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Flores Para Tieta
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E-book89 páginas1 hora

Flores Para Tieta

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Sobre este e-book

As histórias de “Flores para Tieta” são como as narrativas oralizadas por homens e mulheres de tempos e espaços já distantes, sentados em suas cadeiras de balanço. A voz do narrador, que por vezes é a da personagem, é a da tradição: traz consigo a experiência de sua vida, mas também a de seus ancestrais. Com muita frequência saltam do texto ensinamentos, alguns transmitidos por meio de provérbios, que buscam a um só tempo dizer sobre o universo de Tietas, Alines, Isauras, Marcelos, Robertos, Fernandos, como também sobre o universo em que está contido o leitor. O conto que dá nome ao livro é trançado com fios da vida moderna, mas também com os fios da tradição. E neste tecido está em alto relevo as memórias de July, que, ainda no percurso entre sonho e realidade, revisita o jardim do tempo em que estavam vivos os seus amores. O relato é construído a partir de descrições minuciosas: “July, emocionada, sentou no velho banco de madeira que ainda estava lá, à sombra do pé de jambo. Lembrava-se dos acontecimentos dos últimos anos e se perdia em pensamentos naquele horizonte distante pontilhado de saudades”. As imagens criadas por esse emaranhado de registro visual do presente, em construção, e do passado nos conduz a uma reflexão sobre a resistência à concretude de uma modernidade em vias de dispersão. Mais adiante, no conto “O baile do aviador”, dona Marieta alerta a sua neta sobre o comportamento invasivo e estratégico da colega de faculdade: “ – Isaura, minha neta, abre teus olhos... Amiga solteira entre casal nunca deu certo... Essa moça é muito bonita... Não coloca a palha perto do fogo!”. Envoltas nessa atmosfera de acontecimentos e ensinamentos, as narrativas vão sendo construídas. No final, como se espera de um conto, o leitor tem acesso a uma história que lhe é transmitida em primeiro plano e a outras que transitam sob o véu das palavras ditas. Embora os contos sejam embebidos na tradição, eles não trazem moradias erguidas em ruas de barro, as personagens não se locomovem em veículos de tração animal, o meio de comunicação entre pessoas distantes não é a carta. “Flores para Tieta” oferece às suas personagens o asfalto, o aparelho celular, o automóvel. Tratam-se de contos contemporâneos, ancorados em nossa realidade brasileira, em que o velho e o novo, o rústico e o moderno compartilham um mesmo espaço. Também as personagens são erigidas nesse lugar de alternância entre tradição e modernidade. Homens e mulheres são constituídos de sabedoria e ignorância, malícia e inocência. Neste ponto, faz-se necessário destacar o papel das mulheres na obra. Elas protagonizam praticamente todas as narrativas. São batalhadoras, determinadas, carregam nos ombros o peso da responsabilidade, mas também o da ausência de seus maridos. Os homens, diferentemente, são constituídos de personalidades flácidas e valores diminutos, muito embora se destaquem vozes masculinas sábias. A personagem Sandra, do conto “Exaustão”, é exemplo das tais qualidades. É dito sobre suas obrigações: “Tinha que pagar aluguel, água, luz, gás, fazer a feira; além de tudo, ainda existiam as contas extras e básicas com vestuários e medicamentos que por acaso precisasse. Tudo na sua vida se resumia ao básico, a sua casa, os móveis, a roupa e até as horas que precisava para dormir eram reduzidas, mas, mesmo assim, estava grata pelo pouco que possuía (...)”. Pelo dito sobre Sandra, já é possível perceber que as narrativas comunicam as minúcias do dia a dia, mas não se encerram nelas. Em “Flores para Tieta”, conto que abre o livro, o sofrimento está presente, mas são as lembranças vívidas de um exuberante jardim e de um animal de estimação querido, que conduzem a trama. “Exaustão” vem em seguida, trazendo a dura vida conduzida por uma mãe solteira, com pouco tempo e muitos afazeres. Embora seja introduzido por dados de uma vida factível, o conto surpreende o leitor, que se depara com o elemento fantástico como perturbador da ordem. Assim como os de
IdiomaPortuguês
Data de lançamento10 de fev. de 2017
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    Flores Para Tieta - Gercina Dalva Da Silva Santos

    Agradeço ao meu criador, pela vida e por todas as possibilidades de ser feliz. Agradeço também à memória da minha querida e sempre amada avó, Josefa Alves, de quem sinto muita saudade.

    Dedico esse livro de contos, aos meus preciosos netos, Guilherme Augusto e Davi César. Sejam abençoados com a sabedoria e o amor.

    SUMÁRIO

    Flores para Tieta

    Exaustão

    O baile do aviador

    Uma tarde de outono

    Fogaréu

    Depois da chuva, vagalumes e estrelas

    Menina sapeca

    Apresentação

    As histórias de Flores para Tieta são como as narrativas oralizadas por homens e mulheres de tempos e espaços já distantes, sentados em suas cadeiras de balanço. A voz do narrador, que por vezes é a da personagem, é a da tradição: traz consigo a experiência de sua vida, mas também a de seus ancestrais. Com muita frequência saltam do texto ensinamentos, alguns transmitidos por meio de provérbios, que buscam a um só tempo dizer sobre o universo de Tietas, Alines, Isauras, Marcelos, Robertos, Fernandos, como também sobre o universo em que está contido o leitor.

    O conto que dá nome ao livro é trançado com fios da vida moderna, mas também com os fios da tradição. E neste tecido está em alto relevo as memórias de July, que, ainda no percurso entre sonho e realidade, revisita o jardim do tempo em que estavam vivos os seus amores. O relato é construído a partir de descrições minuciosas:  July, emocionada, sentou no velho banco de madeira que ainda estava lá, à sombra do pé de jambo. Lembrava-se dos acontecimentos dos últimos anos e se perdia em pensamentos naquele horizonte distante pontilhado de saudades. As imagens criadas por esse emaranhado de registro visual do presente, em construção, e do passado nos conduz a uma reflexão sobre a resistência à concretude de uma modernidade em vias de dispersão. 

    Mais adiante, no conto O baile do aviador, dona Marieta alerta a sua neta sobre o comportamento invasivo e estratégico da colega de faculdade: – Isaura, minha neta, abre teus olhos... Amiga solteira entre casal nunca deu certo... Essa moça é muito bonita... Não coloca a palha perto do fogo!. Envoltas nessa atmosfera de acontecimentos e ensinamentos, as narrativas vão sendo construídas. No final, como se espera de um conto, o leitor tem acesso a uma história que lhe é transmitida em primeiro plano e a outras que transitam sob o véu das palavras ditas.

    Embora os contos sejam embebidos na tradição, eles não trazem moradias erguidas em ruas de barro, as personagens não se locomovem em veículos de tração animal, o meio de comunicação entre pessoas distantes não é a carta. Flores para Tieta oferece às suas personagens o asfalto, o aparelho celular, o automóvel. Tratam-se de contos contemporâneos, ancorados em nossa realidade brasileira, em que o velho e o novo, o rústico e o moderno compartilham um mesmo espaço.

    Também as personagens são erigidas nesse lugar de alternância entre tradição e modernidade. Homens e mulheres são constituídos de sabedoria e ignorância, malícia e inocência. Neste ponto, faz-se necessário destacar o papel das mulheres na obra. Elas protagonizam praticamente todas as narrativas. São batalhadoras, determinadas, carregam nos ombros o peso da responsabilidade, mas também o da ausência de seus maridos. Os homens, diferentemente, são constituídos de personalidades flácidas e valores diminutos, muito embora se destaquem vozes masculinas sábias.

    A personagem Sandra, do conto Exaustão, é exemplo das tais qualidades. É dito sobre suas obrigações: Tinha que pagar aluguel, água, luz, gás, fazer a feira; além de tudo, ainda existiam as contas extras e básicas com vestuários e medicamentos que por acaso precisasse. Tudo na sua vida se resumia ao básico, a sua casa, os móveis, a roupa e até as horas que precisava para dormir eram reduzidas, mas, mesmo assim, estava grata pelo pouco que possuía (...).

    Pelo dito sobre Sandra, já é possível perceber que as narrativas comunicam as minúcias do dia a dia, mas não se encerram nelas. Em Flores para Tieta, conto que abre o livro, o sofrimento está presente, mas são as lembranças vívidas de um exuberante jardim e de um animal de estimação querido, que conduzem a trama.

    Exaustão vem em seguida, trazendo a dura vida conduzida por uma mãe solteira, com pouco tempo e muitos afazeres. Embora seja introduzido por dados de uma vida factível, o conto surpreende o leitor, que se depara com o elemento fantástico como perturbador da ordem.

    Assim como os demais, O baile do aviador deixa o leitor curioso sobre o destino da personagem principal. Isaura é uma mulher inexperiente, que, ao ignorar a voz da tradição – a que emana de sua mãe e avó –, cai numa armadilha preparada por quem menos esperava.

    Tarde de outono, o quarto conto do livro, traz como protagonista Marcelo: um rapaz que busca desfazer-se do passado, mas tem seu objetivo frustrado como que por peraltice do destino.

    Fogaréu é a narrativa subsequente, que aquece o livro de contos. Com pitadas de erotismo, vai sendo traçado o destino de um homem e uma adolescente, que se lançam numa relação insana.

    Em seguida vem Depois da chuva, vagalumes e estrelas, história narrada em primeira pessoa. A voz da narradora e personagem, Anita, detalha como se tornou onisciente e onipresente. O caminho, percorrido até o dia em que se tornou vítima de um crime, tem nas margens histórias de vidas exemplares, como a de seu pai, Fernando.

    Menina sapeca encerra o livro de contos, trazendo a história de uma criança, Alice. Sua vida também é marcada por perdas: seus pais morrem num acidente de carro. A narrativa é leve e o clímax não é constituído por uma tragédia, embora imprima uma reviravolta significativa. Mais que os outros, Menina sapeca se deixa levar pela tradição, e as histórias passadas adiante, em tardes e calçadas, não só encerram o conto, mas permitem que o livro e o conto sejam espelhos para uma tradição que se projeta no infinito.

                                                                                                          Maria Betânia Monteiro

    FLORES PARA TIETA

    Era uma tarde chuvosa, de uma chuva bem fina. Pequenas gotículas da chuva que caíam na vidraça da janela traziam um certo ar de melancolia àquela tarde.  July espreguiçava-se demoradamente, sentindo vontade de voltar a dormir. Estava sozinha em casa, e o silêncio lhe fazia bem. Não que gostasse de ficar sempre sozinha, mas, de vez em quando, era muito bom.

    Olhou os lençóis desarrumados, travesseiros espalhados, e aquilo lhe era convidativo. Havia sonhado algo muito gostoso. Será que recuperaria aquele sonho? Sonhou com sua cachorrinha Tieta. Passaram-se alguns meses desde o dolorido adeus, e ela ainda não havia se recuperado totalmente

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