O acordo extrajudicial na justiça do trabalho: Natureza jurídica e seus efeitos
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Sobre este e-book
Também foram examinadas decisões judiciais quanto ao tema, oriundas TST, além da revisitação a importantes institutos jurídicos e do estudo dos dados estatísticos acerca do número de Acordos Extrajudiciais no período pós-Reforma Trabalhista.
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O acordo extrajudicial na justiça do trabalho - Edivaldo Lopes Santana
Prefácio
Salomão Viana1
Foi com muita alegria que recebi o convite para prefaciar esta obra. Uma daquelas alegrias de múltiplas fontes, sem que se possa identificar preponderância de uma sobre as outras.
É que prefaciar uma obra de Edivaldo Lopes Santana é uma oportunidade para deixar publicamente registrada a minha reverência a um autor que não teme expor a sua posição frente a um tema polêmico. Um autor que não foge do debate e que não abandona as convicções acadêmicas que cuidadosamente arquitetou e erigiu sobre dois vigorosos alicerces: o estudo científico e a experiência profissional.
Quanto à experiência profissional, Edivaldo Lopes Santana coloca a serviço da defesa das suas posições acadêmicas toda a autoridade que conquistou ao longo de uma rica vivência junto à Justiça do Trabalho.
Aprovado em primeiro lugar no concurso a que se submeteu, em 1986, para o cargo de Técnico Judiciário, foi investido no ano de 1989. O primor com que sempre desempenhou suas atividades o levou a ocupar, por mais de quinze anos, o cargo de Diretor de Secretaria de uma das Varas trabalhistas, no âmbito do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região.
A excelência da sua dedicação e a acurácia dos seus atos conduziram a que a corte o guindasse ao mais elevado cargo da sua estrutura administrativa: foi Diretor-Geral do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região no biênio 2009/2011, sob a presidência da Desembargadora Ana Lúcia Bezerra.
A essa admirável carreira no âmbito administrativo da Justiça do Trabalho deve ser somado o traquejo adquirido no desempenho de atividades diretamente ligadas à prestação jurisdicional, como Coordenador de Recurso de Revista, por dois anos, e Assessor-Chefe de Gabinete de Desembargador, cargo que ocupa há cerca de uma década.
No que se refere ao outro sustentáculo das suas convicções acadêmicas – o estudo científico –, não se pode olvidar que Edivaldo Lopes Santana, além de graduado em Direito, é também graduado em Pedagogia. Tem pós-graduação em Direito Público e Direito Processual e Direito Material do Trabalho.
Mas, fundamentalmente, será por meio do conteúdo desta obra que o leitor poderá confeccionar as suas próprias impressões a respeito da qualidade das bases científicas em que o autor se ancora.
E ele não deixa dúvidas quanto à sua intenção: "chamar a atenção da comunidade jurídica que estuda e reflete sobre o direito material e processual do trabalho, acerca da dimensão e a extensão interpretativa que vem se conferindo ao instituto denominado Acordo Extrajudicial". Realçando que os princípios
"dão vida ao Direito do Trabalho e servem de baliza para elaboração e aplicação das normas trabalhistas", defende – e o faz com destemor – que "não pode a Justiça do Trabalho, como instituição que tem como missão garantir o respeito aos direitos trabalhistas assegurados pela legislação pátria, permitir que esse importantíssimo órgão do Poder Judiciário, seja utilizado como um sindicato para homologar a resilição contratual, cuja finalidade seria a obtenção de uma suposta coisa julgada e dar segurança jurídica aos maus empregadores, em detrimento dos direitos do trabalhador".
Anota Humberto Ávila, em prefácio a uma obra de Fredie Didier Jr.2, que há autores que fogem dos temas polêmicos e fundamentais, com medo de errar e com receio de não conseguir se aprofundar. Invariavelmente não erram, nem se aprofundam, mas também não acertam, nem agregam (...). E há autores que buscam justamente os temas polêmicos e fundamentais, sem receio de se equivocar e com firmeza para tentar se aprofundar
.
O excerto a seguir não deixa dúvidas quanto ao fato de que é ao segundo grupo de autores que Edvaldo Lopes Santana pertence:
"o acordo extrajudicial, que sequer pode ser enquadrado tecnicamente em procedimento de jurisdição voluntária, como explicitado em linhas precedentes, com muito mais razão não se pode entender como procedimento contencioso, o qual faz-se coisa julgada imutável, sob pena de estar-se a chancelar a vontade única do Empregador em detrimento dos direitos do trabalhador, sem nenhum critério científico. Trata-se, pois, o acordo extrajudicial de atividade atípica conferida legalmente ao Poder Judiciário, traduzindo-se em função administrativa exercida por um juiz".
Tanto é suficiente para que um alerta seja dado ao leitor desta obra: os efeitos positivos da degustação do conteúdo deste livro serão tanto mais sentidos quanto mais espaço houver na mente do leitor para cotejar as lições do autor, pelo menos, (i) com as forças normativas do princípio do estímulo estatal à autocomposição, do princípio do respeito ao autorregramento da vontade e do postulado hermenêutico da unidade de interpretação; (ii) com os ensinamentos doutrinários a respeito do que se convencionou rotular de direitos indisponíveis, bem como a respeito dos direitos que admitem autocomposição; (iii) com a interpretação que vem sendo dada aos arts. 15, 487, 503 e 515, III, todos do CPC, quando isoladamente examinados; e (iv) com a interpretação a ser dada ao conjunto de textos normativos composto pelos mencionados dispositivos do CPC, diante de um acordo extrajudicial levado à homologação junto a um juízo trabalhista.
E se o cotejo entre as lições deste livro e os temas acima mencionados transmitir a indevida impressão de obviedade, no sentido de que a balança pende para o lado oposto ao defendido pelo autor desta obra, é imprescindível que o leitor leve em consideração que é induvidosa a existência de grupamentos humanos que gozam de especial proteção constitucional. As crianças, os adolescentes, os idosos, os indígenas e os consumidores, são exemplos. Outro exemplo – e é esse que interessa para esta obra – é o grupamento dos trabalhadores (CF, art. 7º), o que exige que tal fator também seja sopesado todas as vezes que se estiver diante de um quadro que envolva homologação, pela Justiça do Trabalho, de acordos extrajudiciais.
Aceitar o desafio de harmonizar esse conjunto é uma tarefa encantadora.
Esta obra de Edivaldo Lopes Santana é imprescindível para que tal tarefa seja desempenhada com êxito.
Salvador, Bahia, inverno pandêmico de 2021
Introdução
A pacificação social perpassa pela retomada de consciência do cidadão como integrante de uma sociedade plural. Nesse caminhar, eventuais conflitos decorrentes de vínculo de emprego ou de uma relação de trabalho certamente estarão inseridos em um contexto maior.
A litigiosidade não nasce simplesmente pelo fim de uma relação de emprego, relação de trabalho ou pelo descumprimento das obrigações trabalhistas. Ela é preexistente e o é pelo pré-conceito ou pela pré-compreensão que afeta os partícipes daquela relação, movida pela desconfiança. Isto é fato. E fato é fato.
Assim, situações corriqueiras do dia a dia vão se constituindo em pilares da discórdia, até que desmoronam, como se fossem um edifício em ruína.
É necessária, pois, uma reflexão melhor, com determinados elementos que são lançados
no mundo jurídico como instrumentos modernos e capazes de transformar uma relação litigiosa e a realidade social com um estalo, como se fossem uma varinha de condão com poder sobrenatural, a extirpar os conflitos sociais decorrentes de uma relação de emprego ou de trabalho.
À Justiça do Trabalho cabe cumprir a sua missão constitucional, dirimindo os conflitos que batem às suas portas, seja conciliando ou dizendo a quem pertence o direito, mas mantendo-se equidistante de problemas alheios ao descumprimento das normas sociais trabalhistas.
De fato, é papel institucional da Justiça do Trabalho propor a conciliação, mas esta função jurisdicional, que decorre de norma cogente emanada diretamente da Constituição Federal, não lhe transforma em órgão administrador, com função judicial similar àquela que é a essência de sua existência como ramo autônomo do Poder Judiciário.
Ora, se esse entendimento é verdadeiro, incumbe que se investigue qual o desiderato do legislador reformista ao introduzir a homologação extrajudicial como atribuição da Justiça do Trabalho.
Nesse trilhar, foram revogados os §§ 1º e 3º do art. 477 da CLT, no tocante à questão ora em estudo, ou seja, não mais figurando a previsão legal para um terceiro estranho à justiça trabalhista homologar a rescisão contratual.
Com o desaparecimento do mundo jurídico da obrigatoriedade da homologação das resilições contratuais pelos sindicatos, qual seria a necessidade de haver a chancela de um juiz a uma conciliação prévia, cujos interessados não têm dúvidas e estão representados por advogados?
Essa nova atribuição contribuiu ou contribui para a melhoria dos trabalhos e da celeridade tão almejada?
Se não há conflito, mas concordância orientada juridicamente por advogados, por que a submissão ao crivo do judiciário?
Submetida à vontade dos interessados e negando o magistrado a chancela judicial, não se estaria criando mais um conflito?
Afinal, qual é a natureza jurídica desse instituto? A resposta a tais questionamentos, embora não se traduza em verdade absoluta, nem se tenha a pretensão de esgotar a matéria, será destrinchada neste livro.
Os direitos trabalhistas não são absolutamente indisponíveis, notadamente aqueles controversos, e, se assim é, não obstante a fragilidade de um dos polos da relação de emprego ou de trabalho, não haveria a priori como se preocupar com esse novel instrumento introduzido na CLT.
Partindo-se dessa premissa, a princípio, se poderia afirmar que os direitos laborais vinculados aos direitos da personalidade estariam afastados de qualquer possibilidade de renúncia ou transação.
Entretanto, ainda assim, se eventual direito da personalidade sofrer o menoscabo, o seu reflexo pode sofrer mitigação no âmbito patrimonial, de modo que, mesmo nessas hipóteses, seria possível sua renúncia, transação ou qualquer outro meio de solução, por ser parte disponível daquele direito, tido inicialmente como indisponível, a exemplo do valor a ser requerido a título de indenização por dano moral. Vale dizer, a ofensa aos direitos da personalidade é imune à renúncia ou à transação, mas a quantia pecuniária e indenizatória decorrente pode ser objeto de conciliação.
Com efeito, na jurisdição, cabe ao juiz dizer o direito diante do caso concreto que se apresenta. Isso, contudo, não transforma o magistrado em um ser especial, de forma a lhe tornar a única pessoa a possuir isenção, independência e autoridade para intervir em um conflito individual trabalhista.
Essa presunção sequer é ex lege, na medida em que o legislador, ao longo dos tempos, vem estabelecendo outros meios alternativos para soluções dos conflitos, como instrumento de desburocratização e de desafogo
do Poder Judiciário, e para acelerar as resoluções das controvérsias.
Ademais, a realização de justiça é uma busca efêmera, pois uma das partes processuais