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O Mavro Mihalis : um zarvos, muitas histórias
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O Mavro Mihalis : um zarvos, muitas histórias
E-book223 páginas2 horas

O Mavro Mihalis : um zarvos, muitas histórias

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Sobre este e-book

São muitas lembranças, aprendizados e acima de tudo o exemplo que nosso avô nos deixou. Estar com ele, na presença de nossa família, se tornou um arquétipo tão forte e representativo, que transcendeu os típicos almoços de finais de semana, regados a pilaf e pitarudia (pratos típicos da culinária grega).

Sua presença em nossas vidas representou um elo tão forte com as origens, nos acolheu com tanto amor em seus abraços e gargalhadas, que continua nos guiando pelas incontáveis histórias que transmitiu com tanta sabedoria.

Um sentido de família que tive o privilégio de sentir, viver e que hoje agradeço e cultivo em meu coração a oportunidade de honrar o seu nome e, junto com meus primos, transmitir esse exemplo aos nossos filhos.

Com muito Amor,

Miguel Antonio Zarvos
Outubro de 2020
IdiomaPortuguês
Data de lançamento18 de dez. de 2020
ISBN9786586118711
O Mavro Mihalis : um zarvos, muitas histórias

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    Pré-visualização do livro

    O Mavro Mihalis - Helena Zarvos

    Table of Contents

    Apresentação

    Antepassado (Alfredo Bologna)

    Introdução

    Agradecimentos (Natal de 1984)

    Um Zarvos

    Miguel Antonio, Antonio Miguel

    O papú (avô em grego)

    A avó

    Um casamento grego

    A travessia

    O Mundo Novo

    O sopro do destino

    Uma década especial

    Viuvez e orfandade

    Colégio italiano

    Sou brasileiro

    O começo do futuro

    Novos laços

    Europa convulsionada

    A Grécia no conflito

    Antonio Miguel Zarvos, o pai

    Miguelzinho, o político

    A Velha Grécia

    Revelações e descobertas

    Novas revelações

    Muito além desta vida

    Raízes

    Sobre a autora

    Landmarks

    Cover

    © Helena Zarvos 2020

    Produção editorial: Vanessa Pedroso

    Revisão: Helen Bampi

    Imagem da Capa: acervo pessoal familiar

    Design de Capa: Nathalia B. Cecconello

    Editoração: Nathalia B. Cecconello

    Todos os direitos desta edição reservados à

    Buqui Comércio de Livros Eireli.

    Rua Dr Timóteo, 475 sala 102

    Porto Alegre | RS | Brasil

    Fone: +55 51 3508.3991

    www.editorabuqui.com.br

    www.facebook.com/buquistore

    www.instagram.com/editorabuqui

    Printed in Brazil/Impresso no Brasil

    Para os netos e bisnetos

    de Miguel e Josefina.

    �Gratidão a Deus, a meus pais por me confiarem sua história, a meu marido, a cada familiar e amigo pela certeza de pertencimento que me proporcionam e a meus filhos, noras, genro e netos pela grandiosa sensação de transcendência.

    Apresentação

    Crescemos ouvindo as histórias que nosso pai contava.

    Os heróis de nossa infância eram ele, os avós, os bisavós e os tataravós de ambos os lados; os valentes defensores da ilha contra os povos invasores.

    Herdei a tradição do nome, os valores, a confiança no bom combate.

    Hoje, diante do majestoso plátano que plantou em minha casa, penso que seja em forma de uma saga escrita, dessa árvore à beira do riacho, em um simples copo de cerveja gelada, mas sobretudo em nossos corações, pai e mãe estarão sempre!

    O que foi sempre será! Amor e gratidão!

    Antonio Miguel Zarvos

    médico pediatra, 72 anos.

    Meu pai foi meu primeiro amigo.

    Nem gosto de falar, da saudade que sinto!

    Prefiro pensar que está comigo em cada pescaria, em cada brinde que faço e cada vez que ligo o arcangelitis (seu Escort placa 5454) e ando no velho carro como galopei pelos varjões de arroz e por qualquer lugar que fosse a seu lado. Acho que porque minha mãe não dava conta do terremoto que eu era.

    Meu irmão Antonio tem razão. Os dois estão vivos em nós.

    Tudo o que foi sempre será, como ele diz.

    O livro vai eternizá-los ainda mais.

    Com muito amor!

    Jorge Steliano Zarvos

    dentista, 69 anos.

    Uma vida sem desafios não vale a pena ser vivida.

    Sócrates

    Corria o ano de 1954. Nascia a caçula do jovem casal. Em casa, e muito antes do tempo, eu cheguei ao mundo do tamanho de uma caixa de sapatos, segundo me contam. Estava fadada a não passar dos 15 dias de vida, se tanto. Os parentes diziam isso com um misto de pena e certeza no olhar.

    Passei, cresci.

    Como?

    Afirmo, com convicção, que foi a maternagem que me salvou. Minha mãe fez um ninho de amor, pleno e incondicional, extensão de seu útero. Protetor, intocável.

    Ela me protegeu, e meu pai foi o valente protetor de todos nós. Portanto, como não sobreviver com essas camadas de amor? Ele me apelidava carinhosamente de minha minhoquinha de ouro.

    Meus irmãos? Três irmãos, um quintal de brincadeiras sem fim!

    Assim venci a dura batalha. Vencemos todos.

    Hoje, testemunho uma fração da sua grande saga. Sem medo de errar, digo: em nossas veias corre sangue espartano.

    Não é mesmo, pai?

    Não foi travando duras batalhas que você venceu as incontáveis provas e adversidades?

    Quantas histórias! Você foi o meu melhor contador de histórias.

    Algumas testemunhei, inúmeras outras ouvi hipnotizada por sua invejável capacidade para narrar fatos com cor e sabor. Histórias reais — talvez mescladas com alguma ficção, mas magnetizantes, por seu jeito intenso — grego! — de ser. Histórias gravadas em fitas cassete, histórias gravadas em nossas almas, histórias magistralmente registradas pela Helena.

    Pai, você conseguiu nos apresentar todos os nossos ascendentes de um modo adorável e admirável! Conheci minha avó, bororó, pelo imenso amor que você nutriu por ela. Conheci meu avô, através das emocionantes cartas que guardou cuidadosamente por quase um século. Palavras e gestos que nos fizeram amá-los também.

    Conheci sua mão forte a nos conduzir e corrigir, mãos que nos ensinaram a arte de dirigir — o Dauphine e as nossas próprias vidas.

    Conheci e senti sua leve mão mágica, que você impostava para transmitir bons fluídos, sempre que necessário. E como funcionavam, lembra? Agora sei que era dom herdado do seu sangue indígena. Quem sabe contasse também com a proteção dos deuses gregos, hein?

    Com você, meu pai, aprendi também a amar a Grécia, seus cantos e recantos, heróis, deuses, filósofos…

    Conheci seus valores e sua fé inabalável. Fé inabalável, materializada na construção da igrejinha da Aghia Marina, em Arcangelos, Rhodes.

    Sou orgulhosa pelo legado que nos deixou. Minha gratidão por ter sido o pai que foi. Humano — portanto com defeitos dessa humanidade, mas com qualidades de herói para mim. Você, pai, me ensinou a importância da Verdade, da Probidade e da Lealdade. Herança e legado incalculáveis!

    Termino quase ouvindo a mamãe — sua Zefina, companheira da grande viagem da Vida — chamar a todos que aí estão, na festa celestial, para sentarem-se à mesa, fartamente servida.

    Nós, seus filhos, netos, bisnetos, genros e noras, sopraremos preces de gratidão e, daqui, ajudaremos a apagar as 100 velas… gerando uma luz que, como centelha divina, retornará para nós. A grande e pura luz que nunca se apaga, incandescente em nossa saudade.

    Saudade boa.

    Celebraremos daqui sua vida muito bem vivida!

    Muitos beijos!

    Marina Zarvos Ramos de Oliveira

    psicóloga, 66 anos.

    Antepassado (Alfredo Bologna)

    Só te reconheço de retrato,

    Não te conheço de verdade,

    Mas teu sangue bole em meu sangue

    E sem saber te vivo em mim

    E sem saber vou copiando

    Tuas imprevistas maneiras

    Vou descobrindo o que me deste

    Sem saber que me davas, na líquida

    Transmissão de taras e dons,

    Acabei descobrindo tudo

    Que teus papéis não confessaram

    Nem a memória da família

    Transmitiu como fato histórico

    E agora te conheço mais

    Do que a mim próprio me conheço

    Pois sou teu vaso e transcendência

    Refaço os gestos que o retrato

    Não pode ter, aqueles gestos

    Que ficaram em ti à espera

    De tardia repetição,

    E tão meus eles se tornaram

    Que suponho tu os copiaste

    De mim antes que eu os fizesse.

    Bologna, José Ernesto

    Estação Desembarque - Ed. Aquariana.

    Introdução

    Este livro é uma reverência ao antepassado.

    Todas as forças que se movimentaram antes de nós até que essas histórias de vida pudessem ser contadas e ouvidas são celebradas neste registro.

    É também uma homenagem às terras onde nasceram e viveram, às cidades e pessoas cujas vidas se entrelaçaram na mesma trama em um certo tempo.

    Surgiu do interesse infantil em conhecer tudo o que aconteceu antes de nós existirmos e cresceu com a devoção de nosso pai a suas origens e parentes.

    Trata-se de uma história familiar que se confunde com mitos, relatos e sonhos de muitas pessoas e passou a existir por escrito para que alguns valores, costumes e curiosidades possam se perpetuar.

    Em 1984, recebi de meu pai, Miguel Antonio Zarvos, inúmeras fitas gravadas por ele, nas quais toda a experiência de ser um grego nascido em terras brasileiras me foi confiada. Suas emoções, sua própria interpretação de tudo que experienciou e, mais do que isso, seus sonhos e realizações pessoais me foram confiados como um tesouro a ser guardado. Assim o fiz, e desde então permaneceu entre meus projetos para depois da aposentadoria. Sabia que algum dia poderia compartilhar tudo.

    Há anos, um concurso para relatos em forma de conto sobre imigrantes gregos foi o motivo que precisava para tirar a história da gaveta. Formatada como conto, parte dessa história recebeu menção honrosa, mas ainda assim não foi publicada. Quis o destino (o kismet, como ele diria em idioma turco) que viesse a ser publicada no ano de seu centenário.

    Este é o momento de publicar essas memórias, no formato original, iniciado em 1984, quando os depoimentos de nossos pais foram feitos. Celebramos com a redação desses depoimentos, neste ano de 2020, a memória de ambos e o centenário do Mihalis, em 27 de outubro.

    Abaixo, a carta que segue foi escrita em agradecimento ao material que me foi confiado naquela ocasião, há tantos anos, e lida por eles, com emoção, ao lhes entregar o manuscrito do que hoje vem à luz.

    Agradecimentos (Natal de 1984)

    Queridíssimos pais,

    As fitas que me confiaram, atendendo a pedidos meus, eu as ouvi uma a uma, atentamente e muito emocionada, tanto quanto vocês demonstraram estar ao relatarem o que sabem a respeito de nossa família. Chorei com vocês, ri com vocês, mergulhei em tudo o que disseram, de tal maneira, que me senti convivendo com vidas passadas, em um tempo findado, distante demais da minha existência.

    Experiência indizível! Difícil de partilhar. Gostaria, contudo, de dividir a magia da descoberta de minhas raízes, nesse mergulho no passado, escrevendo uma história pessoal. Isso, que antes eu chamaria de passado, já me parece uma construção, que resultou em mim, em meus filhos, em vocês, sem ordem de chegada à cena. Está ainda sendo construído, refeito… pensado e sentido.

    Há uma sensação alegre de despertar para a ligação íntima com fatos e coisas, com pessoas e lugares que escapam de nossa experiência pessoal e limitada e que todavia são parte de nós. Sinto-me referida a um mundo cada vez mais abrangente, assim como se minha consciência fosse o ponto minúsculo, que em uma certa dimensão está conectado a todos e a tudo e que, no limiar da consciência pessoal, descobre raízes profundas e unidade cósmica. Quanto mais entro em contato com minha individualidade, mais necessidade sinto de me ligar à humanidade, e quanto mais me aproximo da humanidade, mais alimento minha personalidade. Por isso… esse tesouro me entrega o melhor de mim mesma… a parcela transpessoal da minha identidade, aquela que me faz um ser humano comum, vivendo aqui e agora.

    Assim, com profunda gratidão, beijo vossas mãos e façamos juntos uma homenagem a todos os nossos antepassados.

    Sua filha Helena

    (dezembro de 1984)

    Capítulo I

    Um Zarvos

    ODC10 da Scandinavian Airlines está pronto para decolar na pista do Aeroporto de Copenhague. Está lotado, com todos os passageiros devidamente acomodados em suas poltronas, com os cintos afivelados e a expressão contrita, como se o sucesso da decolagem dependesse, de algum modo, da responsabilidade com que cada um deles desempenhasse seu papel na imensa classe turística.

    As poderosas turbinas funcionam plenamente, em mal contida pressa para levantar voo, qual gigantesca águia em busca de seu próprio habitat.

    O ruído abafado, porém agudo, que os passageiros podem ouvir é percebido com certo temor, mesmo para os mais experientes e viajados dentre eles, como é o caso do casal de meia-idade acomodado nas primeiras poltronas, junto aos lugares reservados às comissárias de bordo.

    Miguel Antonio Zarvos e Dona Josefina Steliano Zarvos, procedentes de Atenas, estão viajando de volta para o Brasil pela décima vez. Eles formam um casal simpático, ambos grisalhos, trajados com sóbria elegância, o que revela confortável posição social, porém suas feições levemente cansadas e algumas rugas de expressão denunciam mais do que um simples cansaço pela longa jornada. Percebe-se que são duas pessoas cujas conquistas resultaram de muita luta.

    Josefina tem um ar mais descontraído do que o dele; parece mais curiosa e interessada no que se passa à sua volta e acompanha todos os movimentos feitos pelas comissárias nesses minutos que antecedem a decolagem. Miguel, muito sério e pensativo, olha fixamente à sua frente, onde finalmente se acomoda uma bela aeromoça, como costuma chamar essas profissionais. Viu como ela, calmamente, afivelou o próprio cinto de segurança e logo em seguida sentiu o leve trepidar da aeronave levantando voo. Em poucos segundos estavam imersos no límpido céu europeu do mês de julho. Logo ouvem a permissão para destravarem os cintos, um longo suspiro e aí sim uma leve descontração de Miguel. Acomodou-se melhor na poltrona, olhou para a aeromoça que saía com elegância para preparar os aperitivos a serem servidos e então segurou a mão da esposa a seu lado com carinho. Teve certeza de que fariam excelente viagem de volta ao lar, aos filhos e netos. Findavam-se as férias anuais na ilha de Rhodes.

    Era curioso como se sentia desta vez! Tantas e tantas vezes fizera essa mesma viagem e percurso, contudo, por alguma razão, agora se sentia diferente. Estava comovido pensando em si mesmo, na esposa, nos filhos e netos; na Grécia que tanto amava, no passado, na vida, que parecia um filme. Cerrou levemente os olhos, ainda segurando a mão da mulher, porém procurando recolhimento e privacidade.

    De maneira irresistível, insistente, sentia como que a presença do passado, de forma densa, real. Como se o tempo de que dispunha, durante as horas que o separavam da aterrissagem, fosse o que ainda não se houvera concedido para um balanço da própria vida.

    Em uma arrebatadora voragem evocativa, passou a rememorar de forma clara e nítida toda a história de sua existência, ainda que muito da sequência natural e cronológica fosse atropelada pela memória subitamente agitada por lembranças muito remotas, sobrepostas e concomitantes a uma espécie de reflexão, como se estivesse tendo insights luminosos.

    Tão intensa atividade mental passou a ocupá-lo tanto, que decidiu ceder a esse impulso irrefreável em direção ao passado e a si mesmo e mergulhou fundo nesse estado semiletárgico, admitindo a própria avidez pela vida e pelos misteriosos caminhos da existência.

    Afinal, quem sou eu? Tenho andado em busca do meu Eu com ansiedade, incansavelmente. Cada dia é uma nova etapa dessa busca, e meus pensamentos, sensibilidade e mesmo sonhos me levam aos confins do meu Ser. Minhas lembranças vão até onde eu suspeito que já não seja mais eu mesmo, e meus anseios de realização ultrapassam minha expectativa de vida. Acabo chegando à conclusão de que quanto mais mergulho em direção a mim mesmo, mais diviso o Todo de que faço parte; quanto mais procuro a mim, à minha individualidade única e particular, mais me aproximo da humanidade inteira. Meu ‘Eu’ é a consciência particular da família que formei, dos antepassados que me abrigaram em seus corpos e almas, das raízes de cujo tronco e galhos faço parte; da terra que me nutre e do céu que oxigena minha identidade em uma magnífica e divina dinâmica. Se uma folha de um grande plátano tiver consciência, será feliz, se puder ver-se inteira, dependurada no galho, que, por sua vez, nasce em outro grande galho, ligado ao tronco, preso à raiz, ligada à terra e girando no espaço infinito, em torno do Sol. Assim também nós, seremos infelizes se, pelo fato de termos consciência, nos iludirmos a respeito, como se pudéssemos ser uma entidade desvinculada do Todo.

    — Aceita um aperitivo, senhor? — interrompeu a jovem aeromoça.

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