Nos Confins Do Círculo
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Nos Confins Do Círculo - Juliano Ramos De Oliveira
Nos Confins do
Círculo
Juliano Ramos de Oliveira
1
2
O Autor em busca de uma apresentação
O que falar de uma obra?
Se
literária,
para
um
pesquisador e professor das Letras...
eis um banquete. Falo de estrutura, das personagens, da narrativa, das metáforas, das inversões, do assunto e tema. Comento a partir de filósofos, literatos e teóricos, percorro sobre as tendências, sobre o apolíneo e o dionisíaco.
Agora o que um autor pode dizer do próprio trabalho?
É confuso, é um carretel de fio sem ponta. Não há por onde iniciar uma crítica, um comentário. Sei agora 3
a importância de um crítico e do dizer:
Quem vê de fora vê melhor
.
Quanto professor, sou crítico.
Mas quanto autor? Se me perguntam qual o tema ou assunto, respondo não sei. Não sei olhar o horizonte fixando-me num ponto só. O texto é um todo, uma teia intrincada da qual qualquer ponta que eu puxe desfiará a trama toda.
Tentei dar-lhe tema e assunto.
Falhei? Também não sei. Achei tratar-se de um elo que não pode ser rompido. Como num círculo. O
destino tropeça nas próprias pernas, mas segue seu caminho certeiro como num círculo. Ou este elo precisa, na verdade, ser restaurado? Sim, falhei.
Dar-lhe tema ou assunto não é
uma boa ideia. É demais de restrito!
4
Tentei nova tática. Uma sinopse? Uma resenha? Um resumo!
Comecei: Trata-se de um romance.
Um sobrenatural e místico triângulo amoroso, pincelado sobre um pano de fundo dos preceitos ritualísticos do paganismo celta e do ciclo do ano...
Não! Não é um bom começo! Chega ser depreciativo.
Nova
tentativa:
Em
um
ambiente pagão, bem aos moldes do
locus amoenus
da velha arcádia, Dália desaparece após um encontro com um misterioso jovem que exala um perfume de cedro. Rosa, irmã mais nova de Dália algum tempo mais tarde também se encontra, como em um devaneio, com este mesmo jovem...
Desisti mais uma vez. Além do
início pedante demais para a singeleza 5
da história, seria fatiar o todo, desperdiçar
o
encanto.
Definitivamente um resumo é outra péssima ideia.
Onde me encostar se não há pilares?
Voltei-me novamente ao ditado
daquele que vê de fora
, recorri à opinião alheia e extraí alguns adjetivos
que
resumem
mais
precisamente esta singela noveleta mística.
Tais palavras vieram-me de
mestres de muitas considerações, mestres de olhares profundos que não sofrem das afetações do senso comum.
Disse então um dos mestres, um educador, é mítico
. Veio outro, um filósofo e detalhou: onírico
. O
6
mestre artista exclamou: cromático!
e por
último: parabólico
analisou o mestre místico.
Quatro palavras que me
satisfazem. Quatro visões que me complementam, pois complementam o todo. Nos Confins do Círculo
é o mítico, o onírico, o cromático e o parabólico.
Vamos então ao todo!
O autor
7
8
Parte I
dos Sonhos
STAVA calma aquela
tarde.
E Dos confins isolados
ruído nenhum se ouvia, exceto o da natureza: as árvores sacudindo ao vento forte de outono, os pássaros a cantar e insetos a zunir, nada mais.
Dália estivera sozinha desde o alvorecer, a irmã mais nova e a avó encontravam-se na festa que acontecia no vilarejo demasiado longe para que se escutassem as canções festivas.
Sentada de uma languidez
despojada em uma velha e descascada 9
cadeira azul, Dália trajava um vestido reto e simples. A palidez de sua pele contrastava com o negrume de seu cabelo enfeitado com um laço de fita verde e uma flor: uma solitária dália branca no centro do laço.
Dália-moça
e
dália-flor
confundiam-se em formosuras.
O cheiro nostálgico do vento outonal movia os pensamentos da moça. Pensava com saudade na beleza da Festa das Sementes movendo tanta gente daquelas redondezas, que logo cedo migrava para o vilarejo em passeatas. Todo o ano era a mesma coisa: as estradas movimentadas de carroças, as crianças sempre correndo à frente, as mulheres enfeitadas dos pés à cabeça carregando seus panelões de comida e os homens bem alinhados 10
puxando os animais. Era assim ano após ano até onde a memória de Dália pudesse alcançar.
Da varanda, ela direcionava os olhos para a estrada pela qual as outras duas mulheres da casa retornariam em algumas horas. Sentiria saudades, mas era o momento. Ela sempre soubera.
Sempre soube de tudo, quem fomos...
quem somos realmente. Conhecia do passado, do futuro, do presente. De tudo! Este tempo todo... Ao menos se pudesse abraçar a irmã uma última vez. Mas não, Rosa não pode saber de nada! Um dia ela entenderá. Chegará a vez de Rosa...
Concluindo os pensamentos,
Dália percebeu aquele conhecido perfume ardido chegando com a brisa do crepúsculo.
11
Ela se levantou.
É cedro... Ele deve estar chegando!
O coração pulsou forte,
instintivamente conferiu o tempo, olhando o sol mergulhando no riacho, no horizonte à oeste. Fim de tarde. O
perfume começou a causar-lhe náuseas. Três anos! Três anos desde a primeira vez que ele veio, e sempre na Festa das Sementes, três anos... Na mesma hora, no mesmo dia, durante as eras, para todas nós!
O lusco-fusco já invadia toda a paisagem ao redor, o vento rodopiou forte entre as árvores e emitiu um assovio alto, agudo.
E lá estava ele, apenas uma sombra perto da porteira, ela sabia.
Vinha a cavalo, como sempre. É ele!
12
Ele acenou.
Ela sorriu um sorriso entre o alegre e o nervoso, o medo e a felicidade, o sonho e o pesadelo. A sensação que se tinha diante dele era de que o curso do tempo se tornava lento, morno, como quando se toma camomila ao escurecer dos dias quentes.
Mas é cedro, sem dúvida.
O cheiro se espalhara de uma forma alucinante causando uma inesperada sonolência. E o sussurro suave, como o correr de um riacho, chegou-lhe ao ouvido num sopro doce, aveludado:
- É apenas o cair das folhas das árvores que, em breve, após dias hibernais, terão suas flores como adornos, pois sagrado e infinito é o 13
círculo. Isto é tão certo, como é certo que serás parte de mim.
Nos braços dele; aquele que nem ela mesma conhecia o nome, mas sempre soubera da existência; nada mais viu, simplesmente adormeceu e, dos confins, desapareceu...
14
ÃO havia nuvens na manhã, quando