremeu.

    Mesmo eu não fazendo ideia de quem era, quis defender a pessoa, pois

    a pessoa é livre para fazer suas escolhas. Mas fiquei calada e dei a

    desculpa de que era para um amigo. Depois de cadastrar o livro, sentei

    em um dos banquinhos de plástico no meio da garoa para ler um pouco.

    A primeira página citava a frase Se amor é cego, nunca acerta o alvo.

    aquilo me deixou curiosa. O que poderia dizer? Que o amor não era

    real? Que nunca existiria o amor verdadeiro? Minha ex-melhor amiga

    concordaria com isso. Mas, o carro a matou antes dela pronunciar as

    palavras.

    Estava tão atenta tentando decifrar esse começo que não percebi que

    alguém sentou a meu lado. Olhei desinteressada e novamente a barra

    me atingiu no estômago: era Noah. Só que as esmeraldas estavam

    líquidas; conseguia ver a quilômetros dentro de seus olhos. Mas isso não

    foi o pior. Ele me deu um pequeno sorriso e gesticulou para o livro:

    -Uma boa literatura, essa aí. Não parece combinar com você.

    Não consegui responder. Parecia que meus músculos tinham travado e

    meu estômago estava se enchendo de farpas de gelo que subiam pela

    minha garganta...

    -Acho que não me apresentei direito. Meu nome é Noah. O seu é?- ele

    me olhou curiosamente.

    -Daisy- sussurrei

    Aquilo não poderia ser real. Ele não poderia estar falando comigo. Ou

    poderia? Ele estava translúcido sobre a luz, e seus cabelos caíam como

    fagulhas douradas nas gotas de chuva. Mas estava acontecendo. E eu

    poderia perguntar para ele o porque de sua ausência. Ou não poderia?

    Ele estava esperando eu dizer alguma coisa. Mas eu não conseguia

    respirar. Parecia um típico ataque de pânico. Me levantei correndo e fui

    ao banheiro torcendo para não vomitar antes de chegar lá.

    -Quando isso acontecer, você deve me ligar e me falar na hora, ok?

    As palavras da minha psicóloga entoaram na minha mente na medida

    que eu ia me acalmando. Fazia 5 meses desde meu último ataque, e eu

    sabia que poderia estar voltando a velha depressão de sempre. Então,

    voltei para casa e liguei para a doutora Mendes e esperei

    pacientemente. Marquei uma consulta para o dia seguinte, que era

    sábado, na parte da tarde. Tinha me esquecido do Noah até olhar o livro

    que eu joguei em cima da mesa. O que será que ele pensou quando me

    viu descontrolada daquele jeito? Que eu era uma louca, claro. Eu não

    iria falar com ele, no máximo eu evitaria-o. Mas de repente, me passou

    pela cabeça de que talvez ele entenderia. Ou não. Essa confusão estava

    ficando ainda mais mista.

    Consegui perceber que enquanto eu passei os 3 minutos da minha vida

    com ele, meu estômago estava em chamas. Assim como minha cabeça.

    Eu sabia exatamente o que estava acontecendo: paixão. Eu odiava

    quando isso acontecia, principalmente porque era sempre pela pessoa

    errada. E ele parecia bem errado para mim. Como se o coração dele

    fosse complemente errado no corpo dele. E, por dentro, ele fosse só

    trevas. Sem faíscas, ou um ponto luminoso para se agarrar.

    Completamente negro.

    Naquela noite, eu dormi pensando em como ele poderia estar. O que

    era o primeiro estágio da doença mental. Não era amor, nem parecia

    paixão. Parecia algo entre os dois. Mesmo preocupada, caí no sono e

    sonhei que ele andava de costas para mim, a chuva irradiando seus

    cabelos e os olhos mais calorosos do que já tinha visto.

    No outro dia, eu acordei preocupada com o que poderia acontecer. O

    que ele pensou quando me viu correndo como uma louca em direção

    ao banheiro? Que eu estava fugindo dele? Eu nunca tinha dito a

    ninguém sobre minhas crises, pois achava que elas estavam

    controladas. Fiquei preocupada se estava começando a adoecer de

    novo. Marquei uma consulta com minha psicóloga, mas eu não tinha

    nada para falar. Só sobre uma possível paixão mal resolvida e outras

    partículas, mas nada de mais. Porém, mais uma crises dessas e eu

    poderia voltar para o hospital, então resolvi faltar a aula para pelo

    menos dar uma passadinha na doutora.

    Meu estado de espírito vacilou quando decidi faltar; eu não iria ver

    Noah, mas não passaria por isso novamente. Aprendi a ter grande

    respeito por minha saúde, e se ela reclamasse significava que as

    imagens poderiam voltar e eu ficaria ruim novamente.

    Tudo começou quando minha melhor amiga estava viva: Alyson. Nós

    éramos inseparáveis, desde bebês fomos criadas juntas. Nossos pais

    eram grandes amigos de faculdade, e Alyson se tornou minha fiel

    confidente. Nós contávamos tudo uma para a outra, então ela

    naturalmente me contava de suas aventuras. Ela era atirada; adorava

    festas e sair com garotos muito mais velhos. E em uma dessas aventuras,

    sua vida chegou ao fim de uma forma brusca e triste. Ela estava entre

    um carro e outro, e um motorista bêbado invadiu a contramão e colidiu

    com ela; não deve ter dado tempo nem de fechar os olhos. Os pais dela

    me ligaram chorando e eu não sabia o que falar nem fazer, e fiquei assim

    por 3 meses. Até que minha mãe bateu o pé para mudarmos de cidade

    para ver se eu ficaria melhor. Eles nem cogitaram me internar ou me

    consultar em um médico.

    Então eu tomei a liberdade de me ajudar. Mesmo quando ninguém fez

    isso pra mim, eu sabia que a Alyson não gostaria que eu vivesse minha

    vida presa a ela. Principalmente depois que ela se foi. Então, na cidade,

    a doutora Mendes resolveu conversar comigo para depois iniciarmos o

    tratamento. Então, eu disse tudo para ela e ela me diagnosticou com

    depressão estágio II. Um dos piores, de acordo com minhas pesquisas.

    Mas a doutora me assegurou que se eu tomasse meus remédios na hora

    certa, não aumentaria de grau e eu ficaria saudável novamente. Assim

    eu pensei.

    Quando cheguei no consultório, ela já estava em pé, me avaliando com

    olhos cautelosos. Falei com ela sobre tudo que estava acontecendo, mas

    não mencionei Noah. Eu sabia que era besteira; para que incomodar sua

    psiquiátrica com uma paixão adolescente ridícula? Não havia nexo.

    Então, só falei que sentia falta da Alyson por já fazer 2 anos que ela se

    fora. Então, a doutora me passou outros remédios, e disse que ficaria

    bem logo. Ela me deu um beijo apressado pois tinha que consultar um

    garoto que de acordo com ela está com um problema mais grave do que

    o meu.

    Assim que cheguei em casa, liguei para minha mãe para avisar que eu

    tinha ido ao médico, e ela ficou desesperada, naturalmente. Confortei

    ela dizendo que estava bem, e que isso não se repetiria. Mas é claro que

    se repetiu.

    Antes de amanhecer, acordei e fui me arrumar para a escola. Eu estava

    animada demais, e sabia que não era por causa do ambiente

    estimulador de educação. E sim por causa de Noah. Minha cabeça não

    estava tão cheia dele, o que me fez avaliar que talvez eu não estava

    apaixonada por ele. Talvez só tentando entender quem ele era. Era tudo

    dentro de mim; eu poderia administrar. Meu coração tentava projetar

    algo, se minha mente aprovasse, aquilo iria para frente. Mas uma paixão

    platônica estava bem longe de ser aprovada pela minha amiga

    consciência. Talvez porque já sofri tanto com essas mesmas letras que

    cansei de correr atrás. Provavelmente eu não olharia para ele; parecia

    sempre que um buraco na minha barriga era aberto. E mesmo eu

    sabendo que orbitamos em planetas diferentes, eu não conseguia tirar

    essa sensação. O Nicolas é meu segundo melhor amigo, se eu pedisse

    ajuda para ele, será que ele riria e diria que não poderia dar certo? Pois

    somos pessoas totalmente diferentes; e eu mal falei com ele? Poderia

    mudar alguma coisa?

    Com minha mente já cheia, subi a rampa para o colégio sabendo que ele

    estaria lá, sentado no mesmo banco e lendo o mesmo livro. De repente,

    me lembrei do livro que ele sempre lia: o mesmo que estava em minha

    mochila. Então, a bibliotecária estava falando sobre ele; ele pegou o

    livro para ler porque se identificou. Ele não pareceu surpreso nem

    raivoso quando me viu com o livro. Talvez estava querendo ser gentil;

    ninguém sofreria tanta influência assim. Talvez ele só falou comigo para

    tentar desfazer os olhares homicidas que ele me lançou nos últimos

    dias.

    Só que quando eu cheguei no pátio principal, estava ocorrendo uma

    confusão. E eu pude ver claramente pela forma do cabelo quem estava

    metido nela.

    Noah

    Está gostando da amostra?
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