Ouvir, agir e encantar: A estratégia que transformou uma pequena empresa em uma das líderes do seu setor
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Sobre este e-book
Nem sempre é a empresa incompetente que vai à falência. Muitas vezes, uma companhia é excelente no que faz, mas se torna obsoleta diante do surgimento de uma nova tecnologia; e, como se não bastassem os desafios externos, há as dificuldades internas de cada empresa. Em um mundo cada vez mais complexo e diverso, diferentes pontos de vista, opiniões, culturas e conflitos de gerações são comuns: em determinado momento, podem impactar não só o ambiente profissional, mas o negócio em si. E quando se trata de uma empresa familiar, onde o relacionamento entre as pessoas já é mais delicado, o cenário se torna ainda mais desafiador. Como criar um negócio que supere esses obstáculos?
Em Ouvir, agir e encantar, Guilherme Juliani e Eduardo Cosomano apresentam de maneira franca as várias maneiras de contornar qualquer tipo de problema na hora de fazer a empresa acontecer, a partir de uma premissa simples: ouvir verdadeiramente o cliente. E por cliente, fala-se de todo
mundo, do colaborador ao chefe, passando por parceiros e consumidores finais. A partir do entendimento do problema do cliente, parte-se para criar inovações baseadas em necessidades reais e ver os negócios acontecerem.
Entre curiosidades, dificuldades e histórias de superação, a obra se aprofunda e revela, em detalhes, como essa estratégia ajudou a transformar uma pequena operadora logística familiar no Grupo MOVE3, uma das maiores holdings do setor logístico da América Latina. Sem dúvida, uma leitura instigante para profissionais que buscam superar seus desafios nos mais diversos segmentos. Neste livro, você vai aprender que:
- A tecnologia permite crescer com qualidade e em escala;
- Automação é uma realidade, mas o atendimento deve ser sempre humanizado;
- A experiência do consumidor está em tudo;
- Marketing é comunicar de maneira clara tudo que pode beneficiar o cliente.
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Ouvir, agir e encantar - Eduardo Cosomano
Capítulo 1
O começo de tudo
Eduardo Cosomano
Oano de 1993 pode ser definido como a derradeira página de um capítulo difícil do Brasil. Despertados sob a forte ressaca gerada pelo impeachment de Fernando Collor de Mello – o primeiro presidente eleito pelo voto direto pós-ditadura militar –, os brasileiros ainda sentiam as dores do confisco da poupança e de uma economia absolutamente descontrolada: o ciclo de 1993 foi o auge da hiperinflação no Brasil. Aquele ano registou inacreditáveis 2.477,15% de inflação. 1 Para efeito de comparação, em 1993, a inflação dos Estados Unidos ficou em 2,75% ao ano e a do Canadá em 1,65%. Traçando um paralelo com os tempos atuais, a inflação do Brasil em 2020, um ano duríssimo para a economia em razão da pandemia de covid-19, chegou a 10,74%, como aponta o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 2 E esse já é um índice alarmante.
Na prática, essa inflação de quatro dígitos significava que os preços mudavam mais de uma vez por dia nas prateleiras do supermercado, e era muito comum que boa parte das famílias estocasse grandes quantidades de comida e viajasse diariamente para fazer compras em alguma cidade onde o preço ainda não havia sido atualizado. Sem delongas, se há algum ponto positivo nessa história é que ela comprova na carne que não existe bem-estar social sem uma economia eficiente.
Pois bem: neste cenário, muitos empreendedores lutavam para criar negócios sólidos, mas é difícil estabelecer alicerces em uma areia fofa como era (e talvez ainda seja) a economia brasileira. Não havia nenhuma estabilidade. Mesmo assim, Antonio e Beatriz Juliani viviam um sonho em particular: a recém-criada Flash Courier. O negócio parecia estar dando certo.
Eu me lembro que era uma sexta-feira fim de tarde, não sei exatamente o mês. O Juliani (Antonio) me ligou todo feliz dizendo que tínhamos fechado uma remessa de cem entregas. Imagina, era um acontecimento, cem entregas! Ele e o Luiz Antônio, que era nosso sócio na época, não iam dar conta de embalar e entregar tudo. Então, peguei o Guilherme e o Bruno e fomos para a rodoviária e embarcamos para São Paulo. Fiz esse trajeto dezenas de vezes nos anos 1990. Naquela época era ônibus mesmo, não tinha essa de avião, era tudo muito caro e nós estávamos começando
,3 relembra Beatriz Juliani, matriarca da família.
O entusiasmo de Beatriz tinha uma razão de ser, já que era a primeira boa notícia após um período de altos e baixos. Nós tínhamos alugado uma sala na Avenida Vereador José Diniz, em São Paulo, mas as despesas superavam as receitas. Demos o passo maior que a perna, mas agimos rápido. Em menos de seis meses, devolvemos a sala e migramos as operações para o apartamento do Luiz Antônio. Ali a gente ficou por quase um ano. Aí a empresa começou a deslanchar.
Guilherme Juliani
Lembro bem dos episódios em que eu e meu irmão ficávamos na sala do apartamento do Luiz Antônio até a madrugada, ajudando a localizar a página de cada entrega no Guia Quatro Rodas.4 Em seguida, digitávamos no sistema e imprimíamos as etiquetas em uma Epson LX 330, uma impressora matricial de agulhas que fazia um barulhão e demorava uma eternidade para imprimir uma simples folha A4 de etiquetas. E essa era a Ferrari das impressoras, algo que havia permitido aposentar as máquinas de escrever.
Depois, para transmitir os dados, era necessário conectar um modem de 360 kilobytes por segundo. A título de referência, uma foto do celular hoje tem 10 milhões de kilobytes. Outro evento marcante das primeiras versões do nosso sistema operacional é que, na época, não existia um banco de dados que reunisse todos os endereços do Brasil. A solução? Meu irmão e eu digitamos todos os CEPs e ruas do Guia Quatro Rodas no sistema para criar esse banco de dados. Se você tem mais de 30 anos, provavelmente sabe o que isso significa na prática.
Eduardo Cosomano
Antes disso, porém, muita coisa já havia acontecido na vida de Antonio e Beatriz. Muito antes da fundação da Flash, ambos desenvolveram e capitalizaram conhecimento em inúmeras atividades pessoais e profissionais. E quem conhece o Juliani, já sabe: o que não faltam são histórias.
Conversamos quase um dia inteiro e, enquanto me contava seus feitos e detalhava todo o clima de brincadeira e de gozação reinante na aviação, setor em que construiu boa parte da sua carreira e de seus valores, Antonio apontava orgulhoso para o quadro pendurado em seu escritório, na sede da Jall Card, em São Bernardo do Campo, região metropolitana de São Paulo. Na obra, um avião monomotor com o logotipo da Courier Express plana em frente à bandeira do Brasil que flamula com os dizeres Brasil, acredite
.
Juliani foi vendedor de brinquedos na adolescência, digitador e operador de sistemas na PROCERGS (Centro de Tecnologia da Informação e Comunicação do Estado do Rio Grande do Sul). Foi lá que desenvolveu admiração por sistemas e tecnologia, DNA da Flash e demais empresas do grupo até hoje. Aos 18 anos, tornou-se militar e piloto da Força Aérea Brasileira. Mais adiante, adquiriu experiência como piloto de aviação comercial, passando por grandes companhias como a TABA (Transportes Aéreos Regionais da Bacia Amazônica S/A), a Rio Sul e, por fim, a VASP (Viação Aérea São Paulo), onde foi comandante, instrutor, checador e diretor de operações. Nesse último cargo, Juliani realizou feitos importantes para o mercado de aviação, como dirigir a homologação do Boeing 737 para operar no Aeroporto Santos Dumont, implantar as aeronaves DC-10 e MD-11 adequadas para o início das linhas internacionais para Miami, Los Angeles e São Francisco (nos Estados Unidos), além da Coreia do Sul.
Antonio também foi diretor do SNA (Sindicato Nacional dos Aeronautas), onde fundou a VOE (Vasp Organização de Empregados), uma sociedade anônima que congregou cinco mil dos sete mil empregados da Vasp. Essa organização, sem nenhum capital financeiro, acabou adiquirindo 20% da Vasp no processo de privatização
, diz. Sua atuação na aviação militar e comercial trouxe reconhecimentos expressivos, como o troféu de recordista de bombardeio sasante do 2º Esquadrão de Instrução Aérea e a medalha Mérito Santos Dumont, concedida devido aos serviços prestados à Aviação Comercial Brasileira. Além disso, sua experiência trouxe um bom conhecimento do setor.
E aí é que começa a história com o mercado de entregas. Antonio foi sócio da Security Express, uma empresa de carga aérea que não decolou e encerrou as atividades. Logo em seguida, em conjunto com o ex-sócio Luiz Antônio, abriu a Flash Courier. Eu havia acessado o conhecimento da logística, do mercado de transporte, das técnicas de negociação, da história de empresas como FEDEX e UPS, e acreditava que havia demanda para uma grande empresa privada de pequenas encomendas no Brasil. Não tínhamos capital financeiro, mas tínhamos muita força de vontade e então começamos. Após alguns tropeços e adaptações, nasceu a Flash Courier.
Os tropeços pelos quais Juliani passou se referem a uma série de negócios e atividades que podem até parecer descoladas da realidade de uma empresa de logística, mas que, no fim, serviram para ajudar a construir valores que alicerçam os negócios, como atendimento cordial, alegre, honesto, com qualidade em todos os detalhes. Ao longo dos anos 1980 e do início dos 1990, por exemplo, o casal tocou uma série de empreitadas: desde importação de luzes automáticas, passando por vending machines de refrigerante até a venda de caju no Ceasa.
Eduardo, eu me lembro que eu estacionava a caminhonete e começava a descarregar as caixas e ninguém me ajudava. Aquele bando de homem olhando como se eu não pertencesse àquele lugar, e ninguém me ajudava. Então eu descarregava as caixas sozinha, uma por uma. Sem problema nenhum. Mas eu me lembro de cada detalhe
, conta Beatriz.
Outro ponto valioso dessa jornada foi a resiliência, afinal, nem tudo foram rosas ao longo dos anos. Me lembro de um período de ‘vacas magras’, já nos anos 90. Então reuni a família e esclareci a situação. A gente teve uma boa fase, mas as coisas mudaram, ainda mais por conta do cenário de hiperinflação. O Guilherme e o Bruno, ainda meninos, ajudavam como podiam. Lembro que os dois consertaram suas bicicletas e economizavam no transporte para escola
, detalha Juliani.
Guilherme Juliani
Já disse na introdução do livro, mas repito: quando o assunto é Brasil e todas as dificuldades ao empreendedorismo por aqui, o empenho de meus pais nos negócios é de se tirar o chapéu. Eu era um garoto, claro, mas me lembro de todos esses empreendimentos. Foram diversos negócios montados pelos meus pais que fecharam, desde fábrica de guardanapos, vending machines (aquelas máquinas de vender refrigerante) até courier aéreo. Hoje é claro para mim que os aprendizados, os medos e a austeridade gerados por eles, sem dúvida, ajudaram a moldar a Flash Courier e, posteriormente, todas as empresas do grupo.
Voltando para a Flash, já em 1995, a internet começou a funcionar oficialmente no Brasil via Embratel.5 Então, falar de desenvolvimento de sistemas naquela época era como falar de computação quântica e metaverso hoje. Mesmo assim, o tema começou a determinar parte do que é a nossa cultura atualmente: tecnologia e processos muito bem estruturados. Nesse contexto, a empresa seguiu crescendo e se expandiu para o Rio de Janeiro, onde minha mãe fundou e começou a gerenciar a primeira unidade remota da Flash: a Regional