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Esferas Públicas no Brasil: Teoria Social, Públicos Subalternos e Democracia
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Esferas Públicas no Brasil: Teoria Social, Públicos Subalternos e Democracia
E-book291 páginas6 horas

Esferas Públicas no Brasil: Teoria Social, Públicos Subalternos e Democracia

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Sobre este e-book

O livro Esferas públicas no Brasil: teoria social, públicos subalternos e democracia reúne artigos que buscam refletir, a partir de diferentes perspectivas, sobre as mudanças estruturais das esferas públicas no Brasil. Em um diálogo crítico com Jürgen Habermas, autor do clássico Mudança Estrutural da Esfera Pública, assim como com outros autores do campo da teoria crítica – especialmente Nancy Fraser e Craig Calhoun –, Fernando Perlatto reflete neste trabalho sobre questões diversas relacionadas à esfera pública no Brasil e no mundo contemporâneo. Articulando Historiografia e Sociologia Política, este livro analisa as relações que os diferentes sujeitos e grupos sociais estabeleceram historicamente com o que o autor intitula nos textos de esfera pública seletiva e esferas públicas subalternas.

"Mais do que uma história das esferas públicas no Brasil, trata-se de uma verdadeira sociologia política do País, que, opondo-se sutilmente à visão um tanto pessimista de vertentes do pensamento social brasileiro, que encaram o País a partir de uma teoria meio elitista do deficit, aposta suas fichas, como possibilidade de democratização, no diálogo permanente com as esferas públicas subalternas e populares – sem nunca cair, entretanto, no encanto das sereias do populismo [...]. A publicação de Esferas públicas no Brasil reativa o poder da imaginação, da subversão e da reconstrução política. Com este novo livro, Fernando Perlatto assina a sua segunda publicação e se coloca ao lado dos melhores intérpretes das esferas públicas no Brasil."

- Do prefácio de Frederic Vandenberghe
IdiomaPortuguês
Data de lançamento27 de jun. de 2019
ISBN9788547311087
Esferas Públicas no Brasil: Teoria Social, Públicos Subalternos e Democracia

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    Esferas Públicas no Brasil - Fernando Perlatto

    Editora Appris Ltda.

    1ª Edição - Copyright© 2018 dos autores

    Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.

    Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.

    Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.

    Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS

    prefácio

    A ESFERA PÚBLICA SELETIVA E OS PÚBLICOS SUBALTERNOS

    O livro clássico de Jürgen Habermas sobre a esfera pública, de 1962, precisa não somente de uma atualização, mas também de uma reterritorialização. A retomada das ideias norteadoras do esclarecimento europeu dos séculos XVII e XVIII, para entender a esfera pública do tempo presente, não é, de forma nenhuma, desprovida de sentido. A esfera pública ideal não existe e, certamente, não no Brasil, mas esse diagnóstico não invalida, entretanto, o ideal normativo de uma esfera pública livre, aberta e inclusiva. Nessa perspectiva reconstrutiva, o ideal serve de medida do possível. A legitimidade do poder nessa esfera pública ideal não se justificaria mais a partir de fatores externos – como poder, riqueza e honra –, mas mediante a força persuasiva dos argumentos racionais mobilizados em uma discussão pública.

    Na esteira das críticas construtivas ao modelo burguês e eurocentrado elaborado por Habermas, que mostraram que a Öffentlichkeit excluía mais da metade da população (os trabalhadores, as mulheres, sem falar dos habitantes das colônias), o sociólogo-historiador Fernando Perlatto apoia-se em Habermas, em seus melhores críticos, em autores pós-coloniais e em intelectuais brasileiros, para trazer a noção da esfera pública para o território brasileiro. O resultado é a proposição de dois conceitos que articulam sua reflexão: a esfera pública seletiva e as esferas públicas subalternas. Conformada por intelectuais, a esfera pública seletiva, o terceiro espaço entre o Estado e o mercado, configurou-se no Brasil por uma seletividade notável, tanto dos personagens capazes de nela operar quanto das tematizações possíveis nos debates. Em um país onde a escravidão só foi abolida anteontem, a exclusão dos setores populares (escravos, homens livres, a ralé) foi historicamente sistemática.

    Em um diálogo contínuo com Habermas, Gramsci e Bakhtin, além de autores relacionados à teoria crítica contemporânea, como Nancy Fraser e Craig Calhoun, o livro aposta no fortalecimento das esferas públicas subalternas para repensar o papel dos intelectuais e a sua relação com os setores populares na constituição de uma sociedade democrática na semiperiferia do sistema-mundo. Dessa forma, ele demonstra com talento que se os subalternos não podem ser ouvidos, eles podem, entretanto, falar.

    Com amplo conhecimento da literatura secundária sobre o tema da esfera pública, Esferas públicas no Brasil oferece uma notável contribuição à compreensão sobre a maneira como Habermas transformou a ideia kantiana do controle do poder autoritário por uma opinião pública bem formada e informada em uma visão militante da democracia. Além de uma história impecável da recepção do livro de Habermas, que frisa as lacunas da teoria discursiva do Estado, não para enfraquecer a perspectiva habermasiana, mas para fortalecer e superá-la, Perlatto faz uma reconstrução competente da história social e política do Brasil, da Independência até as jornadas de junho de 2013. Com o intuito de melhor entender a circulação internacional das ideias entre países centrais e periféricos, ele analisa o papel dos intelectuais, da cultura popular e da religião na contestação da hegemonia na república dos bacharéis.

    Mais do que uma história das esferas públicas no Brasil, trata-se de uma verdadeira sociologia política do País, que, opondo-se sutilmente à visão um tanto pessimista de vertentes do pensamento social brasileiro, que encaram o País a partir de uma teoria meio elitista do deficit, aposta suas fichas, como possibilidade de democratização, no diálogo permanente com as esferas públicas subalternas e populares – sem nunca cair, entretanto, no encanto das sereias do populismo.

    Antes de ser um intelectual crítico, Perlatto é um intelectual público. A partir de uma teoria da ação, ele analisa a seletividade da esfera pública brasileira, não somente indicando as permanências das heranças malditas do passado, mas também abrindo a perspectiva de uma esfera pública mais inclusiva, contra-hegemônica e expressionista. Rompendo com os processos históricos de exclusão, essa esfera incluiria a maioria da população; contestando o controle exercido pelos meios de comunicação controlados pelas elites, ela abriria um espaço alternativo subalterno e popular; superando a restrição racionalista de Habermas, ela abrir-se-ia, de forma mediada, para as aspirações populares que se exprimem na cultura e na religião. Essa visão de um futuro possível é, cruelmente, contrafactual. De fato, estamos bem longe do possível. A luta é árdua. Para pensar o Sul, não podemos perder o Norte.

    Em um país que se torna cada dia mais periférico, a publicação de Esferas públicas no Brasil reativa o poder da imaginação, da subversão e da reconstrução política. Com este novo livro, Fernando Perlatto assina a sua segunda publicação e se coloca ao lado dos melhores intérpretes das esferas públicas no Brasil, muito bem-vindo na companhia dos Avritzers, Alonsos e Costas.

    Frederic Vandenberghe

    Professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp-Uerj)

    APRESENTAÇÃO

    Em livro publicado no final dos anos 1920, intitulado The Public and its Problems, o filósofo pragmatista americano John Dewey (1927) destacava o quanto a ideia de público se tornara central no mundo contemporâneo por sua conexão direta com o debate democrático. Em um contexto marcado pelo predomínio da sociedade industrial – chamada por ele de Grande Sociedade –, com seus públicos cada vez mais complexos e plurais, as problemáticas da deliberação e da comunicação pública convertiam-se em elementos essenciais para pensar a questão democrática, que não podia mais reduzir-se única e exclusivamente à dimensão do voto. A provocação de Dewey no sentido de estimular uma reflexão mais acurada em torno do público e seus problemas permanece premente e se mostra cada vez mais necessária no contexto atual marcado pelo enfraquecimento progressivo das esferas associadas ao público e pelo declínio do homem público, nos termos de Richard Sennet (1988), em relação ao mundo privado.

    A delimitação do que se trata o conceito de público é um exercício teórico complexo, quando não impossível. Ainda que essa categoria tenha se tornado central no imaginário social contemporâneo, ela é de difícil definição, na medida em que se vincula a diferentes significados que estão em permanente transformação (WARNER, 2002). Falamos de público quando nos referimos a espaços comuns e coletivos, abertos a diferentes pessoas, como praças e parques, ou àquilo que pertence ao Estado e está disponível ao acesso de todos, ou, até mesmo, a conteúdos gratuitamente compartilhados, como muitos daqueles que circulam pela internet. A utilização da noção de público, nesse sentido, é fortemente mobilizada para diferenciar algo daquilo que é privado ou cuja apropriação ocorre de forma privada, não obstante convenha ressaltar que as fronteiras entre o público e o privado tenham se tornado demasiadamente fluidas no mundo contemporâneo (WEINTRAUB; KUMAR, 1997; GRIPSRUD et al., 2010).

    Ainda que as formulações em torno do público tenham suas origens em tempos remotos,¹ foi somente no decorrer dos séculos XVII e XVIII, no contexto das lutas contra a tirania do poder absoluto, que as reflexões sobre essa categoria passaram a ganhar maior sistematicidade. A ideia de soberania gestada nesse período esteve fortemente ancorada não apenas na defesa de direitos civis e políticos, mas também na luta pela liberdade de exprimir publicamente as opiniões divergentes. Os escritos de Immanuel Kant, em especial O que é o Esclarecimento?, são considerados por muitos, não sem razão, como um marco divisório nesse processo de ampliação das reflexões sobre o público, sobretudo por articularem a noção de justiça com o uso público da razão em um ambiente livre do poder despótico e por chamarem a atenção para a importância do princípio da publicidade como elemento primordial para orientar as decisões políticas. No decorrer do século XIX e início do XX, a reflexão sobre o público passou a vincular-se de forma mais sistemática com os embates em torno da questão democrática. Isso ocorreu principalmente de duas maneiras. Por um lado, configurou-se uma percepção cada vez mais difundida quanto à importância dos jornais e de outros meios impressos na formação daquilo que será chamado de opinião pública (BECKER, 1996). O livro clássico de Gabriel Tarde, A Opinião e as Massas, publicado em 1901, é exemplar dessa agenda de preocupações. Por outro, a expansão do sufrágio universal conduziu ao aparecimento de novos públicos e novas vozes pressionando por uma participação mais democrática na vida política (GRIPSRUD et al., 2010). Tanto o surgimento da opinião pública, quanto o aparecimento de novos públicos, provocou uma onda de temor e preocupação entre diversos setores, receosos quanto aos impactos dessas mudanças na ordem política e social.

    Em relação aos temores diante da influência da opinião pública, vale destacar o receio manifestado até mesmo por autores liberais, como o inglês Stuart Mill e o francês Alexis de Tocqueville. Apesar de defenderem a liberdade de expressão, apontando-a como uma das principais conquistas da modernidade e como aspecto central do processo democrático que então se consolidava, ambos exprimiam preocupações com os perigos que a coerção moral da opinião pública poderia exercer. Se antes a opressão dava-se por parte das minorias contra as maiorias, a partir do processo de expansão e consolidação democrática, essa opressão poderia inverter os sinais e converter-se em uma nova forma de tirania, representando um perigo para a autonomia individual e para a própria democracia. As reflexões em torno dos impactos da opinião pública sobre as massas tiveram novos desdobramentos no decorrer do século XX, sobretudo como decorrência do crescimento do impacto dos meios de comunicação sobre a vida social e política, podendo-se destacar nesse sentido, por exemplo, toda a tradição crítica à chamada indústria cultural, que se desenvolveu na esteira das reflexões críticas de Theodor Adorno e Max Horkheimer, em A Dialética do Esclarecimento.

    Para outro grupo de autores, a preocupação que emergiu com força nos séculos XIX e XX não estava nem tanto vinculada ao temor da opressão da opinião pública sobre as minorias, mas ao impacto dos novos públicos que passam a pressionar para participarem mais ativamente do sistema político. Não obstante suas particularidades, os chamados pensadores elitistas – a exemplo de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca, Robert Michels e Joseph Schumpeter – evidenciarão enorme desconfiança, quando não aversão, ao exercício de uma soberania ampliada por essa multidão. Os esforços teóricos desses autores direcionar-se-ão no sentido de esvaziar a ideia da democracia como associada normativamente à noção de discussão pública permanente e à participação ampliada dos cidadãos nas decisões políticas.

    A polêmica em torno da capacidade de os públicos participarem diretamente da democracia em uma esfera pública ampliada pode ser também evidenciada no contexto norte-americano pelo embate que envolveu Walter Lippmann e John Dewey. Para o primeiro, em livros como Public Opinion (1922) e The Phantom Public (1925), o mundo contemporâneo seria demasiadamente complexo para que o sistema democrático pudesse comportar a participação direta dos cidadãos comuns nas decisões públicas. Propondo uma visão autodenominada de realista, Lippmann defendia que a tarefa de elaboração das leis não poderia ser transmitida às massas passivas, irracionais e egoístas, devendo essa tarefa ser confiada aos especialistas (LIPPMANN, 1997). Em seu livro The Public and its Problems, Dewey contrapõe a perspectiva formulada por Lippmann, apostando na deliberação entre os cidadãos comuns como a chave para a melhoria do sistema democrático.² Em uma formulação crítica ao elitismo da tradição liberal que desconfiava da participação das massas nas decisões públicas e restringia a ideia de democracia apenas à dimensão do voto, Dewey evidenciava a necessidade de uma deliberação pública contínua na busca pela construção do bem comum. O público seria um meio discursivo para a solução cooperativa e comunitária dos problemas comuns sob condições democráticas. Para Dewey, uma decisão apenas seria considerada democrática caso ela fosse publicamente debatida; daí serem necessárias melhorias nos métodos e nas condições de discussão pública de modo a assegurar uma maior participação da população (DEWEY, 1927).³

    As décadas que se seguiram à Segunda Guerra Mundial testemunharam uma ressurgência do debate em torno do público e seus problemas. De acordo com Seyla Benhabib (1992), é possível destacar três principais modelos teóricos que orientaram as formulações em torno da temática do público, de maneira geral, e do espaço público, em particular, sobretudo no período do segundo pós-guerra. Em primeiro lugar, haveria o trabalho de Hannah Arendt, em especial, A Condição Humana, que, tomando a antiga distinção grega entre "oikos e polis como ponto de partida, assumiria uma concepção agonística do público, encarando-o como o espaço por excelência para o exercício da virtude cívica e republicana. Em segundo lugar, seria possível distinguir uma concepção liberal", representada por Bruce Ackerman, na obra Social Justice in the Liberal State, na qual o foco da reflexão sobre público direcionar-se-ia para o problema da construção de uma ordem justa e estável. O terceiro modelo teórico para pensar o público seria orientado por uma concepção discursiva, sendo representado por Jürgen Habermas, principalmente em seu trabalho Mudança Estrutural da Esfera Pública.

    Ao ancorar sua reflexão sobre a categoria esfera pública, nesse livro publicado na Alemanha em 1962, Habermas logrou alterar significativamente os debates em torno da questão do público e de seus problemas. Traduzida no Brasil, em 1984, a obra Mudança Estrutural da Esfera Pública tem exercido, desde a sua publicação, enorme influência em todas as áreas do conhecimento, perpassando os trabalhos de sociólogos, cientistas políticos, antropólogos, filósofos, historiadores e pesquisadores das áreas da Literatura e da Comunicação. A despeito de seus múltiplos usos, é possível dizer que a categoria central deste trabalho – esfera pública – vem contribuindo sobremaneira para ampliar as possibilidades de reflexão em torno de temáticas diversas, a exemplo das relações entre Estado e sociedade civil, as origens e as perspectivas da democracia e o impacto dos meios de comunicação de massa sobre a formação da vontade nas sociedades democráticas.

    Ao longo das últimas décadas, o conceito de esfera pública acabou sendo repensado e ampliado, em relação àquele desenvolvido em Mudança Estrutural da Esfera Pública, inclusive em obras posteriores do próprio Habermas, a exemplo da Teoria do Agir Comunicativo e Direito e Democracia: Entre Facticidade e Validade. Essas mudanças, como procurarei discutir em alguns dos capítulos que compõem esta obra, tiveram curso, sobretudo, como decorrência das críticas que o conceito sofreu por parte de diferentes autores. Porém, ainda que abarcando outras concepções para além daquela originalmente formulada na obra de 1962, o conceito de esfera pública, com suas derivações e desdobramentos, permanece como uma categoria central para se compreender a vida democrática nas sociedades contemporâneas. Em um contexto no qual o avanço do mercado e das dimensões do privado ameaça corroer tudo aquilo que se vincula ao público, a categoria de esfera pública, compreendida simultaneamente como formação histórica e como ideal normativo, apresenta-se como um conceito analítico e prescritivo fundamental no sentido de orientar reflexões preocupadas em pensar os desafios e as possibilidades de aprofundamento da democracia no mundo contemporâneo.

    O livro que o leitor tem em mãos nasce com o objetivo de contribuir para essa reflexão mais ampla sobre a categoria de esfera pública, focando a atenção mais diretamente sobre a realidade brasileira. Ainda que a partir de abordagens e perspectivas diferenciadas, os textos que compõem esta obra, escritos entre 2010 e 2015, um deles original e outros já publicados em revistas acadêmicas em momentos anteriores – embora revistos e ampliados –, articulam-se na medida em que buscam refletir, em um diálogo não apenas com Habermas, mas também com outros autores do campo da teoria crítica – especialmente, Nancy Fraser e Craig Calhoun –, sobre questões diversas relacionadas à esfera pública no Brasil e no mundo contemporâneo. Trata-se de uma abordagem mais alargada que objetiva compreender as mudanças estruturais das esferas públicas no Brasil – esferas públicas, aqui, bem entendidas, no plural – e as relações que os diferentes sujeitos e grupos sociais estabeleceram historicamente com o que denomino, nos textos diversos que compõem esta obra, de esfera pública seletiva e esferas públicas subalternas.

    O capítulo que abre o livro, Ler Habermas na (semi)periferia: esfera pública, história e teoria social, procura refletir sobre os processos assimétricos de produção e circulação de teorias entre países dos centros e das (semi)periferias, a partir da discussão acerca dos desafios colocados para aqueles que pretendem mobilizar conceitos como o de esfera pública, formulados em países centrais para compreenderem realidades (semi)periféricas como a brasileira. Esse texto teve suas origens em reflexões construídas conjuntamente com Pedro Luiz da Silva do Rego Lima em torno das recepções da obra de Habermas no Brasil, cujos resultados foram apresentados no 35º Encontro Nacional da Anpocs, em 2011, no Grupo de Trabalho O Pluralismo na Teoria Contemporânea (PERLATTO; LIMA, 2011) e publicados na revista Teoria e Cultura (PERLATTO; LIMA, 2013). Posteriormente, muitas dessas ideias sobre circulação de teorias entre centros e (semi)periferias foram aprofundadas em diálogo com João Marcelo Ehlert Maia em torno de reflexões sobre o conceito de sociologia pública, desenvolvido por Michael Burawoy (PERLATTO; MAIA, 2012), bem como quando fui selecionado para participar, em 2013, do XIIth International Laboratory for PhD Students in Sociology, organizado pela International Sociological Association (ISA), que ocorreu na Universidade de Sydney. Os resultados dessas reflexões foram mobilizados como base da reflexão teórica da minha tese de doutorado, Sociologia pública: imaginação sociológica brasileira e problemas públicos (PERLATTO, 2013), e refinados no artigo que compõe o presente livro para refletir sobre o conceito de esfera pública.

    O segundo capítulo, Seletividade da esfera pública e esferas públicas subalternas no Brasil: desafios e possibilidades na modernização brasileira, é aquele que organiza de forma mais ampla e sistemática minhas reflexões sobre as mudanças estruturais das esferas públicas na história brasileira. Publicado em 2015 na Revista de Sociologia e Política, esse artigo foi ampliado e passou por algumas alterações para que adquirisse o formato final aqui publicado. Esse texto tem uma dimensão teórica mais ampla, uma vez que ele está orientado pela tentativa de se construir um diálogo entre teoria social e Historiografia, que tem sido, em certo sentido, secundarizado com a perda da importância na academia de abordagens ancoradas na chave interpretativa da sociologia política macro-histórica. As reflexões que originaram esse texto – assim como aquelas que estão presentes no Capítulo 4, Esferas públicas, religião e democracia no Brasil– nasceram do diálogo direto com Frederic Vandenberghe, Luiz Werneck Vianna e Rubem Barboza Filho, e foram aprofundadas quando estive associado como visiting scholar ao Institute for Public Knowledge (IPK), da New York University (NYU), sob a

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