Diário De Uma Suicida
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Diário De Uma Suicida - Ricardo Junior Amorim
— É a filha dos Martins, uma menina de quatorze anos que estava na oitava série, estudava na Escola E. Miranda Chaves.
— Sabe mais alguma coisa?
— Além dessas informações concedidas pela madrasta, nada do caso.
Potter observou a cena e com muita cautela, visto que o departamento de pericia forense ainda não estava no local, mesmo com cuidado ainda sim esbarrava em lugar duvidoso, ousou retirar o pano, mas Connor a coibiu dizendo que era melhor esperar, porém quem era ela que deveria esperar? Era um caso normal que igual ou até pior que aquele já havia resolvido muitos, retirou o pano que cobria o rosto da menina e viu aquela cena tenebrosa, não a despiu, pois Jack disse que estava nua, deixou somente seus braços à mostra, porém era muito difícil deduzir algo, pois havia muito sangue esparramado sobre a menina.
Assustou-se, pelo visto não era como os casos anteriores — típico, todavia bem diferente. Observou atentamente cada detalhe; os braços contorcidos com fraturas expostas, o úmero estava à mostra, o occipital bem afundado demolido pelo impacto com a superfície dura.
— Tem sangramento nos três orifícios; boca, ouvido e nariz e os olhos bem arroxeados tipo olhos de guaxinim detetive Potter, disse Connor apontando o dedo direcionando a detetive.
A detetive avaliou bem e pela força do impacto supôs traumatismo craniano com hemorragia interna, não era função dela dizer como aconteceu, logo mais chegaria a perícia e posteriormente o legista daria as conclusões concretas, mas quis tentar explicar para si mesmo o sangramento pelos orifícios apontados por Jack.
Ela também não deixou de avaliar as mãos que estavam encobertas pelo sangue já seco, ela puxou as mãos no intuito de abri-las, o rigor mortis estava apenas começando e ela havia sentido isso, eram sete horas e trinta e seis minutos, pelo tempo ela sugeriu morte as três ou três e pouca da madruga, Jack confirmou o horário.
— Foram três e um mais ou menos.
— Por que demoraram tanto a chamarem a policia?
— Eles não perceberam que ela havia se jogado de lá, só foram aperceber pela manhã quando sentiram sua falta e olharam e viram a janela aberta e o corpo estirado no chão cá embaixo.
— Se jogou de qual andar? Perguntou a detetive Sarah.
— Do décimo andar.
Sarah olhou o prédio de cima a baixo, ela contou vinte andares, a menina morava entremeio, cada andar tinha três metros, então, se ela se jogou do décimo ele tinha trinta metros de altura na hora do salto, após uma breve conta em sua cabeça concluiu por si que a menina caiu a uma velocidade de 24,5m/s = 88,2km/h aproximadamente, aquilo foi perturbador para Sarah, se perguntou, como uma menina de catorze anos faria algo tão cruel contra si mesma?
Ela não tinha motivos, o pai era advogado a madrasta enfermeira e trabalhava no hospital mais concorrido da cidade, tinha tudo que queria cogitou consigo. Abriu as mãos da garota novamente e com uma luva que recebeu de Jack pode sentir sobre o sangue seco aquela superfície áspera, ela passou os dedos levemente outra vez e ela sentiu os cortes, o pulso estava cortado, se fosse por ela haveria limpado os braços da menina para tirar suas conclusões, mas não podia, qualquer coisa que ela ousasse fazer poderia eliminar diretamente um prova criminalística.
— O que você está sentido ai, o que é isso? Interrogou Connor com os olhos bem de perto espreitando cada detalhe que Sarah fazia.
— Ela cortou os pulsos! Disse Sarah, aquilo causou uma reveria na cabeça de Jack.
— Como assim cortou os pulsos?
— Cortando, passou algum objeto sobre eles e pronto, ato bem típico de suicidas.
Os pais da menina ainda estavam sobre choque os outros policiais ainda estavam tentando tirar alguma informação valiosa deles, pelo menos uma que seria útil, que pudesse dizer o motivo, razão ou circunstância fez a pequena Clarisse se atirar do décimo andar, porém o pai e a madrasta diziam sempre a mesma coisa – ela nunca foi assim, ela sempre esteve feliz, ela amava a vida.
De uma coisa era certa: ou eles não estavam falando a verdade e tinham culpa no cartório ou a menina era mais louca do que se podia deduzir, mas Potter apostava bem na primeira hipótese e, após uma breve avaliação pediu que conduzisse os pais a delegacia para prestar depoimentos, Thomas Martins era advogado e logo se recusou, tentou usar a lei a seu favor, porém a lei desta vez estava contra si e não podia fazer nada a não ser prestar um depoimento.
— Policial Connor, disse Sarah, já estiveram no quarto de onde ela se jogou?
— Não, disse o policial, aquele olhar de Sarah não foi agradável e foi muito bem traduzida por Connor, ela pensou; como ainda não foram ao apartamento? Connor pediu que dois de seus homens se dirigissem para lá imediatamente.
— Espere, vou com vocês, disse Sarah.
— Mas... Você não vai investigar mais o corpo? Perguntou Jack.
— As investigações aqui acabaram, deixe o resto para a perícia forense, esse corpo aqui não vai dizer nada, entretanto alguma coisa no apartamento vai isso eu garanto!
Aquelas últimas palavras de Sarah causaram inquietações no rapaz, apesar de conviver tão pouco tempo com ela, ele nunca tinha a visto trabalhar em sua devida área, a não ser correndo atrás de bandidos e de moleques rebeldes bêbados filhos de papaizinhos, pela primeira vez ele estava diante de um caso criminalístico de verdade e sentiu que se continuasse ao lado de Potter certamente acrescentaria algo em seu currículo e poderia almejar até grandes cargos oficiais no futuro.
Capítulo dois
C
omeçaram a subir as escadas até ao décimo andar seria uma longa caminhada, Sarah Potter não gostou nada, como um apartamento de vinte andar estava com elevador atrapalhado? A cada passo na escada ele relembrava do rosto da menina, dos pulsos cortados e dos ossos expostos, aquilo subia sua cabeça, queria por que queria entender, como uma menina de quatorze ano teria coragem de tirar a própria vida?
Do que mais Potter tinha medo era das respostas se as encontrasse e ela sabia que o quarto da menina esconderia muitos segredos que certamente pediriam para serem encontrados. Por fim, chegou ao décimo andar, uma porta de madeira preta com o numero 11 em vermelho, era diferente de todas as portas do apartamento, parecia que foi adaptada aquele local, estava estranho, Potter sentiu um clima ruim, uma força oculta muito forte advinda do apartamento, em outra ocasião não entraria, mas seu trabalho a obrigava.
Abriu a porta, entrou e deu de cara com uma casa muito diferente daquilo que ela estava acostumada, primeiro; a casa estava uma bagunça, para quem era advogado e tinha uma mulher enfermeira, aquilo estava um chiqueiro, todavia não foi à bagunça que chamou a atenção de Potter, foram os quadros nas paredes pintadas de preto, o lugar era sombrio, não havia nada santo, nem apenas um pingente, quadros de guerra, quadros em homenagens a ditadores profanos...
A detetive Sarah caminhou até o quarto de Clarisse e quando abriu a porta.
— AH! - Ela colocou a mão na boca no intuito de emudecê-la, mas aquilo era impossível, — meu Deus! - Disse ela novamente.
Ela olhou pelos cantos, dois policiais entraram com ela e eles eram mais velhos e tinham mais tempo de serviço, Harry e Harvey estavam juntos nessa há muito mais tempo que ela, não era detetives profissionais, porém já tinha uma visão holística formidável.
Não demorou muito para Connor também aparecer no quarto da garota, mas foi Harry que tomou a palavra.
— Cuidado onde pisa, este quarto está cheio de provas, - depois ele olhou para Connor e disse — peça que os peritos dêem uma olhada aqui.
A primeira impressão Potter não havia notada nada, aquele quarto obscuro não queria se mostrar, enfim alguém achou o local de acender a luz, agora estava mais fácil, cogitou Sarah, só sua lanterna não estava mostrando nada, ela caminhou até a janela, mas esbarrou em algo no chão.
— O que é isso? - Perguntou Connor.
Sarah abaixou para pegar, o policial Harvey ordenou que não o tocasse poderia ser uma prova, ela bateu bem a luz sobre o objeto e realmente era uma prova.
— É a navalha, - disse Potter, - ela estava bem suja de sangue, o sangue até já secou nela.
Demarcaram o objeto, foi à primeira prova criminalística do quarto, um quadro na parede chamou a atenção da detetive, nunca tinha visto algo tão forte assim, na parede havia quadros de sacrifício, de mutilação, de pessoas queimando em muito fogo.
— Esse quadro representa o que? Perguntou Harry.
— Pelo visto é o inferno, disse Sarah.
Harry ficou com os olhos tão arregalados naquele instante, havia tanto objeto profano naquela casa que ele desacreditava de si próprio.
— Eles eram maçônicos?
— Não sei, mas aquele quadro com aquela frase e o numero da porta estão dizendo muita coisa.
— Que frase?
A detetive Potter então apontou com o dedo, Connor, Harry e Harvey olharam de imediato e leram aquela passagem bíblica.
Eu vi tronos; e assentaram-se sobre eles, e foi-lhes dado o poder de julgar; e vi as almas daqueles que foram degolados pelo testemunho de Jesus, e pela palavra de Deus, e que não adoraram a besta, nem a sua imagem, e não receberam o sinal em suas testas nem em suas mãos; e viveram, e reinaram com Cristo durante mil anos.
Apocalipse 20:4
— Isso quer dizer o que? - Connor interrogou.
— Não importa isso não vem ao caso, procurem pistas isso sim ajudará, falou Harry.
Potter o espreitou bem e não viu nele uma pessoa ignorante, ele mesmo sabia que aquilo ali queria dizer alguma coisa, mas o medo em seus olhos, a face pálida e as mãos trêmulas indicavam que ele não queria ficar nem por mais um minuto naquele apartamento.
Connor olhou em volta e viu o espelho, ele caminhou até ele e logo viu aquelas marcas de sangue, o espelho era grande e ficava do lado externo do guarda-roupa, mas a metade dele estava trincada e havia pretidão como se alguém estivesse colocada fogo e ele estivesse enfumaçado.
— Como isso é possível?
Sarah Potter veio ver aquilo que Jack estava espreitando com os olhos bem salientes.
— O que está vendo?
— Olhe isso, o que é? Como pode ficar assim? Só uma parte dele está preta a outra não, olhe essas marcas, o local onde elas estão não ficaram ofuscadas.
A detetive olhou com muita atenção, após uma breve reflexão pegou um cordão que estava pendurado em seu pescoço e enfiado para dentro da blusa, retirou-o, nele havia um pingente de crucifixo, Potter era bem religiosa e quase nunca faltava a igreja, retirou o do pescoço e colocou encima das marcas.
— O que é? - Interrogou Connor.
— São... São...
— Diga logo! - Por fim Sarah desengasgou.
— São cruzes invertidas! - Sarah falou com aquela voz tremula de medo, seu corpo arrepiou-se, o olhar de Connor para ela não mostrava nem um pingo de satisfação, agora era Connor que não queria ficar ali.
— Vejam o que achei, disse Harvey.
Nesta prova Harvey não hesitou e a pegou, primeiro ele havia colocado a luva para não mascarar uma analise criminal, ele a levantou e tinha mais no canto esquerdo da cama jogada ao chão, era uma camisinha dessas adquiridas na farmácia do postinho de saúde.
Todas estavam usadas e pelo que ele contou haviam mais de dez, umas com o esperma meio fresco, outras já estavam secas e parecia ser usadas há dias.
— Que nojo! - Disse ele e logo a soltou no chão.
Depois disso a detetive abaixou no chão e olhou por baixo da cama para ver se encontrava mais alguma coisa, além de inúmeros pacotes de camisinhas abertas tinha uma fita que lhe chamou a atenção.
— A luva, por favor!
Connor a serviu, ela a calçou e pegou aquela fita, nela havia contidas duas marcas, era uma fita de teste de gravidez daquelas bem simples e barata, ela se levantou e olhou novamente e se lembrou da vez que havia usado um daquele, se lembrou que uma marca era não e duas sim.
— O que é isso? Perguntou Connor.
— Teste de gravidez e pelo visto ela estava grávida.
— Você acha que ela se matou por descobrir que estava grávida?
— Bem provável, não podemos descartar tal hipótese.
Sarah poderia até engolir esta, mas sua mente não, ela sabia que havia muito mais coisas que eles ainda não viram, não sabiam, e tinha medo de logo descobrir.
— Mas e essas marcas, esses quadros, aquele quadro ali está mais para rock metal, parece com o slogan da Iron Maiden, eu não acho que aqui ouvi só um simples suicídio, pelo simples fato de uma menina de catorze anos descobrir que estava grávida, ela só tinha catorze anos merda!
Para Harry o caso estava encerrado não havia mais nada ali para examinar, era só marcar as provas e deixar que a perícia fizesse seu trabalho.
— Pelo jeito o serviço está encerrado, supostamente a menina trouxe alguns amiguinhos da escola aqui, fizeram sexo até demais e quando descobriu que estava grávida resolveu se matar por medo dos pais, isso é muito corriqueiro, acontece sempre.
— Mas e essas marcas, esse espelho, o que me diz? -Perguntou Connor
— Provavelmente ela queria aparecer, respondeu Harry.
— Não acho que seja isso, disse a detetive Potter.
— Não me venha com suas suposições detetive Sarah, já desvendamos o caso, assuma logo que nós fomos mais competentes que você aqui, da próxima vez eu deixo você vir sozinha assim você se sairá melhor.
Potter engoliu seco, ela queria neste momento fazer com que ele digerisse essas palavras, mas se conteve, não disse nada, deixou que ele saísse e deu mais uma olhada, ao ver que só ele estava saindo, Harry parou na porta do apartamento e esperou, foi quando ele viu de longe aquela frase escrita na parede, ele voltou ao quarto e foi até a frase e a leu.
A ausência de amor mata, mas a presença vã dele mata ainda mais
— Olhem isso!
Pelo visto o caso não estava encerrado, poderia ser ignorado se assim eles quisessem, todavia não terminado. Sarah leu e releu,