Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

O Segundo Armário: diário de um jovem soropositivo
O Segundo Armário: diário de um jovem soropositivo
O Segundo Armário: diário de um jovem soropositivo
E-book209 páginas3 horas

O Segundo Armário: diário de um jovem soropositivo

Nota: 5 de 5 estrelas

5/5

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

Acho que hoje morreu algo em mim. Tem morrido a cada dia e sinto que isso é bom. Talvez seja o processo natural deste luto, talvez seja o nascimento de um novo ser, sim, um Alguém. Vejo a vida com novos “óculos”, ou mesmo novos olhos. Despeço-me hoje de alguém em mim. Acordo de um sonho chamado esperança. Espero que “futuro” seja uma palavra aliada e me reserve coisas boas. Acho que até hoje tive, sim, tive, alguma espécie de esperança de que tudo fosse mentira ou erro de laboratório. Despeço-me dela, sem olhar para trás. Beijo a esperança. Reagente nem sempre é ruim. Hora de reagir.

Gabriel de Souza Abreu nasceu em 1984 no interior do Estado do Rio de Janeiro, em família de classe média. Em 2010, decidiu mudar-se para a capital para concluir seus estudos de pós-graduação numa instituição de referência nacional na área de ciências da saúde. Um pouco mais de um ano de intensa vida gay na cidade do Rio de Janeiro – o paraíso homossexual do Brasil – exatamente no dia 11 de abril de 2011, às 13 horas, Gabriel recebeu um diagnóstico que mudaria sua vida para sempre: descobriu que era soropositivo para HIV-1. Na busca de novos caminhos, ele começou a escrever, registrando seus medos, expectativas e anseios, publicando em 2014 o seu primeiro livro, O Segundo Armário: Diário de um Jovem Soropositivo. Gabriel sempre se dedicou a questões relevantes para a promoção da saúde e qualidade de vida no Brasil, e atualmente concentra energias em projetos de melhoria do sistema público de saúde brasileiro e de acolhimento de jovens soropositivos.

IdiomaPortuguês
Data de lançamento19 de jan. de 2015
ISBN9789898575531
O Segundo Armário: diário de um jovem soropositivo

Relacionado a O Segundo Armário

Ebooks relacionados

Bem-estar para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Avaliações de O Segundo Armário

Nota: 5 de 5 estrelas
5/5

2 avaliações1 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

  • Nota: 5 de 5 estrelas
    5/5
    ótimo

Pré-visualização do livro

O Segundo Armário - Gabriel de Souza Abreu

O Segundo Armário

Diário de um Jovem Soropositivo

Gabriel de Souza Abreu

INDEX ebooks

2014

Ficha técnica

Título: O Segundo Armário: Diário de um Jovem Soropositivo

Autor: Gabriel de Souza Abreu

osegundoarmario@gmail.com

Revisão: João Máximo, Luís Chainho, Patrícia Relvas e Claudino Moura

Foto da capa: Eletromicrografia de uma célula T infetada pelo vírus HIV, gentilmente cedida pelo NIAID (National Institute of Allergy and Infectious Diseases, USA)

Data de publicação: 1 de dezembro de 2014

Edição 1.02 de 19 de janeiro de 2016 

Copyright © João Máximo e Luís Chainho, 2014

Todos os direitos reservados.

Esta publicação não poderá ser reproduzida nem transmitida, parcial ou totalmente, de nenhuma forma e por nenhuns meios, eletrónicos ou mecânicos, incluindo fotocópia, digitalização, gravação ou qualquer outro suporte de informação ou sistema de reprodução, sem o consentimento escrito prévio dos editores, exceto no caso de citações breves para inclusão em artigos críticos ou estudos.

INDEX ebooks

www.indexebooks.com

indexebooks.com@gmail.com

www.facebook.com/indexebooks

Lisboa, Portugal

ISBN: 978-989-8575-53-1 (ebook)

SOS AIDS-SIDA

Introdução

Nascido no interior do Rio de Janeiro, em família de classe média, Gabriel decide mudar-se para a capital do Estado para concluir seus estudos de pós-graduação numa instituição de referência nacional.

Um pouco mais de um ano de intensa vivência da vida gay na cidade do Rio de Janeiro – o paraíso homossexual do Brasil – exatamente no dia 11 de abril de 2011, às 13 horas, Gabriel recebeu um diagnóstico que mudaria sua vida para sempre: descobriu que era soropositivo para HIV-1.

Após sair do laboratório em Ipanema, sentiu que o seu mundo estava virado do avesso. Não tinha perspectivas de futuro: o medo era o imperativo dos seus pensamentos.

Menos de dois meses depois, numa tentativa de externalizar a intensidade de seus sentimentos, resolveu escrever um blogue, que se tornou uma ferramenta para refletir sobre a doença mais estigmatizada do século. A música também o ajudou a lidar com essa maré de emoções; a maioria dos textos foi escrita ao som de músicas, repetidas à exaustão, acompanhadas de muitas lágrimas e aprendizagens. Ao longo do livro foram incluídos links para algumas destas músicas, para que o leitor as possa escutar e compartilhar os sentimentos do autor.

Os textos, a seguir são como que um diário, por ordem cronológica, da descoberta da existência de um segundo armário, tão estigmatizado como o armário da homossexualidade. Este segundo armário é aquele para onde são obrigados a entrar os jovens gay quando descobrem que são portadores de HIV.

Abril de 2011

Uma pausa de mil compassos

Tudo começou com o resultado de um teste! Um teste que mudou tanto minha vida quanto essa espécie de antecipação da morte. Um cigarro, Marisa Monte, café e maconha[1]... foi mais um domingo. É como um reinício. Sinto-me reinfectado. Cada momento parece não ter fim. Mas, no fundo, passaram apenas poucas horas, às vezes o tempo de uma pequena viagem, uma caminhada, um trânsito para o trabalho. Por que temos de fingir tanto? Esconder tantos sentimentos? Queria poder abraçar-te, tocar-te, contar-te. Quero colo! Quero muito colo!

Paulinho e Marisa, obrigado por existirem e cantarem para mim.

Silêncio por favor

Enquanto esqueço um pouco

a dor no peito

(...)

Hoje eu quero apenas

Uma pausa de mil compassos

(Para Ver as Meninas, por Marisa Monte e Paulinho da Viola, aqui ou aqui)

Há uma suspeita de HIV

Sempre fiz teste de HIV, e sempre me cuidei. O preservativo foi e ainda é (agora mais do que antes) algo essencial na minha vida. Muitas vezes aconteceram acidentes que me fizeram sentir como se tivesse sido infectado pelo vírus... camisinha estourar, ocorrer sangramento na hora H. Nesses momentos sempre ligava ao Pablo, por também ter passado por situações semelhantes. Às vezes culpava esses comportamentos associando os mesmos ao fato de eu ser homossexual e gostar de uma boa putaria. Sei que esta história de HIV e homossexualidade já deu o que tinha que dar, e sei de todo aquele blá-blá-blá politicamente correto – AIDS não é coisa de homossexual, mas de desprevenidos.

Pois bem, foi no mês de abril! Numa tarde de segunda-feira, aguardando um resultado que nunca saía, na tentativa de me acalmar, pensava nas inúmeras vezes que os resultados se atrasavam e sempre lia: Não Reagente. Nossa! Sempre foi um alívio! Parecia que toda a culpa da carne estava perdoada, sem nenhuma penitência a ser paga a não ser intensificar o cuidado e prevenir-me, cada vez mais, dali para a frente.

Este abril de 2011 foi diferente. Recebo a ligação do médico (fiz o teste num consultório particular)... você precisa vir aqui e colher uma nova amostra pois faltou alguma sorologia!

Eu já sabia que no Brasil, quando um resultado dá positivo, o laboratório é obrigado a refazer o exame com uma nova amostra a fim de evitar resultados equivocados. Esta ligação deixou-me louco. Pablo ligou-me nesse momento. Num desespero contei-lhe o que estava acontecendo. Este talvez tenha sido meu maior acerto dos últimos tempos – preciso e precisarei muito de seu apoio. Imediatamente peguei o metrô e fui ao médico. Ele estava saindo de seu consultório, agarrou meu braço e falou ainda na rua: Há uma suspeita de HIV, mas pode ficar tranquilo que você pode jogar bola e viver feliz. Se eu tivesse uma bola naquele momento jogaria na cabeça dele. Além de despreparado, era cego. Deixei o médico e fui ao laboratório fazer o novo exame. Enquanto esperava que a técnica de enfermagem me chamasse, lágrimas escorriam dos meus olhos, desespero e incerteza adentravam-se pelo meu ser. Estava sozinho na sala de espera quando ela me chamou para o exame. Saí de lá com a certeza de que estava infetado e fui para a praça General Osório, em Ipanema. Lágrimas e cigarros. Sem saber o que fazer, para quem ligar, se iria contar a alguém, a quem; no regresso a casa, desnorteado, desço num shopping. Dou uma volta com a intenção de comprar óculos escuros, como se fosse capaz de resolver todos meus problemas disfarçando meus olhos chorosos.

Uma semana depois, os resultados das duas amostras:

Amostra reagente para HIV I

Primeira consulta

Minha primeira consulta foi num centro de pesquisa em DST/AIDS. Eu confio muito no pessoal desta instituição, pois já lá fui algumas vezes com alguns amigos. Mas também a escolhi por ser um lugar referência em infectologia. Cheguei lá bem cedo, com a intenção de ser um dos primeiros a ser atendido. Nessa ocasião chamei meu primo para ir comigo. Daniel foi e tem sido essencial. Ele mora perto de mim, também é homossexual e sabia que o resultado de meu teste estava atrasado.

Fomos recebidos por uma enfermeira que se mostrou a pessoa mais doce e amável do mundo. Ela pensou que éramos namorados, mas logo se desculpou pela confusão. Contei tudo que estava acontecendo comigo, inclusive que havia assistido ao filme Filadélfia[2]. A enfermeira boazinha marcou uma consulta.

Retornei na data e, chegando lá, dou de cara com a Dra. Moral. A filha da puta da mulher teve a cara-de-pau de jogar na minha cara toda carga de valores moralistas que ela aprendeu em seus trinta anos de vida. Perguntava-me por que eu não me prevenia já que era tão instruído? Falou que quem leva esse tipo de vida promíscua sempre está exposto... Saí de lá muito pior do que entrei, principalmente porque faço sempre sexo com camisinha. Fiz uma reclamação na instituição e não obtive nenhum feedback até agora.

Ela conseguiu deixar-me triste por muitas semanas. Senti-me o ser humano mais merecedor de AIDS do mundo. Mandou-me também procurar uma médica particular dizendo que com isso não se brinca e falou-me para voltar em trinta dias para saber como estaria minha imunidade (leia-se taxa de CD4[3]). De tanto ódio que sentia, se tivesse passado em frente a uma macumbeira no momento em que saí de lá teria feito um vudu dela; mas segui sua orientação e marquei uma consulta no particular.

CD4 baixo.... paciência!

Não foi fácil e ainda não está sendo.

Após ir à médica particular, que por sinal me tratou muito bem, descobri que meu CD4 está baixo. Ela foi bem clara e objetiva. Diferente da outra, ela não me julgou em nenhum momento; foi bem didática e paciente. Percebi que entende bem do assunto. Desde que fui infectado tenho lido muito sobre HIV/AIDS e pude conversar com ela com certo conhecimento. Dra. Leblon foi a escolhida. Optei por fazer tratamento particular porque:

a) o plano de saúde cobre todas as despesas;

b) não teria de ficar numa fila de espera de quase duas horas;

c) não seria identificado como portador de HIV (esse é, agora, meu maior medo; não sei, não saberia e não quero aprender a lidar com esse preconceito).

d) eu teria sempre a possibilidade de ver o mar do Leblon.

Para Dra. Leblon, em medicina, dois mais dois nem sempre é igual a quatro: o CD4 baixo não quer dizer (isoladamente) muita coisa, embora seja sempre preocupante. Quando o CD4 está baixo significa que a imunidade está baixa. Quanto mais baixo o CD4 maior o risco de doenças oportunistas. O papel

Está gostando da amostra?
Página 1 de 1