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Um Táxi Para O Céu
Um Táxi Para O Céu
Um Táxi Para O Céu
E-book203 páginas2 horas

Um Táxi Para O Céu

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Sobre este e-book

Tendo como inspiração os grandes mestres contistas brasileiros e estrangeiros, o autor sentiu-se desafiado a expressar de forma simples o que sempre entendeu ser a mais autêntica manifestação da arte; a saber: O encontro de pessoas. Nos trinta Contos que compõem este livro, teremos contato com as diversas manifestações encontradas no cotidiano das pessoas comuns que conhecemos. A intolerância, a irreverência, a fé mais simples, a cultura nas suas origens, o amor e a solidariedade são tratados aqui com muito esmero e propriedade. E seu livro de estreia o autor procurou se exprimir de forma simples e corrente. Sua expectativa é sem dúvida conduzir os leitores a um encontro com as personagens através da auto identificação e empatia.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento20 de mar. de 2019
Um Táxi Para O Céu

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    Um Táxi Para O Céu - Ronaldo Conde

    Capa_clube_de_autores.jpg

    RONALDO CONDE

    um

    táxi para

    o céu

    contos que eu conto

    2019 © RONALDO CONDE

    UM TÁXI PARA O CÉU

    Contos que eu conto

    1ª Edição - 2019

    Preparação de originais: Ronaldo Conde

    Revisão: Jefferson Azevedo

    Projeto gráfico: Editora Motres

    ISBN 978-65-5001-008-9

    Todos os direitos reservados

    Nenhuma parte dessa publicação poderá ser reproduzida, seja por meio eletrônico, mecânico, fotocópia ou qualquer tipo sem prévia autorização por escrito do autor.

    A Sogra Vidente

    A despeito de tudo que se fala das sogras, podemos afirmar que boa parte não procede. Digo e provo. Como não sou nenhum tolo, quero sustentar minha tese com fatos e não apenas com causos. Fatos são fatos e não se discute. Mas aonde encontrar fatos? Simples, é só olhar para o lado. Isso mesmo. Sempre ao nosso lado existe algo que podemos observar e usar sem riscos para sustentar nossos causos.

    Estranho isso, mas se sustenta na prática. A causa do momento é provar que as sogras não são tão ruins assim como apregoam aos quatro cantos. Ao olhar para o lado vejo o Vantuil. Homem simples, quase analfabeto, servente de obra; um bom homem. Vantuil é admirado por todos pela sua dedicação ao trabalho. Na obra é uma espécie de faz-tudo. Nunca reclama. Está sempre sorrindo. E não é qualquer sorriso não. Dá para ouvi-lo à distância. Não importa se a piada é sobre ele ou apesar dele. Até quando recebe uma nova tarefa abre um sorriso que é uma dádiva para os que estão por perto.

    — Vantuil, hoje você vai limpar a fossa do prédio principal.

    — A fossa doutor? Aquela bem funda que fica atrás do vestiário? — e desatina a rir uma gargalhada sem fim.

    É sempre assim, missão dada e lá vai o Vantuil feliz da vida.

    Na obra tem a consideração de todos, em especial a do velho Espedito — o mestre de obras. Esse cabra é chucro, mas é bom de serviço, diz o Espedito com orgulho.

    Então, em que nosso amigo Vantuil seria útil para a nossa causa? Vantuil é casado. Todo homem casado tem ou já teve uma sogra. No caso dele, a sogra ainda vive, e vive com ele e a sua mulher na mesma casa. Pobre Vantuil.

    Não, pobre que nada, Vantuil é feliz com a sogra. Eles se dão muito bem. As más línguas dizem até que ele arrasta umas asas pela velha. Isso não vem ao caso agora, deixa pra lá. Já sei, você deve estar pensando com seus botões: Esse contador de causos não é bom da bola, imagina que quer me convencer de que encontrou alguém que gosta da sogra. Loucura isso. Sogra nunca é boa coisa, ainda se tiver morando com a gente, tanto pior. Calma lá que eu explico. Loucura não, são fatos. Vantuil foi agraciado com uma sogra especial. Ele afirma isso com todas a letras. As que ele conhece é óbvio.

    Pois então vamos lá aos fatos.

    Dia desses Vantuil sumiu do trabalho. Três dias sem aparecer na obra. Espedito, o encarregado, ficou quieto para não chamar a atenção da peãozada e do escritório. Isso não significa que não estava preocupado, pois o Vantuil não era de faltar ao trabalho à toa. Deixa como está e vamos ver como fica, pensou ele.

    Não, em obras as coisas não funcionam assim, e logo deram por falta do Vantuil e começou o falatório no canteiro. Todos queriam saber aonde estava o malandro do Vantuil a faltar o trabalho havia mais de três dias. No terceiro ia do sumiço do cabra. Espedito não se conteve e foi questionar o Sebastião — um pedreiro que era mais próximo do Vantuil. Sei dele não, respondeu de pronto o pedreiro. Também se soubesse nada diria. Código de ética da peãozada e ninguém quebrava. Somente em situações muitos especiais o colega abriria o bico.

    Por esta época havia na obra um Apontador novo. Querendo mostrar serviço, informou ao chefe da Obra sobre aquela falta. Não deu outra, Espedito foi chamado ao escritório. No escritório não há tolerância, falta é falta e pronto. Faltar ao trabalho tantos dias assim poderia ensejar a demissão sumária do sujeito.

    Alguém sabe onde ele mora?, perguntou o chefe da obra. Sim, obviamente alguém saberia onde morava o Vantuil.

    Era uma sexta-feira e a missão foi dada. O delegado para a missão chamava-se Dagoberto mais conhecido como Baldinho por ser baixinho e ao mesmo tempo muito gordinho. Deveria retornar na segunda-feira trazendo notícias do Vantuil. Espedito foi para casa preocupado com situação do Vantuil.

    Na segunda-feira pela manhã o Dagoberto foi chamado ao escritório. Havia um bilhete no seu cartão de ponto — era a forma de convocar um funcionário ao escritório. Esses bilhetes geralmente eram temidos por todos — sinal de encrenca no mais das vezes, mas, como o nosso amigo Baldinho estava investido da missão de delegado da firma, não havia o que temer. Subiu a escada assobiando descontraidamente. Bateu a porta e entrou.

    — Então, seu Dagoberto, tens notícias do senhor Vantuil? — nesse instante baldinho fez um grande esforço para não rir na frente do chefe. A notícia que trazia era grave, mas ao mesmo tempo hilária para não dizer trágica. Ele sabia que aquela informação se tornaria a piada da semana, quiçá dos próximos dias.

    — Fala logo, homem, resmungou o chefe.

    — Então, doutor, o Vantuil está muito machucado. Sabe o que é? Ele não obedeceu a sogra e as coisas se complicaram para ele, coitado!

    — O que foi homem, ele apanhou da sogra? — isso não é raro. Já teve muitos outros casos.

    — Não, doutor, foi um acidente mesmo. Quer dizer, mais ou menos grave.

    — Desembucha logo, Baldinho — berra o chefe quase perdendo a compostura.

    — É o seguinte, doutor, o Vantuil foi caçar com os amigos na serra.

    — E daí, o que mais?

    — Um amigo dele escorregou no morro e a espingarda disparou enchendo a bunda do Vantuil de chumbinhos, muitos chumbinhos, para mais de cinquenta. Na hora, ele foi levado para o postinho e o enfermeiro tirou os chumbinhos, um por um, com um alicate, — como sofreu a criatura — foi tudo sem anestesia, Doutor. A coisa ficou feia para o lado dele. Está em casa na cama, de bunda para cima com um monte de curativos, um em cada furinho.

    O chefe botou a mão na cara, não podia rir na frente do Baldinho.

    — Tá bom, mas o que tem a velha com esse acidente?

    Ele contou que a sogra havia sonhado na noite anterior que se ele fosse caçar poderia sofrer algum acidente.

    — O pobre do Vantuil não creu nela — na velha. Doutor, dito e certo, a velha acertou em cheio. Quase o Vantuil vai dessa para melhor. Imagina o senhor.

    Narrados os fatos, dispensaram o Dagoberto.

    — Ok, Baldinho, pode voltar para o trabalho e olha, não conte isso para ninguém para não constranger seu colega, entendeu?

    — Sim, Doutor, mas o que isso, c-o-n-s-t-r-a-n-g-e-r?

    — Deixa para lá, Dagoberto, é só não falar nada para ninguém.

    O Baldinho desceu a escada feliz da vida, tinha cumprido a missão direitinho.

    Bem amigos, como se tratava de acidente, nada havia a ser feito que não esperar a volta do funcionário. E assim foi feito. Ah, e quanto à recomendação do chefe para o Baldinho ficar de bico calado? De nada adiantou, pois o sujeito contou para a mulher dele, que obviamente compartilhou com outras esposas e daí a notícia se espalhou obra a fora. Foi uma diversão só. Muitas piadas e algumas invencionices, é claro.

    Na terça-feira da semana seguinte o Vantuil voltou ao trabalho. Chegou meio ressabiado, na expectativa de sofrer muita gozação. Como havia alguns dias, até que não buliram muito com ele.

    E o tempo se passou. Todos se esqueceram da bunda e da sogra vidente do Vantuil. Ele obviamente jamais se esqueceria, pois toda vez que ia se sentar em algum lugar sentia umas fisgadas no traseiro. A respeito disso também a sogra havia profetizado: Olha, genro, toda vez a houver mudança de lua você vai sentir umas pontadinhas na bunda, mas depois passa, eu garanto.

    E a vida seguiu seu rumo.

    Dia desses, o Espedito foi chamado no escritório. Tinha um serviço importante a fazer e carecia de alguém de confiança. A missão era limpar a piscina da mansão do diretor em Santa Teresa. Em quem vocês acham que o Espedito pensou na hora? Isso mesmo, no Vantuil, seu fiel escudeiro para missões importantes. O chefe até que tentou demovê-lo desta indicação, mas não teve jeito, era o Vantuil e pronto. A tarefa deveria ser feita no próximo sábado, dia em que o diretor estaria de viagem. Tudo acertado. Seriam levados de Kombi até Santa Teresa.

    No dia e hora combinados, lá estava o Cinquentinha — motorista da Kombi. Chamava-se Antônio e havia recebido este apelido por dirigir somente em alta velocidade e fazendo manobras perigosas. Testemunhas contavam que alguns chegavam a quase borrar as calças quando pegavam caronas com ele.

    Sábado às seis e trinta estava no portão da obra. O Espedito, como sempre, já estava esperando sentado no meio-fio. Agora restava esperar o Vantuil. Esperar, esperar e esperar. Duas horas de espera e nada do Vantuil aparecer. O Cinquentinha deu o grito: Não dá mais para esperar esse cara. Melhor abortar a missão, seu Espedito. Coitado do encarregado, fazer o quê? Voltaram para casa. Espedito muito preocupado pois na segunda-feira teria que dar uma boa explicação ao chefe. Este por sua vez teria que se ver com o diretor. Isso tinha tudo para dar errado. Demissão de alguém.

    Dava dó de ver o Espedito sentado na recepção do escritório esperando o chefe chegar para ganhar uma bronca por causa do Vantuil, — novamente o Vantuil — e não deu outra:

    Espedito, vamos demitir esse cara. Não tem responsabilidade. É um enrolado.

    Espedito desceu a escada de cabeça baixa, triste com a situação, mas reconheceu que não dava mais para segurar o simplório do Vantuil.

    Tão logo chegou na Obra, Vantuil viu o tal bilhetinho no cartão de ponto convocando-o para ir ao escritório. Como era de fato inocente, seguiu para lá sorrindo como se nada devesse. Bate à porta e entra. O chefe chama o Apontador que lhe entrega o aviso. Coloca sobre a mesa e faz sinal para o Vantuil se aproximar.

    — Sim, Doutor, bom dia! Tudo bem com o senhor?

    — Não, seu Vantuil, nada bem. Estamos com problemas, o senhor e eu. O pobre olha com a costumeira cara de tacho, sem entender nada.

    Conhecendo a índole do funcionário, o chefe se controla para não brigar com ele.

    — Vantuil, diga para mim por que você não apareceu no sábado para fazer o serviço na casa do nosso diretor? Você se esqueceu? O Espedito e a Kombi ficaram esperando por você por quase duas horas. O que eu digo para o diretor?

    — Não, chefe esqueci não. Lembrei direitinho.

    — Então, por que não apareceu? Cadê sua responsabilidade? Vantuil baixa a cabeça com vergonha e demora dizer palavra. — Tô esperando, Vantuil.

    — Sabe o que é, chefe? Eu acordei cedo, me arrumei para sair, mas daí minha sogra acordou e disse que tinha sonhado comigo e que se eu saísse de casa seria atropelado na rodovia. O senhor sabe que eu venho trabalhar de bicicleta, certo? Então doutor, senhor lembra do outra vez que desobedeci a minha sogra, deu no que deu. Até hoje não posso sentar direito, parece que ainda tenho chumbinho na bunda. Fiquei com medo e não saí de casa naquele dia.

    O chefe ficou parado olhando para ele sem nada dizer por um bom tempo. Chamou o Apontador, devolveu o Aviso de Demissão, olhou novamente para o Vantuil e disse:

    — Seu Vantuil, o senhor está liberado, pode voltar para o trabalho. O homem desceu as escadas sem dizer palavra. Lá embaixo, olhou para cima, se benzeu e agradeceu a Deus pela sogra vidente.

    Jesus vai à escola

    Primeiro dia de aula para o menino Bentinho. Tá que não se aguenta de ansiedade. Checam tudo: uniforme, sapatos, cadernos, merendeira, mochila e demais parafernálias.

    A mãe está focada em que o filho cause uma boa impressão logo no primeiro dia de aula. A escola fica um pouco distante da casa do Betinho. Corrigindo, escola não, Grupo Escolar Municipal Melo Viana, orgulho da cidade. O diretor, — sim o Grupo Escolar era dirigido por um homem — um italiano chamado Professor Bruno — tinha sotaque e tudo.

    Como vinha fazendo havia alguns dias, Bentinho, no caminho da escola pergunta para a mãe:

    — Mamãe, o que se ensina na escola?

    — Tudo, meu filho. Tudo.

    — Tudo, mamãe?

    — Sim, tudo.

    Obviamente, com uma resposta cretina dessa o menino não ficou satisfeito. Sabemos que tudo quase sempre é nada. Logo, o menino retoma a pergunta, mas de outra forma.

    — E o que mais ensinam, mamãe?

    — Ah, filho, ensinam a ler, a escrever, a cantar o hino nacional e a rezar.

    — Que legal, mamãe, ensinam a rezar também?

    — Sim, muitas rezas.

    O menino se animou, pois agora as respostas foram mais esclarecedoras. Entram no ônibus e seguem rumo à escola. Já acomodado no banco da condução o menino volta às perguntas.

    — Mamãe, você vai ficar comigo na escola?

    — Não, meu filho, na escola você vai ficar sozinho. Você terá muitos coleguinhas para conversar e brincar. E também os professores.

    — Sozinho? Perguntou o menino olhando no rosto da mãe.

    Será que não haviam dito ao menino Bentinho que iria para escola e ficaria sozinho? Estranha a pergunta a esta altura. Não acham?

    Finalmente chegaram à escola. Uma multidão de crianças. Bentinho ficou um pouco assustado, mas comportou-se bem. Tranquilo. Todos deveriam aguardar o primeiro sinal para entrar na escola. Naquela época ainda era um pequeno sino tocado por um inspetor.

    Hora da despedida, a mãe achava que Bentinho iria chorar, mas, não foi bem assim. Ele entrou sorridente na escola. O menino enfrentou tudo naturalmente.

    Passado este período inicial, tanto a mãe quanto Bentinho se acostumaram com a rotina da escola. Tudo fluía bem e o menino parecia ter se entrosado bem com a nova realidade. E o tempo passava.

    Certo dia, o menino chega em casa com novidades.

    — Mamãe, agora temos um novo coleguinha na classe.

    — É, filho? Que legal! E qual é o nome dele? — perguntou a mãe.

    — Jesus.

    — Como é

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