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Estamos Perdidos. O autismo visto através dos olhos de um autista.
Estamos Perdidos. O autismo visto através dos olhos de um autista.
Estamos Perdidos. O autismo visto através dos olhos de um autista.
E-book141 páginas1 hora

Estamos Perdidos. O autismo visto através dos olhos de um autista.

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Sobre este e-book

Os pais de uma criança descobrem que o filho é autista. Começa, a partir daquele momento, uma descida no inferno da reabilitação, de médicos despreparados, de psicólogas catastróficas, de pessoas normais horripilantes e pessoas competentes.

“Estamos Perdidos” é um livro verdade, que nos narra a estória de uma criança autista, a partir do seu próprio ponto de vista.

Gianni Papa amplifica, como uma caixa de som, a voz interior do interprete principal: uma criança autista que descreve a estrada percorrida pela sua família através da experiência do seu complicado desenvolvimento.

Os personagens principais não têm um nome, a família é como muitas na Itália, abandonadas no vazio normativo e assistencial, obrigadas a aprender experimentando e às vezes errando, como curar e resolver as dificuldades que derivam de uma situação que lhes coloca fora daquilo que se pode definir “normalidade”.

O interprete é Eu: uma criança autista, o pai é papai, a mãe é mamãe, e o irmão é o menino pequeno com os cabelos vermelhos. Somente os personagens que cercam a família têm nome e, às vezes, sobrenome. E assim conhecemos a vovó Cinzia, vovó Katya, vovô Francesco, zio Fabio e etc...

Nesse livro, Gianni Papa soube interpretar em modo legítimo o pensamento da criança, dando voz à “criança que não sabe falar (mesmo sabendo falar)”. Uma criança que observa o mundo ao seu redor e que, como todas as crianças, não pode entender em profundidade o significado de certos comportamentos dos adultos. Uma criança que na dramatização do seu ser, narra com leveza e extrema simplicidade, como só as crianças sabem fazer. Uma criança que vê os adultos complicarem os percursos óbvios e transformar em difíceis os relacionamentos simples. Uma criança que acata as decisões dos grandes com a naturalidade de quem sabe aceitar como sendo justo até aquilo que poderia estar errado e não sabe se perguntar porque o amor acaba.

O autor demonstrou uma grande habilidade revirando de cabeça para baixo as prospectivas muitas vezes condicionadas pela maturidade de mentes que, crescendo se tornam “grandes” e, exatamente como fariam as crianças, conseguiu não escorregar na dramatização estereotipada conseguindo, assim, respeitar o ponto de vista do autista.

IdiomaPortuguês
EditoraBadPress
Data de lançamento13 de abr. de 2016
ISBN9781507137802
Estamos Perdidos. O autismo visto através dos olhos de um autista.

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    Estamos Perdidos. O autismo visto através dos olhos de um autista. - Gianni Papa

    ANTES

    ––––––––

    Eu sou uma criança autista e – mesmo sabendo falar – eu não sei falar.

    Eu sei repetir tudo aquilo que escuto. Eu repito com precisão as frases ditas nos desenhos animados, eu sei imitar o som do Pingu quando ele coloca o bico na tromba, eu sei dizer o meu nome e onde moro, mas não sei falar.

    Quando eu era pequeno, os meus pais não perceberam nada, porque eu tive alguns problemas assim que nasci e assim pensaram que eu fosse um pouco estranho porque eu estava me recuperando. Eu não me lembro quais foram os problemas que eu tive assim que nasci, mas – pelo que eu sei – eu morri. Saí da barriga, morri um pouquinho e fui levado para a unidade de terapia intensiva.

    Alguma coisa aconteceu dentro da minha cabeça, e então? Eu não sei: sei que eu morri e que depois – durante muito tempo – me senti cansado e confuso.

    Aos meus pais sempre disseram que <>. Disseram que era << possível considerar, no quadro geral do espectro autista, o nascimento com uma cesariana urgente como uma coincidência>>. Sugeriram aos meus pais que cantassem, dançassem e acendessem uma vela à Nossa Senhora porque, de acordo com as cartelas clínicas, eu não respirei durante alguns minutos mas – apesar de tudo —  eu ainda era uma criança  nor­mal.

    Comecei a ser seguido por um  neurops­iquiatra infantil muito famoso que até hoje trabalha na unidade de terapia intensiva neonatal. Era um homem que parecia ser muito capaz. A minha mãe dizia ao meu pai: Ele é muito capaz. O meu pai dizia à minha mãe: È realmente muito capaz. Todas as pessoas que encontramos na terapia intensiva neonatal diziam: Ele é muito capaz.

    O papai e a mamãe não entendiam muito. Eram marinheiros de primeira viagem sendo o primeiro filho deles; e assim, tendo escutado alguém dizer: Ele é muito capaz, acreditaram. E além disso, diziam à outras pessoas: Ele é muito capaz, nós tivemos sorte, porque é ele quem cuida do nosso filho... Poderia ser seguido por alguém menos experiente mas ao invés disso é seguido por um profissional muito capaz. Mas que sorte! Um profissional capaz! É preciso uma pessoa capaz para seguir uma criança que teve problemas ao nascer e que teve sorte em não sofrer consequências. Temos mesmo que acender uma vela à Nossa Senhora!!!.

    Foi aquele profissional capaz quem disse. Eles confiavam naquele que era capaz.

    E então, já que não aconteceu nada de importante, a vida seguiu em frente, porque eles já tinham obtido um milagre, e assim os meus pais continuaram a levar a mesma vida de sempre, ou quase.

    Mais ou menos, porque o nascimento de uma criança traz muitas mudanças.

    Crescer, eu crescia.

    Eu crescia de uma maneira não muito proporcional: eu tinha um problema no lado direito do meu corpo, eu dormia sempre com um braço teso voltado para a direita, a minha cabeça também pendia para a direita e a minha mãe temia que eu tivesse feridas de decúbito do lado direito.

    Ou o problema era do lado esquerdo e por isso eu pendia para a direita? Isso eu não sei!

    Como eu posso saber com certeza? Eu não entendia o que acontecia comigo. O meu cérebro era como o cérebro de uma criança recém-nascida: um cérebro confuso ainda em formação..

    Quando eu ainda era muito pequeno meus pais me matricularam em uma creche pública com horário integral.

    A mamãe e o papai trabalhavam, eram professores, e algumas vezes tinham que voltar à escola à tarde, mas me deixavam na creche até às 4, mesmo quando não tinham que trabalhar.

    Para eles era normal que eu frequentasse a creche. Principalmente porque todos os médicos que acompanharam o meu nascimento, incluindo aquele capaz, diziam que frequentar um ambiente como a creche me ajudaria muito e que eu deveria frequentá-la normalmente.

    Aquele que era capaz deu uma sua opinião:

    Essa criança ainda tem alguns problemas, mas estará bem. Quando alguém leva uma pancada na cabeça, o que pense que acontece? É possível se recuperar logo???  Depois de alguns minutos a pessoa começa a pronunciar algumas palavras, a se mover, mas se recuperar instantaneamente é impossível.. Ter contato com outras crianças da mesma idade lhe fará muito bem senhora. A hipotonia dele desaparecerá: poderá se comunicar, se expressar, e vocês irão ver quantos progressos ele fará!!!.

    Aquele capaz era muito bom em tranquilizar os meus pais. E às vezes eu também me sentia mais tranquilo.

    Como eu poderia saber algo sobre o autismo? Eu era somente uma criança. E basta. 

    Na creche, as professoras logo perceberam que eu era estranho. Elas me olhavam e diziam entre elas: Que estranho! Decidiram falar com a minha mãe e ela disse que também achava que eu agia de maneira estranha e que eu estava sendo seguido por um neuropsiquiatra, mas que isso não era motivo de preocupação porque eu estava crescendo bem, recuperando-me em uma maneira incrível e que estava me tornando normal. O neuropsiquiatra dizia que a creche teria sido a minha salvação e a mamãe acreditava que as professoras teriam feito milagres por mim.

    Eu vivia em um mundo só meu e repetia na minha cabeça e em voz alta frases pegas quem sabe onde, andava de um lado para outro repetindo palavras desconectadas e cumprindo ações incongruentes, ignorava as crianças da minha idade.

    A psicóloga da creche percebeu o meu comportamento estranho e quis conversar com a minha mãe. E em um segundo momento também com o meu pai (que aceitou o convite, mas nunca compareceu).

    A mamãe já havia intuído o meu autismo, para a mamãe, basta pouco, geralmente. A mamãe percebe as coisas, no ar.

    A mamãe sabia que – se eu não tivesse tido problemas – teria sido fácil se relacionar comigo. Mas ao invés disso ela não sabia como  entrar no meu mundo: ela não conseguia me entender e não sabia como falar comigo.

    A mamãe era aterrorizada e atônita, mas se consolava porque o neuropsiquiatra capaz havia dito que era questão de tempo e que as crianças com o tempo se recuperam.

    Senhora, lhe disse, Daqui a alguns anos tudo isso lhe parecerá distante e então poderá lhe dizer: <>... Acredite: Está tudo bem!!!

    A mamãe procurou a psicóloga da creche e lhe disse:

    Eu temo que o meu filho seja autista

    A psicóloga deu uma risada sem graça Iiiii­iih. Eu a escutei porque estava na sala ao lado, com as crianças que brincavam enquanto eu atormentava as rodas de um carrinho, tentando decidir se seria melhor comê-las ou fazê-las rodarem até desgastá-las.

    Eu estava lá, ignorado e ao mesmo tempo, sendo observado pelas professoras/coordenadoras/educadoras. Eu estava lá, completamente em silêncio e pendendo para a direita ou para a esquerda... Mas escutei a  risada.

    Depois da risada sem graça, a psicóloga disse:

    Como a senhora pôde pensar nisso? Autismo? Por que pensar em autismo? Eu observei o seu filho: eu vi como ele brinca em presença de outras crianças. Ele não brinca com as outras crianças, não, mas somente porque ele ainda é pequeno. Mas o seu desenvolvimento psicomotor parece adequado e em contínua evolução

    A minha mãe ficava feliz em escutar certas coisas, apesar de saber que no fundo no fundo não era essa a realidade.

    Na verdade, nós notamos, um bloqueio continuou a psicóloga Como se o seu filho estivesse se escondendo dentro de uma bolha. E essa bolha é composta por sons desarticulados e palavras ditas ao acaso. O seu filho canta, repete frases de desenhos animados, repete palavras incompletas ouvidas quem sabe onde, mas o problema é que, o que ele diz em certos momentos não tem relação com a conversa feita naquele momento ou com ação ou mesmo com a brincadeira ...

    A mamãe suspirou, desanimada:

    Então quer dizer que existe um problema!

    A psicóloga balançou a cabeça. Eu não estava lá, mas – no meio da confusão das crianças que jogavam pedaços de lego nas paredes - eu escutei o balanço da cabeça da  psicóloga.

    Senhora disse a psicóloga Com muita frequência os pais brigam na frente dos filhos, a senhora e o seu marido discutem com frequência?

    A mamãe e o papai não discutiam não. Eles discutiram quando eu nasci, porque nasci de uma maneira diferente... e a vovó começou a chorar. Ela chorou tanto quanto os médicos correram para tentar me salvar. Ela chorava e gritava:

    É a terceira criança morta na minha família! Antes que eu nascesse, a minha mãe perdeu o meu irmão. Há muito tempo e foi durante a segunda guerra mundial, mas nós – na Suíça – estávamos tranquilos vivendo tranquilamente. Depois, a minha cunhada, a mulher do irmão do meu marido, perdeu uma criança.... Agora a minha filha perdeu o seu filho... E com esse são 3.

    A mamãe não tinha me perdido. Eu estava somente um pouco adormentado. Eu nadava no líquido amniótico, tranquilo e sereno, sem nenhum problema, e — repentinamente – ela parou de sentir movimentos dentro da sua barriga e começou a se preocupar. Mas não comentou nada com a vovó porque não queria preocupá-la e sabia que ela começaria a chorar.

    A mamãe comentou com o papai quando ele voltou da escola. O papai ainda não tinha  conseguido um trabalho fixo na escola: ele fazia  substituições até  ter direito ao trabalho fixo, e  – repentinamente – no lugar dele entrou uma pessoa que tinha mais direitos que ele por ter obtido mais pontos. E por isso ele perdeu o lugar.

    Não penso que o papai tenha se arrependido de ter perdido o lugar e de ter ficado desempregado, porque dessa maneira ele pôde estar perto de mim quando eu nasci.

    A situação era complicada: eu nasci em  Busto Arsizio e me levaram imediatamente à

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