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Aposentadoria Especial na Nova Previdência: os caminhos do Direito Previdenciário
Aposentadoria Especial na Nova Previdência: os caminhos do Direito Previdenciário
Aposentadoria Especial na Nova Previdência: os caminhos do Direito Previdenciário
E-book677 páginas19 horas

Aposentadoria Especial na Nova Previdência: os caminhos do Direito Previdenciário

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Sobre este e-book

Autor: Diego Henrique Schuster

Prefácio: Adriane Bramante de Castro Ladenthin

Apresentação: Melissa Folmann

O objetivo deste livro é fornecer condições para uma adequada compreensão, interpretação e aplicação das novas regras da aposentadoria especial. Assim, a escolha, a reiteração e a recombinação dos temas propostos permitirão – assim esperamos – um salto de significado. Considerando as inúmeras situações e dificuldades que gravitam em torno da caracterização e comprovação do tempo de serviço especial, o que se compartilha com o leitor são os problemas enfrentados no dia a dia e, por óbvio, soluções possíveis – já experimentadas ou em construção. O uso de alegorias e metáforas não reconhecidas na prática desempenham um papel importante quando se tenta entender a prática. Este livro é uma viagem sem volta! (O autor)

Aposentadoria Especial na Nova Previdência: os caminhos do Direito Previdenciário

"Meus parabéns dirijo a você leitor que tem em suas mãos um instrumento transformador de vidas, pois em cada linha certamente você
pensará no quanto ainda deve aprender e refletir sobre a aposentadoria especial, mantendo em sua mente uma das frases usadas pelo autor ao se
referenciar a um de seus professores: "a certeza de que não sabemos tudo, nem demais"" (Melissa Folmann, em Apresentação).

Aposentadoria Especial na Nova Previdência: os caminhos do Direito Previdenciário

É exatamente isso que o estudioso Diego Henrique Schuster faz nesse trabalho, com a desenvoltura e as palavras sempre tão bem colocadas,
que nos imerge e nos faz viajar nas inúmeras divergências e incongruências do texto modificado, nos apresentando um cenário recheado de
novas possibilidades.

Sua preocupação com o futuro dos trabalhadores expostos a agentes nocivos é flagrante. O que farão após completar o tempo mínimo de
exposição sem ter alcançado a idade mínima? Teses sobre a conversão do tempo especial em comum ou mesmo sobre a possibilidade de se aplicarem as regras de transição 3 (pedágio de 50%) e 4 (pedágio de 100% + idade mínima) foram cuidadosamente estudadas, para que o leitor pudesse enxergar "fora da caixinha". Apesar de excluída a vedação por exposição à periculosidade, inegavelmente não há mais respaldo constitucional para garanti-la dentro da "nova" aposentadoria especial. Será? O autor traz os números da acidentalidade e releva não ser razoável qualquer mudança acerca dessa exclusão.

Essas e outras questões foram delineadas cuidadosamente por Diego, que nos permite uma leitura prazerosa e convidativa à reflexão sobre
o benefício mais complexo de todos. Sua didática e intimidade com as palavras, sempre na medida exata, além de recheadas de metáforas, nos
dão a certeza de que haverá muito a debater e que isso é apenas o começo de uma longa e instigante caminhada". (Adriane Bramante, em Prefácio)
IdiomaPortuguês
Data de lançamento16 de jun. de 2021
ISBN9786589533115
Aposentadoria Especial na Nova Previdência: os caminhos do Direito Previdenciário

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    Aposentadoria Especial na Nova Previdência - Diego Henrique Schuster

    APOSENTADORIA ESPECIAL E

    A NOVA PREVIDÊNCIA:

    os caminhos do Direito Previdenciário

    DIEGO HENRIQUE SCHUSTER

    APOSENTADORIA ESPECIAL E

    A NOVA PREVIDÊNCIA:

    os caminhos do Direito Previdenciário

    Rua Itupava, 118 - Alto da Rua XV, CEP 80045-140 Curitiba – Paraná

    Fone: (41) 3075.3238 • Email: alteridade@alteridade.com.br

    www.alteridade.com.br

    Conselho Editorial

    Carlos Luiz Strapazzon

    Claudia Rosane Roesler

    Daniela Cademartori

    Fabiano Hartmann Peixoto

    Guido Aguila Grados

    Ingo Wolfgang Sarlet

    Isaac Reis

    Jairo Enrique Herrera Pérez

    Jairo Gilberto Schäfer

    José Antonio Savaris

    Marcos Garcia Leite

    Luis Alberto Petit Guerra

    Paulo Márcio Cruz

    Zenildo Bodnar

    S395

    Schuster, Diego Henrique

    Aposentadoria especial e a nova previdência [livro eletrônico] : os caminhos do direito previdenciário / Diego Henrique Schuster - 1.ed. – Curitiba: Alteridade, 2021.

    384p.; 23cm

    ISBN 978-65-89533-11-5

    1. Direito previdenciário. 2. Previdência social – Legislação. 3. Aposentadoria especial. I. Título.

    CDD 344.032(22.ed)

    CDU 349.3

    Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

    Catalogação: Mª Isabel Schiavon Kinasz, CRB9 / 626

    Diagramação: Jonny M. Prochnow

    Capa: Paulo Benczik

    Aos meus filhos, Benjamin e Teodora,

    por encherem minha vida de cor e alegria.

    Ciente de que não há causas vitoriosas, tomo gosto pelas causas perdidas: elas requerem uma alma inteira, igual à sua derrota, como a suas vitórias passageiras. (Albert Camus)

    PREFÁCIO

    A complexidade das questões que envolvem a aposentadoria especial exige reflexões panorâmicas e uma imperiosa revisitação aos conceitos e motivações de sua criação.

    Desde quando foi instituído, o benefício esteve voltado para a prevenção da saúde do trabalhador, após alcançar o tempo mínimo de exposição, retirando-o do ambiente nocivo antes que sofresse os prejuízos deletérios dos agentes agressivos (ainda que saibamos estar em Repercussão Geral sua permanência na mesma ou em outra atividade nociva), aplicando-se o Princípio da Precaução/Prevenção.

    O desenho da proteção que ele propunha permitiu, por quase sessenta anos, evitar muitas doenças e mortes prematuras pela exposição excessiva nesse trabalho hostil.

    O Brasil é o quarto no mundo em acidente do trabalho, atrás da China, Índia e Indonésia. São 700 mil acidentes de trabalho por ano. A cada 48 segundos ocorre um acidente de trabalho e a cada 3h38 um trabalhador perde a vida pela falta de uma cultura de prevenção à saúde e à segurança do trabalho. Será que estávamos preparados para mudar as regras de um benefício, cujo objetivo principal sempre foi proteger esse trabalhador exposto a agentes nocivos? Estamos na contramão da história com esse quadro dramático e infeliz de acidentalidade? Ou o critério econômico pesou mais na hora de decidir pelas alterações legislativas?

    Como bem colocado pelo autor neste livro, a Organização Internacional do Trabalho divulgou que o Brasil gastou 20,4 bilhões com pagamento de auxílio-doença e 61,5 bilhões com aposentadoria por invalidez. A economia perde anualmente 4% do PIB, com pagamentos de benefícios por incapacidade, além de perdas humanas e de produtividade em razão de trabalho insalubre ou inseguro. Estabelecer uma idade mínima para a aposentadoria especial sem qualquer estudo epidemiológico e atuarial, certamente dispenderá um gasto ainda maior, na medida em que aumentará, inexoravelmente, as concessões dos benefícios por incapacidade, pensões por morte, além dos serviços de saúde, o que refletirá em toda a sociedade.

    Para Armando de Oliveira ASSIS, o risco social, ao atingir um indivíduo, reflete em toda a sociedade. Segundo ele, o "risco social, conforme pretendemos modelar, é o perigo, é a ameaça a que fica exposta a coletividade diante da possibilidade de qualquer de seus membros, por esta ou aquela ocorrência, ficar privado dos meios essenciais à vida, transformando-se, destarte, num nódulo de infecção no organismo social que cumpre extirpar"*.

    Pode ser ilusório criar regras mais rígidas e inflexíveis para a aposentadoria especial, sem, no mínimo, um estudo aprofundado, pautado em dados empíricos, para justificar as mudanças ocorridas e os planos de proteção a esses trabalhadores. Mas não foi o que ocorreu. A novas regras já estão vigentes desde a promulgação da EC 103/19. Cabe-nos agora, refletir para encontrar outras teses a partir do novel texto constitucional.

    É exatamente isso que o estudioso Diego Henrique Schuster faz nesse trabalho, com a desenvoltura e as palavras sempre tão bem colocadas, que nos imerge e nos faz viajar nas inúmeras divergências e incongruências do texto modificado, nos apresentando um cenário recheado de novas possibilidades.

    Sua preocupação com o futuro dos trabalhadores expostos a agentes nocivos é flagrante. O que farão após completar o tempo mínimo de exposição sem ter alcançado a idade mínima? Teses sobre a conversão do tempo especial em comum ou mesmo sobre a possibilidade de se aplicarem as regras de transição 3 (pedágio de 50%) e 4 (pedágio de 100% + idade mínima) foram cuidadosamente estudadas, para que o leitor pudesse enxergar fora da caixinha. Apesar de excluída a vedação por exposição à periculosidade, inegavelmente não há mais respaldo constitucional para garanti-la dentro da nova aposentadoria especial. Será? O autor traz os números da acidentalidade e releva não ser razoável qualquer mudança acerca dessa exclusão.

    Essas e outras questões foram delineadas cuidadosamente por Diego, que nos permite uma leitura prazerosa e convidativa à reflexão sobre o benefício mais complexo de todos. Sua didática e intimidade com as palavras, sempre na medida exata, além de recheadas de metáforas, nos dão a certeza de que haverá muito a debater e que isso é apenas o começo de uma longa e instigante caminhada.

    A felicidade de ter recebido o convite para prefaciar esse livro não me cabe. Fazer parte, de certa forma, de um trabalho dessa magnitude, é uma alegria, ao mesmo tempo, uma preocupação para estar à altura desse autor, que carinhosamente chamamos de pupilo do Direito Previdenciário. Poucos são os autores da nossa área que escrevem com esse conteúdo tão rico e com tanta propriedade como o Diego. Agradeço imensamente pelo convite e o parabenizo por ser essa pessoa tão ímpar e tão inteligente. Não tenho dúvidas de que esse livro contribuirá para o avanço das discussões sobre a Nova Aposentadoria Especial!

    Desejo a todos uma agradável leitura!

    Adriane Bramante de Castro Ladenthin

    Advogada. Mestre e Doutora pela PUC/SP. Presidente do IBDP. Autora de livros. Professora e coordenadora de cursos de pós-graduação. Vice-Presidente da Comissão de Direito Previdenciário da OAB/SP.

    APRESENTAÇÃO

    Resiliência, democracia e respeito são as três palavras que definem a presente obra de Diego Henrique Schuster.

    Respeito, uma marca indelével do autor com seus leitores a lhes apresentar uma obra técnica, com reflexões de fundo, interdisciplinares e, acima de tudo, firme no propósito de não apresentar fórmulas prontas ou receitas de sucesso que dia a dia levam o direito previdenciário para a bancarrota.

    Diego, com seu admirável respeito ao leitor, provoca-o em várias passagens da obra, razão pela qual recomendo o início da leitura, para aqueles que buscam milagres, pelo capítulo 5, intitulado Direito Previdenciário do Inimigo. Mas por que iniciar a leitura pelo último capítulo? Para o leitor compreender que a obra não veio para ser mais uma dentre tantas, mas para provocar a reflexão sobre quem é o sujeito da proteção previdenciária no plano abstrato e no plano real e o quanto cada um está disposto a ceder.

    Ceder? Sim porque no confronto entre argumentos normativos e argumentos consequencialistas, alguém cederá de forma técnica. Já no mundo calcado exclusivamente em argumentos consequencialistas sempre haverá um fim para justificar o meio e, claramente, paixões levarão ao precipício.

    Por isso o capítulo 5 instiga o leitor a perceber que, enquanto permanecer no plano do discurso evasivo de ser a filosofia do Direito algo distante e desimportante para a prática previdenciária, não há futuro mesmo para o novo direito previdenciário, pois este não passa de se um senhor antigo revisitando seu passado e incorrendo nos mesmos erros. Enquanto o leitor permanecer na busca do pote de ouro por trás do arco-íris, traduzindo enquanto permanecer no sonho de modelos, irreflexões, paixões, para chegar ao melhor Direito, o Direito Previdenciário do Inimigo existirá, pois engana-se aquele que parte com o dedo em riste apontado para o Poder Judiciário sem antes olhar a sua própria atuação.

    E o Direito Previdenciário do Inimigo leva o leitor a compreender a importância do capítulo 1 quando Diego, festejadamente, e como ele mesmo diz por fim, mas nem tanto, apresenta ao leitor o cenário da EC 103/2019 sem o arremedo de uma busca pela justiça, mas o concreto estilo de ser refletir sobre conceitos, aplicar a hermenêutica e compreender o universo da Justiça Social não como o bem do outro, mas do coletivo*.

    O nem tanto de Diego, democraticamente, encontra em suas conclusões sobre o Tema 709/STF o perfeito casamento porque, mesmo com temáticas diversas, a hermenêutica toca novamente o ponto nodal de todo o discurso sobre a aposentadoria especial, promovendo o conflito entre haver uma função para o processo previdenciário e o consequencialismo quando divorciados do plano social.

    Por fim, resiliência nos capítulos 3 e 4, quando Diego expõe suas preocupações com a forma de interpretação e de aplicação de conceitos e institutos norteadores da aposentadoria especial, sempre indicando uma alternativa técnica para cada problema posto ao, nas palavras de Diego, administrador do tempo: o juiz.

    Todavia, resiliência não se processa em corpos fulminados pela tentadora vontade de olhar para frente sem aprender com o passado. Talvez aqui resida a importante colocação de Diego sobre as regras de experiência nas demandas previdenciárias e o CPC como garantia contra as armadilhas no processo previdenciário, com exemplos práticos de uma e de outra, que mais tarde encontram resposta na coerência.

    Vivamente Diego redigiu uma obra que teria tudo para partir da casualística e se perder em divagações de justiça ou Direito, porém o leitor pode ter a certeza de que nem a justiça nem o Direito presentes coloquialmente no senso comum nortearam a presente obra. Mas, sim, a construção técnica, precisa e fundamentada por que clamam os Tribunais ao serem provocados.

    Finalizo sem dar parabéns ao autor porque seria redundante, diria eu, até piegas.

    Meus parabéns dirijo a você leitor que tem em suas mãos um instrumento transformador de vidas, pois em cada linha certamente você pensará no quanto ainda deve aprender e refletir sobre a aposentadoria especial, mantendo em sua mente uma das frases usadas pelo autor ao se referenciar a um de seus professores: a certeza de que não sabemos tudo, nem demais.

    Por certo, desejo a você leitor firmeza nos caminhos do Direito Previdenciário. Afinal, de discursos sobre justiça social, a retórica e o google conhecem bem, pois aceitam qualquer coisa. Precisamos é da prática e para se chegar a ela de forma concreta não há caminho sem filosofia do Direito, sem obras densas, sem reflexão. Isso sob pena de continuarmos a ouvir e ler falácias facebookianas, instagrianas, whatsappianas e depois reclamarmos quando essas são replicadas em decisões administrativas e judiciais.

    Agradeço a Diego a honra de apresentar a obra Aposentadoria Especial e a Nova Previdência; uma honra dupla, primeiro por ser uma obra de Diego, amigo querido, companheiro de tantas reflexões e debates; e, segundo, pela qualidade do texto publicizado.

    Parafaraseando Heráclito: não se pode entrar duas vezes no mesmo rio, portanto, usemos as lições de Diego para, nos caminhos do direito previdenciário, não cometermos mais os mesmos erros.

    Curitiba, 28 de março de 2021 (Domingo de Ramos)

    Melissa Folmann

    Advogada, Professora da PUCPR, Coordenadora da Pós-graduação em Advocacia em Regimes Próprios de Previdência Social pela ESMAFE/PR

    SUMÁRIO

    Capítulo 1 – INTRODUÇÃO

    Capítulo 2 – APOSENTADORIA ESPECIAL: NOVAS TESES

    2.1 - Considerações Preliminares e Necessárias

    2.1.1 - A importância dos conceitos jurídicos em matéria previdenciária: (des)continuidades presentes na nova previdência

    2.1.2 - O que deve nos acompanhar…

    2.1.3 - Uma mudança no texto constitucional: são tantas perguntas (Show da Luna)

    2.1.3.1 - Da exigência de carência (180 contribuições mensais) na nova previdência

    2.1.3.2 - Da tabela do artigo 142 da Lei de Benefícios: é possível a idade fixar a carência exigida para depois da EC 103/2019?

    2.1.3.3 - Do tempo de contribuição na EC 103/2019

    2.1.3.4 - Da conversão do tempo de contribuição para fins de aumento da RMI (Renda Mensal Inicial) da aposentadoria por idade (na regra transitória e geral)

    2.1.3.5 - Do direito adquirido…

    2.1.3.6 - Do mínimo divisor…

    2.1.3.7 - Exclusão de contribuições: cuidado!

    2.1.4 - Por fim, mas nem tanto…

    2.2 - Justiça Social e Pobreza

    2.2.1 - O adicional de 25%: qual a lógica do sistema?

    2.2.2 - O adicional de 25% (para qualquer aposentadoria) à desaposentação: estamos no caminho certo?

    2.2.3 - O adicional de 25% (sobre as demais aposentadorias): o STJ incorreu em ativismo judicial?

    2.3 - Aposentadoria Enquanto Técnica de Proteção Específica da Previdência Social

    2.3.1 - Os princípios que fundamentam o risco na aposentadoria especial

    2.3.2 - A nova aposentadoria especial: bem-vindos!

    2.3.3 - Uma interpretação hermeneuticamente adequada do artigo 25, § 2º, da EC 103/2019

    2.3.4 - A conversão do tempo de serviço especial em comum na DER (data de entrada do requerimento) e o fator de conversão após a reforma da previdência: limites e (im) possibilidades

    2.3.5 - A conversão do tempo de serviço especial em comum dentro da regra de transição da aposentadoria especial

    2.3.6 - A aplicação da regra de transição prevista no artigo 17 da EC 103/2019 (RT3)

    2.3.7 - O cálculo do valor benefício de aposentadoria especial

    2.3.8 - A aplicação da regra de transição prevista no artigo 20 da EC 103/2019 (RT4)

    2.4 - Aposentadoria Especial pela Via da Periculosidade: Vamos Dar Chance ao Azar?

    2.5 - (Im)Possibilidade de Percepção do Benefício da Aposentadoria Especial na Hipótese em que o Segurado Permanece no Exercício de Atividades Laborais Nocivas à Saúde (Tema 709/STF)

    Capítulo 3 – CARACTERIZAÇÃO E COMPROVAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL: UMA PROBLEMATIZAÇÃO

    3.1 - Requisitos à Comprovação da Atividade Especial: Quando a Distância Aproxima o Direito Trabalhista do Direito Previdenciário

    3.1.1 - O princípio da precaução diante da ausência de regulamentação e das incertezas quanto aos riscos das nanopartículas: a busca de uma orientação operacional em matéria previdenciária

    3.2 - Atividade Especial do Vigilante: Com Uso de Arma de Fogo?

    3.3 - Enquadramento Por Categoria Profissional: Por Analogia?

    3.4 - Motorista de Caminhão e Ônibus: Do Risco à Integridade Física e Mental Até a Vibração

    3.5 - Os Critérios de Habitualidade e Permanência na Exposição aos Agentes - Eletricidade e Biológicos

    3.6 - Radiação Solar no Meio Ambiente do Trabalho: Quais as Consequências Jurídicas na Saúde do Trabalhador?

    3.7 - Agente Físico Ruído Acima de 90 Decibéis: o Mito Grego de Sísifo

    3.7.1 - Os limites, as metodologias e os procedimentos: como aferir o nível de exposição do trabalhador ao agente físico ruído sem perder de vista o destinatário da norma (de proteção) previdenciária?

    3.8 - Equipamento de Proteção Individual (epi): O Que Forma o Sentido Jurídico de (In)Eficácia em Matéria Previdenciária?

    3.9 - Diferença entre Auxílio-Doença Previdenciário e Auxílio-Doença Acidentário Para Efeitos de Tempo Permanente de Trabalho Especial

    Capítulo 4 – DIREITO PROCESSUAL (PREVIDENCIÁRIO)

    4.1 - Resgate da Função do Processo (Previdenciário)

    4.2 - Prova Pericial: Sistema Jurídico Cobra Critérios Para Seu (In)Deferimento e Não Apenas a Efetivação das Garantias Constitucionais

    4.2.1 - Qual o limite da dúvida (em desfavor do segurado)?

    4.3 - Laudos por Analogia e Prova Emprestada em Matéria Previdenciária: É Possível se Emprestar o Contraditório?

    4.4 - Regras de Experiência: Utilização nas Ações Previdenciárias

    4.5 - CPC é Garantia Contra Armadilhas em Matéria Previdenciária?

    4.6 - Reafirmação da der na Tese do Fato Superveniente: Uma (Re)Afirmação do Direito Fundamental-Social-Previdenciário

    4.6.1 - A reafirmação da DER: entre a coerência e a data de ajuizamento da ação

    4.6.2 - E quando a aposentadoria concedida na via administrativa impede a concessão do benefício postulado na justiça?

    4.7 - Como Garantir Celeridade à Luz do Novo Código de Processo Civil? Consideração do Tempo de Serviço Prestado às Forças Armadas Como Especial e Seu Cômputo no RGPS: Desafio Para o Administrador do Tempo, o Juiz!

    4.7.1 - As considerações preliminares

    4.7.2 - A legitimidade passiva do INSS para conceder o benefício da aposentadoria especial

    4.7.2.1 - Da (im)possibilidade de litisconsórcio passivo necessário entre INSS e União

    4.7.2.2 - Da conexão e/ou suspensão do processo

    4.7.2.3 - Da garantia da duração razoável do processo: o juiz como gestor do tempo

    4.7.3 - As considerações finais

    4.8 - É o Fim da Competência Delegada?

    4.9 - Aposentadoria da Pessoa com Deficiência

    Capítulo 5 – DIREITO PREVIDENCIÁRIO DO INIMIGO

    5.1 - Discurso Sobre Um Direito de Exceção

    5.2 - Antecipação da Intervenção Punitiva: a Utilização de Discursos de Justificação Prévia

    5.3 - Flexibilização de Garantias Processuais e o Desrespeito ao Núcleo Duro do Devido Processo Legal (Processo Justo)

    5.4 - Demonização do Segurado: Destinatário das Normas (de Proteção) Previdenciárias

    5.5 - Considerações Finais

    Capítulo 6 – UMA ÚLTIMA PALAVRA

    REFERÊNCIAS

    CAPÍTULO 1

    INTRODUÇÃO

    A partir de uma análise holística e integrada do conjunto do Direito, pretende-se refletir a respeito das mudanças operadas pela Emenda Constitucional (EC) 103/2019¹, com maior atenção para a aposentadoria especial (ou o que dela restou), buscando integrá-las a um sistema coerente, no qual deverão ser observados os princípios que comandam a aplicação das regras previdenciárias, bem assim os objetivos de um Estado Democrático de Direito (art. 3º) e da Ordem Social (art. 193) – diretrizes axiológicas, fixadas na Constituição Federal, para interpretação e aplicação da normatização protetiva previdenciária.

    O objetivo é fornecer condições para uma adequada compreensão, interpretação e aplicação das novas regras da aposentadoria especial. Assim, a escolha, a reiteração e a recombinação dos temas propostos permitirão – assim esperamos – um salto de significado para a ideia de jurisdição constitucional, o papel do Judiciário, a função dos princípios constitucionais e a realização de um devido processo legal, em matéria previdenciária. Aqui se aprende a caminhar já suportando a circularidade, pois é na relação do dito e pensado que se desvela o não dito e não pensado.

    A contrário senso, a filosofia do direito acrescenta – e muito – à legislação e à prática judicial. A reflexão filosófica a respeito do direito é capaz de dotá-lo de uma função crítica dos seus próprios pressupostos teóricos, além de permitir uma avaliação valorativa da sua prática. Como bem observa Vicente de Paulo Barreto:

    Se a ciência do direito reduz-se, como na perspectiva kelseniana, a uma análise da estrutura interna do direito positivo, ela não pode integrar em suas considerações as ideias de justo e do injusto, fazendo com que não se possa realizar uma verdadeira avaliação do sistema jurídico, principalmente, daquele que consagra situações de injustiça.²

    A EC 103/2019 representa uma situação sem retorno, mas que precisa do estranhamento. É preciso questionar (refletir). A falta de reflexão ou mera reprodução da literalidade dos enunciados deixam muito clara a diferença entre a elaboração de um material de consulta e a produção daquilo que se pretende como doutrina ou algo a mais. Já existem livros relativos à nova previdência que fazem isso muito bem. Assim, o que se pretende é lançar uma melhor luz às novas regras, a fim de fornecer condições para se ultrapassar os limites do positivismo tradicional e, até mesmo, aqueles limites impostos pelo senso comum. Decerto, não se pretende negar aquilo que foi produzido democraticamente. Contudo, não estamos resignados, porque ainda nos cabe perquirir a constitucionalidade dos novos dispositivos.

    O trabalho, no seu desenvolvimento, está dividido em quatro capítulos. No primeiro capítulo, trabalham-se aspectos importantes da nova previdência social, todos relacionados com a aposentadoria especial; aspectos que fornecem o significado exato da interpretação dos conceitos jurídicos, a fim de bem demarcar as fronteiras e proposições deste trabalho. No segundo, ganham destaque os critérios de caracterização e comprovação da atividade especial, sendo possível se discernir os princípios que norteiam – deveriam nortear – as decisões judiciais; pois, mesmo quando o julgador pensa estar aplicando, única e exclusivamente, uma regra, ele está aplicando também os princípios que a fundamentam. No terceiro, busca-se um resgate da função do processo, não sendo possível ao Poder Judiciário se contentar com a declaração do direito material ou a mera reprodução da realidade. No quarto e último, o presente trabalho arrisca algumas comparações entre a teoria do Direito Penal do inimigo e aquilo que acontece, sobretudo, no âmbito dos Juizados Especiais Federais.

    O último capítulo corre o risco de soar severo demais diante das últimas decisões proferidas pela Turma Nacional de Uniformização ou da atuação elogiável de muitos magistrados, já que escrito na pendência de decisões acerca de alguns temas ou sob a influência de críticas, compartilhadas pela comunidade jurídica, a determinadas orientações, que coloca(ra)m em discussão o nível de preparo e de comprometimento dos magistrados. A sua manutenção no livro tem como finalidade lembrá-los de comportamentos que causam danos à toda uma visão social que merece o Direito Previdenciário, não apenas no âmbito dos Juizados Especiais Federais. Dito de outro modo, não podemos incorrer nos mesmos tão criticados. E, nessa perspectiva, a crítica é sempre construtiva.

    Ainda a respeito da aposentadoria especial, este trabalho foca em questões que escaparam ou cuja importância não se percebeu; vale dizer: de modo reflexivo ou para além de uma reprodução da literalidade dos novos enunciados, mormente por parte de quem aprovou a reforma da previdência social. A retomada do tema, portanto, não é pura repetição do que já foi dito. É exigência de uma reflexão crítica a respeito da prática, sem a qual a aposentadoria especial pode virar uma ficção e a realidade uma tragédia para os trabalhadores expostos a agentes nocivos.

    Considerando as inúmeras situações e dificuldades que gravitam em torno da caracterização e comprovação do tempo de serviço especial, o que se compartilha com o leitor são os problemas enfrentados no dia a dia e, por óbvio, soluções possíveis – já experimentadas ou em construção. A impossibilidade de se prever todos os desfechos – ou favorecer aquele que efetivamente aconteceu³ – cria uma situação que implica verdadeira armadilha processual; fazendo, em muitos casos, garantias processuais sucumbirem e deixando o processo distante da sua verdadeira finalidade.

    Dois outros avisos iniciais são necessários. O primeiro chama a atenção para o fato de o trabalho não apostar em esquemas, modelos, etc., embora se reconheça e aplauda a iniciativa de quem se preocupa em facilitar a vida dos advogados, mormente os iniciantes. O segundo, que atravessa cada linha desse trabalho, afirma o reconhecimento e o respeito pela opinião contrária, pois esse tipo de relação parte da certeza de que não sabemos tudo, nem demais, o que aprendi com o professor Wilson Engelmann.

    A propósito, a primeira pessoa do plural (nós) em algumas frases pressupõe um tipo de comunidade ou irmandade entre previdenciaristas, mesmo correndo-se o risco de não ser essa a opinião do leitor acerca da situação; enfim, ainda que o leitor não sinta ou pense igualmente ao escritor. Esclarecemos que a opção por nós não tem como objetivo impor o ponto de vista do escritor, relembrando o esclarecimento de John Holloway, para quem a terceira pessoa, igualmente, não é garantia de um ponto de partida neutro, já que pressupõe a supressão do nós!

    Este livro deve representar um ponto de partida que deve ser respeitado e criticado. A crítica e o respeito não são rejeitados. O que se rejeita é uma perspectiva prepotente e toda forma de pensar que provém dela ou apoia tal perspectiva. Muitas ideias aqui pertencem aos filósofos e, a respeito delas destaca-se que não são reconhecidas na prática, mas se justificam pelo papel que desempenham quando se tenta entender a prática, como bem ensina Ronald Dworkin.

    CAPÍTULO 2

    APOSENTADORIA ESPECIAL: NOVAS TESES

    2.1 - CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES E NECESSÁRIAS

    No plano prático ou teórico, a instituição ou aumento do limite de idade, bem assim a redução dos valores pagos, são uma tendência mundial diante do envelhecimento da população, das baixas taxas de natalidade e da insuficiência generalizada de recursos. Todo e qualquer debate – sóbrio e comedido – passa, necessariamente, pelo reconhecimento destas influências e/ou tendências, buscando-se o adequado dimensionamento do Estado moderno, na formação do que muitos denominam Estado Pós-Social.

    Paradoxalmente, verifica-se um reforço do princípio da solidariedade, na seguinte lógica:

    Quanto mais previsível for a prestação e quanto mais for o sistema vinculado ao tradicional sistema de seguro social, mais evidente será a relação jurídica única. Ao revés, quando maior a imprevisibilidade da prestação, e quanto maior a solidariedade do sistema, menor será a relação entre custeio e benefício, individualmente considerada.

    Com a nova previdência, tem-se uma redução da probabilidade de o segurado conseguir se aposentar, por conta do fim da aposentadoria por tempo de contribuição. Aos desvalidos (com baixa escolaridade e emprego inseguro) restará apenas a conformação com a necessidade de trabalhar até os 65 anos de idade, se homem, e 62, se mulher. Via de regra, os segurados deverão contribuir mais e por mais tempo (e receber por menos tempo). Por outro lado, é possível haver um incentivo ao trabalho informal.

    Nas aposentadorias por tempo de contribuição, a média de idade é 54,22 anos, porque muitos são os que começa(ra)m trabalhar cedo e em atividades insalubres, penosas ou perigosas. No campo, 78,2% dos homens e 70,2% das mulheres começam a trabalhar antes dos 14 anos de idade.⁷ Com efeito, as aposentadorias por tempo de contribuição ou especial eram, ao mesmo tempo, uma das poucas vantagens para esses trabalhadores. Em retrospectiva, fica claro o retrocesso social⁸, já que, uma vez atingindo um determinado nível de proteção do trabalhador/segurado, esse nível não pode ser diminuído.⁹ Toda e qualquer redução na ordem de prevenção – contra acidentes e doenças laborais –, contida nos preceitos normativos vigentes, configura um retrocesso.

    A recente reforma previdenciária introduziu grandes males para corrigir menores. A ideia era acabar com privilégios, já que apenas 15% dos mais ricos acumulam 47% da renda previdenciária, diziam as vozes oficiais. No entanto, qual a solução proposta? Acabar com a aposentadoria por tempo de contribuição, ou melhor, não permitir a aposentação antes dos 62 anos, se mulher, ou 65 anos, se homem. A PEC 06/2019¹⁰ partiu da equivocada premissa de que quem ganha acima de 2 salários mínimos pode ser considerado rico. E, mesmo que assim fosse, grande coisa os ricos se aposentarem com a mesma idade. A pergunta que devemos fazer: Quem mais precisa ou depende do benefício previdenciário?¹¹

    Exatamente as pessoas que estão mais tempo trabalhando, pois ingressaram mais precocemente no mundo do trabalho, ou aqueles cujas atividades ocorrem em ambiente laboral insalubre, perigoso ou penoso. Percebe-se que muitas dessas pessoas apoiaram a reforma da previdência social e, paradoxalmente, se fizeram matar pelas ilusões que lhes proporcionaram uma razão de igualdade meramente formal, sem falar nos que acreditam que há um excesso de direitos trabalhistas/previdenciários. Na trajetória do Estado, o que ocorre não pode ser circunscrito, apenas, a um aumento no número de direitos, mas, isto sim, a uma transformação fundamental no conteúdo do Direito ele mesmo.¹²

    É verdade que os únicos países que não têm idade mínima são Arábia Saudita, Argélia, Bahrein, Egito, Equador, Hungria, Lêmen, Irã, Iraque, Luxemburgo, Sérvia e Síria. Acontece que o Brasil é um país continental, razão pela qual a idade mínima proposta atinge de forma desproporcional, regiões, estados e pessoas, em razão da diferença na expectativa de vida – principalmente por fatores socioeconômicos. Aqui se poderia falar na expectativa de sobrevida com qualidade, que, no Brasil, gravita em torno de 65 anos, ficando atrás de países como México, Chile, Portugal, para citar apenas estes.

    Enfim, não se tira dos ricos para dar aos pobres, a fim de combater privilégios e buscar uma justa distribuição da renda previdenciária. Se tão poucos cumulam 47% da renda previdenciária, por que não estabelecer um teto menor para essas aposentadorias ou uma contribuição para os inativos? Enfim, porque não se atacou o problema? De cada três brasileiros, dois ganham um salário de aposentadoria. No entanto, com estatísticas, os especialistas tentam comprovar, nos termos da frase usada pelo Prof. Lenio Streck, que […] se uma pessoa come um frango por dia, e outro nenhum, ambos comem meio frango por dia.

    Mas, voltando à aposentadoria especial, assim como o princípio da equidade na forma de participação no custeio (art. 194, parágrafo único, V, da CF/88) justifica contribuições maiores para aqueles que recebem maior remuneração – observada a capacidade contributiva –, a solidariedade e a seletividade podem autorizar contribuições relacionadas com o risco da atividade, devendo a coletividade arcar com o custo da prevenção.

    Assim o risco da atividade insalubre e ou perigosa deve ser compartilhado pela sociedade. A solidariedade impõe à coletividade menos compensar os danos e mais preveni-los. O risco surge como discrímen para desigualar contribuintes, e não para cobrar de quem mais demanda prevenção ou serviços.¹³ Não pretendo, por ora, avançar muito além nesse caminho.

    2.1.1 - A importância dos conceitos jurídicos em matéria previdenciária: (des)continuidades presentes na nova previdência

    Aprovada a reforma previdenciária, as novas regras já estão em vigor desde 13/11/2019. A previdência sofreu profundas alterações, colocando em dúvida a aplicação, na prática, de alguns conceitos jurídicos. A proposta deste capítulo é discutir a (des)continuidade desses conceitos, tal como conhecemos, olhando-se para a tradição. Nesse sentido:

    O intérprete não domina a tradição. Os sentidos que atribuirá ao teto não dependem de sua vontade, por mais que assim queiram os adeptos do esquema representacional sujeito-objeto. E se o intérprete impuser sua vontade, já não haverá hermenêutica. Não haverá compreensão. Haverá uma extorsão de sentido.¹⁴

    A reflexão posta em debate emergiu, basicamente, do estranhamento causado pelo texto da EC 103/2019 (é óbvio) e da leitura do artigo Os conceitos jurídicos, do professor José Rodrigo Rodriguez. As mudanças nas regras de aposentadoria levantaram interrogações quanto à permanência e aplicação de alguns conceitos, tais como carência, tempo de contribuição etc., mas não o suficiente para se apostar numa nova ordem constitucional ou numa ruptura de paradigmas, daí a importância de uma reconstrução dos institutos.

    Em Dworkin, a reconstrução linguística é filtrada pelo texto, mormente constitucional. Nessa perspectiva, ganha destaque o conceito de integridade:

    A integridade a que se refere Dworkin significa sobretudo uma atitude interpretativa do Direito que busca integrar cada decisão em um sistema coerente que atente para a legislação e para os precedentes jurisprudenciais sobre o tema, procurando discernir um princípio que os haja norteado.¹⁵

    Assim, o juiz deve conhecer a história institucional do Direito, uma vez que […] o Direito não é apenas uma questão de fato, mas é principalmente uma questão interpretativa.¹⁶ Entretanto:

    O direito como integridade, portanto, começa no presente e só volta ao passado na medida em que seu enfoque contemporâneo assim o determine. Não pretende recuperar, mesmo para o direito atual, os ideais ou objetivos práticos dos políticos que o primeiro o criaram. Pretende, sim, justificar o que eles fizeram (às vezes incluindo, como veremos, o que disseram) em uma história geral digna de ser contada aqui, uma história que traz consigo uma afirmação complexa: a de que a prática atual pode ser organizada e justificada por princípios suficientemente atraentes para oferecer um futuro honrado. O direito como integridade deplora o mecanismo do antigo ponto de vista de que ‘lei é lei’, bem como o cinismo do novo ‘realismo’. Considera esses dois pontos de vista como enraizados na mesma falsa dicotomia entre encontrar e inventar a lei. […] o princípio se ajusta a alguma parte complexa da prática jurídica e a justifica; oferece uma maneira atraente de ver, na estrutura dessa prática, a coerência de princípio que a integridade requer.¹⁷

    A tradição, que traz limites intersubjetivos e, por isso, faz um controle ou constrangimento epistemológico, como fala Lenio Streck, aponta para uma resposta adequada, conforme o direito vigente. É importante pensar na questão dos conceitos jurídicos num plano hermenêutico, como no caso de bem imóvel. Por que o navio é considerado um bem imóvel para fins de garantia real (se ele é móvel)? Assim, devemos pensar a EC 103/2019 enfocando os conceitos previdenciários. Afinal, qual a função dos conceitos jurídicos?¹⁸ O que são eles: o que antes justificavam uma coisa e, talvez, agora não mais?

    A partir da certeza de que a EC 103/2019 acabou com a aposentadoria por tempo de contribuição, a proposta deste artigo é discutir os limites e as possibilidades da nova previdência, o que vai desde os seus critérios de acesso, passando pela possibilidade de conversão do tempo de serviço especial em comum, até o cálculo do valor do benefício previdenciário (aposentadoria).

    2.1.2 - O que deve nos acompanhar…

    É importante uma reconstrução da história institucional do direito numa leitura fundada na teoria de filósofos como Gadamer, Dworkin, para citar apenas esses, como fala Lenio Streck; e aqui a sua a metáfora do hermeneuta pode ser útil para que o leitor possa compreender e aproximar-se dessa proposta

    Nela um hermeneuta chega a uma ilha e lá constata que as pessoas cortam (desprezam) a cabeça e o rabo dos peixes, mesmo diante da escassez de alimentos. Intrigado, o hermeneuta foi buscar as raízes desse mito. Descobriu, finalmente, que, no início do povoamento da ilhota, os peixes eram grandes e abundantes, não cabendo nas frigideiras. Consequentemente, cortavam a cabeça e o rabo. Hoje, mesmo que os peixes sejam menores que as panelas, ainda assim continuam a cortar a cabeça e o rabo.

    Compreendeu assim o fenômeno que se encobria aos moradores mais jovens da ilha, os quais, ao serem questionados o porquê de agirem dessa maneira, respondiam: Não sei […] Mas as coisas sempre foram assim por aqui! Eis o senso comum. Eis a naturalização de uma prática.¹⁹

    O fenômeno, reconstruído, aponta para uma direção. Assim, por exemplo, José Rodrigo Rodriguez explica que os conceitos de bem móvel e bem imóvel nasceram com as sociedades agrárias em que a terra era o bem mais valioso, e por essa razão,

    a compra e venda de bens imóveis foi submetida a formalidades específicas. Comprar uma fazenda não é comprar um chiclete: envolve mais riscos, mais dinheiro, mais poder econômico. Em sociedades de economia agrária, sem indústrias, sem sociedades anônimas, sem mercados de ações, sem navios e sem chuveiros aquecidos; mas com carroças, cavalos e banhos de bacia, as coisas móveis tendiam a ter uma importância econômica menor do que as coisas imóveis.²⁰

    Com efeito, não podemos ficar com a primeira impressão A gente se comunica, no direito previdenciário, por meio de um mesmo conjunto de palavras. Os iniciados aprendem a linguagem, a lógica e os cálculos dos benefícios. E também aprendem que algumas expressões, fora do contexto jurídico (previdenciário), têm funções diversas. Lá fora, as palavras se afastam do sentido jurídico e, por isso, devemos tomar cuidado.

    Temos que tomar cuidado com o senso comum, fora e dentro do Direito. É como adverte José Rodrigo Rodriguez: Mudar um conceito jurídico pode significar ampliar, diminuir ou mudar o foco de sua ação, além de desorientar a ação dos indivíduos que compõem a sociedade sujeita ao seu poder. E conclui: […] um navio tratado juridicamente como imóvel não é, necessariamente, um navio encalhado.²¹ Isto, obviamente, não poderia ser…

    Com tais reflexões instauradas, não pretendo apenas lançar luz sobre as mudanças, mas sobre as teses que devemos continuar a sustentar, pois há uma principiologia constitucional que garante essa continuidade. A abordagem hermenêutica não traduz apenas uma forma sofisticada de tratar o assunto, mas uma tentativa de deixar o texto mais saboroso (assim espero).

    2.1.3 - Uma mudança no texto constitucional: são tantas perguntas (Show da Luna)

    A EC 103/2019 não fala em carência. Assim como a Lei de benefícios fala em 35 anos de contribuição, se homem, e 30, se mulher, na parte da extinta aposentadoria por tempo de contribuição, a regra transitória (e geral), prevista no art. 19 da Emenda em questão estabelece uma idade mínima de 65 anos de idade, se homem, e 62, se mulher, além de exigir 15 anos de tempo de contribuição. Aos homens, inscritos após a publicação da Emenda, serão exigidos 20 anos. A Renda Mensal Inicial (RMI) corresponderá a 60% média + 2% a cada ano, além dos 20 anos para homens ou além dos 15 anos para mulheres, de todo o período contributivo, desde a competência de 07/94.

    Com a nova previdência, o tempo resultante da conversão, no mínimo, até 13/11/2019, poderá ser considerado para aumentar alíquota de cálculo? A conversão do tempo de serviço especial em comum só tem espaço (até 13/11/2019) nas regras de transição da aposentadoria por tempo de contribuição? A dúvida abre espaço para uma outra pergunta: ao segurado é possível completar os 15 ou 20 anos de contribuição – exigidos a título de critério de acesso ao benefício previdenciário – mediante a inclusão do tempo resultante da conversão do tempo de serviço especial em comum ou deve ser observada a exigência de 180 contribuições, como estabelece o inc. II do art. 25, da Lei 8.213/1991²²?

    2.1.3.1 - Da exigência de carência (180 contribuições mensais) na nova previdência

    Segundo o art. 24, da Lei 8.213/91²³, período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências. Ainda, de acordo com o art. 145, da Instrução Normativa 77/2015²⁴, do INSS, por sua vez, "um dia de trabalho, no mês, vale como contribuição para aquele mês, para qualquer categoria de segurado, observadas as especificações relativas aos trabalhadores rurais".

    Imagine-se o seguinte caso: um segurado que contribuiu de 01/12/2004 a 13/11/2019, ele possui 180 meses de carência, mas somente 14 anos, 11 meses e 12 dias de tempo de contribuição. Nesse caso, o segurado está protegido pelo direito adquirido! A propósito, estou sugerindo um segurado homem, com a idade de 65 anos, idade que está implementada antes da EC 103/2019. Ele completou as 180 contribuições mensais e, por isso, tem direito às regras anteriores. No caso de quem não conseguiu cumprir com os requisitos ensejadores do benefício antes de 13/11/2019, o critério de cálculo a ser observado é 60% + 2% a cada ano além dos 20 anos.

    O conceito de carência parece ser mais vantajoso para o segurado. Mas como será a partir da EC 103/2019, já que a nova ordem não fala em carência? Serão exigidos 15 anos de tempo de contribuição? A resposta extrai-se da Portaria INSS 450, de 3 de abril de 2020²⁵, que deixa clara e expressa a manutenção da exigência de carência:

    Art. 5º Fica mantida a carência disciplinada pela Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, mantendo-se, assim, a exigência de 180 (cento e oitenta) contribuições mensais para as aposentadorias programáveis e de 12 (doze) contribuições para a aposentadoria por incapacidade permanente previdenciária, antiga aposentadoria por invalidez previdenciária, classificada como não-programável.

    Parágrafo único. Para definição da carência, deve ser verificado o direito à aplicação da tabela progressiva prevista no art. 142 da Lei nº 8.213, de 1991.

    Art. 7º São requisitos para concessão da aposentadoria programada, cumulativamente:

    I - 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, e 65 (sessenta e cinco) anos, se homem;

    II - 15 (quinze) anos de tempo de contribuição, se mulher, e 20 (vinte) anos, se homem; e

    III - 180 (cento e oitenta) meses de carência.

    Art. 8º Para a concessão da aposentadoria por idade, conforme regra de transição fixada pela EC nº 103, de 2019, exige-se, cumulativamente:

    I - 60 (sessenta) anos de idade da mulher e 65 (sessenta e cinco) do homem;

    II - 15 (quinze) anos de tempo de contribuição; e

    III - 180 (cento e oitenta) meses de carência.

    Parágrafo único. Para definição da carência, deve ser verificado o direito à aplicação da tabela progressiva prevista no art. 142 da Lei nº 8.213, de 1991.

    Como visto, os requisitos devem ser reunidos de forma cumulativa. Cabe lembrar que é verdade que o Direito tem o poder de manipular os conceitos, ampliando ou estreitando seu sentido, mas entender que não podemos simplesmente escolher o sentido.²⁶ Não se trata, pois, de descobrir, mas de respeitar as regras referentes ao uso do conceito de tempo de contribuição. É incorreto tratar tempo de contribuição como qualquer tempo no contexto de um sistema contributivo. Destarte, deve ser observado o tempo mínimo exigido para a concessão do benefício previdenciário.

    Não podemos começar simulando que estamos fora de nossa própria experiência. Nem tampouco estou ignorando as inúmeras variáveis para favorecer o que de fato aconteceu (na Portaria INSS 450/2020). Existe uma moderação das expectativas normativas aqui. Antes de prosseguir, é bom relembrar que, segundo Lenio Streck:

    Não há grau zero de sentido. Assim, pode-se dizer que nem o texto é tudo e nem o texto é um nada. Por exemplo: nem a lei escrita é tudo; mas não se pode dizer que este texto (lei escrita) não tem valor ou importância para o intérprete. E, importante, textos, aqui, devem ser entendidos como eventos.²⁷

    Na aposentadoria por tempo de contribuição, extinta pela EC 103/2019, o segurado precisava comprovar 180 contribuições mensais para atingir o requisito carência. Mas, quanto ao restante do período, era possível o cômputo de atividade rural (até 11/1991 sem necessidade de indenização) para completar o tempo de idade, 30 e 35 anos, mulher e homem, respectivamente. Na prática, a carência e o tempo de contribuição acabam (quase) sempre coincidindo como critérios de acesso ao benefício previdenciário. Agora, definitivamente, tempo de contribuição e carência devem coincidir na aposentadoria programada, tendo em vista que o Decreto 10.410/2020²⁸ incluiu os incisos I e II no art. 51 e alterou a redação do caput do Decreto 3.048/99 – Regulamento da Previdência Social, nos seguintes termos:

    Art. 51 A aposentadoria programada, uma vez cumprido o período de carência exigido, será devida ao segurado que cumprir, cumulativamente, os seguintes requisitos:

    I - sessenta e dois anos de idade, se mulher, e sessenta e cinco anos de idade, se homem; e

    II - quinze anos de tempo de contribuição, se mulher, e vinte anos de tempo de contribuição, se homem.

    Eis que o Decreto 10.410/2020 também alterou o Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3048/1999, para nele incluir o art. 19-E, que estabelece:

    A partir de 13 de novembro de 2019, para fins de aquisição e manutenção da qualidade de segurado, de carência, de tempo de contribuição e de cálculo do salário de benefício exigidos para o reconhecimento do direito aos benefícios do RGPS e para fins de contagem recíproca, somente serão consideradas as competências cujo salário de contribuição seja igual ou superior ao limite mínimo mensal do salário de contribuição. ²⁹

    Isso significa que serão computados os meses, independentemente da quantidade de dias que trabalhou o segurado, desde que a remuneração seja igual ou superior ao salário mínimo, e que no caso de receber remuneração inferior ao limite mínimo mensal do salário de contribuição exigido, conforme previsto no § 1º desse art. 19-E, ao segurado será possível:

    I - complementar a contribuição das competências, de forma a alcançar o limite mínimo do salário de contribuição exigido;

    II - utilizar o excedente do salário de contribuição superior ao limite mínimo de uma competência para completar o salário de contribuição de outra competência até atingir o limite mínimo; ou

    III - agrupar os salários de contribuição inferiores ao limite mínimo de diferentes competências para aproveitamento em uma ou mais competências até que estas atinjam o limite mínimo.³⁰

    Essa era uma das grandes preocupações pós-reforma da previdência. Explico. O art. 29, da EC 103/2019, ao estabelecer essas mesmas regras, foi bem conciso conforme se pode ver em cada um dos seus incisos:

    Art. 29. Até que entre em vigor lei que disponha sobre o § 14 do art. 195 da Constituição Federal, o segurado que, no somatório de remunerações auferidas no período de 1 (um) mês, receber remuneração inferior ao limite mínimo mensal do salário de contribuição poderá:

    I - complementar a sua contribuição, de forma a alcançar o limite mínimo exigido;

    II - utilizar o valor da contribuição que exceder o limite mínimo de contribuição de uma competência em outra; ou

    III - agrupar contribuições inferiores ao limite mínimo de diferentes competências, para aproveitamento em contribuições mínimas mensais.

    Parágrafo único. Os ajustes de complementação ou agrupamento de contribuições previstos nos incisos I, II e III do caput somente poderão ser feitos ao longo do mesmo ano civil.³¹

    Além da concisão dos incisos, verifica-se que, para fazer os ajustes neles fixados, o segurado tenha um limite temporal exíguo de ao longo do mesmo ano civil. A nova redação do Decreto 3.048/99, no § 2º do dispositivo em foco, o art. 19-E, além de esclarecer, traz um prazo bem mais amplo: Os ajustes de complementação, utilização e agrupamento previstos no § 1º poderão ser efetivados, a qualquer tempo, por iniciativa do segurado, hipótese em que se tornarão irreversíveis e irrenunciáveis após processados.

    O art. 19-E em comento, ainda regulamentou, no § 7º, que:

    Na hipótese de falecimento do segurado, os ajustes previstos no § 1º poderão ser solicitados por seus dependentes para fins de reconhecimento de direito para benefício a eles devidos até o dia quinze do mês de janeiro subsequente ao do ano civil correspondente, observado o disposto no § 4º.

    Diante de tantas alterações, pergunta-se: E quanto ao recolhimento de contribuições previdenciárias post mortem? Nada mudou. A orientação jurisprudencial vigente é a de que se o contribuinte individual não tiver recolhido em dia as contribuições relativas ao período imediatamente anterior ao óbito, seus dependentes não têm direito ao benefício da pensão por morte, exceto, é claro: a) quando o óbito houver ocorrido durante o chamado período de graça, previsto no art. 15 da Lei 8.213/91; b) se preenchidos os requisitos para a obtenção de qualquer aposentadoria, segundo a legislação em vigor à época em que foram atendidos, nos termos dos parágrafos 1º e 2º do art. 102 dessa Lei 8.213/91 e da Súmula 416 do STJ³².

    O entendimento, hoje pacificado, é de que:

    A manutenção da qualidade de segurado, no caso do contribuinte individual, não decorre simplesmente do exercício de atividade remunerada, como no caso do segurado empregado, mas deste associado ao efetivo recolhimento das contribuições previdenciárias. A Corte tem adotado entendimento no sentido da necessidade de recolhimento de

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