Traída pelo Passado
De Annie Gracie
3/5
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Sobre este e-book
Miriam queria romper os laços com o passado, mas Vicente intrometeu-se no seu caminho. Esse homem a levava à loucura! Explodia de desejo por ele e ao mesmo tempo o odiava. Ela queria desfazer-se de tudo que restava do passado de sua família e ir embora, mas cada vez que se encontrava com Vicente, discutiam e surgia um novo desafio que a fazia ficar. Mas quando Miriam finalmente conseguiu ir embora, uma revelação do passado mudou tudo.
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Traída pelo Passado - Annie Gracie
CAPÍTULO I
A neblina costeira invadia a marina de Pascagoula, envolvendo o barco numa bruma cinzenta, cheia de mistérios. Miriam, sentada no chão da cabine do capitão, sentiu um arrepio percorrer-lhe o corpo ao ver Vicente se aproximar e, sem uma só palavra, tomá-la nos braços para um beijo longo, apaixonado... como há muito tempo ela esperava.
Então ele se ajoelhou a seu lado e passou os braços fortes em torno de seus ombros delicados. A respiração quente acariciou-lhe a orelha, o pescoço.
Miriam deitou-se no chão, os olhos cor de esmeralda fixos nos dele, enviando mensagens sensuais. Precisava ir fundo, explorar até o fim o que estava sentindo.
Vicente afastou-se um pouco para apreciar melhor os contornos do corpo feminino e bem-feito.
– Miriam... – murmurou com voz rouca. – Onde esteve esse tempo todo? Tantos anos... Como você mudou!
A emoção era intensa e ela teve vontade de olhá-lo nos olhos, bem de perto. Soergueu-se e apoiou-se no cotovelo. Aproximando-se mais, inclinou a cabeça, jogando para o lado seus longos cabelos castanhos.
– Vicente, eu sempre o desejei, mas você nem notava que eu existia.
– Deixe-me ver como você mudou – disse ele com voz acariciante e um sorriso de derreter corações.
Fascinada pelo sorriso e pelo olhar dele, Miriam nem percebeu que Vicente desabotoara-lhe a blusa e insinuava as mãos hábeis e experientes por sobre o colo, os seios.
– Vicente... – balbuciou, com lábios trêmulos, quando sentiu os dedos dele em seu corpo.
Aquelas mãos quentes, calosas e rudes, em contato com sua pele macia e delicada, intensificaram-lhe o desejo. Uma quentura gostosa a invadiu e a cabeça ficou leve, tomada por uma sensação de prazer.
Seria bom estar nua diante dele. Tinha sonhado com isso muito antes de sair de Pascagoula, aos catorze anos.
– Quero ser sua, Vicente... agora... – disse em tom de súplica, vendo os olhos dele brilharem de desejo.
A resposta foi um gemido rouco. Os lábios carnudos beijavam os seios descobertos; os cabelos loiros, queimados de sol e de mar, recebiam carícias dos dedos delicados de Miriam.
– Tire minha blusa, Vicente... Quero abraçar você como sempre sonhei.
Ele ergueu um pouco a cabeça e fitou-a com olhos semicerrados, apaixonados, cheios de desejo.
Trêmula, numa ânsia incontida, Miriam passou os braços pelo pescoço de Vicente e trouxe o rosto dele para perto do seu, fazendo-o beijar seus lábios entreabertos.
Apertou-o contra si, entrelaçando-lhe as pernas, puxando-o sobre seu corpo no delírio de uma paixão incontida.
Parecia um sonho, uma ilusão maravilhosa da qual Miriam não queria mais despertar, um momento mágico, desses que só se tem uma vez na vida.
E ali estava ela, perdida em doces emoções, quando ouviu o apito de uma sirene. Luzes, vermelhas e azuis, piscando intermitentemente, fizeram Miriam perceber que sonhara demais e como resultado teria que pagar uma pesada multa à polícia rodoviária, que vinha em seu encalço. Motivo: excesso de velocidade.
Era o que ganhava por pensar tanto em Vicente. Saindo para o acostamento, ela concluiu que estivera tão distraída, imersa em seu sonho, que nem percebera que calcara o acelerador. Mas mal podia acreditar que aquele beijo fosse de mentira.
Parecia tão real! Ah, que fantasia maluca! Tinha chegado a sentir os lábios dele como se fossem de verdade!
Ainda tremendo de emoção, parou o carro e baixou o vidro, perguntando-se se Vicente mudara muito desde que o vira pela última vez. Como estaria agora?
Um sisudo guarda rodoviário aproximou-se do carro, fazendo-a voltar à realidade de uma vez.
– Mocinha, seus documentos. Quer fazer o favor de ir descendo desse seu carrinho e me mostrar sua carteira de motorista?
– Sim, senhor... hã... claro... – gaguejou ela, confusa, sem ter-se situado direito, ainda, diante do que estava acontecendo.
Pegou a bolsa e desceu, enfrentando o frio. Ajeitou a calça branca de lã, fechou o zíper do agasalho, protegendo-se da garoa fina, e juntou-se ao guarda que, com o pé no para-choque traseiro, anotava a placa do carro no bloco de multas.
– De que cidade do Texas a senhorita vem?
– De Houston. Meu nome é Miriam Svensen. Desculpe se... Quer dizer, eu fiz alguma coisa errada?
– Quero ver sua carteira de motorista – repetiu ele, impaciente.
Miriam remexeu na bolsa, ainda confusa.
– Eu... hã... parece que não sei bem onde estou...
O guarda parou de escrever, cruzou os braços e olhou-a, desconfiado.
– Está a uns quarenta quilômetros de Baton Rouge. Por que essa pressa, mocinha? Alguma emergência?
– Emergência, propriamente, não. É que meu avô morreu no outono e... – Interrompeu-se ao achar finalmente a carta de motorista. – Ah, aqui está!
– Meus pêsames – disse o guarda, pegando os documentos e, com um suspiro, continuou a escrever no bloco.
– Estou indo para Pascagoula, no Mississipi, para vender o estaleiro da família, ou melhor, o que restou dele. – Seus olhos cor de esmeralda assumiram uma expressão triste. – Eu gostava muito de lá. Quando meus pais morreram, fui para a casa de uma tia, em Houston. Fiquei morando lá e nunca mais voltei. Nem para o enterro de vovô. Eu não suportaria.
O autoritário guarda abrandou um pouco a expressão severa. Tinha parado de escrever para ouvi-la.
– Sabe, eu nunca mais conseguiria viver em Pascagoula. Gosto de cidades grandes, barulhentas, agitadas.
O guarda pôs-se a escrever de novo.
– Este é seu endereço? Está correto? Hum, deixe-me conferir o prazo de renovação de sua carteira... – Entregou-lhe a multa. – A senhorita infringiu seriamente a lei. Estava a mais de cem quilômetros por hora! Já recebeu alguma outra multa por excesso de velocidade?
– Não, nunca. Não percebi que estava correndo tanto. Vinha pensando... hã... no que vou encontrar em Pascagoula.
– Está bem, está bem. Pode ir. Pague a multa e trate de não ultrapassar mais o limite de velocidade, certo?
Devagar e cautelosamente, ela voltou para a estrada, rumo ao leste, um tanto surpresa com o incidente. De fato nunca pensara que seu velho carrinho esporte pudesse correr tanto. Ganhara-o há seis anos de tia Linda, que assumira o papel de sua guardiã. Com ele, viera junto um livro de mecânica e não demorara muito para Miriam descobrir como lidar com motores e engrenagens. O pequeno automóvel nunca passara pelas mãos de um mecânico: ela fazia todos os consertos.
Com certeza acabei transformando esta pequena peça de museu num carro de corrida
, pensou, sorrindo, divertida, ao vencer o tráfego intenso que vinha da ponte do rio Mississipi. Deixou a cidade de Baton Rouge para trás e seu bom humor foi substituído por inúmeras perguntas sem respostas: será que Vicente tinha se casado? Se não, haveria a possibilidade de vir a se interessar por ela? E aquele beijo que sua imaginação criara poderia virar realidade?
Miriam o conhecera quando tinha doze anos e a cabeça cheia de sonhos românticos. Mas seu corpo franzino não a ajudava a encontrar príncipes encantados; ela parecia mais um garoto de ar travesso e cabelos encaracolados do que uma menina querendo virar mulher.
E fora essa menina que se apaixonara por um rapaz de vinte anos que um dia aparecera no cais dos Svensen, para tratar de negócios. Ela ficou observando, fascinada, os movimentos, decididos, o porte atlético, os cabelos loiros, a pele bronzeada, os olhos castanhos... No entanto, ele sequer a notara. Quem iria prestar atenção numa garota de doze anos, a não ser um garoto da mesma idade? Mesmo assim, Miriam se apaixonara por um homem impossível: Vicente Hamilton.
Dois anos mais tarde, Miriam perdia os pais e ia morar longe dali, em Houston, com tia Linda, que a ensinara a viver o presente sem chorar o passado, a compreender a alma humana, a ajudar os necessitados e a amar a arte.
Mas, acima de tudo, tia Linda mostrara a Miriam a importância de ser independente, dona da sua vida e das suas vontades. Assim, incentivara-a a cursar a universidade e a ir morar sozinha, assim que a situação financeira permitiu. Na época, Miriam era assistente do diretor de criação de uma famosa agência de publicidade e sonhava em ter seu próprio negócio. Ganhava bem, saía muito e se divertia sempre.
Mas nenhum dos rapazes que a cortejavam era dono de seu coração. Miriam não amava ninguém e não pensava em casamento. Aliás, chegara até a achar que jamais conseguiria apaixonar-se de verdade e dividir a vida com alguém, tão acostumada estava a resolver tudo sozinha. No entanto, agora, sentia necessidade de um amor, um companheiro, e se perguntava se Vicente não seria seu príncipe encantado...
Um raio riscou o céu cinzento e escuro, anunciando tempestade para breve. Um segundo trovão e despencou o aguaceiro, reduzindo a visibilidade a zero. Miriam teve que concentrar toda a sua atenção na estrada, para dirigir em meio àquela tormenta. Xingou baixinho quando alguns pingos começaram a cair em seu colo, vindos da goteira do teto de lona.
Esses contratempos a fizeram parar de pensar em Vicente. Afinal, não havia mesmo motivos para sonhar acordada com ele: iria vê-lo no dia seguinte, para vender-lhe o velho estaleiro do avô.
Sentia-se grata ao advogado do velho Svensen, John Lewis, que insistira na sua presença em Pascagoula. Miriam tinha pensado em fazer o negócio pelo correio e por telefone, para evitar os lugares que lhe lembravam o passado. Agora, porém, não perderia por nada a oportunidade de rever Vicente. Quando pensava em como seria o encontro e no que poderia haver entre ambos, ficava alvoroçada como a menina de doze anos que um dia se apaixonara