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A Problemática da Clivagem: Aspectos Teóricos e Clínicos
A Problemática da Clivagem: Aspectos Teóricos e Clínicos
A Problemática da Clivagem: Aspectos Teóricos e Clínicos
E-book181 páginas7 horas

A Problemática da Clivagem: Aspectos Teóricos e Clínicos

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Sobre este e-book

Este livro aborda a problemática da clivagem como uma importante chave de leitura para a compreensão de sofrimentos psíquicos mais primários do que os sofrimentos clássicos da neurose. A autora mostra articulações potentes entre os desafios encontrados na clínica psicanalítica e as teorias metapsicológicas, desde Freud e Ferenczi até autores atuais. A clivagem assume um lugar de destaque enquanto modo de funcionamento privilegiado diante do excesso pulsional no âmbito da reviravolta conceitual dos anos 1920. Duas outras grandes noções são articuladas à problemática em questão: o trauma, que se encontra na origem das clivagens, e a simbolização, continuamente em processo. Com um estilo pulsante e inspirador, Renata Mello brinda-nos com importantes contribuições para a prática clínica, conjecturando sobre as adaptações e as modificações necessárias no dispositivo terapêutico para a escuta de modos de existência mais fragmentários.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento31 de ago. de 2021
ISBN9786525009070
A Problemática da Clivagem: Aspectos Teóricos e Clínicos

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    A Problemática da Clivagem - Renata Mello

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    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO ESTUDOS PSICANALÍTICOS

    Para meu pai (in memoriam), pela curiosidade sobre o mundo.

    Para Amora, pela abertura insistente para o sim.

    AGRADECIMENTOS

    Este livro, originalmente apresentado na forma de tese de doutorado ao Programa de Pós-Graduação em Teoria Psicanalítica da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é fruto de alguns anos de trabalho. Sou grata a algumas pessoas que contribuíram direta ou indiretamente para que esta escrita fosse possível.

    Agradeço, primeiramente, à Regina Herzog, orientadora da minha pesquisa de doutorado, pelo rigor acadêmico, pelas leituras atenciosas e primorosas do texto e pelo acompanhamento afetivo ao longo dos anos. Aos colegas do Núcleo de Estudos em Psicanálise e Clínica da Contemporaneidade (Nepecc/UFRJ), pela troca de altíssimo nível teórico-clínico que tanto enriqueceu o meu modo de pensar e fazer Psicanálise. Ao François Richard, pelas preciosas indicações e pelo acolhimento durante o período-sanduíche em Paris.

    Ao Ary Band, pedra angular da minha formação em Psicanálise, pelo despertar analítico. À Genny Nissenbaum, pela escuta clínica e pela aproximação da Psicanálise com a arte. Ao Octavio Souza, pelos apontamentos valiosos ao longo da pesquisa. Aos amigos da Casa da Árvore, sobretudo Lulli Milman e Fernanda Baines, pela vitalidade da Psicanálise em contextos áridos. Também sou profundamente grata à Terezinha Féres-Carneiro, orientadora da minha pesquisa de pós-doutorado, pela paixão contagiante com a universidade e pela amizade generosa. Agradeço à Andrea Seixas Magalhães e à Rebeca Nonato Machado, pela parceria e rosés acadêmicos. Ao grupo de discussão clínica coordenado pelo mestre Luis Claudio Figueiredo, pela articulação sofisticada entre teoria e clínica. À Haydée Côrtes, pelo incentivo à publicação e pelos cafés permeados de insights.

    À Jô Gondar, pela escuta sensível e pela aposta ao longo dos anos todos. A cada paciente que experimentou comigo a aventura da Psicanálise.

    À Capes, pela concessão da bolsa que financiou, tanto no país quanto no exterior, a pesquisa que fundamenta este livro.

    Agradeço, ainda, aos meus amigos, em especial, à Adriana Benveniste e à Beatriz Dale, pelas inúmeras experiências compartilhadas, fôlego indispensável para a escrita. À minha mãe e ao meu irmão, pela fibra. Ao Gabriel Gutierrez, pela vida de luta e poesia.

    Autotomia

    Em perigo, a holotúria se divide em duas:

    com uma metade se entrega a voracidade do mundo,

    com a outra foge.

    Desintegra-se violentamente em ruína e salvação,

    em multa e prêmio, no que foi e no que será.

    No meio do corpo da holotúria se abre um abismo

    com duas margens subitamente estranhas.

    Em uma margem a morte, na outra a vida.

    Aqui o desespero, lá o alento.

    Se existe uma balança, os pratos não oscilam.

    Se existe justiça, é esta.

    Morrer só o necessário, sem exceder a medida.

    Regenerar quanto for preciso da parte que restou.

    Também nós, é verdade, sabemos nos dividir.

    Mas somente em corpo e sussurro interrompido.

    Em corpo e poesia.

    De um lado a garganta, do outro o riso,

    leve, logo sufocado.

    Aqui o coração pesado, lá non omnis moriar,

    três palavrinhas apenas como três penas em voo.

    O abismo não nos divide.

    O abismo nos circunda.

    (Wislawa Symborska, 2016)

    Prefácio

    Em fins do século XIX, Sigmund Freud viu-se diante de um grande desafio – o de mostrar que, mais importante do que ver a lesão para explicar um sintoma, era preciso escutar a dor que se escondia por trás desse sintoma. Estamos distantes há cerca de 120 anos da invenção da Psicanálise. Invenção que revolucionou o mundo de um modo paradoxal. Não à toa, Foucault considera Freud, juntamente a Marx e Nietzsche, o mestre da dúvida. Sem dar respostas científicas para o sofrimento dos pacientes, tal como preconizado pela medicina de então, esse médico de Viena propõe outra lógica para compreender os sintomas. Os sintomas psíquicos têm um sentido e não uma causa.

    Apoiando-se em duas regras fundamentais – associação livre e atenção flutuante –, Freud se propôs a escutar o sofrimento psíquico e interpretar o sintoma. Nesses termos, a Psicanálise foi, sem sombra de dúvida, além de uma teoria consistente, um método de investigação que contribuiu significativamente para desvendar a dinâmica psíquica; e ocupar tal lugar se deu a despeito das mais variadas resistências que experimentou ao longo do século XX.

    Todavia, ainda hoje, em pleno século XXI, apesar da importância que finalmente lhe foi conferida, perdura a resistência. E perdura de forma bastante peculiar, pois antes foi possível aceitar, a partir dessas regras fundamentais, a pertinência do dispositivo clínico, principalmente com relação ao modelo das psiconeuroses; no entanto, agora, deparamo-nos com a denúncia de que seja como saber, seja como terapêutica, a Psicanálise estaria ultrapassada. E isso porque estamos diante de quadros que muito diferem dos que se apresentavam na época de Freud. Assim é que hoje estamos novamente diante de um desafio, um desafio que se traduz, para muitos, como um impasse.

    É inegável que todo modelo é produto da racionalidade que vige em determinado momento da cultura. E, certamente, em nossa prática clínica, na atualidade, estamos diante de formas de mal-estar nas quais o desejo parece obscurecido, diverso de como se mostra no modelo das psiconeuroses ou nas quais o laço social se revela esgarçado, senão rompido, trazendo para o campo um questionamento sobre a pertinência de sustentar um modelo de subjetivação que teria no conflito psíquico – desejo versus proibição – e no mecanismo do recalque sua sustentação.

    Acompanhando o dito de Freud daquela época, o de que a Psicanálise era uma disciplina nova, cabe acrescentar a esse dito que se trata de uma disciplina em constante construção, na medida em que ele próprio considerou que é a partir da escuta do sofrimento que uma teoria se constrói. Por esse motivo, longe de se constituir um impasse ou mesmo uma renúncia para enfrentar essas modalidades de sofrimento psíquico, a denúncia de que a Psicanálise estaria superada se tornou, na pena de Renata Mello, um desafio. Ou melhor, tornou-se uma exigência de revisitar a trama psicanalítica em seus desdobramentos, buscando ferramentas teórico-clínicas que pudessem contribuir no atendimento terapêutico.

    Porém, longe de propor um novo modelo teórico ou mesmo um novo dispositivo clínico, este livro surpreende-nos ao trazer o próprio Freud para a cena e problematizar, a partir de seu pensamento, a prática clínica, conjecturando sobre as adaptações e as modificações necessárias no dispositivo terapêutico. Seguindo uma observação clínica extremamente acurada – que vê nas experiências mais primárias sujeitos afetados por acontecimentos traumáticos não inscritos no psiquismo –, a autora circunscreve, além do recalque, a clivagem como uma chave de leitura para os sofrimentos narcísicos e os casos limites, designações que ganharam lugar de destaque na descrição das formas contemporâneas de adoecimento psíquico. Chave de leitura que tem sua sustentação em Sándor Ferenczi, pensador extremamente caro à autora e que lhe permite avançar tanto teórica quanto clinicamente.

    Essa visita ao pensamento freudiano realçou o aspecto intensivo presente desde os textos mais remotos, tais como a Carta 52, extraindo dali a dimensão de inacabamento que se manifesta em todo processo de subjetivação. Daí deriva, para além da referência teórica que o conceito de recalque conferiu no trato das psiconeuroses, o conceito de clivagem, abrindo, ou melhor, ampliando o campo da intervenção clínica.

    Longe de dispensar a trama conceitual da Psicanálise, Renata Mello brindou-nos, também, com uma ampliação dessa trama, outorgando à fragmentação um papel tão relevante quanto ao conferido à divisão presente no conflito psíquico. Foram seus companheiros nesse percurso pesquisadores nacionais e internacionais de peso; impossível listar aqui todos, pois foram certamente importantes para dar às ideias aqui defendidas ratificação à originalidade de seus argumentos. Como pano de fundo, segundo suas próprias palavras, pronunciadas desde a introdução: a preocupação crucial aqui reside na expansão da nossa sensibilidade clínica e no vetor terapêutico da trama dos conceitos.

    Cada capítulo flui em consonância com essa preocupação e o texto evolui com leveza, presenteando o profissional de saúde mental com um campo aberto a infinitas possibilidades. Confirmando suas palavras finais: se a Psicanálise convém à vida, certamente, a vida convém à Psicanálise. Admitindo que a clivagem implica um sujeito que consegue relativamente funcionar com base em ligações precárias, vislumbra-se aí a potência de ligações genuínas.

    Nesse sentido, o livro vai proporcionar ao leitor um duplo agrado – pela forma como os argumentos vão sendo introduzidos na cena e pela densidade com que os conceitos são trabalhados. Não é preciso dizer mais nada.

    Prof.ª Dr.ª Regina Herzog

    Programa de Pós-Graduação em Teoria Psicanalítica

    Universidade Federal do Rio de Janeiro

    Sumário

    Introdução 17

    Capítulo 1

    Trauma e clivagem: situando a problemática 23

    1.1 Conflitualidade e recalque 25

    1.2 Da impossibilidade de representação à repetição compulsória 31

    1.3 Algumas notas sobre a noção de ligação 35

    Capítulo 2

    Clivagem e processos de simbolização 39

    2.1 Simbolização primária versus simbolização secundária 41

    2.2 Fueros psíquicos 45

    2.3 A impressão traumática e os processos de clivagem 48

    2.4 Insistências traumáticas 52

    Capítulo 3

    Clivagem e relações de objeto 57

    3.1 A clivagem ferencziana 60

    3.2 A contrapartida do objeto: holding e continência 64

    3.3 O trabalho do negativo 72

    3.4 Alcances e limites da clivagem 75

    3.4.1 Sistema fechado e povoado interno 79

    Capítulo 4

    A clínica da clivagem 85

    4.1 A aventura do método psicanalítico 87

    4.1.1 As extensões associativas 90

    4.2 Apropriação subjetiva e síntese psíquica 93

    4.3 Por uma simbolização compartilhada 97

    4.3.1 Conversações primitivas 99

    4.3.2 O envelope pré-narrativo 102

    4.3.3 O analista-espelho 106

    4.4 O encontro analítico 110

    Considerações finais 115

    Referências 119

    Introdução

    O contexto de surgimento da presente obra é o confronto cada vez mais frequente na experiência psicanalítica com subjetividades que encerram os ditos estados limites e sofrimentos narcísicos. Tais configurações subjetivas têm em comum a especificidade de serem refratárias ao dispositivo psicanalítico clássico, colocando em xeque o próprio método da Psicanálise fundamentado na livre associação, atenção flutuante e interpretação. Ou seja, nesses casos, o aparato conceitual que gravita em torno do conflito psíquico e do recalque, no que compreende os sofrimentos neuróticos, parece não dar conta da condução do processo analítico. Estamos, portanto, diante de sujeitos que apresentam sofrimentos mais primários e mais profundos, marcados por acontecimentos traumáticos no limite da representação e da morte psíquica. Tais sujeitos

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