Justiça e neurociências: por que punir?
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Justiça e neurociências - Marcelo Tubino
1. Prefácio
Mauro Henrique Renner
Procurador de Justiça
Mestre em Direito
Com enorme honra, cumpro o convite que me foi gentilmente feito por Marcelo Tubino Vieira para prefaciar a sua obra Justiça e Neurociências: Por que punir?, fruto de sua pesquisa científica qualificada no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Neurociências e Comportamento junto à Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Conheço o autor desde o início de sua atividade profissional no Ministério Público gaúcho, em 1998. Tive a honra de tê-lo como assessor na Promotoria de Justiça da Restinga, quando, prematuramente, despontava seu talento e desvelo profissional, motivo pelo qual me acompanhou no exercício das funções no Centro de Apoio Criminal, na Supervisão das Coordenadorias de Promotorias de Justiça e junto à Subprocuradoria-geral de Justiça para Assuntos Institucionais. Marcelo sempre esteve pronto para galgar o cargo de Promotor de Justiça, e sua assunção concretizou-se, naturalmente, em 2002, pelas suas qualidades profissionais.
O autor, no curso do tempo, mostrou-se cultor dos mais elevados valores, maximizando a simplicidade e o conhecimento técnico profissional. Vem se aprimorando, tanto no campo teórico como prático, com a experiência de quem atua como Coordenador do Núcleo de Inteligência e do Sistema de Investigação Criminal do MP gaúcho.
O presente trabalho revela sua permanente preocupação na busca de novos horizontes e preenche uma lacuna sobre um tema a respeito do qual poucos se aventuram a escrever em razão do campo inóspito, complexo e dada a escassez de sua bibliografia.
Nessa perspectiva, a publicação da atual obra merece o reconhecimento por contribuir para preencher um pouco mais a lacuna da bibliografia brasileira sobre a neurociência.
Para atingir o seu objetivo, o pesquisador defende que o sistema de Justiça deve estar em constante adaptação e, nesse cenário, aproxima com habilidade os elos da neurociência e da Justiça. Traduz com singularidade a divisão trina do cérebro e o seu funcionamento em relação ao agente do crime.
Registra a importância de compreender como o cérebro funciona e como ele responde aos vários estímulos, para que possamos antecipar cenários, prevenindo o agir criminoso em determinadas circunstâncias.
Nesse formato, Marcelo inclina-se no entendimento de que a origem da violência não se restringe a fatores sociais, devendo ser investigada sob a ótica da transdisciplinaridade, sem desprezar a ciência que está a apontar a existência de áreas cerebrais que, se prejudicadas, diminuem seus freios e potencializam ações criminosas. Observa que essas conclusões, quando bem sedimentadas, permitirão calcular o risco de um indivíduo incidir ou reincidir em comportamento antissocial, tornando-se uma ferramenta útil no campo forense.
Por fim, deixa claro que a sanção penal, quando efetiva e contemporânea, tem significado, sob o ponto de vista neural. Por via diversa, a destempo, não traz, na percepção do criminoso, dissuasão suficiente ao comportamento, sendo necessário que a Justiça Penal funcione em competição ao comportamento criminoso. Ilustra que a sanção deve ser dura, palpável, que realmente atinja a parte mais profunda do cérebro do desviante, repercutindo-lhe tensão ao cogitar a experiência criminosa, ensejando a compreensão de que a ação criminosa não vale a pena ser reproduzida.
Novos tempos nos esperam, por isso, o autor nos convida à reflexão para que possamos entender que somente os meios tradicionais de investigação não podem romper o ciclo criminoso. O realinhamento do mundo jurídico com o mundo dos fatos deve ser um objetivo ao moderno operador do Direito.
Cumprimento Marcelo Tubino pela qualidade da pesquisa. A ciência penal se enriquece ainda mais com a presente obra.
2. Introdução
Depois de mais de um ano de aulas em Neurociências pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), realmente estou preocupado: de um lado, frequentemente frisado em todas as disciplinas que nossa evolução como espécie decorreu do aperfeiçoamento do convívio social. Progredimos, aumentamos nosso cérebro em regiões cada vez mais sofisticadas, principalmente em termos da densidade de neurônios, e nos integramos pela convivência cooperativa. Fomos curiosos, espalhamo-nos pelo globo e, recentemente, nos lançamos pela galáxia. Aprendemos que o toque é imprescindível ao desenvolvimento afetivo, de forma a aperfeiçoarmo-nos na interação com o outro. A Ocitocina exerce papel fundamental na integração, característica destacada dos mamíferos. Neste momento, a humanidade vive a pandemia pela Covid-19, que exige, contraditoriamente, distanciamento social. Tempos forçados de reflexão e desaceleração. A tecnologia, quando mal aproveitada, causadora de tanto distanciamento e depressão, apesar da superpopulação e do aumento de conexões, terá de nos melhor auxiliar nesse desafio.
As Neurociências vêm trazendo luz a detalhes sobre o comportamento humano que eram desconhecidos até então. Desvendaram-se áreas do cérebro de maior ou menor ativação diante de determinado cenário, conjugadas no mosaico genético e ambiental, a estabelecer nosso comportamento. Conviver em grupos exigiu regras e concessões. Em simples análise, podemos dizer que optamos por agir dentro ou fora da lei.
Buscávamos saúde, felicidade, muito mais sob uma perspectiva intuitiva e exercício de fé do que propriamente sob viés científico. Praticamos o bem, até então, movidos por uma autodisciplina, opção holística, atendendo a um processo educacional, sem maiores questionamentos da finalidade, desconhecendo detidamente, ainda que de forma mínima, o