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O Mundo de Amanhã: Geopolítica contemporânea
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O Mundo de Amanhã: Geopolítica contemporânea
E-book123 páginas2 horas

O Mundo de Amanhã: Geopolítica contemporânea

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Sobre este e-book

O mundo de amanhã será definido mais pelas dinâmicas que prevalecem na luta entre as democracias liberais do que pela evolução da ciência e da tecnologia, das mudanças climáticas ou das epidemias. A crise da ordem liberal marca o regresso da competição entre as grandes potências. As divergências entre os Estados Unidos, a China e a Rússia dominam a política internacional e prejudicam as dinâmicas de integração que garantiram a paz no período pós-Guerra Fria. No mundo de amanhã, Portugal e a Europa terão de recuperar as condições de autonomia indispensáveis à defesa dos seus valores e dos seus interesses. Através de uma análise das crises internacionais e das estratégias das principais potências, este ensaio procura demonstrar que o destino do mundo está, afinal, nas mãos da geopolítica contemporânea.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento29 de abr. de 2020
ISBN9789899004368
O Mundo de Amanhã: Geopolítica contemporânea
Autor

Carlos Gaspar

Carlos Gaspar é investigador do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI-NOVA) e professor associado convidado da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. É assessor do Conselho de Administração da Fundação Oriente e do Instituto de Defesa Nacional. Autor de O Pós-Guerra Fria (2016), A Balança da Europa, e Raymond Aron e a Guerra Fria (2018).

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    O Mundo de Amanhã - Carlos Gaspar

    Introdução

    No dia 8 de Novembro de 2016, o embaixador da França em Washington, Gérard Araud, enviou um tweet: Depois do Brexit, depois de Trump, tudo é possível: um mundo está a desmoronar­-se diante dos nossos olhos. Vertigem!

    Esse mundo admirável tinha começado 25 anos antes em Moscovo, depois do colapso soviético. O fim da Guerra Fria, dominada pela competição política, estratégica e ideológica entre as duas superpotências, é o princípio de um novo sistema internacional. Desde logo, o fim da União Soviética transforma a balança do poder e os Estados Unidos passam a ser a única potência global, dominante em todas as dimensões relevantes: em 1991, a sua economia, a mais inovadora e a mais avançada, representa um quarto do produto mundial e os gastos de defesa norte­-americanos excedem a soma dos orçamentos militares de todas as outras potências. Essa concentração de poder sem precedentes marca a passagem da divisão bipolar da Guerra Fria, em que as duas superpotências tinham um estatuto de paridade, para uma estrutura unipolar, em que a posição ímpar dos Estados Unidos assegura o seu primado na política internacional.

    Por outro lado, os equilíbrios regionais na Europa e na Ásia Oriental deixam de estar condicionados pela competição entre os Estados Unidos e a União Soviética: as relações entre a Alemanha, a Grã­-Bretanha e a França definem a balança europeia, a competição entre a China, o Japão e a Índia vai dar forma à nova balança asiática. A hegemonia norte­-americana acelera as dinâmicas de integração à escala global, ao mesmo tempo que a reconstituição da autonomia e da identidade da Europa e da Ásia Oriental consolida as dinâmicas de integração à escala regional. No espaço europeu, a fundação da União Europeia e a sua expansão esboçam a emergência de uma entidade política alternativa que pode contrabalançar o peso excessivo dos Estados Unidos.

    Por último, quando o campo socialista reconhece ter perdido o duelo ideológico com o campo ocidental, passa a ser possível restaurar a unidade da ordem internacional, sob o signo dos valores liberais. A vaga de democratização que começa em Portugal com o 25 de Abril de 1974 não termina com as transições pós­-comunistas na Europa Central e Oriental e, no fim do século XX, pela primeira vez, há mais regimes democráticos do que regimes autoritários, entre estes a China e a Rússia.

    Paradoxalmente, essa mudança estrutural coexiste com a continuidade fundamental das normas e das instituições que formam a arquitectura multilateral da ordem internacional do pós­-Guerra. Os Estados Unidos impõem uma linha de continuidade nos momentos críticos: a unificação da Alemanha não altera as fronteiras internacionais, nem o estatuto da República Federal como Estado não­-nuclear, membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e das Comunidades Europeias; a decomposição da União Soviética não muda as fronteiras internacionais, nem as fronteiras entre as antigas Repúblicas soviéticas, e a Rússia vai ser o único herdeiro do arsenal nuclear da antiga superpotência.

    No pós­-Guerra Fria, as Nações Unidas mantêm o seu estatuto, a União Europeia e a NATO alargam­-se para enquadrar o conjunto das democracias europeias e ocidentais, a Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) abre as suas portas para incluir todos os Estados dessa região, a Organização Mundial do Comércio (OMC) vai integrar a China e a Rússia, o Brasil e a Argentina criam o Mercosul com o Uruguai e o Paraguai, e os Estados Unidos, o Canadá e o México formam a Área de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA). As instituições multilaterais do bloco soviético, como o Pacto de Varsóvia e o Conselho de Assistência Económica Mútua (COMECON), são as únicas que deixam de existir.

    A ordem liberal construída pelos Estados Unidos e pela comunidade das democracias passa a ser o centro da ordem internacional, assente nas normas do direito e nas instituições multilaterais, e garante um período notável de paz e de desenvolvimento no pós­-Guerra Fria.

    Não obstante, o declínio relativo dos Estados Unidos e dos seus aliados e a erosão da ordem liberal são inevitáveis: a posição de poder dos vencedores da Guerra Fria é máxima no momento da vitória e a legitimidade do seu modelo normativo joga­-se nesse momento ordenador. A defesa do statu quo é uma condenação à impotência: todo o mundo é feito de mudança. A ressurgência da China e a ressurreição da Rússia tornam necessário reformar a ordem dominante para integrar as novas grandes potências e reconhecer os seus interesses legítimos, mas o sucesso das tentativas de mudança não está assegurado à partida.

    Os momentos de viragem estão bem identificados. A 11 de Setembro de 2001, os atentados suicidas da Al­-Qaida contra as Twin Towers em Nova Iorque e contra o Pentágono em Washington revelam a vulnerabilidade dos Estados Unidos, os limites da ordem liberal e a força do totalitarismo pan­-islâmico. Nesse ano, a necessidade política imperativa de impedir a repetição dos atentados terroristas em solo norte­-americano representa uma oportunidade para recuperar o primado da política externa nos Estados Unidos e formar um concerto unipolar na ordem internacional, quando todas as potências, incluindo a Rússia e a China, estão preparadas para convergir numa estratégia comum contra as redes terroristas. Essa estratégia, porém, é prejudicada pela decisão norte­-americana de invadir o Iraque, que divide a comunidade transatlântica e ameaça os regimes autocráticos.

    A 15 de Setembro de 2008, a queda do Lehman Brothers confirma o declínio relativo do poder norte­-americano. Os Estados Unidos precisam de recorrer não só às democracias industriais, mas sobretudo às novas potências económicas, nomeadamente a China, para conter a crise financeira internacional e enfrentar a Grande Recessão. Para os responsáveis chineses e russos, a crise confirma as teses sobre a decadência irreversível da potência dominante e da ordem liberal.

    As respostas dos Estados Unidos, da Rússia e da China à nova conjuntura definem uma nova configuração diplomática, em que as relações entre as três grandes potências determinam a balança central do sistema

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