Um Casal Mal-Assombrado
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Sobre este e-book
Gustavo é um advogado que não está nos seus melhores dias no casamento quando uma velha cigana lhe pede esmola.
Além de não dar dinheiro, ele ofende a cigana, que por sua vez, joga uma terrível maldição nele.
Agora Gustavo e sua esposa serão assombrados por um gato morto, um demônio, um vampiro e pelo fantasma vingativo de um coveiro.
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Um Casal Mal-Assombrado - Luciel Henrique Ribeiro
Capítulo 1
Quem nunca ouviu falar sobre casas mal-assombradas?
Aposto que quando você era criança sabia de pelo menos uma casa mal-assombrada na sua cidade.
Geralmente é aquela casa feia, abandonada, que dá arrepio só de passar na calçada.
Mas a casa não é mal-assombrada porque é feia e abandonada. Ela é mal-assombrada porque ali ocorrem eventos sobrenaturais, como barulhos estranhos no meio da noite, passos no corredor, fantasmas voando pelo teto, gritos de dor, portas batendo, vultos na janela, choro de crianças, ranger de dentes...
Você deve estar cansado de ouvir histórias de casas mal-assombradas.
Só que agora você vai conhecer a história de um casal
mal-assombrado.
Gustavo Reis e Juliana Lima Reis estão casados há quase cinco anos.
Ele é advogado e trabalha em um escritório. Não é sócio. Cuida das pequenas causas.
Juliana é professora estadual e dá aulas para o ensino fundamental.
Gustavo é um homem branco e magro de 35 anos. Tem cabelos negros. É alto, mais de 1,80 m.
Juliana é uma mulher de 32 anos. Tem a pele branca e cabelos vermelhos. A pele de seu rosto é salpicada por sardas. Tem os olhos cinzas. Por causa de sua estatura de 1,52 m, ela parece uma anã quando fica ao lado de Gustavo.
O casal mora na Rua das Oliveiras, em Pouso Alegre, sul de Minas Gerais.
São pessoas simpáticas.
Amabilíssimas.
Até hoje Juliana faz questão de manter viva a tradição de sua avó de levar bolinhos de chuva para os seus novos vizinhos.
Você se pergunta: por que esse casal tão amável seria assombrado?
Bom, para explicar isso, temos que começar por aquela manhã de 25 de setembro...
Capítulo 2
O rádio relógio apitou às sete horas.
Gustavo apertou o botão.
Tudo voltou ao silêncio.
Ele jogou o edredom de lado e girou as pernas sobre a cama.
Ficou sentado olhando para os pés.
Esfregou o rosto.
Levantou-se.
Arrastou-se até o banheiro.
Escovou os dentes.
Pegou o barbeador e acertou a barba.
Urinou.
Deu a descarga.
Lavou as mãos.
Saiu do banheiro.
Juliana, sua esposa, sentou-se na beira da cama.
Gustavo atravessou o quarto, sem dizer bom dia
.
Foi para a cozinha.
Encheu um canecão de água.
Colocou-o no fogão.
Acendeu a boca.
Cruzou os braços.
Ouviu:
Que droga, Gustavo. Será que é pedir demais para abaixar a maldita tampa do vaso?
Ele fechou os olhos.
Friccionou a testa com as pontas dos dedos.
— Hoje não, meu Deus, hoje não.
Juliana entrou na cozinha.
— Quantas vezes eu já te pedi para abaixar a tampa?
— Eu esqueci. Desculpe.
— Desculpe
, desculpe
, é só o que você sabe dizer. Você se desculpa por tudo, não é mesmo doutor Gustavo Reis? Se desculpa por não ter arrumado a calha, se desculpa por não ter limpado o quintal, se desculpa por ter esquecido o meu aniversário.
Gustavo respirou fundo.
— Olha, querida, hoje eu tenho uma audiência bem estressante. Se você não se importar, eu gostaria de tomar o meu café em paz.
Juliana riu.
— Aposto que essa audiência será em uma sala com ar condicionado, não é mesmo? Com água fresca e um cafezinho quente. Nossa, que coisa mais estressante. Eu, por outro lado, tenho que dar aulas na parte da tarde, em um calor de trinta e poucos graus, dentro de uma sala lotada de crianças de oito anos. Tudo bem, isso não é nada perto da sua audiência estressante
.
— Quando eu tiver a minha promoção e as coisas melhorarem, você não precisará mais dar aulas.
— Ah, claro, a sua promoção. Será que ela sai antes da minha aposentadoria? Olha só para você, Gustavo. Você nunca será promovido.
Gustavo olhou para o seu pijama azul marinho com estampas de âncoras.
— O que você quer dizer?
— Você é um morto, um paradão, um pamonha.
Gustavo virou-se para o fogão.
A água estava fervendo.
Desligou o fogo.
— É melhor tomar o meu café na padaria.
Saiu da cozinha.
— Isso mesmo, fuja! É bem a sua cara – disse Juliana, seguindo-o até o quarto.
Gustavo despiu-se do pijama.
Abriu o guarda-roupa.
Retirou um cabide com uma camisa rosa claro.
Juliana encostou-se no batente e cruzou os braços.
— Puxa, Gustavo, eu só quero que você se importe mais com o nosso casamento.
Gustavo vestiu a camisa.
Abotoou.
Andou até o espelho.
Passou a gravata no colarinho e fez o nó.
— Você parece nem aí para mim.
Colocou as meias.
Vestiu a calça.
Enfiou a camisa dentro da calça.
Passou o cinto.
— Tem hora que eu penso que você não me ama mais.
Gustavo terminou de amarrar os sapatos.
Pegou o relógio na gaveta do criado mudo e prendeu no pulso esquerdo.
— Se eu não te amasse, Juliana, acha mesmo que eu iria agüentar toda essa sua chatice?
Enquanto colocava o paletó, continuou:
— Hoje é dia 25. A sua TPM começou e você está irritada por causa da discussão sobre ter um filho. Acredite, eu consigo entender a sua chatice.
Pediu licença e passou pela esposa.
Ela seguiu-o até a sala.
— Eu não estou com TPM, e mesmo que estivesse, isso não tira o fato de que você não se importa com a minha felicidade. Se você se importasse, a gente já teria um filho.
Gustavo apanhou a chave do carro e a maleta em cima da mesa.
— Depois a gente conversa.
Destrancou a fechadura e abriu a porta.
Ia saindo quando Juliana pegou em sua mão.
— Eu quero um filho.
Gustavo deixou a maleta no chão e guardou a chave no bolso da calça.
Com as mãos livres, pegou no rosto da esposa.
— Não é a hora certa.
— Temos a nossa própria casa. Não temos dívidas. Somos saudáveis. O que mais você espera? Daqui a pouco eu terei 40 anos e não poderei mais ter filhos. É isso o que você quer?
— Não seja dramática, querida, você só tem 32 anos. Você é um botão de rosa na flor da idade.
— Vamos fazer cinco anos de casamento em dezembro.
— Eu sei, eu não esqueci.
— Lembra-se que você prometeu que iríamos passar a nossa segunda lua de mel em Campos do Jordão quando completássemos cinco anos de casados?
— Tudo bem, em dezembro a gente viaja para Campos do Jordão.
Gustavo beijou Juliana.
— Até mais tarde, querida.
— Olhe aqui nos meus olhos.
Ele olhou.
— Diz a verdade, por que você não quer ter um filho comigo?
— Já disse, não é a hora certa.
— Isso não é o motivo. Vamos, diz a verdade.
Gustavo olhou para baixo.
Talvez tenha pensado mil coisas antes de responder:
— Eu não estou pronto para ser pai. É isso.
Pegou a maleta e saiu.
Capítulo 3
Gustavo deixou o carro no estacionamento.
Foi a pé para o Fórum.
Andava cabisbaixo.
Tinha um rosto de poucos amigos.
Poderia ser capaz de xingar qualquer um que lhe desse bom dia
.
Passando por debaixo de uma marquise, algo agarrou a barra de sua calça.
Era uma velha sentada sobre o papelão.
Seus cabelos brancos pareciam um emaranhado de arames retorcidos.
A pele era vermelha.
O olho esquerdo parecia uma bola de fubeca branca enquanto que o direito era verde.
Usava um vestido de cores vibrantes, mas encardido.
— Dois reais, moço? – disse a senhora, revelando uma boca com apenas dois dentes na parte debaixo.
Gustavo, sem paciência, respondeu:
— Vá trabalhar em vez de amolar os outros.
— Sou velha, moço, preciso de dinheiro pra comprar leite.
— Então procure algum trabalho em vez de vagabundear.
Gustavo continuou andando e ouviu a cigana dizer:
— Escute aqui, seu desgraçado.
Ele virou-se.
A cigana levantou-se.
Apontou o dedo.
— Coisas ruins vão acontecer na sua casa.
A cigana deu um sopro na direção de Gustavo.
Mesmo estando longe, ele sentiu o bafo podre da velha.
Capítulo 4
Você conhece alguma benzedeira?
Já ouviu falar de alguém que procurou uma benzedeira para tirar quebranto
.
A benzedeira não é uma velha feia com um chapéu preto pontudo ou com um nariz verruguento.
Não, ela não é uma bruxa malvada.
Ela, na maioria das vezes, é uma senhorinha simpática, de aspecto sereno e sábio.
Dona Angelina é uma dessas benzedeiras
.
Ela é uma velhinha de seus 71 anos com um corpo mirrado e frágil. Tem os cabelinhos brancos e os olhos cheios de bondade.
Coitada, ela acabou de ficar viúva.
Como