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Movimentos Sociais e Resistência no Sul do Brasil
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Movimentos Sociais e Resistência no Sul do Brasil
E-book521 páginas7 horas

Movimentos Sociais e Resistência no Sul do Brasil

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Sobre este e-book

Como se articulam as lutas sociais e a resistência no Sul do Brasil? Essa foi a questão que tínhamos em mente quando pensamos em organizar este livro. Sobre a região Sul, por suas particularidades históricas, construiu-se um imaginário, em especial nos últimos anos, de local do conservadorismo, em que haveria um domínio de ideias reacionárias.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento11 de mar. de 2021
ISBN9786555232981
Movimentos Sociais e Resistência no Sul do Brasil

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    Pré-visualização do livro

    Movimentos Sociais e Resistência no Sul do Brasil - Elenita Malta Pereira

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    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS

    Dedicamos este livro

    a todas e todos que lutam e resistem, todos os dias,

    sem perder a esperança de construir um Brasil melhor.

    Eu luto e não me rendo

    Caio e não me vendo

    Não recuo nem em pensamento

    Eu sigo em movimento que pra mim é natural

    De resistência cultural

    (Marcelo D2. Resistência cultural).

    PREFÁCIO

    Escrever o prefácio de um livro é uma honra e um reconhecimento, mas também uma grande responsabilidade. Uma honra pela oportunidade de ler os manuscritos antes dos demais leitores e pelo aprendizado que eles nos proporcionam. E um reconhecimento por parte das organizadoras do livro pela trajetória de vida e de pesquisa do prefaciador. Por isso acredito que recebi o convite. De fato, tenho dedicado décadas de pesquisas aos movimentos sociais, temas centrais deste livro. Mas digo que também é uma responsabilidade pelo motivo de que tanto os autores como os leitores esperam algumas palavras que demonstram a qualidade da obra e da sua importância social.

    E o livro que ora os leitores têm em mãos – Movimentos sociais e resistência no Sul do Brasil – tão bem organizado pelas professoras Elenita Malta Pereira e Rose Elke Debiasi tem um significado muito especial no atual cenário político brasileiro.

    Vivemos tempos estranhos. A conjuntura política e social do Brasil e dos demais países da América Latina requer um esforço de análise dos historiadores e dos cientistas sociais do tempo presente. O autoritarismo, o ódio e a violência estão cada vez mais em destaque na sociedade, como se fossem atitudes naturais. Não são. Por isso é fundamental que os temas, abordagens e problemas mais sensíveis, tais como a questão das graves violações de direitos humanos, da violência, das ditaduras, da tortura, do autoritarismo, da escravidão, da imigração diaspórica, bem como das questões de gênero (mulheres e grupos LGBT+), dos indígenas, dos camponeses e dos quilombolas, precisam ser estudados e problematizados.

    Consolidar a cidadania, a justiça social, a igualdade, a liberdade e os direitos humanos e sociais, que foram historicamente conquistados, por meio de lutas políticas e sociais de muitos/as agentes sociais, tornou-se uma obrigação de quem defende a democracia. E também é um ato de resistência. O Brasil tem uma dívida de memória com os povos e grupos sociais que sofreram e sofrem graves violações. Assim sendo, nós, intelectuais, temos que formatar ferramentas teóricas e metodológicas adequadas para analisar esse passado, muitas vezes sensível e traumático, e apontar caminhos de reflexão para os esquecimentos da sociedade, tanto os construídos como os silenciados.

    Este livro tem diversos méritos. O primeiro é por demonstrar essa preocupação política referida anteriormente, em todos os seus capítulos. O segundo é por dar visibilidade às lutas de diversos movimentos sociais, tais como os de moradia, de acesso a terra, do uso agroecologicamente correto da terra e do acesso a uma alimentação sem agrotóxicos. Mas também por destacar as diversas lutas de homossexuais, negros, mulheres, indígenas, operários, estudantes, jovens e quilombolas.

    No campo teórico e metodológico, o mérito é o de abordar essas lutas como movimentos sociais, destacando o seu processo histórico e a longa caminhada dos grupos sociais pela conquista de direitos. Ou seja, são nas tentativas e práticas de um determinado grupo social, fundadas num conjunto de valores comuns que definem as formas de ação social para obter resultados coletivos. Nos casos concretos analisados neste livro, a ação social proporcionou aos agentes sociais pesquisados novas coletividades e novas consciências. Uma dessas consciências é a noção de resistência. Só resiste quem tem consciência do lugar que ocupa na sociedade em que vive. E como escreveram as organizadoras na apresentação deste livro: Há uma história muito rica e bela de resistências no Sul do Brasil que não pode ser ignorada. E, ainda, acrescentaram que a resistência pode ser a luz no fim do túnel nesses momentos de trevas. Concordo com elas. E esta passagem me fez relembrar a poesia do cantor e compositor uruguaio, Jorge Drexler: Eu prego o meu remo na água, eu carrego o seu remo no meu, eu acho que vi uma luz do outro lado do rio. Não existem barreiras, nem correntezas que são intransponíveis. É por isso que esses movimentos de resistência são, simbolicamente, caracterizados pela consciência de um destino e de esperanças comuns.

    Quero destacar ainda que o livro analisa os movimentos sociais e de resistências ocorridos nos três estados do Sul do Brasil. Eis outro mérito extremamente importante. Se pensarmos que há no Sul do Brasil um imaginário social bastante hegemônico de que o sucesso econômico da região é resultado da imigração europeia, do trabalho árduo e de certa obediência social, com a leitura deste livro encontraremos outras realidades. O conservadorismo tem lugar na região, é verdade, mas os movimentos sociais, de resistências e insurgências, também têm o seu espaço e ajudaram a solidificar a grandeza da região. Não é só o homem branco descendente de europeu que fez a história da região. São eles também. Mas são também as mulheres, os homossexuais, os jovens, os negros, os quilombolas, os indígenas, os camponeses e os trabalhadores em geral.

    Por fim, essas pesquisas mostram a pujança dos programas de Pós-Graduação no Sul do Brasil, já que os textos aqui apresentados são frutos de dissertações, teses e pesquisas realizadas nas Universidades Públicas da região. Para quem acha que as Universidades Públicas fazem apenas balbúrdias, o resultado deste livro não só desmente essa ideia estapafúrdia como destaca o trabalho sério realizado dentro das universidades.

    Boa leitura a todos e todas!

    Angelo Priori

    Professor no Programa de Pós-Graduação em História

    da Universidade Estadual de Maringá/PR (UEM)

    Maringá/PR, 30 de julho de 2019.

    Sumário

    INTRODUÇÃO ١٥

    Parte 1

    Movimentos sociais, gênero e raça

    AS DEMANDAS DO MOVIMENTO SOCIAL NEGRO NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL 21

    Arilson dos Santos Gomes

    UNIDAS SOMOS FORTES! O(S) MOVIMENTO(S) FEMINISTA(S) NO SUL DO BRASIL 47

    Mônica Karawejczyk, Nikelen Witter

    INVENTANDO A DIGNIDADE: A EMERGÊNCIA DA LUTA HOMOSSEXUAL ORGANIZADA NO PARANÁ 71

    Jeferson Ramos, Paulo Souto Maior

    Parte 2

    Movimentos sociais, entre o urbano e o rural

    MOVIMENTOS AMBIENTALISTAS NO RIO GRANDE DO SUL: HISTÓRIA E HISTORIOGRAFIA 97

    Elenita Malta Pereira, Fabiano Quadros Rückert

    OS MOVIMENTOS DE LUTA PELA MORADIA EM FLORIANÓPOLIS 121

    Francisco Canella

    FILHOS DE SEPÉ: A PRODUÇÃO DE ARROZ DE BASE AGROECOLÓGICA DO MST NO RIO GRANDE DO SUL 149

    Leonardo Melgarejo

    ENTRE O MATO VIRGEM E OS NEGÓCIOS DA MADEIRA: CAMINHOS DO INDIGENISMO BRASILEIRO EM TERRAS KAINGANG 167

    Carina Santos de Almeida, Ana Lúcia Vulfe Nötzold

    Parte 3

    Resistência, memória e patrimônio

    SANTA CATARINA FOI UMA SEMENTEIRA: JUVENTUDE E MILITÂNCIA NA ORGANIZAÇÃO NACIONAL DO MST 197

    Rose Elke Debiasi

    ALIMENTAÇÃO E PATRIMÔNIO ALIMENTAR: MOVIMENTOS E PRÁTICAS ALTERNATIVAS NO PARANÁ 223

    Neli Maria Teleginski, Sabrina Fernanda Demozzi

    MEMÓRIAS DA LUTA PELA TERRA: O QUILOMBO INVERNADA PAIOL DE TELHA (1970-2015) 249

    Queler Cristina Borges, Elenita Malta Pereira

    Parte 4

    Movimentos sociais e ditadura civil-militar

    SINDICALISMOS EM TEMPOS DE GENERAIS: A AGÊNCIA OPERÁRIA NO RIO GRANDE DO SUL DURANTE A DITADURA CIVIL-MILITAR (1964-1985) 279

    Evandro Machado Luciano

    MOVIMENTOS ESTUDANTIS NO SUL DO BRASIL DURANTE A DITADURA MILITAR: UMA REFLEXÃO A PARTIR DO CASO DA UFRGS (1964-1974) 301

    Jaime Valim Mansan

    A CAMPANHA DIRETAS JÁ NO RIO GRANDE DO SUL: UMA ANÁLISE DO MOVIMENTO NOTICIADO NO JORNAL ZERO HORA 327

    Daniela de Campos, Andrei Marcelo da Rosa, Dimy José Moreira Dornelles

    SOBRE AS AUTORAS E OS AUTORES 347

    Índice remissivo 353

    INTRODUÇÃO

    Como se articulam as lutas sociais e a resistência no Sul do Brasil? Essa foi a questão que tínhamos em mente quando pensamos em organizar este livro. Sobre a região Sul, por suas particularidades históricas, construiu-se um imaginário, em especial nos últimos anos, de local do conservadorismo, em que haveria um domínio de ideias reacionárias.

    De fato, constata-se a existência de movimentos de cunho separatista e fascista na região. No entanto convive ao lado deles uma série de movimentos sociais progressistas que, acreditamos, não receberam tanta visibilidade nos últimos anos. Como historiadoras, nossa função social é trazer à tona a agência de indivíduos e grupos que, desde o Sul, têm lutado por um Brasil e um mundo melhores ao longo do tempo.

    Aqui consideramos o conceito de movimentos sociais em afinidade com a socióloga Maria da Glória Gohn (2002; 2013), que os percebe como fonte de inovações e mudanças; elementos fundamentais nas sociedades modernas na luta por direitos. Eles são também movimentos históricos, acompanhando as demandas e possibilidades de cada contexto.

    Na história, movimentos sociais se tornaram um conceito operacional muito recentemente. Duarte e Meksenas (2008) afirmam que a primeira referência a movimentos sociais, na historiografia, talvez tenha sido o livro Rebeldes primitivos, de Eric Hobsbawn (1978), com o subtítulo Estudos de formas arcaicas de movimentos sociais nos séculos XIX e XX. O mesmo autor publicou também Da história social à história da sociedade (HOBSBAWM, 1972), tomando movimentos sociais como sinônimo do estudo dos conflitos sociais, dos tumultos e das revoluções. Os trabalhos de E. P. Thompson sobre a classe operária inglesa também representam importante contribuição à historiografia sobre movimentos sociais. Especialmente com a chamada história vista de baixo, as lutas sociais das classes populares passaram a ser tema legítimo do interesse dos historiadores.

    Para além dos movimentos operários, a partir dos anos 1960, outros movimentos sociais entraram na cena mundial, como os movimentos feministas, ambientalistas, estudantis, de resistência negra, LGBT+ etc. Simultaneamente, o debate sobre a ação humana ocupou o cenário acadêmico. Tornou-se importante compreender a agência, a cultura, a experiência humanas no tempo.

    O Brasil, nesse contexto, passava por uma ditadura civil-militar. Por aqui, o (re)despertar dos movimentos sociais aconteceu no final dos anos 1970, contribuindo para a visibilidade das lutas de diversos grupos e também para a derrubada da ditadura.

    Nosso recorte se atém aos estados do Sul do Brasil, no intuito de demonstrar a riqueza e a vitalidade dos movimentos sociais e de resistência nessa região, que abarcam um espectro muito amplo de lutas e reivindicações. Os treze capítulos do livro buscam oferecer um apanhado das mais importantes lutas sociais ocorridas ao longo dos séculos XX e XXI, nos âmbitos rural e urbano.

    Dividimos o livro em quatro partes. Na primeira, Movimentos sociais, gênero e raça, agrupamos capítulos que abordam os movimentos negro, feminista e LGBT+. A segunda parte, Movimentos sociais, entre o urbano e o rural, agrega quatro textos; dois sobre movimentos urbanos: ambientalista e de luta pela moradia, e dois tratando o mundo rural: movimento da agroecologia e o movimento indígena. O terceiro segmento do livro, Resistência, memória e patrimônio, reúne três capítulos que utilizam fontes orais e discutem as relações entre memória, patrimônio e resistência. Na quarta parte, Movimentos sociais e ditadura civil-militar, os textos abordam três formas de resistência ocorridas na ditadura civil-militar: o movimento operário, os movimentos estudantis e a campanha Diretas-Já.

    Quando começamos a organizar o livro, em maio de 2018, sabíamos que ele era necessário e original. No entanto, à medida que os artigos ficavam prontos, o contexto nacional nos mostrava que ele é mais atual e oportuno do que nunca. O país que mais mata LGBT+ e ambientalistas, e o 5º do mundo em feminicídio, vive um contexto de valorização de Fake News e de perseguição a integrantes do MST e MTST, criminalizando suas lutas. Aqui, racismo estrutural leva à morte milhares de jovens negros nas periferias, todos os anos. Governantes, em vez de homologar terras indígenas, falam em liberar a mineração em seus territórios. Em vez de apoiar a universidade pública, desmontam-na e aplaudem agressões de policiais a estudantes que se manifestavam contra o programa Future-se. Num país carente de moradia, de alimentos saudáveis e, muitas vezes, de qualquer alimento, o presidente da República afirma que não há fome no Brasil. Como se não bastasse, o governo intensificou a liberação de agrotóxicos e aprovou uma novo marco regulatório para sua classificação: apenas quando houver risco de morte poderão ser considerados extremamente tóxicos.

    Diante desse contexto distópico que temos vivenciado desde o golpe de 2016, a própria publicação deste livro é um ato de resistência. Com ele mostramos que há uma história muito rica e bela de lutas no Sul do Brasil que não pode ser ignorada. Essa história pode ser nossa luz no fim do túnel, nesse momento de trevas por que passa nosso país. Que esses capítulos possam ser farol – aos pesquisadores do tema e aos leitores em geral – e, quem sabe, ajudar no necessário despertar para as tão necessárias lutas que esse período nos exige. Resistamos!

    As organizadoras

    Florianópolis-SC, Guarapuava-PR (2018-2020)

    Obras citadas

    DUARTE, Adriano Luiz; MEKSENAS, Paulo. História e movimentos sociais: possibilidades e impasses na constituição do campo do conhecimento. Diálogos, DHI/PPH/UEM, v. 12, n. 1, p. 119-139, 2008.

    GOHN, Maria da Glória. Teoria dos movimentos sociais: paradigmas clássicos e contemporâneos. São Paulo: Edições Loyola, 2002.

    GOHN, Maria da Glória. Desafios dos movimentos sociais hoje no Brasil. SER Social, Brasília, v. 15, n. 33, p. 261-384, jul./dez. 2013.

    Parte 1

    Movimentos sociais, gênero e raça

    AS DEMANDAS DO MOVIMENTO SOCIAL NEGRO NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

    Arilson dos Santos Gomes

    Introdução

    Entende-se por movimento social as ações coletivas de caráter sociopolítico e cultural que viabilizam formas distintas de a população se organizar e expressar suas demandas (GOHN, 2011, p. 335). Já a identidade negra é uma construção social, histórica, cultural e plural. Implica a construção do olhar de um grupo étnico/racial ou de sujeitos que pertencem a um mesmo grupo étnico/racial, sobre si mesmos, a partir da relação com o outro (GOMES, 2005, p. 43).

    Na elaboração identitária, os representantes desses grupos reuniram nas suas acepções uma possível solidariedade entre pretos, pardos e outros grupos considerados não brancos, conforme categorização do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), para reivindicar coletivamente as suas demandas como negros. Em um país decantado e reificado pelas relações harmoniosas entre as suas identidades formadoras (índios, brancos e negros), o movimento negro passa a tensionar essa realidade. Essa situação é defendida por alguns ideólogos brasileiros como uma americanização, diante de uma identidade nacional complexa, mestiça, todavia, com reflexos estruturais e mentais que remontam à época do período colonial. Naquele período, a construção social da representação da brancura legou possibilidades de privilégios para alguns em detrimento de outros, como apregoam suas lideranças na contemporaneidade.

    Dessa forma, temos hoje o desafio de uma identidade negra positiva em uma sociedade que, historicamente, ensina aos negros, desde muito cedo, que para ser aceito é preciso negar-se a si mesmo (GOMES, 2005, p. 43). E esses desafios são encarados, diretamente, pelos movimentos sociais representantes dessas populações.

    Nesse sentido, compreende-se que os movimentos negros são instâncias reivindicativas de indivíduos pertencentes às coletividades negras. Possuem opositores que, mesmo diferentes, dependendo do contexto, possibilitaram suas articulações em torno de um projeto de vida além, com contribuições na organização e na conscientização de setores da sociedade; apresentam um conjunto de demandas por meio de mobilizações, com certa continuidade e permanência a partir de uma reflexão sobre sua própria experiência (GOHN, 2011).

    O associativismo, a luta contra a discriminação racial e os estigmas, o acesso à educação, ao mercado de trabalho e a afirmação de sua identidade foram reivindicações constantes dos movimentos coletivos negros após a abolição.

    Conforme Sales dos Santos, em um primeiro momento, a tentativa dos movimentos negros de atuarem no parlamento, visando combater ao racismo, se dava por meio de intermediários que não eram militantes orgânicos desse movimento (SANTOS, 2009, p. 127). As lideranças desses movimentos sociais já haviam percebido, há algum tempo, que precisavam de representantes afro-brasileiros engajados na luta antirracista no Congresso Nacional (SANTOS, 2009). A Frente Negra (1931-1937) arregimentou associados, tendendo tornar-se partido político, projeto cancelado em virtude do decreto do Estado Novo.¹

    Contudo as comunidades negras insistiram na representação política em contextos democráticos, como forma de institucionalizar as suas demandas. Diante disso, parlamentares como Carlos da Silva Santos (1904-1989), Abdias do Nascimento (1914-2011), Carlos Alberto de Oliveira (1941-2018), Benedita da Silva (1942), entre outros, reivindicaram constantemente as demandas advindas das pressões das populações negras.²

    O objetivo principal deste capítulo é problematizar as demandas do movimento social negro em consonância com a trajetória do parlamentar, assumidamente negro, Carlos da Silva Santos na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul (RS). Trata-se de um estado

    de acentuada concentração de descendentes de europeus, atualmente são 82,3%, e baixa presença negra (17,3%), o que tem acarretado, ainda hoje, denúncias recorrentes de casos de racismos e de preconceitos praticados contra essa população minoritária (SANTOS, 2016, p. 01).

    Além do combate ao racismo, outras demandas pautadas pelo parlamentar na Assembleia tiveram origem a partir das demandas do movimento social negro, como o acesso à educação, ao mercado de trabalho, à elaboração de um referencial simbólico identitário e de conscientização em torno da alusão a Zumbi dos Palmares e ao dia 20 de novembro.³

    O recorte temporal do capítulo incide no surgimento das organizações negras no Rio Grande do Sul, finais do século XIX, até o último mandato de Carlos Santos como deputado estadual, em 1974. A perspectiva teórico-metodológica aponta para a renovação da história política (RÉMOND, 2003), visto que o estudo será desenvolvido a partir da análise de discurso do parlamentar à luz da obra de Eni Orlandi e as tensões sociais do contexto histórico.

    As fontes documentais consultadas, anais e impressas, são oriundas dos acervos localizados no Memorial da Assembleia Legislativa do RS e no Museu de Comunicação Social Hipólito José da Costa, além de entrevista com José Luiz Pereira da Costa, ex-assessor do parlamentar. Serão investigadas, qualitativamente, suas intervenções realizadas na Assembleia com as demais fontes, a fim de atingir o objetivo do artigo.

    Movimento social negro e Carlos da Silva Santos

    Depois da abolição e do advento da república, um setor da população negra fundou associações de diversos tipos: clubes, centros cívicos, grêmios literários, sociedades recreativas e dançantes. Elas formavam o que mais tarde foi designado movimento negro [...] (DOMINGUES, 2007, p. 19). Nesse período, no Rio Grande do Sul, fundam-se jornais que, em suas linhas, denunciam e protestam contra as discriminações e visibilizam e afirmam a identidade negra. Criado por intelectuais negros, o jornal O Exemplo é o mais antigo do país, fundado em Porto Alegre no ano de 1892 (SANTOS, 2011).

    Nos jornais da imprensa negra localizam-se matérias sobre cursos de alfabetização e de instrução.⁴ Na capital sul-rio-grandense, as sociedades Floresta Aurora, Marcilio Dias e Satélite Prontidão, desde o final do século XIX mantinham em suas sedes cursos de alfabetização (PEREIRA, 2008).

    Nesse contexto de afirmação das populações negras nasce, na cidade litorânea de Rio Grande, Carlos da Silva Santos, em 1904. Profissionalmente, na função de caldeireiro,⁵ trabalhou em estaleiros navais e, em virtude de seus talentos oratórios, tornou-se líder sindical, além de ter participado de associações étnicas (CLEMENTE; BARBOSA, 1995; GOMES, 2014; LONER, 2013; TORRES, 2004).⁶

    Entre 1935 e 1937, Carlos Santos assumiu como deputado classista, representando os operários de Rio Grande na Assembleia Legislativa do Estado, em Porto Alegre.⁷ Conforme seu primeiro discurso como deputado classista na Assembleia, em 26 de outubro de 1935, o político relacionava de maneira peculiar a causa dos trabalhadores à situação dos negros após 1888, ano formal da libertação. Mas, para ele, a carta de alforria dos trabalhadores deveria ser na letra e na prática, ao invés da saída do cativeiro, a execução do código de trabalho, possibilitando uma nova abolição ou, como costumava dizer, uma segunda abolição (SANTOS, 1937, p. 36).⁸

    Imagina-se que, para esse líder, sindicalista, devido ao seu histórico familiar, sem determinações, mas por influências e pressões sociais, não bastava defender somente o laço sindical, era necessário também manter e defender as suas raízes, a sua identidade negra. Era uma dupla militância.

    Carlos Santos, em seu discurso como deputado classista, parece-nos alertar sobre o hibridismo de sua identidade social combativa, de trabalhador e de negro, ao declarar:

    Deputados, eu faço da minha mocidade, da minha lealdade, de minha condição de trabalhador e da minha própria raça o fogo retemperador dessa vontade inabalável que anima a representação classista dos empregados de trabalharmos, de sermos compreendidos, de sermos correspondidos (SANTOS, 1937, p. 41, grifo nosso).

    Assim, além de defender a sua classe, Carlos Santos também defendia sua identidade negra, como se algo o aproximasse de seus antepassados. Era a defesa da construção social e simbólica de sua identidade. Participava ativamente da vida social na cidade de Rio Grande, inclusive fazendo parte de clubes e associações negras.¹⁰

    Carlos Santos, no intuito de continuar colaborando com sua comunidade, fundou, no dia 11 de junho de 1936, o Centro Cultural Marcílio Dias. A instalação oficial do centro ocorreu no Teatro 7 de setembro, na cidade de Rio Grande. Sobre o Centro Cultural Marcílio Dias, provavelmente respondendo a algumas inquietações de pessoas preocupadas com as divisões raciais no Brasil, já que o clube foi fundado basicamente para alfabetizar negros, Carlos Santos disse, em discurso na Rádio Farroupilha no dia 21 de abril de 1936:

    Não é demais repetir: nós não somos como muitos julgam, promotores de um movimento antipático de racialidade que o Brasil não comportaria, antes ao contrário, queremos à luz divina do facho inflamante da alfabetização e da instrução, ministradas a todos os brasileiros sem distinção de cor, classe ou credo [...]" (SANTOS, 1937, p. 61, grifos nossos).

    Portanto, mesmo defendendo a comunidade negra, Carlos Santos jamais pensou em fomentar uma sociedade dividida racialmente e, sim, projetar o seu grupo a uma condição igual de oportunidades, a partir da instrução e da busca de méritos. Essas ideias eram motivadas pela democracia racial brasileira.¹¹

    Durante sua permanência como classista, fundou sindicatos no interior do Rio Grande do Sul, além de ter participado de congressos trabalhistas no Rio de Janeiro. Com o decreto do Estado Novo (1937), com o final de seu mandato classista, retornou a sua terra natal para trabalhar na função de delegado escolar na escola Lemos Júnior, onde passou a cuidar do cotidiano administrativo da instituição escolar.¹²

    Com o final do Estado Novo, Santos concorreu ao parlamento sul-rio-grandense pelo Partido Social Democrático (PSD), em 1947, ficando na suplência do deputado Tarso de Moraes Dutra (1914-1983), assumindo a vaga em três ocasiões. Aos 46 anos, formou-se em Direito, na época, pela Faculdade de Pelotas da Universidade do Rio Grande do Sul, em 1951.

    Identidade negra, representação política e questões raciais

    Para Ivair Augusto Alves dos Santos, no período entre 1945 a 1964, viveu-se de modo singular, com a existência de um sistema multipartidário (SANTOS, 2002). A partir dessa fase democrática, passou também a existir, em alguns partidos políticos, a preocupação sobre a questão racial. Conforme Alves dos Santos:

    Ao analisar os programas partidários, encontramos referências sobre a questão racial nos seguintes partidos políticos: Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Partido Socialista Brasileiro (PSB) e Partido Democrata Cristão. Nos maiores partidos deste período, o Partido Social Democrático (PSD) e a União Democrática Nacional (UDN), partidos conservadores, não constava nenhuma menção ou citação em seus programas sobre a questão racial. Entretanto, foram os parlamentares da UDN os autores da lei que dispunha sobre os atos de discriminação e preconceito racial e de cor que, durante décadas, permaneceu como o único recurso legal, a Lei Afonso Arinos (Santos, 2002, p. 59, grifo nosso).¹³

    Portanto o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) contemplava as questões raciais em suas diretrizes, enquanto o Partido Social Democrático (PSD), mais conservador, mantinha-se neutro quanto a esse assunto. Apesar de os parlamentares da UDN terem proposto a Lei Afonso Arinos, foi no Trabalhismo que Carlos Santos encontrou campo às suas reivindicações, já que o programa político do PTB contemplava aspectos alusivos às questões raciais (SANTOS, 2002) e à harmonização das classes.

    Carlos Santos era referência na década de 1950 para a imprensa negra pelotense, principalmente para os organizadores do Jornal A Alvorada, que motivava seus leitores, a comunidade negra, a estudar para melhorar as suas condições econômicas e sociais (SANTOS, 2000, p. 93).¹⁴

    Salienta-se que o político Carlos Santos (1904-1989), líder negro e operário, chegou ao Legislativo sul-rio-grandense pelo voto, no ano de 1947, para assumir a vaga de Tarso de Moraes Dutra (1914-1983), pois ele foi eleito deputado na Câmara Federal, abrindo seu posto à nomeação do suplente. Na ocasião, Santos era político vinculado ao PSD. Porém, mais adiante, iria filiar-se à dominante agremiação de ideologia trabalhista, o PTB. Tal situação, provavelmente, era influenciada pela necessidade própria de sua articulação política ser mais próxima das massas populares e das questões nacionais, identificadas na plataforma petebista.¹⁵

    Destaca-se que o PTB, a partir da ideologia do trabalhismo e de um consenso com outros grupos subordinados, buscou difundir o seu projeto político, mantendo sua hegemonia por meio de uma liderança perante esses grupos. Entretanto existiam negociações. Por meio de entrevistas orais com pessoas frequentadoras de associações negras porto-alegrenses, foi percebida a forte influência exercida pelo PTB na comunidade negra. A maioria dos entrevistados citava essa ligação pela identificação do discurso vinculado ao trabalho (GOMES, 2008).¹⁶

    Inclusive, foram as articulações políticas que possibilitaram a realização do Primeiro Congresso Nacional do Negro, realizado na cidade de Porto Alegre no ano de 1958, sob organização da Sociedade Beneficente Floresta Aurora.

    Não se localizou indícios da participação de Carlos Santos no congresso de Porto Alegre, mas por seu envolvimento e trânsito nas sociedades negras, acredita-se que, provavelmente, ele tenha tido conhecimento do evento. Na década de 1960, o parlamentar passa a frequentar a Sociedade Beneficente Floresta Aurora.¹⁷

    E quanto à Lei Afonso Arinos, decretada em 1950? Para Carlos Santos, em 1963, em um discurso proferido em homenagem aos 75 anos da abolição oficial da escravidão no Brasil, a lei Afonso Arinos era um platonismo, uma vez que sem a resolução dos problemas econômicos, o problema cultural e social do negro seriam intensificados. Por isso, o político acreditava na manutenção da maior democracia racial do mundo por meio da justiça social. E conclamou:

    Aos professores, aos jornalistas, aos forjadores de correntes de opiniões, aos capitães das indústrias e de líderes do comércio, aos quantos possam influir no processo de revalorização do homem de cor pela exata aplicação em seu favor, das normas da verdadeira igualdade de oportunidades (ANAIS DA ASSEMBLEIA DO RS, 1963, p. 189).

    Contudo, o político sentenciou: Cabe esta tarefa aos partidos políticos que [...] são peças necessárias do regime democrático e instrumento de uma ideia social. Santos concluiu seu discurso de 75 anos da abolição, citando que era necessário cumprir a versão econômica do dia 13 de maio, que é a ascensão do negro como classe, sem as relutâncias dos embargos ao negro como raça (ANAIS DA ASSEMBLEIA DO RS, 1963, p. 189).

    O modelo político para equilibrar as tensões da incipiente democracia foi identificado na ideologia trabalhista, promovida pelo estado e pela mobilização dos movimentos sociais originada com esse processo. Esses movimentos passam a ter espaço no período conhecido como populismo ou do pacto trabalhista, os quais iriam sofrer um duro revés em 1964 com a ditadura civil-militar.¹⁸

    As demandas do movimento social negro no parlamento

    Sem ilusão biográfica, como alerta Pierre Bordieu (1996), e por meio da renovação da história política – como aponta René Rémond (2003) –, em que os sujeitos atuam sob as tensões sociais e culturais que os cercam, evidenciam-se as ações de Carlos Santos em consonância com as demandas do movimento negro.

    Das 318 intervenções realizadas por Carlos Santos no parlamento sul-rio-grandense, como deputado estadual (1958-1974), 41, ou 12,89% foram em torno das demandas da identidade negra, perfazendo uma considerável mediação política em torno das causas defendidas pelo movimento negro.¹⁹

    Para Orlandi (2001, p. 10), no momento em que o sujeito diz o que diz, ele se assume como autor. Seus sentimentos, seus desígnios, suas expectativas e sua determinação são identificados. O sujeito é determinado pela exterioridade, pela formulação discursiva, passível de contradições. Ainda segundo a autora, tratar a questão da ideologia é criar condições teóricas e metodológicas para observá-la; é observar o funcionamento do discurso.

    Enfatiza-se que a ação e o discurso são as formas com que os seres humanos aparecem uns aos outros. Uma vida sem discurso e sem ação é, literalmente, morta para o mundo; deixa de ser uma vida humana, uma vez que já não é vivida entre as pessoas. "O agir, em seu sentido mais geral, significa tomar iniciativa, intervir, iniciar, começar, conduzir e, finalmente, governar, imprimir movimento a alguma coisa (que é o significado original do termo latino agere)" (ARENDT, 2011, p. 220-221).

    Em pleno regime ditatorial, em maio de 1966, em outra intervenção em homenagem à Abolição, o parlamentar disse:

    Falando a um repórter da Revista Time, de Nova Iorque, como antes fizera a um representante da Revista Ébon, que se edita em Chicago, neguei peremptoriamente a existência de segregação racial no Brasil, porque somos de fato um caldeirão de raças [...] (ANAIS, maio, 1966, v. 194, p. 120).

    Em 1967, Carlos Santos foi eleito pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Em 31 de janeiro, foi selecionado para o cargo de presidente do Legislativo, sendo convocado para assumir o governo do Rio Grande do Sul em ocasião da viagem à Guanabara do governador Walter Peracchi Barcellos (1907 - 1986), da Aliança Renovadora Nacional (Arena) (GOMES, 2014).²⁰

    Na ocasião, muitos jornais porto-alegrenses analisaram com satisfação a elevação de Carlos Santos ao posto máximo do estado, pois, em virtude das disputas acirradas entre correligionários da Arena e do MDB, partidos fundados no contexto da ditadura militar, esse personagem era uma unanimidade, inclusive representando, conforme o noticiado, a conciliação dessas duas facções, mesmo que temporariamente. Esse fato também foi utilizado pela imprensa sulina para dignificar a harmonia das raças e a democracia racial no estado, pois o exemplo servia como modelo para o sucesso brasileiro diante de outros países que mantinham os negros segregados, como os Estados Unidos e a África do Sul (GOMES, 2008).

    Por outro lado, essa situação evidencia o contexto ideológico dispensado aos políticos negros, já que se aceita a ascensão de Carlos Santos ao parlamento regional, diferentemente do caso de Monteiro Lopes no início da República.²¹ Todavia a elevação de Carlos Santos não significou a superação do racismo, pois foram os casos de discriminação racial – como o sofrido por uma professora negra que não conseguia emprego e pelos negros impedidos de entrar em clubes – que o motivaram a encarar essas demandas no plenário. Como vimos, no início de sua carreira política, era adepto da democracia racial, a qual tornou-se, devido as discriminações raciais sofridas pela comunidade negra, um famigerado mito (GOMES, 2005). Diante disso, três aspectos evidenciam as relações entre a agenda do movimento negro e a atuação política de Carlos Santos: a) a luta contra o racismo, b) a alusão ao referencial simbólico de Zumbi e c) o acesso das populações negras ao mercado de trabalho.

    As denúncias contra a discriminação racial no Rio Grande do Sul

    A forma mais usual dos grupos solicitarem a mediação de Carlos Santos em seus problemas cotidianos era por meio de correspondências (COSTA, 2013). O deputado respondia todas as cartas enviadas para o seu gabinete. Além disso, muitas dessas cartas tinham ressonância na Assembleia, ou seja, tinham amplitude na voz do parlamentar.

    Carlos Santos, com o tempo, devido a situações de discriminação sofridas por negros em clubes sociais, passou a questionar as relações raciais cotidianas existentes no Rio Grande do Sul. Santos denominava as práticas discriminatórias de pruridos racistóides. ²²

    O parlamentar subiu à tribuna, no dia 4 de fevereiro de 1965, para ‒ como primeiro orador inscrito ‒ denunciar os estúpidos inimigos da nação da cidade de Pelotas, RS, por não terem permitido a entrada de Francisco de Paula Soares, vereador da cidade, e de mais dois amigos negros, no Clube Oásis Praia Club (ANAIS, v. 182, p. 273- 274, dez. 1964, fev. 1965).

    Francisco Soares era vereador, portanto, com condições econômicas para frequentar o Clube. Carlos Santos acreditava que, com as questões econômicas estabelecidas, poucas possibilidades restariam aos problemas raciais. Mas acredita-se que depois desse episódio ele notaria mais uma vez que os pruridos racistóides eram para além das questões econômicas.

    Em setembro de 1965, ele denunciou outro caso de prurido racistóide ocorrido no Estado. Da tribuna, prestou solidariedade e denunciou o racismo, estúpido, antibrasileiro e retrógrado, que entre nós e que se afigura a um cancro corrosivo da própria unidade nacional (ANAIS, v. 183, p. 74, mar. 1965). Também citou o caso da filha do Capitão e ex-pracinha, Sr. Osvaldo Marques de Souza: Que lutou contra a tirania de Adolf Hitler, mas que em sua cidade, Taquari, sua filha foi proibida de entrar no baile de formatura realizado no Clube Alvi-Negro. Narra outra situação constrangedora: O CTG Pelego branco tinha uma placa escrita: proibida a entrada de morenos (ANAIS, v. 183, p. 74, mar. 1965).

    Nesse contexto de autoritarismo, eram complicadas as pressões enfrentadas quanto aos debates referentes à discriminação racial, pois, como afirmou José Correia Leite, fundador da organização negra Frente Negra Brasileira, em entrevista referente às homenagens dos 80 anos da abolição: Falar de racismo era tabu (NASCIMENTO, 1968, p. 21).

    O terceiro caso de racismo denunciado por Carlos Santos em plenário ocorreu no dia 18 de maio de 1973, portanto, três dias depois das comemorações dos 84 anos da abolição da escravidão, o tribuno ocupou o púlpito para versar sobre um caso de discriminação racial ocorrido no interior do Estado. Conforme o deputado, foi "lamentável o caso de racismo ocorrido na cidade de Santa Vitória do

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