A Vida Adulta: Dificuldades na Passagem da Adolescência para a Maturidade
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A Vida Adulta - Felícia Rodrigues Rebelo da Silva Araujo
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO MULTIDISCIPLINARIDADES EM SAÚDE E HUMANIDADES
À Verena e à Cora.
Elas me mostraram um amor novo e infinito,
que não cabe no peito e me faz ser mais eu mesma.
AGRADECIMENTOS
A elaboração deste estudo contou com importantes contribuições por parte de pessoas as quais eu admiro muito. Foram trocas, apoios e parcerias especiais, que me enriqueceram de aprendizados. Dentre essas pessoas, gostaria de destacar os agradecimentos à Eloísa Penna, pelos imensos ensinamentos, por emprestar a clareza de pensamento e pela amizade gostosa e enriquecedora. Também, gostaria de destacar os agradecimentos à Teresa Machado, pelo apoio, pela sensibilidade e por dividir comigo seu olhar clínico, claro e profundo, que contribuíram muito para as reflexões que resultaram neste trabalho. E, é claro, aos meus pacientes, pela confiança e pelos aprendizados que me proporcionaram.
PREFÁCIO
Grande prazer e grande honra apresentar o texto de Felícia, agora publicado em livro. Tenho acompanhado seu percurso profissional desde a graduação em Psicologia na PUC-SP, seu interesse pela Psicologia Analítica foi precoce e seu aprofundamento é constante. Muitas parcerias e uma grande amizade. A adolescência foi, e ainda é, um tema que atraiu a atenção de Felícia desde o início de sua carreira, tendo sido alvo de estudos, pesquisas e experiência clínica. Agora, ela se dedica à etapa seguinte do processo de individuação, a entrada na maturidade. Falar sobre a passagem da adolescência para a maturidade é tratar de um tema muito atual. Como bem aponta a autora, temos observado, na clínica, um afluxo de pessoas que nos procuram em função de grande sofrimento para fazer a transição para a vida adulta.
O texto de Felícia discorre com clareza sobre as dificuldades enfrentadas por essas pessoas: a autora faz, também, uma reflexão profunda sobre as implicações dessa situação no processo de individuação.
Viver é estar em constante transformação rumo à consolidação crescente da individualidade. Entretanto, há alguns períodos, particularmente críticos no desenvolvimento dessa individualidade, como a passagem da infância para a adolescência, da adolescência para a vida adulta e, depois, para a senescência.
As sociedades antigas e as comunidades tribais instituem ritos de passagem para esses momentos culminantes do processo de individuação, com a finalidade de promover a saída de uma etapa e a entrada em outra fase da vida. Esses rituais ajudam os indivíduos a fazer a passagem em curso de forma mais natural e não tão traumática. Os desafios inerentes a tais passagens são descritos e discutidos no texto, assim como a autora mostra-nos como é necessária uma reinvenção de si mesmo para que a individuação prossiga.
A experiência clínica de Felícia é evidente em todo o texto, e sua sensibilidade para as dificuldades desses jovens adultos conduz-nos a um entendimento empático com o sofrimento dessas pessoas. A entrada na maturidade, até muito recentemente, não era alvo de estudos e pesquisas na área da Psicologia, mas os fatos sempre se impõem. Temos observado uma crescente busca pela psicoterapia por parte de jovens adultos, seja nos consultórios particulares, como nos serviços públicos de saúde mental.
A literatura está repleta de material sobre a adolescência e suas vicissitudes, já sobre a vida adulta, ou melhor, sobre os critérios ou indicadores de maturidade, há um grande silêncio. É como se ser adulto fosse algo óbvio, natural e, portanto, não há o que ser dito. Há parâmetros bastante claros sobre as diferentes fases da infância e os indícios de passagem para a adolescência. Desde Stanley Hall (1904), a adolescência tem sido largamente discutida e suas características são claramente colocadas. Mas, estranhamente, não existe bibliografia sobre a demarcação do final da adolescência e o início da maturidade, assim como sobre os fatores indicativos de maturidade. Trata-se de uma passagem essencialmente psicológica. Como bem aponta a autora, na adolescência o corpo insurge-se de modo exuberante e as transformações físicas e orgânicas são evidentes. Entre a adolescência e a maturidade não são observadas alterações nesse âmbito, as mudanças agora são de ordem atitudinal. Entre o adolescente e o adulto há que se instaurar uma nova forma de encarar o mundo, os outros e, principalmente, faz-se necessário o desempenho de novos papéis na vida.
A autora coloca, de modo muito interessante, a autonomia como uma qualidade essencial da vida adulta. Autonomia confere liberdade, mas exige responsabilidade e, por isso, este parece ser um dos dilemas que dificulta a passagem para a vida adulta. Como diz Baumann (2003, p. 24) a liberdade e a segurança, ambas igualmente urgentes e indispensáveis, são difíceis de conciliar sem atrito – e atrito considerável na maior parte do tempo. Essas duas qualidades são, ao mesmo tempo, complementares e incompatíveis
. O impasse entre liberdade e segurança parece atingir fortemente esses jovens e, assim, compromete o prosseguimento do processo de individuação. Observa-se uma tentativa teimosa em ser completamente livre e simultaneamente estar totalmente seguro, no entanto, parece, que na vida, quanto mais liberdade, menos segurança, e vice-versa. Alguns jovens mantêm um ideal visionário de que seria possível alcançar um nível de liberdade individual sem correr riscos. Almejam uma vida plena, sem angústia e sem medo, mas isso não é possível. As polaridades liberdade e segurança alternam-se, complementam-se e atritam-se constantemente.
Felicia discute com perspicácia outros pares de opostos, igualmente importantes, que assolam os adultos jovens em seu caminho rumo à maturidade, com destaque, sobretudo, para a ambivalência entre Puer e Senex; a tensão entre persona e sombra; e o conflito e a oscilação entre onipotência e impotência. A saída da adolescência e a entrada na maturidade constelam um impasse altamente sofrido para algumas pessoas.
Afora as idiossincrasias e a história de vida de cada um, em seu processo único de individuação, não podemos esquecer que todo indivíduo está inserido em uma cultura que interfere na sua individualidade. Dessa forma, vale a menção à ênfase de nossa cultura atual na supervalorização e idealização da juventude. Todos querem ser jovens: as crianças e os idosos.