Princípios do Tabelião Mediador: O Tabelião Mediador e o caminho para o tratamento adequado de conflitos
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Sobre este e-book
O objetivo do autor é compartilhar com estudantes de direito, mediadores, conciliadores, notários, registradores e demais profissionais experientes e os novatos quanto aos princípios que norteiam os processos adequados de resolução de conflitos, para que possam aplicar, estudar e melhorar seus processos conciliatórios, com foco na figura do Tabelião de Notas. Para isso, analisa os princípios da mediação e da conciliação com os princípios do Tabelionato de Notas, apresentando a atividade típica e o conceito de Tabelião Mediador, bem como a atividade atípica com a análise do provimento 67 do CNJ.
Escrito em um texto dinâmico e de fácil compreensão, Princípios do Tabelião Mediador é um convite para o leitor aprender a pensar as resoluções de conflitos utilizando os meios extrajudiciais e um chamado à reflexão sobre o conceito de justiça preventiva.
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Princípios do Tabelião Mediador - Honório Júnior da Silveira Alves
CAPÍTULO 1. DO TRATAMENTO ADEQUADO DO CONFLITO
Imaginemos que vocês está com uma forte dor de dente. Irá procurar um profissional para resolver este problema. Mas qual profissional? Um médico pode até ‘resolver’ sua dor de dente receitando algum medicamento, mas será que é o melhor profissional para isso? Sua resposta, certamente, seria que o tratamento adequado para uma dor de dente seria com odontólogo (o dentista).
Agora imagine que no lugar de uma dor de dente, você está com um problema sucessório, um conflito sobre a partilha de bens em razão do inventário por um ente familiar. Essa partilha tem ocasionado discussões entre irmãos, primos, tios. Ou você está se divorciando e a discussão é sobre os bens do casal. A discussão aumenta e você compreende que a melhor alternativa
é buscar seus direitos junto ao Poder Judiciário.
Porque razão ousamos pensar que o poder judiciário é a melhor alternativa
? Da mesma forma que um médico ‘resolve’ o problema, o Poder Judiciário também resolverá. Todavia, não significa que é o tratamento mais adequado. A atuação pelo Notário, em diversas situações, mostra-se mais adequada que uma decisão imposta por um Juiz, Desembargador ou Ministro.
Este capítulo busca os meandros em que a função pública do notário e o processo de mediação se reúnem, não para conceber um notário atuando como mediador, mas para visualizar como o exercício dessa função pública pode garantir a eficácia da mediação, seja através do uso da função consultiva do notário, que permita a inserção de cláusulas sobre mediação nas vontades, como forma de antecipação de conflitos sucessórios e familiares ou como forma de garantir a natureza vinculativa dos acordos de mediação.
1.1. DO CONFLITO
O método mais antigo para gerenciar e resolver conflitos é e tem sido a lei. Para entender a relação entre lei e conflito, elucida-se a definição de conflito; entretanto, cabe enfatizar que não é possível desvencilhar as questões referente ao conflito dos pressupostos inerentes à mediação e, desse modo, ambos os conceitos então intimamente imbricados.
A mediação como alternativa à resolução de conflitos deve ter uma preparação completa em termos de regras, princípios, formas de solução, ou seja, uma especialização real e específica nessa função. No Brasil, a adoção de uma lei de mediação é chamada para conceber o notário como o instrumento ideal para antecipar conflitos e/ou como garantidor da legalidade do acordo transacional¹.
Em meio às complexidades da sociedade moderna e ao tráfego econômico e jurídico, o documento notarial assume importância especial como garantia da segurança jurídica, e seu caráter preventivo confere confiança às transações legais realizadas por indivíduos².
Somente com o correto desempenho da função pública notarial é possível obter um documento público notarial autêntico por si só, de modo que, além disso, seu conteúdo seja tomado como garantido permanentemente, implicitamente portando seu valor probatório, mas também conferir segurança jurídica à lei, evitando preventivamente possíveis litígios, constituindo um título de legitimação para o tráfico com eficácia probatória, dotado de uma presunção de legalidade tanto na forma como na substância, e juntando-se à realização harmoniosa da lei.
1.1.1. DO CONCEITO
O conflito consiste em um confronto ou confronto intencional entre dois seres ou grupos da mesma espécie que manifestam entre si uma intenção hostil, geralmente sobre um direito que, para manter, afirmar ou restabelecer, entra-se em disputa frente a resistência do outro.
Nesta definição, identificamos dois elementos: a intenção do conflito e sua relação com o direito notarial. Desse modo, conflito
é uma espécie ou classe de relacionamento social em que existem objetivos de diferentes membros do relacionamento que são incompatíveis entre si³.
Pode-se então, referir-se a dois elementos que são fundamentais para o desenvolvimento de qualquer conflito. Todos os conflitos que se analisa, sempre serão vistos esses dois elementos: a vontade de decidir entrar em conflito com outro e um conjunto de argumentos ou racionalizações sobre o motivo pelo qual ele entra em conflito.
É importante destacar a Teoria do Conflito, em qualquer um de seus desenvolvimentos tem como base uma antropologia ou visão de conflito humano e que, por sua vez, possui uma psicologia ou entendimento dos mecanismos psicológicos que permitem ao ser humano justificar suas ações⁴.
Voltando ao tema da lei como mecanismo de solução de controvérsias, descobrimos que ele procura, por meio de um sistema de normas, dissuadir as pessoas a evitar condutas consideradas proibidas e ajudar os membros de uma comunidade a se comportarem de uma certa maneira ou modo que é considerado desejável.
Certamente nem todos os conflitos são regulados pelos regulamentos das comunidades, uma vez que se entende que existem regiões da vida humana que devem ser deixadas de fora e que permanecem nas mãos de seus membros. Quando qualquer conflito ou tipo de conflito se estende ao ponto em que a comunidade exige sua regulamentação, uma nova regra é buscada através dos mecanismos estabelecidos para isso⁵.
Diante dessa situação, chega-se a classificação/distinção entre comportamentos possíveis, comportamentos proibidos e permitidos. Essa ideia nos leva a considerar que, em qualquer conflito, os competidores tendem a procurar qual dos dois está certo e, se não houver acordo possível, deixam o sistema de regras defini-lo.
O problema, é que a lei define quem está certo desde a criação de um binômio fechado: alguém está certo e, portanto, é o detentor do direito e o outro não está certo e, portanto, está desvinculado da proteção do direito. Nesse viés, as possibilidades dos candidatos são reduzidas a: - alguém está certo e o outro é obrigado a lidar com o fato de que está errado; - ninguém está certo e, portanto, são livres. Para ambos, é igualmente permitido ou legítimo estar em conflito com o outro⁶.
Em economia, isso reflete um jogo de soma zero. Que para um ganhar o outro precisa perder. E os meios de tratamento de conflito, visam buscar estratégias que todos os participantes podem se beneficiar de alguma forma, de forma cooperativa. Ou seja, um jogo de soma não-zero.
1.1.1.1. DA INEVITABILIDADE DO CONFLITO
Percebe-se que há uma infinidade de conflitos que estão fora do alcance da norma e que, portanto, os seres humanos são livres para entrar em conflito. Logo, se o padrão não fornecer meios para resolver esses conflitos, que meios os cidadãos terão disponíveis para resolvê-los⁷?
Além disso, questiona-se ainda que, apesar de um conflito ser resolvido, a referida legislação não tem legitimidade suficiente para ser apoiada pelos atos dos cidadãos? Uma resposta parcial, mas pertinente, reside na necessidade se procurar métodos alternativos
que permitam regular esses conflitos, algo com o qual será trabalhado mais adiante.
Em resumo, muitos conflitos surgem da reivindicação de atores que acreditam ter direito, em comparação com outros que acreditam que não são vinculados, por representarem reivindicações incompatíveis, mas permitidas, uma vez que não são sancionadas pelas normas vigentes. Nesta área, a lei como método de resolução de conflitos é insuficiente ou ineficaz⁸.
Há uma ênfase particular no conflito como um fator dentro de um relacionamento social em que o social pode envolver duas, dez, mil ou milhões de pessoas envolvidas, o que adicionaria a cada passo uma mudança em suas estruturas, dinâmicas e abordagens⁹.
Nesse contexto abordado, são indicados apenas os possíveis conflitos entre pares, indivíduo-indivíduo ou instituição-instituição; mas, como se pode ver, outras combinações podem ocorrer, visto que é possível analisar sua estrutura, processos, recursos e tipo abordagem. Além disso, o notário também pode antecipar que quanto maior o número de participantes, maior o nível de complexidade do conflito, os fatores intervenientes e, principalmente, a dinâmica deles¹⁰.
Levando em consideração que a Lei não pode operar em muitos dos cenários acima e que cabe à sociedade se integrar dentro de suas possibilidades e dos mecanismos alternativos de resolução de disputas, tais como: negociação, mediação, conciliação, arbitragem, entre outros¹¹.
Dessa maneira, é imprescindível que se promovam essas discussões necessárias para a sociedade, a fim de construir comunidades pacíficas, com alta tolerância e respeito pelo outro; sociedades nas quais a cultura da paz é algo integrado aos valores da família e da comunidade.
1.1.1.2. DA PERCEPÇÃO DO CONFLITO
A ausência de regulamentação da mediação como método alternativo de solução de conflitos no sistema jurídico brasileiro não impediu os esforços de vários juristas que, concebendo uma lei melhor, canalizam suas pesquisas para a busca constante de harmonia e paz entre as partes em conflito¹².
Medidas concretas, como a elaboração da Primeira Proposta para a implementação experimental da mediação, de acordo com as possibilidades oferecidas pela lei, já estão ocorrendo nesse sentido. Mesmo quando a ideia é configurada exclusivamente no campo jurisdicional, sob o estudo de uma Instrução do Supremo Tribunal da República, é essencial fazer parte dessa ideia para a atividade notarial, devido às amplas possibilidades de sua implementação, sem que seja necessário aguardar a futura aprovação de um regulamento que regule o processo de solução de conflitos dessa natureza no sistema jurídico nacional¹³.
Nesse sentido, ninguém está oculto à crise da justiça, expressa na impossibilidade de um sistema jurídico eficaz e nos altos custos e atrasos dos processos. Além do nível de complexidade que atingem todos os dias, da especialização dos diferentes ramos do direito e de sua excessiva regulamentação¹⁴.
Diante desses dilemas, buscou-se meios alternativos que permitissem a solução satisfatória de disputas. Embora seja praticamente impossível para a sociedade atual se desenvolver sem eles, é possível procurar mecanismos alternativos dentro do processo judicial tradicional que, sem significar uma ruptura com ele, fragmentem os antigos esquemas que concentraram ou reduziram a função judicial, ao mesmo tempo que os valores supremos disso sejam preservados, como imparcialidade, justiça e respeito pelos direitos dos cidadãos.
1.1.1.3. DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Diante da evolução histórica dos conflitos e, consequentemente, da Mediação como mecanismo alternativo para resolução de impasses, pode-se elucidar que a mediação surgiu nos Estados Unidos nas décadas de 1960 e 1970, e de lá se espalhou imediatamente para o Canadá, alcançando a Inglaterra nos anos 80 e o resto da Europa, juntamente com o Brasil e América Latina nos anos 90¹⁵.
Embora seja muito difícil fornecer uma definição que leve em consideração todas as características da mediação e seu campo de ação, pois é um processo que vai além do conteúdo do conflito que se pretende resolver, esse termo refere-se à possibilidade de os indivíduos resolverem seus conflitos sozinhos, mantendo total controle do procedimento e, portanto, de seu resultado¹⁶.
Etimologicamente, a palavra mediação
em latim é equivalente a mediationis, que significa ação ou efeito de mediação
, e mediar
vem do latim mediare, que significa ficar entre dois ou mais que brigam ou argumentam, tentando reconciliar e uni-los em amizade
¹⁷.
Desse modo, a mediação pode ser definida como o processo pelo qual os participantes, com a assistência de uma