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Coroa de Poder
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E-book467 páginas7 horas

Coroa de Poder

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Sobre este e-book

Uma história dinâmica e fascinante sobre as tribos e os deuses antigos eslavos

Território da atual República Tcheca. Fim do século VII - início do século VIII.

O príncipe Tcheh e sua numerosa tribo deixam o território em que já estavam assentados há muito tempo e partem em busca de uma nova terra. Rjíp é escolhida como a capital do novo reino, que foi batizado de Tchéquia. De Rjíp, Tcheh governa as suas terras e os destinos de seus habitantes.     

O jovem Krok e sua família decidem ir embora de Rjíp e assentar-se em terras mais livres. Eles encontram o lugar perfeito, não muito longe de um córrego. Um dia, Krok conhece a bela Medulina na floresta, sem nem imaginar que ela é um espírito da floresta. O amor floresce entre eles. Os pais de Medulina, o deus da floresta Bor e a deusa da fertilidade Didilia, abençoam a união. O jovem casal tem três filhas: Kazi, Teta e Libushe. Medulina já sabe o destino de suas filhas. Porém, ela não tem como mudá-lo, afinal, os fios do destino foram tecidos pelas irmãs divinas sudenitsas.   

O tempo passa e Krok se torna o líder de Budech. O forasteiro príncipe Ladvik chega nas florestas com sua tribo, que haviam deixado sua terra natal após serem atacados pelas tribos saxãs. Ladvik é forte, astuto e adorador do deus Veles. Veles favorece o seu fiel adorador de todas as formas. Ladvik e seus guerreiros destroem as terras fronteiriças dos tchecos e dos lucanos. Krok decide unir-se ao príncipe lucano Radoslav para poderem lutar contra ele. Seus esforços conjuntos ajudam a fazer com que consigam resistir. Depois de uma derrota arrasadora, Ladvik foge para a floresta, onde, em forma de urso, servirá  o próprio Veles. Mas o deus não fica nada feliz com Krok e Radoslav atrapalhando seus planos. Ele planeja se vingar e encontra um aliado em Chernobog.

Medulina tenta proteger sua família da ira de Veles e salva o marido de uma morte certa. Os esforços conjuntos de Bor e Didilia ajudam a combater os poderes complexos de Veles e Chernobog e eles cessam os ataques por algum tempo. Mas Veles, seja como for, está disposto a fazer com que a família de Krok pague pelo que fizeram e, para começar, usa sua filha mais velha, Kazi. Para tal, Veles atrai Libor, o filho de Ladvik. Libushe e Medulina estão dispostas a proteger Kazi, mas é em vão. Da união de Kazi e Libor nasce um menino, que está destinado a servir Veles. Medulina pega o neto recém-nascido e vai embora com ele do mundo dos homens. Krok sofre muito com o desaparecimento da esposa. Teta e Libushe tentam ajudar Kazi de todas as formas e, logo depois, ela se casa com Radoslav. No casamento da irmã, Libushe começa a ter visões, onde prevê que o jovem morrerá durante a caça…

IdiomaPortuguês
EditoraBadPress
Data de lançamento2 de dez. de 2019
ISBN9781386854579
Coroa de Poder
Autor

Olga Kryuchkova

Olga Kryuchkova began her creative career in 2006. During this time, the author had more than 100 publications and reprints (historical novels, historical adventures, esotericism, art therapy, fantasy). A number of novels were co-written with Elena Kryuchkova.

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    Coroa de Poder - Olga Kryuchkova

    OLGA KRYUCHKOVA

    COROA DE PODER

    ––––––––

    Prólogo

    Território da atual República Tcheca. Fim do século VII - início do século VIII.

    O príncipe Tcheh e sua numerosa tribo deixam o território em que já estavam assentados há muito tempo e partem em busca de uma nova terra. Rjíp é escolhida como a capital do novo reino, que foi batizado de Tchéquia. De Rjíp, Tcheh governa as suas terras e os destinos de seus habitantes. 

    O jovem Krok e sua família decidem ir embora de Rjíp e assentar-se em terras mais livres. Eles encontram o lugar perfeito, não muito longe de um córrego. Um dia, Krok conhece a bela Medulina na floresta, sem nem imaginar que ela é um espírito da floresta. O amor floresce entre eles. Os pais de Medulina, o deus da floresta Bor e a deusa da fertilidade Didilia, abençoam a união. O jovem casal tem três filhas: Kazi, Teta e Libushe. Medulina já sabe o destino de suas filhas. Porém, ela não tem como mudá-lo, afinal, os fios do destino foram tecidos pelas irmãs divinas sudenitsas

    O tempo passa e Krok se torna o líder de Budech. O forasteiro príncipe Ladvik chega nas florestas com sua tribo, que haviam deixado sua terra natal após serem atacados pelas tribos saxãs. Ladvik é forte, astuto e adorador do deus Veles. Veles favorece o seu fiel adorador de todas as formas. Ladvik e seus guerreiros destroem as terras fronteiriças dos tchecos e dos lucanos. Krok decide unir-se ao príncipe lucano Radoslav para poderem lutar contra ele. Seus esforços conjuntos ajudam a fazer com que consigam resistir. Depois de uma derrota arrasadora, Ladvik foge para a floresta, onde, em forma de urso, servirá  o próprio Veles. Mas o deus não fica nada feliz com Krok e Radoslav atrapalhando seus planos. Ele planeja se vingar e encontra um aliado em Chernobog. 

    Medulina tenta proteger sua família da ira de Veles e salva o marido de uma morte certa. Os esforços conjuntos de Bor e Didilia ajudam a combater os poderes complexos de Veles e Chernobog e eles cessam os ataques por algum tempo. Mas Veles, seja como for, está disposto a fazer com que a família de Krok pague pelo que fizeram e, para começar, usa sua filha mais velha, Kazi. Para tal, Veles atrai Libor, o filho de Ladvik. Libushe e Medulina estão dispostas a proteger Kazi, mas é em vão. Da união de Kazi e Libor nasce um menino, que está destinado a servir Veles. Medulina pega o neto recém-nascido e vai embora com ele do mundo dos homens. Krok sofre muito com o desaparecimento da esposa. Teta e Libushe tentam ajudar Kazi de todas as formas e, logo depois, ela se casa com Radoslav. No casamento da irmã, Libushe começa a ter visões, onde prevê que o jovem morrerá durante a caça...

    Capítulo 1

    Tchéquia. Final do século VII — início do século VIII.

    No território da atual Croácia, viviam muitas tribos parecidas na língua, nas tradições, no estilo de vida e nos costumes. Elas se espalharam e passaram a disputar a propriedade das terras, florestas e rios. E assim começou uma guerra sangrenta entre as tribos irmãs, que tirou a vida de muitas pessoas. 

    Então, dois irmãos, Tcheh e Leh, decidiram deixar sua terra natal para fundar seu próprio reino, com a intenção de levar seu povo para novas terras, onde poderiam trabalhar e viver em paz. 

    Tcheh e Leh chamaram sua tribo e informaram suas intenções. Depois, rezaram aos deuses e ofereceram generosos sacrifícios. Os deuses sinalizaram que  Tcheh e Leh deveriam conduzir a tribo em direção ao oeste, para terras desconhecidas. Eles não levaram consigo só pessoas, mas também cavalos, vacas e ovelhas. E assim, a tribo cruzou o rio Oder e seguiu seu caminho. 

    Muitas famílias estavam reunidas em clãs, liderados por um ancião. Assim, foi clã atrás de clã, família atrás de família. E todos acreditavam em Tcheh e Leh, estavam crentes que encontrariam uma nova terra.

    À frente dos clãs, iam jovens guerreiros que atuavam como protetores e vigias. Em seguida, a cavalo, estavam os líderes Tcheh e Leh, rodeados por pessoas de confiança e anciões. Mais atrás, em carroças, estavam as famílias com seus pertences. Atrás deles, seguiam-se os cavalos e os rebanhos de gado doméstico. Esse grande grupo terminava com guerreiros, que faziam a proteção. Pelo fato das terras por onde viajam serem desconhecidas, havia o risco deles serem atacados pelas tribos que viviam nelas. Mas as florestas e campos por onde passaram eram quase inabitados e as pessoas que moravam nestas terras falavam línguas conhecidas. E assim continuaram até o rio Laba. Após cruzarem suas águas, não encontram mais nenhum povoado. 

    A jornada pelas novas terras foi difícil. Passaram por vegetações impenetráveis e  pântanos infestados de cobras e mosquitos. Leh se separou do irmão e resolveu se assentar com os seus clãs nestas novas terras, que o atraíram. Tcheh seguiu adiante. 

    A tribo passou por florestas até que, finalmente, chegaram ao rio Moldava. Após cruzarem suas águas, começaram a se queixar que estavam viajando dia e noite, sem descansar, o que acontecia por causa dos animais selvagens que incomodavam as pessoas durante a noite. 

    Tcheh então compreendeu que a paciência e a força de seu povo já estava no limite. Finalmente, a tribo chegou a uma montanha alta chamada Rjíp e pararam para descansar próximo ao pé da montanha. Pela manhã, o comandante a escalou e analisou atentamente seus arredores. 

    Ele viu no horizonte o azul das montanhas. Um vale fértil e pitoresco espalhava-se por elas, cortado por rios brilhantes como prata. Tcheh ficou muito feliz por finalmente ter encontrado uma terra onde poderia se assentar com sua tribo. Ele desceu a montanha e informou às pessoas de sua decisão. 

    No dia seguinte, Tcheh, seus homens de confiança e os anciões foram inspecionar o vale. Eles encontraram relvas vistosas e rios cheios de peixes. 

    Ao voltarem à montanha Rjíp, Tcheh e os anciões contaram ao resto da tribo que as terras em que estavam eram boas para se viver, criar animais e para o cultivo. Tcheh então disse:

    — Nós encontramos a terra onde nós e nossos animais vamos viver. Ela é fértil e repleta de mel, rica em animais, pássaros e peixes, não faltará nada a ninguém. Só que essa terra não tem nome... 

    Então, os membros da tribo gritaram:

    — Vamos batizá-la com o seu nome! A nossa terra se chamará Tchéquia e nós, seus filhos, seremos os tchéquios!

    O líder ficou comovido, ajoelhou-se e beijou a terra prometida. Depois, levantou-se e com os braços estendidos, falou: 

    — Eu te saúdo, terra presenteada pelos deuses! Mantenha-nos sãos, salvos e que nosso povo se multiplique de geração a geração, agora e sempre! 

    A pedido de Tcheh, templos dedicados aos deuses foram erguidos perto da montanha de Rjíp e os tchéquios organizaram ritos generosos aos deuses, que se alegraram com todos eles, sejam os pequenos ou os grandes. 

    Depois das festividades, chega a hora de trabalhar duro. Era necessário cultivar na terra. Para tal, os tchéquios cortaram e queimaram madeira, removeram os tocos de árvore, assim eles teriam uma terra fértil e pronta para o cultivo. Construíram suas casas, pequenos burdeis cobertos de feno. E cada família procurou-se instalar somente na terra dada por Tcheh.

    Todo ano, a terra produzia colheitas abundantes, as abelhas zumbiam nos bosques de tílias, os peixes nadavam nos rios, o gado doméstico se multiplicou, os tchéquios enriqueceram. E por ordem do agora príncipe Tcheh, eles ergueram sua capital na montanha Rjíp. Cada clã tinha um ancião como seu líder, ele lia as preces aos deuses, agia como juiz, distribuía as tarefas entre os membros e coletava os impostos para o tesouro real. 

    As mulheres se ocupavam das tarefas domésticas, pariam filhos belos e saudáveis, e os homens cuidavam do gado, da terra, caçavam e pescavam. Os povoados eram populosos e movimentados. Podia-se ouvir o som suave de uma flauta nos prados onde o gado pastava, e nos campos onde havia pessoas trabalhando, cantavam-se canções. Mas, ao meio-dia, tudo ficava quieto, pois era a hora dos espíritos do meio-dia, as poludenitsas, que tinham a forma de donzelas vestidas com roupas brancas, que caminhavam pelos campos e prados, em direção às casas das pessoas. Elas assustavam as crianças, pois no verão podiam causar insolação e roubá-las, se estivessem sozinhas nos campos.  As poludenitsas adoravam dançar e se vissem alguma garota a essa hora no campo, elas a colocavam para dançar até que a pobre ficasse com as pernas bambas. Mas se a garota aguentasse, ela ganhava um generoso dote das poludenitsas

    Os tchéquios tinham medo dos yazinok, que colocavam as pessoas para dormir e extraíam os seus olhos. Também temiam as almas penadas, que apareciam como luzes azuis nos pântanos. Eles achavam que nos rios viviam os vodyanoy, espíritos da água e suas ajudantes, as sereias. 

    Mas os tchéquios também acreditavam que sua terra era protegida pelos espíritos de seus ancestrais. Suas imagens esculpidas em madeira eram colocadas próximas a lareira, que acreditavam ser um lugar sagrado. O domovoy, o espírito da casa, também protegia a casa de qualquer infortúnio. 

    Os anos passaram e a tribo do tchéquios cresceu. Depois do solstício do verão, chegava a hora da colheita, seguida do outono frio e então, vinha o inverno. A glória dos tchéquios estendeu-se às suas casas ancestrais, o que atraiu mais migrantes. Os tchéquios cresciam cada vez mais e se assentavam cada vez mais longe de Rjíp. Fundavam novos povoados, construíam novas cidades, que eram cercadas por muros reforçados ou barricadas, com portões e torres de vigilância. A ordem reinava, ninguém precisava trancar suas casas e seus estábulos. 

    Tcheh foi um governante justo por muito tempo, o povo o reconhecia como seu príncipe e pai fundador. Os tchéquios viviam em harmonia, alimentavam-se dos frutos de seu trabalho,  não cobiçavam o que era do outro. Dia após dia,  a tribo crescia e enriquecia cada vez mais.

    O jovem Krok e sua família foram embora de  Rjíp em direção à terras livres. Sua jornada foi longa até encontrarem sua nova casa. No primeiro ano, eles construíram uma pequena cabana, onde viviam apertados, mas em harmonia. No primeiro inverno, Krok conseguiu caçar um lobo e fez um manto quente de sua pele. No ano seguinte, o pai, a mãe e a irmã mais nova, Milada, ficaram na casa antiga, enquanto os filhos mais velhos, Krok e Borruslav, construíram uma nova para cada um. 

    Krok adorava caçar, por isso construiu a sua cabana bem na floresta. Ele caçava e pescava para toda a família, pois na floresta havia muita abundância. Borruslav e Krok construíram um pequeno fumeiro para preparar as carnes e os peixes. Para defumar, usavam lascas de madeira de zimbro e cones de abeto.

    O pai e os filhos limparam a terra e começaram a semear. Pouco tempo depois, tiveram sua primeira colheita farta. E assim iam vivendo. 

    Um dia, no meio do verão, Krok partiu para a floresta em busca de mel. Ele já havia notado, há algum tempo, qual era o buraco da árvore onde as abelhas pousavam. Mas não conseguiu chegar perto, pois da árvore saiu uma bela jovem, que vestia uma longa túnica branca com um cinto de vime. Os cabelos da garota eram da cor do mel e iam até a cintura. Ela segurava uma cesta de flores. A desconhecida olhou para Krok com seus olhos azuis celestes e perguntou:

    — Você sabia que os espíritos do mel vivem na floresta?  

    Inconscientemente, Krok levantou sua mão direita na direção da bela garota. Ele pensou: Eu vou tocar nela e ela desaparecerá no ar, como a névoa da manhã. Como ela é bonita! Em Rjíp e nos arredores você não encontra alguém assim!

    A jovem não se assustou, nem  recuou. Enquanto isso, Krok, sem pensar, aproximou-se da desconhecida, tocando em seus cabelos.

    — São da cor do mel... — ele sussurrou. Ela cheirava a flores e mel.

    — Você não respondeu a minha pergunta... — A garota insistiu.

    — Sim... Eu já ouvi falar dos espíritos do mel. Eles vivem na floresta. Antigamente, a minha tribo fazia oferendas à Medulina, as meninas deixavam tigelas cheias de mel na floresta. Elas diziam: Este mel é para você, Medulina, sirva-se. Depois, traga do céu para nós.. Todos sabem que o mel cai do céu nas flores, que vem do paraíso. E que são as abelhas que o colhem.

    Krok se calou e ficou imóvel, sem desviar o olhar da bela jovem. Ela sorriu e surgiram covinhas fofas em suas bochechas brancas. Sem pensar, ele deu um passo à frente e trouxe a garota para si. Alguma força irresistível a atraía para ele. 

    — Ei! — a garota o alertou.

    — Não tenha medo, não vou te machucar... — Krok disse calmamente. —  Não podemos machucar garotas bonitas...

    A desconhecida sorriu. Krok não se aguentou e beijou os lábios dela. Mas ela não recuou e respondeu ao beijo. Krok sentiu um leve gosto de mel em sua boca. 

    — Quem é você? Qual o seu nome? Por que está sozinha na floresta? — Finalmente, ele respirou, se afastando dos lábios doces dela.

    — Eu vivo aqui... — a garota simplesmente respondeu.  — Meu nome é Medulina e o meu pai é Bor, o senhor da floresta. 

    Krok começou a rir, não acreditando na jovem.

    — Você está brincando, não é?! Se o seu pai é Bor, então, você, Medulina, é um espírito da floresta!

    A garota meneou a cabeça, concordando.

    — Isso mesmo... — Ela confirmou calmamente. — Eu vim aqui buscar mel, afinal, as medulinas amam mel.

    Krok ficou imóvel e sentiu um frio da espinha.

    — O que te assustou? — Medulina perguntou, divertida, escondendo-se atrás da árvore.  — Você não quer mais beijar a filha de Bor? 

    — Eu quero te beijar pelo resto da minha vida,  — ele confessou. Medulina riu.  — E como saber se você é mesmo um espírito? Você parece uma garota normal, só que muito bonita...

    Medulina riu.

    — Nós somos todas assim... — ela deu de ombros. — A nossa mãe é Didilia, a deusa da fertilidade, e ela também sempre foi muito bela...

    Krok, finalmente, voltou a si e começou a rir.

    — Você está brincando! Fala logo, o seu povoado fica muito longe daqui?

    Medulina suspirou, vendo que o jovem não acreditava nela. Ela habilmente subiu na árvore, indo em direção ao buraco e colocou seu braço lá dentro.

    Krok fechou os olhos, achando que um enxame de abelhas sairia do buraco e que elas comeriam viva a jovem, não deixando nem rastro dela.

    Mas ela tirou um favo de mel do buraco e começou, com muito gosto, a chupar vagarosamente o mel dele. 

    —Então é verdade, você é mesmo Medulina?

    — Aham... — a bela jovem assentiu, dando um sorrisinho.

    Em seguida, ela enfiou o braço no buraco mais uma vez, pegou outro favo de mel de dentro dele e o ofereceu a Krok.

    — Pegue. O mel desse buraco é excelente, um pouco amargo... 

    Um Krok muito pasmo aceitou o presente, mas não ousou saboreá-lo.

    — E vocês podem se casar? — Ele perguntou e se assustou por isso.

    A jovem lambeu os lábios e respondeu:

    — Sim, só temos que pedir permissão aos nossos pais.

    Por dentro, era como se Krok estivesse queimando.

    Medulina desceu da árvore, seu braço direito estava pegajoso, todo coberto de mel. Ela o limpou na barra da camisa. 

    — Case-se comigo... — Krok pediu.

    Medulina riu alto.

    — Nossa, como você é rápido! Nós mal nos conhecemos e você já quer casar!

    — Eu te amo! — Krok confessou.

    — E não te assusta o fato de eu ser a filha do senhor da floresta? Se você me machucar, vai atrair a ira dele... — ela falou.

    Krok fez que não com a cabeça.

    — Não vou machucar, mas amar, nós vamos ter muitos filhos...

    Ela voltou a rir.

    — Confesso que tinha reparado em você na primavera passada, assim que a sua família chegou a essas terras.

    — E então? — ele perguntou, determinado. — Aceita se casar comigo?

    Medulina olhou para Krok com os seus olhos da cor do céu azul.

    — Aceito... — ela sussurrou. — Só que você precisa pedir a benção de seus pais. Quando o fizer, ao pôr-do-sol, vá até o velho carvalho que fica na clareira aqui perto. 

    Krok sabia muito bem que carvalho era esse. Em dias quentes, ele costumava descansar à sua sombra. Ele achava que aquele carvalho antigo, enorme e largo continha alguma força oculta, era como se a árvore fosse um elo entre o mundo dos homens e o mundo dos deuses, como se fosse a personificação da Árvore da Vida. 

    Krok gostava de ouvir o farfalhar de suas folhas, fechava os olhos e era como se numerosas vozes femininas sussurrassem para ele:

    — Krok, você está cansado, descanse... Feche os olhos, durma um pouquinho... Nós vamos cuidar de você.

    Ele não sabia que essas eram as vozes das lesavkas, espíritos que habitavam as folhas e eram parentes dos lechies, espíritos da floresta. Às vezes, o farfalhar das folhas e os sussurros misteriosos faziam o jovem adormecer e ele via uma cidade envolta por uma parede de madeira maciça, que era muito populosa. No meio dela, havia um terem[1] de madeira  e dele saiu um homem corpulento, que vestia botas de pano, calças novinhas e uma camisa branca feita de linho.

    Krok tentou olhar para o rosto dele e viu a si mesmo, mas já grisalho e com uma barba até o peito. E a vida acontecia ao seu redor. Todos na cidade, e os idosos, e os jovens ocupavam-se de seus assuntos. Ele viu três belas jovens que estavam mais afastadas e cantavam alguma coisa. Em seguida, Krok, como sempre, acordou e não viu a continuação do sonho. Só lhe restou uma sensação de algo por revelar, o que agitava sua imaginação. 

    O jovem teve a certeza de que os deuses estavam lhe preparando para algo importante e que na hora certa, eles dariam um sinal e ele faria o que tivesse que fazer.

    Naquele mesmo dia, depois de seu encontro com Medulina na floresta, Krok foi até a casa dos pais. Seu pai estava cortando a lenha, enquanto sua mãe preparava ukha[2] ao ar livre, Milada pintava perto do riacho e Borruslav trabalhava no campo. 

    Krok cumprimentou seus pais com uma reverência e lhes desejou boa saúde. 

    — A ukha ficará pronta logo... — a mãe falou. — Você vai querer, filho?

    — Obrigado... — ele respondeu e em seguida falou, sem rodeios: — Eu vim aqui a negócios, quero me casar...

    O pai congelou com o machado na mão. A mãe esqueceu completamente da ukha.

    — E onde foi que você achou uma noiva? — o pai ficou realmente surpreso. — Afinal, só tem mato e animais selvagens por aqui!

    — Achei na floresta — Krok respondeu. — Ela é Medulina, a filha do senhor da floresta, Bor, e da deusa Didilia.

    A mãe deu um suspiro e sentou-se perto da panela com a sopa fervente. O pai rapidamente colocou o machado no toco de lenha que estava cortando. 

    — Parece que você resolveu brincar com a nossa cara... — o pai disse incerto e tentou conter um sorriso.

    — Eu vim pedir a benção de vocês. A Medulina falou que isso é imprescindível. Depois, nós vamos nos encontrar no velho carvalho que fica perto da clareira... 

    O pai calou-se por um momento. A mãe sentou-se no chão com a colher de pau na mão.

    — Por que estão quietos? Vocês vão dar a benção ou não?

    O pai enxugou o suor da testa com as costas da mão.

    — Você deve estar doente... Que pressa é essa! Você ainda é jovem, impulsivo! Pense bem, não é melhor casar com uma garota normal do que com um espírito da floresta? Como terão filhos? 

    — Nós vamos ter filhos! — Krok respondeu, cheio de certeza.

    — Pensa bem, filho — a mãe começou — e se não der certo e Bor se voltar contra você, o que fará?

    — Eu não vou despertar sua ira! — Krok disse. — Mas se vocês vissem como ela é! - ele disse empolgado.

    — Bom, você já é crescido, tem dezesseis anos, está mesmo na hora de casar... — o pai concordou. — O que você acha disso, esposa?

    — Tenho medo... — ela admitiu.

    — Eu também — o marido falou. — Nós vamos ser parentes dos deuses e dos espíritos! Nunca houve algo do tipo na nossa família!

    Ao pôr-do-sol, vestindo suas melhores roupas, a família partiu em direção ao velho carvalho. Krok foi na frente de todos, seguido por Milada. A menina de oito anos estava empolgada com o fato de que seu irmão mais velho iria casar com Medulina.

    Quando soube da notícia, ela ficou imóvel e bateu palmas.

    — Eu quero me casar! Não com um homem normal, mas com um espírito da floresta!

    — Nem pensar! — a mãe disse, indignada.  — Já basta o Krok que resolveu se casar com um espírito do mel! 

    — Não brigue, esposa! É difícil viver nessa selva sem a ajuda das forças superiores... — o marido refletiu.

    — Mas nós vivemos! — ela respondeu.

    — E vamos viver ainda melhor! —  Krok disse, endireitando os ombros, cheio de convicção..

    Borruslav, que reagiu tranquilamente ao casamento do irmão mais velho, resumiu-se a dizer:

    — Vamos ver essa bela feiticeira da floresta!

    E diante da família, abria-se uma grande clareira. No meio dela, estava o carvalho com seus galhos apontando para o céu. Os raios do sol que se punha deixavam as folhas com um tom rosa pálido e faziam com que a árvore transmitisse um ar de mistério, como se ela fosse uma ponte que ligava o mundo dos humanos e o mundo dos deuses.

    A família aproximou-se da árvore e formou um semi-círculo perto dela. Mas nem Medulina, nem seus pais divinos estavam lá. O pai lançou um olhar preocupado a Krok: Você tem certeza que chegamos na hora? Será que ela não estava te pregando uma peça?

    Krok deu um passo à frente, ajoelhou-se diante da árvore sagrada e disse, com determinação: 

    — Bor, deus da floresta, e linda deusa Didilia! Eu sou Krok, filho de um mortal, peço a permissão de vocês para casar com a sua filha Medulina! Prometo amá-la, protegê-la e ser uma fonte de apoio e esperança!

    O tronco do carvalho foi envolto por luz. Krok e sua família tiveram que fechar os olhos, pois ela era muito forte. Ao abri-los, eles viram diante deles um homem de barba grisalha, vestindo uma longa túnica bordada, segurando em sua mão direita um cajado longo. Aos seus pés, havia filhotes de coelho, raposa, lobo e ursos, além de pássaros pousados em seus ombros. Sem dúvida, era o deus Bor, o senhor da floresta. 

    Ao seu lado, havia uma linda mulher grávida, Didilia. Seus cabelos e a barra de seu vestido estavam enfeitados com flores. 

    — Minha filha se apaixonou por você assim que o viu — Bor disse, com um tom paternal. Nesse momento, todos os medos de Krok e sua família desapareceram.

    — Levante-se, Krok! — falou a doce voz de Didilia. — Medulina é a minha filha amada. Mas eu tenho certeza de que você não quebrará sua promessa. Eu vou sempre apoiar vocês, lhes darei filhos lindos, alegria e prosperidade para o seu lar. 

    Krok e sua família fizeram uma reverência aos deuses.

    E então, Medulina saiu do carvalho. Uma coroa de flores brancas enfeitava seus cabelos cor de mel. Todos estavam fascinados, como ela estava linda!

    O pai de Krok perdeu tempo, foi até a jovem, pegou sua mão e disse: 

    — Seja bem-vinda à nossa família, vou te amar como se fosse minha filha. 

    Medulina respondeu:

    — E eu ao senhor, como se fosse meu pai...

    Krok conduziu Medulina até sua mãe, depois até Borruslav e, por fim, Milada. Eles também prometeram amá-la como se fossem do mesmo sangue.

    — Agora, vamos celebrar o casamento de Krok e Medulina! — Bor disse em voz alta, bateu três vezes o seu cajado na terra e na mesma hora podia-se ouvir uma canção, berrantes e flautas tocando; fogueiras apareceram na clareira. Ao redor delas, havia cirandas de espíritos da floresta.

    Bereguinias[3] trouxeram xícaras de mel e lúpulo para o jovem casal e suas famílias. Krok e Medulina brindaram olhando nos olhos um do outro. Em seguida, uma das bereguinias juntou suas mãos direitas e as envolveu em uma guirlanda de flores frescas. A festa de casamento continuou ao redor do carvalho até o amanhecer... 

    Três vilas[4] cercaram Borruslav e ele passou a noite toda na companhia delas. Os pais de Krok e Medulina sentaram-se embaixo do velho carvalho. Perto da fogueira, Milada ouvia as histórias do velho lechie, ele estava contando como os humanos surgiram na terra:

    Foi há muito tempo. Foi quando a Árvore da Vida cresceu e uniu os três mundos: Prav, o mundo dos deuses, Yav, o dos humanos, e Nav, o dos espíritos. Svarog, o deus-ferreiro e protetor do fogo divino, e Lada, a deusa do amor e da fertilidade, povoaram o Yav com diversas criaturas, pássaros e peixes. As árvores, as flores e a grama cresceram. Svarog e Lada foram para a clareira da floresta e começaram a jogar pedras no chão por cima do ombro. A Mãe Terra molhou essas pedrinhas com o seu orvalho e, em seguida, elas se transformaram nos humanos. As pedras jogadas por Svarog deram origem aos homens, enquanto aquelas jogadas por Lada, às mulheres.

    Mas eles acharam que surgiram poucas pessoas destas pedras. Então, Lada pegou dois gravetos e começou a esfregá-los um contra o outro. Deles, saíram faíscas divinas, das quais nasceram mais pessoas. E assim, Svarog e Lada povoaram a Terra com humanos. E eles legaram às pessoas as leis que regeriam suas vidas, que estavam inscritas na pedra de Alatyr. E as irmãs sudenitsas[5] fiaram os fios da vida...

    As sudenitsas fiaram em palácios celestiais e previram que o jovem casal teria três filhas: Kazi, a mais velha, Teta, a do meio, e Libushe, a mais nova e mais amada. 

    Didilia cumpriu sua promessa: ajudou a jovem família a encontrar harmonia e prosperidade. Um pouco depois do casamento, apareceu mais uma família na floresta e depois, mais duas, e seis meses depois, mais três... E passaram a aparecer mais e mais pessoas se assentando próximo ao povoado fundado pela família de Krok. 

    O pai de Krok deu um pequeno sorriso. Ele sabia bem, isso era assunto de Bor e Didilia. As pessoas vinham, pediam permissão para construir suas casas na área e, depois, ajuda para limpar a terra para cultivo. 

    A família de Krok acolhia todos os trabalhadores. E era tudo muito fácil: a colheita era colhida da terra fértil, peixes eram pescados sem limites e os animais sempre caíam nas armadilhas. E havia mel, cogumelos e frutas em abundância, ninguém ficava sem. 

    Os habitantes do povoado não  se esqueciam de adorar os deuses: Perun, o deus do raio, Jivá, a deusa da força vital, e Svarog, o deus ferreiro, senhor do fogo celestial. Templos foram construídos pelo povoado, para que assim as pessoas pudessem rezar e fazer as devidas oferendas a eles. 

    Mas a desgraça chegou sem avisar. No início da primavera, a casa dos pais de Krok queimou até virar cinzas. Aconteceu durante a noite, eles estavam dormindo e não viram as chamas consumirem tudo. Quando Krok acordou (nesta época, Medulina estava grávida da segunda filha), a casa de seus pais ardia feito uma tocha. Seu irmão Borruslav não morava mais lá, pois também havia se casado. Os irmãos partiram em busca de ajuda, queriam tirar seus pais das chamas (nesta noite, Milada estava dormindo na casa de Krok), mas as vigas do teto ruíram, enterrando seus pais na casa para todo o sempre. Borruslav e Krok ficaram arrasados. Um tempo depois, eles escavaram a terra de onde ficava a casa e colocaram uma pedra em memória de seus pais. 

    Cinco anos depois do incêndio, o povoado havia se expandido, e acharam ser necessário ter alguém que governaria pela consciência e pelas leis dadas pelo príncipe Tcheh. Os habitantes se reuniram e elegeram Krok como seu líder. Ele era muito jovem, mas os anos o fizeram inteligente, forte e justo, além de ser casado com uma bela esposa, ter três filhas e uma boa propriedade. Ele acolhia todos, tinha sempre uma palavra amiga para quem precisasse e dava apoio àqueles que passavam por dificuldades.

    Desde então, a cada ano o povoado se expandia mais e enriquecia. E lhe deram o nome de Budech[6]. Em respeito a Bor e Didilia, Krok ergueu um templo perto do velho carvalho. 

    Ele entalhou um Bor de madeira, com a barba longa, o cajado na mão e os filhotes de coelho, raposa e urso aos seu pés. Ao seu lado, ele colocou uma bela Didilia de madeira. No verão, as moças enfeitaram sua estátua com coroas de flores.

    Perto dos ídolos, Krok colocou uma pedra achatada, que serviria de altar, e construiu uma paliçada baixa em volta do templo e do carvalho. E começou a adorar seus novos parentes, mostrando todo o respeito. 

    Os habitantes do povoado se reuniam frequentemente em volta do carvalho. Regavam a pedra do altar com leite, traziam comida caseira aos deuses e pediam que a floresta estivesse sempre repleta de frutas, mel e caça, que o rio sempre estivesse cheio de peixes e que o centeio crescesse e amadurecesse sempre dentro do tempo. 

    Os deuses escutavam as preces dos habitantes de Budech. A história do sacerdote Krok e sua bela esposa Medulina, filha de Bor, o senhor da floresta, se espalhava. E chegaram ao povoado mercadores vendendo as mais diversas mercadorias. E logo depois, jovens ansiosos por ofertarem suas habilidades com a espada, e assim, Krok conseguiu seu próprio exército. E ele foi reconhecido como líder até mesmo em Rjip, que era governada por Tcheh. E Krok fazia tudo que era exigido pelo príncipe, inclusive enviando os impostos estabelecidos por ele.

    E Tcheh escreveu um pergaminho rúnico, onde ficava decidido que ele passava o poder sobre Budech e adjacências para o líder Krok, além de desejar que as terras do jovem comandante florescessem e seus povoados se multiplicassem. Tcheh selou o pergaminho com o seu selo real e o enviou a Budech. Assim, Krok se tornou um líder de plenos poderes.

    Logo, a cidade de Budech cresceu ainda mais. E ao seu redor havia pequenos povoados, onde viviam o exército e inúmeros artesãos. Nestas terras haviam muitos caçadores, mas eles preferiam viver na floresta, pois era mais prático para caçar. Eles traziam sua caça para Budech e a vendiam. 

    Os lavradores se estabeleceram um pouco além. No começo, construíam casas simples, mas após algumas colheitas vendidas, podiam se permitir ter uma casa de madeira.

    Krok estava satisfeito com a sua vida, mas não esqueceu do que o príncipe Tcheh havia dito e aos poucos foi dominando as terras locais, cada vez mais se afastando das suas. Naquele tempo, as terras de Krok já faziam fronteira com as terras do príncipe Ladvik. 

    O príncipe Ladvik e sua tribo de milcenos tiveram que abandonar sua terra que estava sob o ataque dos saxões e dos migrantes sérvios. Era uma terra de colinas íngremes e de lagos e águas calmas repletas de peixes. As florestas e pântanos eram repletos de caça. As tribos nativas eram rodeadas por bétulas, olmos, choupos, álamos, tílias e carvalhos. Nas florestas viviam lobos, raposas, ursos, linces, carcajus, veados e javalis. Os prados eram de uma grama verde e abundante. A princípio, o príncipe havia adentrado mais a floresta com o seu povo, mas, ainda assim, não conseguiram ficar em paz.    

    A fome, o medo dos invasores e o fato de terem perdido suas casas para eles, fizeram com que os milcenos resolvessem fugir. Eles reuniram seus pertences, colocaram-nos em uma volokusha[7] e deixaram sua morada. Fugiram para longe, esperando encontrar um novo lar, onde ninguém pudesse expulsá-los ou escravizá-los, onde ninguém ousasse proibi-los de acreditar no deus Veles[8], o padroeiro da tribo. 

    E lá se foram os milcenos, carregando seus pertences, puxando a volokusha com vontade com suas peles e seus galhos, que usavam para construir abrigos temporários. Em cima das peles, havia arcos e flechas, dardos, lanças, martelos e equipamentos de pesca. Os milcenos viajaram no inverno gelado e no verão sufocante. O sol queimava suas peles e eles empurravam suas volokushas com muita dificuldade pelos prados secos. Atrás delas, seguiam-se os pequenos rebanhos. Como era necessário alimentar os animais durante a viagem e não havia como, aos poucos eles eram abatidos para servir de alimento.

    Atrás das volokushas, empurradas pelos homens, iam as mulheres, levando seus bebês em trapos presos na altura do peito. E assim seguia-se a viagem, que lhes parecia infinita. Às vezes, os milcenos não tinham comida suficiente, então reclamavam com Ladvik. Ele então entendeu que a paciência de seus seguidores tinha limite e passou a fazer paradas constantes para descansar. Quando isso acontecia, os homens montavam abrigos temporários e iam para a floresta caçar, mas nem sempre tinham sucesso. 

    Desde de tempos imemoriais, os milcenos adoravam Veles e, por isso, sempre lhe pediam sorte na caçada. Às vezes, por motivos desconhecidos, um animal grande adentrava mais a floresta e os caçadores tinham que se contentar somente com pássaros. Provavelmente, Veles achava que isso era o suficiente para a numerosa tribo.

    O tempo passava absurdamente rápido. Durante a viagem, muitas mulheres deram à luz. Em uma das paradas, foi a vez de uma das esposas do príncipe[9]. Foi no meio de um verão muito quente. Fazia tempos que não chovia, as florestas haviam perdido sua vegetação pela falta de umidade, os raios de sol castigavam a terra e as pessoas passavam mal de calor. O gado emagreceu tanto que suas costelas ficaram à mostra, já que não havia como alimentá-lo. A grama rala secou, ficou ácida e espinhosa. 

    Ladvik decidiu fazer uma pausa mais longa e abater todo o gado que restava. Ele pegou o touro mais forte e o ofereceu como sacrifício a Veles. O deus atendeu a prece e aos pedidos do príncipe: sua esposa teve um parto tranquilo e finalmente caiu a chuva tão aguardada. Enquanto a terra tão sôfrega absorvia a umidade, os milcenos abrigavam-se em suas moradias temporárias. 

    Ele havia trazido consigo um ícone antigo de Veles, a quem ele rezava e fazia oferendas. Depois do nascimento de seu filho, ele fez a seguinte pergunta ao padroeiro da tribo: continuamos a viajar ou nos assentamos aqui mesmo?

    Depois de fazer sua prece, o príncipe fechou os olhos e ficou parado próximo ao ícone. Quando ele abriu os olhos, havia um grande esquilo ruivo sentado perto da escultura. Ladvik achou que ele era um mensageiro de Veles. E não estava errado. O esquilo, pulando de árvore em árvore, atraiu o príncipe mato adentro. Diante dele, revelou-se uma clareira espaçosa rodeada de carvalhos antigos. Perto dali, corria um riacho límpido. Ao ver isso, o príncipe Ladvik decidiu que iria construir uma nova cidade ali e fincar raízes naquela terra. E assim, os milcenos encontraram uma nova casa. 

    Ladvik não gostava do fortalecimento do poder dos tchéquios, ainda mais de Krok. Afinal, o comandante já havia se aproximado de seus domínios. Apesar de ter chegado há pouco tempo nessas terras, o príncipe já as considerava suas. Ele não queria ter que se submeter ao príncipe Tcheh, assim como não queria ter que obedecer às leis dos outros e pagar impostos ao um reino estranho. Ele amava sua liberdade e reconhecia somente um poder: o do deus Veles. Por isso, de tempos em tempos, Ladvik mandava seus espiões às terras dos comandante Krok, para saber como vivia e o que fazia o seu adversário. Ele não tinha

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