Água Dentro De Água
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Sobre este e-book
Nero desde criança foi particular. Nunca conseguiu traçar uma linha nítida de separação entre o real e o imaginário. Uma história de amor falsa, o suicídio da sua namorada, a fuga, o regresso e o encontro com Sofia. Uma jovem mulher que pensa de não ter tido por acaso a liberdade de escolher a sua vida. Sentiu-se sempre vítima dos acontecimentos. Até àquele momento.
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Água Dentro De Água - Mirko Ravaschino
2
Em certos momentos sentia-me à deriva. À mercê das pessoas. E acreditava que não houvesse outro modo. Existir para alguém. Existir para os outros. Nunca para si mesmo. Como se alguma vez tivesse sido capaz.
Não sou forte. Muitos dizem-me que sou forte; que tenho uma grande personalidade, que sou teimoso. Todavia eu não me sinto forte. E não sou.
Se estiver no convés dum barco no meio da tempestade e o vento varre-te com violência, agarras a primeira coisa que encontras. Para não cair no mar. Para não ser levado. Para ficar à superfície. Na esperança de que o barco não afunde. E não sou forte. Procuro apenas de estar em cima. Por cima da superfície. Às coisas podes controlá-las num modo ou noutro. Podes pensando bem prever as consequências das tuas acções. Sabes que se vais trabalhar, no fim do mês terás dinheiro para a renda, para sair e tomar uma cerveja, para guardar à parte alguma coisa. Com as pessoas é mais difícil. As pessoas são imprevisíveis.
Embora pois no fundo são todas previsíveis. Procuro sempre prever o que vão fazer. Que vão pensar. Às vezes parece-me de estar agir duma forma mais que noutra na base à reacção que prevejo. Por vezes não sei tão-pouco o porquê faço algo. Faço-o e basta. E não penso.
Às vezes não me importa.
É como se, não compreendendo realmente o que desejo, vejo-me a fazer tudo e o contrario de tudo. Para perceber. Eu não sei o que desejo na verdade.
Por favor poderia dizer-me que rua devo seguir para ir embora daqui?
Depende muito de onde queres ir
– disse o Gato.
Não me importa muito onde
disse Alice
E Sofia Sentia-se precisamente como Alice.
Contive com dificuldade uma lágrima. Tirei-a outra vez fora. Chorava por nada. Mesmo assistindo um filme, mesmo escutando uma canção. Só que neste momento era diferente. Sentia-me sozinha. Perdida. E não sabia o que fazer. Que direcção devia tomar. Não me sentia de modo nenhum. Era como se não existisse e finalmente me apercebesse. E tinha que ser forte. Duma força que não tinha na verdade. Tinha apenas a vontade de permanecer em cima. E nada mais. A flutuar. Porque afundar é pior.
Talvez.
Se calhar já estava afundada. E tinha notado apenas agora. Estava colocando-me em foco. Como quando sais dum sonho e realizas devagarinho que a realidade é uma outra coisa. Antes pelo contrario daquilo que pensavas que fosse.
Um pouco de dissabor na boca.
Náuseas. E não querer mais sentir.
Reparava Marco.
Dormia.
Dormitava sempre de todas as vezes que fazíamos sexo.
Dizia que relaxava assim tanto que tinha a necessidade dalgum momento de esquecimento. E estava sozinha. Por vezes me sentia sozinha mesmo quando me fornicava. E me questionava o que estivesse errado em mim. Porquê me apegava assim tanto às pessoas?
Um suspiro.
Talvez o fazia para ter algo em troca. Um pouco deles. Um pouco de mim. E não sentir-me mais eu
: sozinha na face da terra.
Queria apenas um bocadinho de amor. Nada de tão especial ou muito dinheiro. Um poucochinho de amor. E nada mais. Oferecia-me para receber. Mas sabia no fundo que isto estava errado… não compreendia realmente o porquê. Contudo sabia. Havia alguma coisa de errado em tudo isto.
Não estava sozinha; sabia bem. Todavia sentia-me sempre uma engrenagem que girava separadamente. Um pedaço de algo. Do qual não sentia de fazer parte plenamente.
Ligou o tubo.
Dai a pouco Marco estaria acordado. Teria dado alguns tiros e quereria fornicar-me de novo. Eu deixava-o fazer. Agradava-me de como me tocava. Como me pegava.
Agradava-me sentir-me sua.
Talvez. Não sei mais agora.
Dentro sentia-me água. Um mar de tristeza que as vezes transbordava. Quando Marco me agarrava forte sentia-me sua. Sentia de ser alguma coisa com ele. Não sempre pois. Embora agradava-me.
Queria parar de pensar. Não queria mais pensar. Não me levava a nada. Apenas para sentir-me mais sozinha. Sentia-me cada vez mais sozinha.
No terceiro tiro Marco tinha virado. Tinha pegado na mão o tubo. Com a mão me tocava ligeiramente. Eu reparava-o. A ponta termina no cinzeiro.
Puxa-me para si. Beija-me. Morde-me. Aperta-me.
Pega-me.
De trás.
E me fornica.
Não penso.
Não estou.
Não existo.
Desfruto.
Desfruto.
A mente para de funcionar.
Os pensamentos congelam. Afundam na água, dentro do estômago.
Depois chorarei.
No duche.
Agora desfruto.
E não existo mais.
Enquanto as nádegas comprimem-se em saltos cada vez mais irregulares contra mim. No momento em que sinto o calor do seu corpo.
O suor.
Deus como gosto.
Talvez tudo isto está errado, mas não sei para que parte seguir.
Vai deixar-me vazia. Depois.
Agora. Nunca mais.
E não me interessa mais nada.
Ainda que fico em