Enhembo'eté
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Autoajuda para você
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Enhembo'eté - Alexsander Vacaro - Karai Djekupé Ywy Djú Mirim
A ilusão
DJADJEOI NHANDERÚ AMBARE DJAUPITŸ MAVÂ DJADJEOI NHANDERÚ AMBARE DJAUPITŸ
MAVŸ NHANDERÚ JOGUERU MBARAKA MIRIM ONHENDU RAMÔ DJADJAPŸTCHAKA
MBARAKA MIRIM ONHENDU RAMÔ DJADJAPŸTCHAKA DJADJAREO DJUI.
NHANDERÚ ETÉ OETCHA.
TODOS NÓS VAMOS PARA O LUGAR DE NOSSO PAI. QUANDO ALCANÇARMOS,
O GRANDE ESPÍRITO VEM. QUANDO ESCUTARMOS O SOM DO CHOCALHO
VAMOS NOS CONCENTRAR E VAMOS DANÇAR PARA O GRANDE ESPÍRITO VER.
cap_1_a_ilusaoHÁ DIAS, UMA FORTE DOR no ombro esquerdo me incomodava. Estava se agravando. Sem solução, já começava a ficar inquieto: fazia um mês que não surfava e na época era o que realmente importava para mim. Estava vivendo um dos momentos mais conturbados de minha vida: a recente separação após um relacionamento de dez anos e com isso a saudade de meus filhos, que apertava meu coração.
Havia também uma inquietude interior quanto à minha caminhada espiritual. Desde jovem, o contato com aquele universo esteve presente, começando pela manifestação de meu avô, que entre os meus quatro e oito anos de idade aparecia todas as noites em meu quarto, atravessando meu corpo. Era quase tangível e naturalmente assustador.
Minha família, na época, desconhecia quase tudo sobre a espiritualidade e pouco sabia me explicar o que estava acontecendo. Na minha imaginação infantil, concluí que deveria ser um vampiro, lobisomem ou qualquer outro monstro! Para mim, a noite havia se transformado em um trauma.
Passei a ser visto como criança-problema e meus pais já pensavam em me levar ao psiquiatra. O problema foi resolvido quando meus tios, sabendo de meu sofrimento de mais de quatro anos, convidaram meus pais para um atendimento com um médium que conheciam. Muito simples, atendia a quem o procurasse, não importando dia ou horário. Através de sua mediunidade, meu avô se apresentou, começando a conversa com um pedido de desculpas pelo sofrimento que me causava, mas que só poderia ser assim, pela maior sensibilidade espiritual que eu possuía, dentre os membros de minha família. Segundo ele, eu seria o único que poderia senti-lo de alguma forma. Passou a meus pais o recado que o fez aproximar-se de nós, e nunca mais o vi.
Meus pais se aprofundaram no mundo da espiritualidade, e como eu e meu irmão éramos crianças, convivemos com grupos espiritualistas como se fossem parte da família. O trauma de infância foi desaparecendo e naturalmente conversar com os mortos deixou de ser coisa do outro mundo.
O episódio da infância e seus desdobramentos me permitiram conhecer de perto figuras e fatos interessantes, inusitados até, no mundo da espiritualidade.
Mas, apesar de viver normalmente entre os dois mundos, eu continuava inquieto, sentia que algo poderia ou estaria por acontecer! Neste ponto da minha história, devo agradecer a meu ombro esquerdo. Sabendo do quanto a dor me incomodava, uma querida amiga chamada Catarina me apresentou Maria, terapeuta de Porto Alegre, que me propôs uma sessão de massagem.
– Perfeito! – pensei.
Já havia recebido algumas massagens antes e tinha certeza que 30 minutos acabariam com meu sofrimento. Mas, percebendo minha euforia, Maria alertou:
– Não é uma massagem comum. Tu tens que entender que o corpo físico apenas manifesta desequilíbrios que podem ter origem nos campos emocional e espiritual.
Quase não a ouvi. A dor estava insuportável, eu queria – mais que tudo! – voltar a surfar! Era uma semanada de boas ondas.
– Tudo bem, Maria, confio em você! Podemos começar agora mesmo?
– Se é o que tu queres de verdade... Podemos, sim. Catarina já ofereceu sua casa e o espaço é perfeito. Teremos tranquilidade e poderei trabalhar teus corpos.
Hoje, sei que novamente não dei tanta importância à sua última frase. Antes de começar, Maria me alertou:
– Sei bem que em algum momento tu podes ter alguma visão ou sensação... Podes até sentir raiva ou vontade de chorar... Dê atenção a isso tudo, e depois conversamos, ok, tchê?
Só queria o fim da dor, tudo o mais era superficial para mim. Não havia como imaginar o que iria passar nas próximas horas. O trabalho começou, como toda e qualquer sessão de massagem. Maria pediu que me deitasse no chão, sobre um colchão fino, no centro da sala. Usou um óleo feito por ela mesma que era uma combinação de óleos essenciais, de aroma delicioso. Pôs uma música de índios norte-americanos de fundo. Gostei do som! Envolventes batidas do tambor e os chamados ancestrais me fizeram rapidamente perder a noção do espaço-tempo e, sem me dar conta, já não sentia mais o toque terapêutico. Na verdade, foi um grande e profundo mergulho no vazio. Imagens desconexas e um turbilhão de vozes, músicas, sabores e aromas me provocaram um profundo entorpecimento, até a perda da noção de mim mesmo. A impressão era a de um quase desmaio.
O despertar
ORERU OREMBO’E KATU NE AMBÁ ROUPITŸ’I AWÃ.
NHANHEMBO’E KATU PARAROWAI DJAUPITŸ’I AWÃ.
DJADJERO DJY DJADJERO DJŸ’I PARAROWAI DJAUPITŸ’I AWÃ.
GRANDE ESPÍRITO, NOS ENSINA A CHEGAR NO SEU ALTAR SAGRADO.
VAMOS TODOS REZAR PARA ALCANÇARMOS O OUTRO LADO DO OCEANO.
VAMOS TODOS DANÇAR PARA ALCANÇARMOS O OUTRO LADO DO OCEANO.
cap 2 - o despertarACORDEI NUM GALPÃO de oito lados, paredes de madeira, telhado de taquara rachada, cercado de mata nativa. Tinha mais ou menos 13 metros de largura, e o que chamava atenção era a estrutura de suporte do telhado: imensos caibros, feitos com toras, se encontravam num pilar central suspenso no ar, e a nítida impressão que tive era a de que tudo fosse desabar a qualquer momento, devido à sua grandiosidade. O piso era de chão batido e no centro havia uma meia lua de barro em alto relevo. Suas pontas terminavam em espiral, onde no alinhamento das espirais um fogo estava aceso.
Este fogo usava grandes galhos retos colocados uns sobre os outros, em V ou flecha, e sua ponta se alinhava na direção leste-oeste, de modo que, ao entrar no ambiente, toda a energia apontava para Miguel e Carlos, líderes espirituais que conduziriam aquele evento.
No lado oposto ao fogo, no lado externo e bem no centro da meia-lua, diante dos líderes, um altar em forma de águia com suas asas abertas – sobre as quais estavam dispostos cocares das mais lindas cores que já havia visto, chocalhos, bastões, tabaco picado, palhas de milho, jarras com um líquido que não reconheci, vasos com alguma espécie de cacto e cestas com ramos de cedro e algumas resinas.
Quem me recebeu foi Vítor, o homem fogo da cerimônia xamânica – que estava por começar. Percebendo que eu não estava à vontade, dedicou atenção especial a mim, me mostrando onde deveria sentar e explicando sobre o que aconteceria naquela noite. Aos poucos, percebi que todos ali tinham uma forma diferente de agir, um sentimento de respeito a tudo e a todos fazia brotar do ambiente e das pessoas: como se formássemos uma única família.
Antes do início, Vítor me explicou que todos os que ali estavam eram pessoas que vinham sentindo um chamado interior. Algo que os instigava a uma mudança mais profunda em sua forma de viver, saindo do campo dos interesses pessoais e vendo sua vida com um olhar inegoísta.
Ali, naquele espaço isolado do resto do mundo material, todos participaríamos de rituais xamânicos que nos ajudariam a honrar e respeitar a própria vida e, acima de tudo, nutrir uma relação de harmonia e respeito para com todos os seres e elementos que nos cercam, vendo o fogo não mais como o próprio fogo, mas como um dos elementos mais antigos do Universo, transmutador e agente da vida... A terra como a sagrada mãe, que nos permite viver com toda a abundância... A água como a fecundadora de todos nós, sementes que somos da própria vida... O ar como aquele que traz e leva toda a instrução para que a transformemos em entendimento, sabedoria.
Havia comigo terapeutas, médicos, psicólogos, políticos, donas de casa, jovens, crianças... Homens e mulheres que queriam, mesmo sem saber claramente, se transformar em agentes do Grande Espírito, seguindo suas vidas com propósitos verdadeiros, tendo em suas mãos as rédeas de suas vidas, conduzindo-as para uma direção onde toda a humanidade poderia, de algum modo, alcançar uma relação de harmonia e entendimento.
Seríamos, no tempo em que estivéssemos reunidos, apresentados às sagradas medicinas ou plantas de poder: Tabaco, Ayahuasca, Peyote, Cogumelos e o São Pedro. Plantas que, assim como muitas outras, em várias partes do mundo vêm sendo usadas pelos povos antigos há