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A invasão dos sombrios
A invasão dos sombrios
A invasão dos sombrios
E-book477 páginas6 horas

A invasão dos sombrios

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Sobre este e-book

A invasão dos sombrios

Um feitiço que pode mudar tudo, um romance inesperado, uma guerra inevitável, duas histórias entrelaçadas…

Os sombrios estão à espreita! Eles querem conquistar toda a Frienia. Orcs e humanos, após muitos anos em guerra, devem se aliar para fazer frente ao novo inimigo comum. A forçada união entre Syriel, o príncipe humano, e Lirieth, a princesa orc, será o selo dessa aliança. Mas entre eles começa a surgir um verdadeiro romance que se vê abalado por uma suspeita de traição.

Lirieth está escondendo algo obscuro de seu passado?

A nova aliança e seus inimigos tentarão capturar dragões e outros poderosos aliados para reforçar suas fileiras.

Conseguirão os príncipes reunir um exército robusto para poder combater os sombrios?

Dois mil anos antes, um perverso mago chamado Mazorik, conhecedor do pior feitiço de magia negra que pode existir, Linderiun tesarien racem, planeja dominar todas as raças de Frienia: elfos, humanos, anões, metadílio, gigantes e sombrios.

Alguém conseguirá acabar com seus planos?

Duas histórias que se entrelaçam em meio a guerras, traições, romances, intrigas e aventuras, concluindo em um desenlace surpreendente.

IdiomaPortuguês
Data de lançamento10 de jun. de 2018
ISBN9781507196311
A invasão dos sombrios

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    A invasão dos sombrios - Jordi Villalobos

    Linderiun tesarien racem:

    A invasão dos sombrios

    Jordi Villalobos

    ––––––––

    A invasão dos sombrios

    © Jordi Villalobos

    Terceira edição: Outubro de 2016

    ISBN: 978-84-16912-09-4

    Registro de propriedade intelectual: B-3073-15

    Ilustração da capa: Sarima (envuelorasante.com)

    Ilustração do mapa: David Puertas

    Criação do boneco: Sara García (tucubierta.es)

    Revisão: Antonia Cuenca Honrubia

    S.COOP. de Escritores Independientes

    Nº de registro: CyL/349/AV CIF: F05253307

    www.edicionesproust.com

    info@edicionesproust.com

    É rigorosamente proibida, sem autorização por escrito dos titulares do copyright, sob as sanções estabelecidas pelas leis, a reprodução, parcial ou total, desta obra por qualquer meio ou procedimento, reprografia e o tratamento informático, a distribuição de exemplares mediante aluguel ou empréstimo. As fotografias desta obra compõem o arquivo pessoal do autor.

    jovigiltr.wix.com/Linderiun

    www.facebook.com/jovigiltr

    jovigi.ltr@gmail.com

    Sumário

    Agradecimentos

    Sinopse

    Prelúdio: o pacto de sangue e morte

    Prólogo

    Parte 1: A Montanha dos Dragões

    O pacto secreto

    A grande aliança

    Até as Terras Inóspitas

    A hospitalidade dos anões

    Um gigante aprisionado

    O Mago Branco

    A armadura dragão

    Debaixo do rio Celeste

    O último dragão

    Encontro na Montanha dos Dragões

    Corações de dragão

    Reencontros

    O grande mestre ferreiro Arginel

    Batalha na Montanha dos Dragões

    A pedra negra

    Parte 2: A invasão dos sombrios

    O segredo do general

    A pedra verde

    Resgate

    A pedra dourada

    Regresso à Montanha dos Dragões

    A pedra azul

    Venenos

    A pedra vermelha

    Em busca dos unicórnios

    A pedra cinza

    Coroação

    A pedra branca

    Os vaus de Rasen

    Reencontro com Mazorik

    O início da invasão

    O assalto a Urkaroth

    Invasão a Delfia

    Desfecho

    Apêndices

    Apêndice 1: Sobre Frienia

    Apêndice 2: Lista de personagens

    Agradecimentos

    Em primeiro lugar, quero agradecer a minha mulher e meus dois filhos pela paciência por terem aguentado, sem reclamar, todas as horas que dediquei a esta obra, assim como o apoio e os conselhos que me deram.

    Em segundo lugar, quero mostrar minha maior gratidão a Lucia Arca, Sarima e Antonia Cuenca por terem me apresentando umas às outras e por sua enorme colaboração, profissionalismo e simpatia, possibilitando e, acima de tudo, melhorando esta publicação.

    Também quero agradecer a David Palacios e a Juan Manuel Carmona por sua coragem por serem os primeiros a se atreverem a ler este romance até o final e por terem me dado sua sincera opinião e sugestões sensatas.

    Também não posso deixar de agradecer ao povo de Olmedilla de Alarcón por boa parte da inspiração que me permitiu escrever esta obra, ao ter aproveitado meus dias de férias nessa querida localidade para escrever a maior parte destas páginas.

    E, por último, queria agradecer a todos os amigos e familiares, que não deixaram de me apoiar e incentivar para trabalhar na publicação deste livro.

    Não se pode manter viva a chama do amor

    sem confiança nem esperança.

    (Pacoyo)

    A verdadeira amizade é como a fosforescência:

    resplandece melhor quando tudo escureceu.

    (Rabindranath Tagore)

    Odeia a teus inimigos,

    como se um dia devesse amá-los.

    (Pedro Calderón de la Barca)

    Sinopse

    Após uma guerra centenária entre humanos e orcs, ambos se veem forçados a se unirem para se defender dos sombrios, uma raça descendente dos elfos predominantemente malvada que ameaça invadir e subjugar seus territórios. Para selar essa aliança, os herdeiros dos dois reinos, o corajoso príncipe humano Syriel e a bela princesa orc Lirieth, fazem um pacto de matrimônio e, contrariando todas as previsões, iniciam um romance de amor sincero.

    Os sombrios empreendem uma expedição a terras repletas de criaturas perigosas para obter dragões e, assim, criar uma clara vantagem. A aliança faz seu próprio esforço para evitar que isso aconteça e também conseguir alguns dragões para igualarem as forças. Syriel e Lirieth comandam essa missão, no decorrer da qual deverão superar um motim de seus vassalos anões, o ataque de uma serpente gigantesca, emboscadas dos elfos sombrios e assaltos de criaturas estranhas e perigosas.

    Syriel também terá que enfrentar a dolorosa suspeita de uma perversa traição de sua prometida, que parece ter feito um pacto com os invasores vários anos antes.

    Além disso, eles se encontram com o Mago Branco, um dos sete discípulos de Mazorik, que informa a Syriel que é dono de dois dos objetos da Armadura Dragão, e entrega a ele mais um que pertenceu a seu avô. O Mago Branco insiste que o príncipe reúna os sete objetos mágicos que compõem a poderosa armadura, pois suspeita que alguém com intenções não muito boas também quer fazer isso.

    Tanto as tropas dos elfos sombrios como as da aliança conseguem obter o controle sobre um grupo de dragões. A guerra já é inevitável: os sombrios iniciarão uma invasão iminente aos reinos de orcs e humanos.

    Cerca de dois mil anos antes, um perverso mago chamado Mazorik põe em prática um dos piores feitiços de magia negra que já existiu. Com os sete corações de cada uma das raças de dragão, ele cria as sete joias de luz, que têm a propriedade de absorver as essências dos seres que as possuem por sete anos. Para isso, ele obtém um discípulo de cada uma das espécies civilizadas que povoam Frienia – elfos, humanos, orcs, sombrios, anões, metadílios e gigantes – e engana-os com a falsa promessa de acabar com todas as guerras.

    Com as sete joias já impregnadas com as essências das sete espécies, ele pretende engastá-las em sete objetos que compõem a Armadura Dragão, o que lhe conferirá um poder ilimitado, obtendo as imanências de cada raça, assim como sua total submissão, que o elevará a imperador supremo de toda a terra conhecida. Mas um de seus discípulos o descobre e consegue atrapalhar seus planos desprezíveis.

    As duas tramas vão se entrelaçando neste romance, chegando a um desfecho de final surpreendente.

    http://jovigiltr.wix.com/linderiun/mapa-de-frienia

    Prelúdio: O pacto de sangue e morte

    Frienia, ano 1808 da segunda era

    Entre Barvian, o feudo dos sombrios, e o reino orc de Teberion, encontrava-se o bosque da Noite Eterna. Suas árvores de grandes e frondosos ramos só permitiam a passagem de alguns raios de luz e, portanto, a escuridão tênue e perene se apoderava de sua imensa extensão. Tratava-se de um lugar propício para que diferentes criaturas pudessem se reunir clandestinamente sem medo de serem descobertas.

    Serpenteando por entre o bosque encontrava-se o rio Aquos, o mais caudaloso de toda Frienia, que marcava a fronteira entre os dois reinos. Sua torrente era tão volumosa que em boa parte do ano era possível atravessá-lo apenas pelos vaus de Rasen, ao sul do bosque.

    Em uma de suas áreas mais escuras, um pequeno ladino de raça mediana perambulava em busca dos apreciados cogumelos monarcas, uns míscaros de bom tamanho que, cozidos com habilidade, se transformavam em um dos pratos mais saborosos de toda Frienia, em especial para os metadílios.

    Bellamir, o coletor de fungos, não costumava vir sozinho a esse bosque, pois era um dos mais perigosos, tanto por causa de seres e feras selvagens que o habitavam como pelo tipo de indivíduos que normalmente o frequentava. Geralmente, ia acompanhado de seu inseparável amigo Frodin; no entanto, nesse dia ele estava indisposto por ter se empanturrado de bolos. Por isso, Bellamir decidiu se aventurar sozinho.

    Bem quando tinha encontrado uma colônia considerável dos valiosos cogumelos, depois de ter farejado seu aroma que parecia delicioso, escutou um estalido próximo que fez com que ele se escondesse para observar e ocultar sua mente como muito poucos sabiam fazer.

    Uma mulher se soberba beleza e raça sombria esperava impaciente com evidentes mostras de nervosismo. Tinha a ligeira impressão de que estava sendo observada, e não exatamente pela outra feiticeira com quem esperava se reunir. A sombria conservava os traços característicos dos antigos elfos, mas com a típica tonalidade mais macilenta da pele dos elfos sombrios. Seus longos cabelos negros, que chegavam a sua cintura, e seus olhos cinzentos e luminosos se destacavam sobre um rosto não carente de beleza, ainda que com feições marcadas que insinuavam uma maldade pronunciada.

    Ela realizou um exaustivo rastreio mental pelos arredores e não encontrou nada além de vários insetos e pequenas feras selvagens. Seu olfato também não a alertou quanto a nada ameaçador ou fora do comum, então se esforçou para aparentar maior calma.

    De repente, um quase imperceptível estalido precedeu a aparição de uma esbelta e régia figura. As feições de fêmea orc da recém-chegada, ainda que de uma singular beleza natural, demonstravam uma notável segurança e elegância. Sem dizer nada, olhou desafiadoramente nos olhos da outra maga que a estava esperando.

    — Está atrasada, Lirieth, filha de Gulrath – disse a sombria, fingindo o maior sossego possível.

    — Cheguei quando me propus a chegar, Elenir, filha de Nigriel — retorquiu a fêmea orc com certa agressividade, acrescentando pouco depois: — Você parece muito nervosa; não está querendo voltar atrás em nosso trato, não é?

    — Claro que não! Não me arrependo de nosso pacto. Venha! Acabemos logo com isso — defendeu-se a sombria.

    Aproximaram-se uma da outra e, revelando o fio de adagas, que competiam em sua luxuosa ornamentação, trocaram um profundo corte nas palmas de suas mãos e, ao uni-las, pronunciaram em uníssono:

    — Esses cortes simbolizam o pacto sagrado de sangue e morte entre feiticeiras, que nos ata com a própria vida ao cumprimento do acordo. Só será rompido o compromisso por mútuo acordo ou por morte de uma das duas. A cicatriz sangrará antes de desaparecer, indicará que uma parte perdeu a vida, liberando a outra de toda a obrigação. Por sua vez, o sinal de traição se revelará através de uma dor intensa na mão para a traída e a morte fulminante para a traidora.

    Uma luz segadora surgiu das mãos unidas das magas e o pacto de sangue e morte foi selado de forma irremediável.

    Ambas as fêmeas ficaram aturdidas por alguns segundos, cambaleando e fazendo um grande esforço para não caírem desfalecidas. Com toda segurança, as duas teriam caído ao chão se não estivessem ainda de mãos dadas.

    Pouco a pouco recuperaram sua régia compostura. Elenir foi a primeira a se mostrar restabelecida.

    — Bom, já está feito, Alteza. Foi um verdadeiro prazer voltar a vê-la — dirigiu-se a Lirieth com tom de sarcasmo. — Contarei os segundos até que nossos caminhos voltem a se cruzar — se despediu, acompanhando seu gesto de uma irônica reverência.

    — Eu também esperarei impaciente, querida — concluiu Lirieth sem se preocupar com imenso desapreço que demonstrava seu tom.

    As taumaturgas se separaram e desapareceram cada qual em seu caminho, deixando o bosque submerso em um silêncio sepulcral e em uma penumbra que, junto ao frio da noite, congelariam os ossos de qualquer criatura que rondasse por ali.

    O pequeno ladino observou a cena aterrorizado, apesar de saber que não poderiam tê-lo detectado graças a sua habilidade para se camuflar física e mentalmente, inclusive para os feiticeiros mais poderosos.

    Apesar de só ter podido escutar fragmentos da conversa, o que, junto à similaridade das vozes, dificultou o entendimento do que diziam, captou o suficiente para intuir que sua morte teria sido inevitável se elas o tivessem descoberto.

    Esperou ainda um bom tempo antes de se atrever a sair de seu esconderijo, para se afastar o mais rápido possível daquele lugar e voltar ao seu tranquilo e seguro povoado, de tal forma que acabou se esquecendo da suculenta colônia de cogumelos descoberta, além dos que já tinha coletado, que também ficaram para trás entre os arbustos.

    Prólogo

    Frienia, ano 1815 da segunda era

    A guerra entre humanos e orcs, que já durava vários séculos, estava prestes a ser encerrada. Os anões haviam ajudado os humanos mais por obrigação ao juramento de vassalagem que por implicação direta no conflito. Assim, Ankar, o atual rei dos anões, apesar de sua declarada aversão aos orcs, tinha mantido a mínima contribuição de soldados a que estava estritamente obrigado.

    Depois da última grande batalha nas imediações de Belquecia, capital do reino humano de Delfia, onde os orcs se saíram vitoriosos, o rei orc Gulrath, em vez de subjugar os vencidos à força, surpreendeu o rei humano Jorion oferecendo a ele uma aliança, selada pelo matrimônio de seus filhos primogênitos: a princesa Lirieth, herdeira de Teberion, e o príncipe Syriel, herdeiro de Delfia.

    Este acordo se fazia cada vez mais necessário para homens e orcs, devido à vigorosa e devastadora civilização dos sombrios, que ansiava pelo controle total de Frienia e por subjugar todas as raças da terra à escravidão. Portanto, não restou ao rei humano outro remédio senão aceitar as condições do rei orc, e Syriel também não teve alternativa a não ser aceitar a vontade de seu pai.

    Gulrath chegou a recusar em várias ocasiões a oferta de aliança que os sombrios lhe faziam para derrotar os humanos, convencido de que, uma vez que isso acontecesse, eles romperiam o pacto para subjugá-los também.

    Há muito tempo o rei orc ansiava por uma aliança com os homens e pelo fim de uma guerra que favorecia mais aos interesses dos sombrios, debilitando, ao mesmo tempo e em grande parte, as duas raças inimigas. Também desejava reinar em uma época de paz, onde homens e orcs pudessem conviver e prosperar em harmonia, e isso só seria possível caso se unissem e conseguissem vencer juntos os sombrios.

    Nigriel, rei dos sombrios, continuava à espera do momento em que homens e orcs se desentendessem para, enfim, poder aplicar neles o golpe definitivo que os deixaria a sua mercê. Esse momento, com o fim da guerra, parecia se aproximar, apesar de que o soberano sombrio teria gostado de ver a contenda durar ainda mais, pois as forças de homens e orcs, ainda que debilitadas, em aliança ainda seriam tão poderosas quanto suas próprias tropas, mas talvez não por muito mais tempo...

    Parte 1:

    A Montanha

    dos Dragões

    O pacto secreto

    Frienia, ano 1815 da segunda era

    Belquecia, a majestosa cidade cercada por muralhas, levantava-se de forma altiva sobre uma colina que dominava a extensão de vários quilômetros a sua volta. Não era possível tentar um ataque surpresa contra ela, pois sua altitude e os escassos acidentes geográficos de todas as terras circundantes faziam com que qualquer exército fosse avistado de todos os pontos do horizonte. Ao leste, e em dias muito claros, era possível ver o rio da Esperança, fronteira natural com Teberion, reino dos orcs. Muito a oeste, longe de ser alcançado inclusive pela extraordinária visão dos elfos, encontrava-se o mar Belquio, e tanto ao norte quanto ao sul se estendiam vales e terrenos planos onde estavam estabelecidas numerosas aldeias e sítios dominados por várias altivas fortalezas da alta nobreza.

    Os formidáveis muros externos de Belquecia fariam os exércitos mais poderosos desistir de tentar um assalto contra tal fortificação, dado que os vastos terrenos que encerravam seus próprios muros incluíam poços, hortos e fazendas que garantiam o autoabastecimento da cidade praticamente de forma indefinida.

    Bem no coração da cidade erguia-se o palácio real de Lorimar, residência habitual da família real de Delfia desde tempos imemoriais. O palácio contava com quatro robustos torreões que se erguiam a grande altura, um em cada canto, rodeados de belos jardins circundados também por uma sólida muralha que era atravessada, no centro de cada lado do quadrado que se formava, por entradas fortemente vigiadas pela valente guarda real.

    O palácio central contava com cinco extensas plantas com vários cômodos. De um dos mais luxuosos deles, Syriel, príncipe herdeiro do trono de Delfia, olhava desconsolado pela janela.

    Sua mãe, Clariel, descendia de uma antiga estirpe élfica, uma das poucas que ainda restavam, segundo os sábios historiadores. Um deles era Baldrich, seu mentor, que era também um dos poucos elfos autênticos que ainda viviam em Delfia.

    Syriel só havia chorado uma vez em seus vinte e três anos de vida, no dia da triste morte de sua mãe por uma longa e dolorosa enfermidade que a consumiu pouco a pouco, quando ele contava apenas seis anos de idade.

    Hoje, os olhos de Syriel voltavam a deixar escapar lágrimas; lágrima de pesar por ver a decadência do reino que sua linhagem vinha por tantos e tantos séculos reinando; lágrimas de saudade de uma época de esplendor em que humanos e elfos viviam em harmonia e, normalmente, em paz, e que só havia conhecido por livros e relatos de seu mestre Baldrich; lágrimas de raiva pelas inúmeras vidas perdidas de forma inútil nas incombatíveis batalhas contra os orcs; e lágrimas de resignação por ver-se obrigado a contrair matrimônio com Lirieth, a herdeira do rei dos orcs, a quem imaginava tão horrível quanto pestilenta.

    Syriel reprimiu a última lágrima quando viu aproximar-se de seu palácio a grande comitiva que escoltava a luxuosa carruagem que trazia sua futura e odiada família política. Tinha se vestido com suas roupas mais elegantes a pedido de seu pai para recebê-los e não sabia o que o oprimia mais: as majestosas, mas pouco confortáveis, roupas ou o desassossego produzido pela união antinatural que o esperava e que o angustiava até o mais profundo de seu ser.

    Syriel prendeu à cintura sua espada élfica, Almafiel, que tanto sangue orc já havia derramado, para entregar-se ao sofrimento do rei orc. Sabia que logo a levantaria contra os sombrios e começava a desejar que a proteção mágica com que os elfos a haviam dotado deixasse de funcionar na próxima batalha para que, assim, encerrasse de uma vez sua triste vida.

    A espada, que era uma das poucas heranças materiais que conservava de seus antepassados élficos, possuía uma beleza sem igual. O brilho de seu aço não havia diminuído com o passar dos anos, nem seu peso leve, que, junto a sua extraordinária dureza, a transformava em uma arma manejável e mortífera. Seu fio era ornamentado com algumas gravações em uma escrita estranha, que formavam umas palavras mágicas em uma língua antiga que nunca ninguém soube dizer a Syriel o que significavam, mas que dotavam a espada de certos poderes mágicos que em mais de uma ocasião haviam salvado a vida de seu dono.

    Mas o que mais chamava a atenção na espada era sua empunhadura, que terminava em uma cabeça de dragão magistralmente esculpida e ornamentada com uma pedra preciosa de cor dourada que se destacava por cima do restante dos elementos da arma. Tratava-se de uma gema de tamanho considerável que uma só mão humana podia cobrir ao empunhá-la. Contaram a Syriel que, no passado, a joia brilhava com luz própria; no entanto, agora só fazia isso ao refletir os raios do sol.

    Desceu as escadarias até o saguão de entrada, colocando-se ao lado de seu pai. Sua esbelta figura de quase dois metros contrastava com a altura mediana e o feitio mais encorpado de seu pai, e sua melena, tão loira quanto comprida, também contradizia a escassez dos cabelos negros do rei. O único atributo em que se refletia a paternidade de Jorion em seu primogênito eram os vivos olhos azuis que ambos tinham; o restante dos traços do príncipe, sem dúvida semiélficos, tinham sido herdados das belas feições de Clariel, sua bondosa mãe.

    A carruagem real dos orcs parou diante da comitiva de boas-vindas. O primeiro a descer foi Gulrath, que saudou com cortesia seus anfitriões. Pouco depois, Syriel viu, com dissimulada exasperação, como Gulrath ajudava a descer da carruagem uma mulher orc de idade indeterminada, de considerável robustez e de uma fisionomia bastante desagradável, que dedicou a ele o sorriso mais espantoso que Syriel jamais pensou que poderia receber.

    Para grande alívio do pretendente real, Gulrath a apresentou como sua esposa, Baldia. De repente, todos ficaram olhando para o príncipe como se esperassem algo dele e Syriel se lembrou de que as normas da cortesia o obrigavam à grande honra de ajudar a princesa a descer de sua carruagem. No entanto, ele não se moveu até que sentiu uma dolorosa cotovelada aplicada por seu próprio pai, mais com desespero do que com dissimulação.

    Ele se aproximou, resignado, da porta e estendeu seu braço, dizendo de forma quase inaudível:

    — Seja bem-vinda, Alteza.

    Uma fina mão, de uma pálida pele de tom ligeiramente esverdeado, pousou sobre seu braço com timidez, mas com firmeza, e uma cálida e bela voz murmurou:

    — Meu agradecimento, príncipe Syriel.

    Um vestido de sedosa brancura envolvia uma figura esbelta que deslumbrou a todos ao descer da carruagem. Seus movimentos eram firmes, apesar de não carecerem de graça.

    Subitamente, o príncipe se surpreendeu ao contemplar um rosto demarcado por exuberantes cabelos negros repletos de cachos e um lindo sorriso que adornava uma proeminente mandíbula de inegáveis traços orcs, mas não carentes de formosura aos olhos de um humano. Nem tampouco o leve tom esverdeado da pele da jovem orc, de idade semelhante à de Syriel, evitou que o príncipe se impressionasse com o exótico atraente da princesa.

    Mas o que de verdade mergulhou Syriel na mais inesperada das surpresas foram os olhos verdes, quase a sua altura, nos quais pôde ler uma viva inteligência e uma excepcional pureza de coração.

    O príncipe tinha herdado de seus ancestrais élficos a capacidade de ler a alma das criaturas de qualquer índole através de seus olhos. Essa qualidade nunca lhe havia falhado e sempre o havia ajudado a se cercar de colaboradores e lideranças de notável valentia, inteligência e infraquejável lealdade. Também o havia ajudado a recusar inúmeras candidatas a se tornarem sua esposa, nas quais havia lido a ambição e falta de bons sentimentos que, por desgraça, caracterizavam cada vez mais a raça humana.

    Ao contrário, nos olhos de Lirieth leu o mais belo que jamais havia observado em outra criatura, exceto pelo pouco que recordava do olhar mágico e bondoso de sua mãe.

    Syriel demorou um pouco para se recuperar da surpresa e ao beijar a mão da princesa, que ao tato lhe pareceu suave e calorosa, também notou uma agradável fragrância de flores frescas e silvestres, não como se ela tivesse aplicado algum perfume, mas como se o aroma surgisse de sua própria essência. Finalmente, Syriel a convidou para conhecer os jardins do palácio, ao que ela aceitou, encantada, com uma mal disfarçada timidez.

    O rei Jorion deu as boas-vindas a seus régios hóspedes e os convidou a entrar em seu palácio, com o que se despediram dos jovens prometidos.

    Era costume dos príncipes presentear uma égua branca da mais pura raça a sua futura esposa no dia do anúncio do compromisso. Portanto, Syriel levou Lirieth às cavalarias para entregar a ela a mais perfeita equina branca que já havia visto. Temia que a égua empinasse com ela, já que só as raças de cavalos mais selvagens eram capazes de suportar a presença dos orcs. No entanto, quando lhe apresentou o animal, notou em seguida que não apenas ele seria capaz de suportar Lirieth, mas também poderia estabelecer com ela uma boa conexão, talvez até como a que ele próprio havia estabelecido com seu leal Noite, um belo puro-sangue, negro como o azeviche.

    — Lirieth, ofereço-lhe esta égua chamada Lua Cheia, que provém das raças mais puras e régias, como presente pelo compromisso que vamos selar. Espero que a aceite e que seja de seu agrado — recitou Syriel, mais com resignado apego à tradição que com entusiasmo.

    Mas a resposta da princesa voltou a encher o humano de assombro.

    — Príncipe Syriel, deixemos de lado a formalidade e sejamos claros. Sei que o senhor se sente na obrigação de sacrificar o resto de sua vida pelo bem de seu povo e o respeito e admiro por isso. Mas quero que saiba que a ideia do matrimônio partiu de mim; eu propus a meu pai esta união e não porque deseje me casar com um belo príncipe humano de cabelos loiros e olhos como o céu celeste, mas porque, caso nossos povos não se unam contra os sombrios, acabaremos todos mortos ou escravos deles. Meu pai pensava em acordar com os senhores uma submissão que não fosse como uma rendição, mas que não deixaria de sê-lo no fim das contas. No entanto, para lutar contra os sombrios de forma efetiva há que se fazer muito mais, pelo menos uns mínimos laços de cumplicidade e até de verdadeira amizade. Algo assim só se pode obter de nossos povos dando um bom exemplo, e isso apenas nós dois podemos fazer.

    Dando alguns segundos para que seu interlocutor assimilasse suas palavras, Lirieth prosseguiu:

    — Assim, eu lhe proponho um trato, um pacto infraquejável, pois a vida de nossos povos depende desesperadamente disso. Acordemos solenemente simular que nossa união é fruto de um amor sincero; só assim seremos capazes de plantar e propagar a semente da amizade e da harmonia entre orcs e humanos — propôs a atrevida princesa, com paixão e uma firme convicção.

    Depois de sorrir de maneira quase imperceptível, ao ver o semblante de profundo assombro que se desenhava no semblante do príncipe, acrescentou:

    — Tenho consciência da aversão que os orcs produzem nos humanos e entendo a dificuldade que pode ter em cumprir com a sua parte. No entanto, sei também que é um príncipe corajoso, bondoso e exemplar para com seu povo e estou convencida de que será capaz de fazer isso, pelo menos de uma forma minimamente convincente. Não posso dar-lhe muito tempo para pensar; esse pacto é apenas entre nós, ninguém mais pode saber. A meu pai só dei a ideia, mas não sabe nada sobre este trato, nem tampouco minha mãe. Temos que convencê-los a eles mais que a qualquer outro de que nosso amor é sincero e real, para que sejam capazes de transmitir com maior força a seus povos bons sentimentos entre as duas raças. Temos que começar a interpretar nosso papel o quanto antes, portanto, deve decidir neste momento se aceita o acordo ou se vai seguir com suas tradições com essa cara de coitado. Se tiver outra ideia melhor para podermos enfrentar os sombrios com boas garantias, eu o escutarei com atenção, do contrário, aceite minha proposta ou acabaremos sucumbindo irremediavelmente diante de nossos inimigos — concluiu a princesa, com um sincero pesar.

    Syriel levou uns segundos para se recompor de tanta surpresa. No entanto, depois de meditar e avaliar a proposta singular da impetuosa princesa, por fim conseguiu responder:

    — Esta manhã quase desejava perder a vida antes de ver meu povo subjugado aos orcs, e de ver-me unido à força a uma mulher orc. Mas suas nobres e sinceras palavras — e pensou também no que havia lido em seus lindos olhos — fazem renascer em mim uma nova esperança. Aceito seu pacto, Lirieth, e juro entregar-lhe minha vida antes de trair este acordo. E não se preocupe, porque saberei interpretar meu papel com total convencimento para todo aquele que o contemple.

    E depois de admirar o belo sorriso que se desenhou no satisfeito rosto da princesa, acrescentou:

    — Entendo, portanto, que aceita esta montaria...

    — É a égua mais bela que já vi. Aceito encantada, príncipe Syriel — agradeceu Lirieth, enquanto dedicava uma amorosa carícia ao animal e um luminoso sorriso a seu prometido. — Também tenho um presente para o senhor... — apontou Lirieth para o príncipe.

    E lhe estendeu sua mão onde, de repente, apareceu uma corrente de ouro com um pingente de tamanho semelhante ao de um punho humano, que carregava um belíssimo e perfeito rubi.

    — É um valioso amuleto que o protegerá da magia negra dos sombrios — explicou — e o inspirará novas forças quando pensar que tudo está perdido. É um colar antiquíssimo, mas eu mesma o encantei. Sou uma poderosa feiticeira; é melhor que saiba o quanto antes se vamos a compartilhar nossas vidas — confessou a princesa, sem poder evitar um leve tom de orgulho.

    — Também é feiticeira? Deixarás algum dia de me surpreender? — perguntou Syriel, um pouco mais animado.

    — Provavelmente não. Sempre terei algo guardado para continuar surpreendendo-o — brincou Lirieth.

    Syriel tomou o amuleto e o colocou no pescoço. Pareceu a ele que tanto o rubi como a pedra da sua espada brilhavam juntas durante um imperceptível instante. E quase sem se dar conta, segurou a mão da princesa e beijou-lhe a palma com delicadeza, agradecendo o precioso presente.

    — E essa cicatriz? — quis saber o príncipe, indicando a palma da mão de sua prometida.

    — Ganhei já faz muito tempo, afiando minha espada — mentiu Lirieth.

    A mentira passou despercebida ao sexto sentido do príncipe, pois a princesa tratou de manter seus olhos fora do alcance dos dele enquanto dizia isso.

    Syriel voltou a olhar nos olhos da princesa.

    — A essa altura já não me estranharia que manejasse uma espada melhor que eu — indicou Syriel com um tom de caro desafio.

    — Que não reste dúvida: quando quiser podemos comprovar — riu a princesa.

    Syriel envolveu Lirieth pela cintura e concluiu:

    — Também é tradição nossa que depois da troca de presentes entre os novos prometidos eles se beijem.

    E, em seguida, uniu seus lábios aos da princesa e desta vez foi ela quem se surpreendeu enquanto pensava que o príncipe já começava a interpretar seu papel muito melhor do que ela esperava.

    A grande aliança

    Frienia, ano 1815 da segunda era

    As duas comitivas reais encontravam-se sentadas nas majestosas mesas da sala de reuniões do rei Jorion.

    A comitiva humana estava abatida e derrotada e ninguém se decidia a dar início ao assunto. Nem sequer o rei Jorion atrevia-se a fazê-lo.

    Foi o rei Gulrath quem, por fim, rompeu o silêncio:

    — Rei Jorion, cavalheiros, não estou aqui para exigir submissão incondicional aos humanos, apesar de estar em condições de fazê-lo diante do resultado da última batalha. Já tivemos muito sangue derramado, sem dúvida inutilmente, em uma contenda de séculos que talvez ninguém nem ao menos se lembre por que iniciou. Talvez tenha sido nós, os orcs, quem a começou; no entanto, agora eram os homens quem não queriam encerrá-la e nos obrigava a continuar com ela, ignorando nossas numerosas propostas de paz. Foi preciso um novo, excessivo e desnecessário derramamento de sangue às portas desta cidade para fazê-los compreender a falta de razão dessa guerra vã.

    Após uma breve pausa para reforçar a atenção dos presentes, o rei orc continuou:

    — Uma subjugação humilhante ao reino humano não faria mais que avivar ódios e conduzir a luta aberta a um conflito de guerrilhas e resistência. E eu, como rei dos orcs, não desejo isso nem anseio eliminar da face da terra todo vestígio de vida humana, como sustentam muitos dos aqui presentes. O que desejo é uma paz sólida e duradoura, iniciar uma convivência com os humanos, como em outros tempos conviveram elfos e homens. O que pretendo é iniciar uma aliança entre nossos reinos, capaz de fazer com que os sombrios vejam que ou eles ficam nos limites de seu reino, ou serão derrotados por um exército unido pela confiança e até pela amizade de homens e orcs, de orcs e homens. É por isso que ofereço a mão de minha adorada filha ao valente príncipe de Delfia, como símbolo e exemplo de uma próspera coalizão de igual para igual entre nossos povos. Esta união será o selo da aliança que vamos firmar sem desavenças, sem vencedores, sem vencidos, sem olhar para o horrível passado e olhando para o esperançoso futuro.

    Com essas palavras, e depois de meditar brevemente sobre elas, o rei Jorion levantou-se, dizendo:

    — Rei Gulrath, rainha Baldia, cavalheiros, se as palavras que acabamos de escutar tivessem vindo de outro rei, seja orc ou humano, não teria acreditado, mas vindo do rei que sempre demonstrou de sobra sua honra, nobreza e sinceridade com feitos por todos conhecidos, não posso mais que abraçar uma renovada esperança e agradecer ao rei Gulrath a generosidade e a verdade que expressam suas palavras. E aceitamos de bom grado a aliança que nos oferece, e nos honra acolher em

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