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Sonhos e Gravidez
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E-book212 páginas3 horas

Sonhos e Gravidez

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Sobre este e-book

Em sua forma original, este livro é fruto de um trabalho de pesquisa apresentado como dissertação de mestrado. Ele conjuga dois interesses: fazer um trabalho que utilize sonhos e que, ao mesmo tempo, reflita sobre o desenvolvimento da mulher. A gravidez é uma situação propícia para fazer um estudo comparativo de sonhos de várias mulheres, por seguir um padrão semelhante, a gravidez se diferencia das diversas situações de vida, por ser uma situação especial e comum.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento5 de jun. de 2024
ISBN9788534953993
Sonhos e Gravidez

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    Sonhos e Gravidez - Marion Rauscher Gallbach

    A meus filhos, pela alegria de ser mãe

    Foram muitas as pessoas que contribuíram, direta ou indiretamente, para a realização deste trabalho. Gostaria de agradecer especialmente à Dra. Therezinha Moreira Leite, à Dra. Vera Stella Telles e à Dra. Doucy Douek, pelo auxílio e as sugestões valiosas. Aos clientes e participantes dos grupos de sonhos, pelas frutíferas discussões. E, principalmente, às mulheres que forneceram o material indispensável para a realização deste trabalho, por se disporem a compartilhar comigo seus sonhos.

    PREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃO

    É com grande alegria que escrevo o prefácio para a segunda edição de Sonhos e gravidez, estando muito satisfeita com o alcance que este livro teve.

    Nos cursos ministrados na Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica (SBPA), em especial no Núcleo de Sonhos, o qual coordeno, bem como no Núcleo de Estudos Pós-graduados da PUC-SP, nos últimos anos, tenho notado uma demanda cada vez maior pelo livro, que se encontrava esgotado, seja pelas questões do feminino que ele aborda, seja pelos sonhos.

    A importância dos sonhos sempre foi universal, e continua sendo. O tema dos sonhos perpassa as mais diversas situações e mantém sua atualidade. Com a pandemia da Covid-19, vivenciada em 2020 e 2021, pode-se até dizer que houve um incremento dessa importância na humanidade em geral. Nunca se sonhou tanto, nem se falou tanto de sonhos coletivamente. Também nunca antes houve uma exposição tão grande na mídia a respeito desse tema, com inúmeras pesquisas sobre o impacto que a pandemia e o confinamento tiveram nos conteúdos oníricos. Descobriram-se muitos sonhos semelhantes refletindo o ambiente apocalíptico do confinamento incitado pelo coronavírus – que até receberam a denominação de sonhos pandêmicos. Houve o convite para uma maior intimidade com os sonhos nesse tempo de isolamento.

    Sonhos mais frequentes e mais vívidos estão relacionados com períodos de grandes mudanças, para dar conta das transformações mobilizadas. Assim, também na gravidez, podemos observar uma mobilização maior de sonhos, bem como de símbolos e temas característicos dessa transição na vida, o que constitui o estudo deste livro.

    Jung apontou que, em fases de transição de vital importância, mobilizam-se as imagens eternas relacionadas a essa situação humana típica, como no nascimento, puberdade, casamento, metanoia, morte. Uma primeira gravidez faz parte dessas transições decisivas da vida, que constelam o inconsciente arquetípico, mobilizando imagens e símbolos universais, a imagem primordial da necessidade do momento, para auxiliar a lidar com essa situação humana geral.

    Os sonhos são a grande porta de entrada para esses sentidos e significados mais profundos da experiência humana, como testemunhos, cúmplices e interlocutores ativos do desenrolar da vida. Os sonhos são os grandes guias interiores do processo de individuação, do tornar-se um consigo e com a humanidade que também somos.

    INTRODUÇÃO

    Em sua forma original, este livro é fruto de um trabalho de pesquisa apresentado como dissertação de mestrado no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Ele conjuga dois interesses: fazer um trabalho que utilize sonhos e que, ao mesmo tempo, reflita sobre o desenvolvimento da mulher. A gravidez me parece uma situação propícia para fazer um estudo comparativo de sonhos de várias mulheres. Em seus, geralmente, nove meses de duração, e por seguir um padrão semelhante, a gravidez se diferencia das diversas situações de vida, por ser uma situação especial e comum, apesar da multiplicidade de psiquismos individuais. Optei por focalizar o estudo de sonhos durante a primeira gravidez, por levantar, na mulher, a questão da transição da identidade de filha para a de mãe.

    Especialmente a primeira gravidez posiciona a mulher diante de uma situação nova em sua vida, pois ela nunca teve um filho antes: é um contato com algo novo que lhe acontece, que demanda uma adaptação e uma nova orientação da personalidade. É um processo que acarreta mudanças na mulher e em sua vida: num nível mais visível, seu corpo passa por uma transformação e nunca mais será o mesmo, e, desde já, uma nova vida, que sempre estará ligada à sua, se insere.

    Nos relatos de muitas grávidas, no consultório e no círculo de conhecidos, pude observar uma preocupação grande em relação ao parto. É conhecido que a maioria dos partos no Brasil – aproximadamente 80% – são cesáreos. Algo que me chama a atenção são os casos das mulheres que, apesar de desejar muito um parto natural e se preparar para ele – através de cursos, ginástica, aprendizado da respiração correta e outros –, acabam tendo o nenê por cesariana. Refletir sobre essa questão também me parece importante.

    Até o século passado, via de regra, a menina permanecia no lar, contida na órbita de sua mãe, até chegar o tempo de ela própria se tornar mãe e, assim, reverter seu papel, permanecendo em sua identificação biológica e psíquica com a mãe. Na atualidade, nos países e regiões em que não mais lhe negam a participação cultural, estimula-se a mulher desde cedo para o desenvolvimento da consciência, como também se espera que ela desenvolva as características antes associadas aos homens. Esse desenvolvimento afrouxou a identificação da mulher-mãe como caminho único ou ideal de realização feminina, abrindo espaço para outras formas de desenvolvimento e realização próprias (como profissional ou como companheira, por exemplo, e todas as outras formas de desenvolvimento possíveis para o sexo masculino). Ademais, o controle da natalidade, através do uso de preventivos, como a pílula anticoncepcional e outros, trouxe uma crescente desvinculação entre a sexualidade e a maternidade, possibilitando à mulher se perceber como sexualmente adulta sem necessariamente ser mãe.

    No contexto atual, gravidez e maternidade se apresentam para a mulher moderna consciente cada vez mais como uma opção, com todas as complicações inerentes a uma escolha e à responsabilidade por esta. O gradual desaparecimento do significado de destino biológico da mulher coloca-a diante da questão de encontrar o sentido de sua maternidade internamente.

    Na luta pela emancipação feminina, pela igualdade de direitos de homens e mulheres, a posição feminista leva muitas mulheres modernas a rejeitar a possibilidade da maternidade, em favor de maior independência e do direito de participação na esfera pública na qual ocorre o trabalho.

    Várias autoras, como Rich (1967), Plaskow (1981) e Rabuzzi (1988), apontam a confusão existente quanto aos dois sentidos de maternidade, e a necessidade de que sejam diferenciados: como instituição, que confina a maioria das mulheres adultas a um único papel na vida, e como experiência, como a condição da mulher em sua relação com suas crianças, sejam elas naturais ou adotadas. É diferente rebelar-se contra a instituição, ou contra o símbolo subjacente, pois, no último caso, o significado da imagem de mãe, com todo o seu mistério profundo, é perdido. Se a mulher não se identifica com a maternidade, com o papel de mãe, enquanto destino estritamente biológico, ela pode vivê-la como um recurso, uma fonte, e abrir-se para um novo senso de limites e possibilidades do Self. Pode relacionar-se com a experiência, e usufruir das possibilidades de crescimento e autoconhecimento que esta oferece.

    Se não desejada, a maternidade pode ser opressiva. Mas, potencialmente, a gravidez, o parto e a experiência corporal providenciam uma oportunidade de medir, explorar e expandir nosso senso e conhecimento de quem somos. A gravidez é um processo que afeta a identidade da mulher, altera seu senso físico e convida-a a reconsiderar vários aspectos dessa identidade: sua relação com seu corpo, com o pai da criança, com os próprios familiares, com os outros planos e esperanças para sua vida, e com a imagem social da mulher grávida. A gravidez estimula o diálogo da mulher com a natureza e a cultura.

    O intuito deste trabalho é refletir sobre o desenvolvimento feminino, sob um referencial teórico junguiano, tentando perceber quais são as questões de adaptação e amadurecimento que se apresentam à personalidade da mulher durante a fase de gestação e quais são as possibilidades que a gravidez pode trazer para o desenvolvimento psíquico dela (entenda-se gravidez sempre como o início de um processo que continua e se realiza na maternidade).

    Apoiando-me principalmente em Neumann (1952) e em sua descrição dos estágios psicológicos do desenvolvimento feminino, objeto do capítulo 2, e nas considerações de Esther Harding (1970), em seu livro The way of all women, tentarei refletir teoricamente sobre como a gravidez e a maternidade poderiam se inserir no processo de individuação da mulher moderna, considerando essas experiências em relação ao desenvolvimento da consciência.

    Dentro da abordagem junguiana, não encontrei trabalhos específicos que falassem da psicologia da gravidez. Nessa fase de procura, tive a oportunidade de estar no Instituto C. G. Jung, em Zurique, ocasião em que tentei levantar, na biblioteca do instituto, uma bibliografia que pudesse me ajudar nesta pesquisa. Após meu retorno, recebi uma carta da Fundação Marie-Louise von Franz, que pedia que mandássemos sonhos arquetípicos, numinosos, ocorridos durante a gravidez – de clientes, de conhecidas ou próprios –, pois essa fundação estava realizando uma pesquisa sobre sonhos durante a gravidez. Essa pesquisa foi publicada em 1996 por Regina Abt na língua alemã. Outras publicações sobre psicologia da gravidez existentes inserem-se numa abordagem psicanalítica: Soifer (1980), Langer (1978), Maldonado (1985), por exemplo, nas quais não me basearei neste trabalho.

    Encontrei, em Zurique, somente alguns artigos: de Baumann (1957), sobre vivências psicológicas relacionadas com o parto; de Ulanov (1979), a respeito das reações de três clientes do sexo feminino diante da gravidez da autora; e de Schroer (1984), sobre sonhos arquetípicos durante a primeira gravidez.

    Schroer comparou os sonhos de 32 grávidas, durante um período de quatro semanas, com os sonhos de 16 mulheres não grávidas ocorridos num período idêntico. Segundo ele, três temas relevantes à gravidez emergiram da leitura desses sonhos. Os três temas são: animais, deixar o marido e uma nova identidade feminina (SCHROER, p. 72).

    Outras características distintivas que ele encontrou nos sonhos das mulheres grávidas, comparadas ao grupo de controle, foram: maior grau de ansiedade, mais figuras de animus, mais referências a morte e destruição, mais imagens de água e mais referências a figuras maternas.

    Na abordagem junguiana, fui levada a ampliar o tema específico da gravidez para buscar suas raízes arquetípicas, ligando-o ao arquétipo da Grande Mãe, e a observar esse tema em função do desenvolvimento feminino, tal como ele aparece na cultura e nos mitos.

    Várias autoras junguianas, como Spretnak (1978), Perera (1981), Downing (1987) e Harding (1985), têm se baseado nas representações do feminino contidas em ritos e mitos em sua versão pré-helênica, precedente ao sistema olímpico e à versão clássica da mitologia grega (esta escrita a partir do século VII a.C. e a mais conhecida), para apresentar certos fundamentos arquetípicos da psicologia feminina. No capítulo 3, investigo os padrões femininos arquetípicos e os mitos da Antiguidade refletidos em nossa cultura.

    Para o presente estudo, foi realizado um levantamento de sonhos durante a primeira gravidez (desejada), em mulheres de classe média, casadas, profissionais atuantes de nível universitário. Conto com sonhos anotados de dez grávidas. Destas, cinco forneceram sonhos que ocorreram ao longo de quatro ou mais meses, durante a gestação.

    Os sonhos foram utilizados para observar quais temas e símbolos aparecem neles; se há indícios sobre questões de adaptação requeridas, e o que os sonhos poderiam estar fornecendo para ajudar a mulher grávida nessa transição em sua vida. O resultado do estudo é exposto no capítulo 4.

    Jung (1948) diz que os arquétipos se manifestam com maior intensidade durante fases críticas da vida, como na primeira infância, na puberdade, na época da metanoia (36 até 40 anos), e perto da morte (p. 321, par. 555), podendo aparecer em sonhos como uma compensação do inconsciente coletivo a uma adaptação precária da consciência. Como outras fases críticas de transição, a primeira gravidez também tem componentes biológicos e psicológicos: a mulher grávida experimenta grandes mudanças hormonais e metabólicas em seu corpo, e está elaborando sua identidade como mãe pela primeira vez. Os sonhos arquetípicos ocorrem em momentos em que uma nova orientação e uma nova adaptação são necessárias, e o arquétipo constelado é sempre a imagem primordial da necessidade do momento (JUNG, 1952, apud SCHROER, 1984).

    O significado e a maneira de vivenciar a gravidez não são uniformes. Cada mulher a experimenta de forma individual, relacionada com a estrutura de sua personalidade e sua história de vida. Meu interesse, neste trabalho, é levantar e estudar tanto alguns temas comuns aos sonhos de várias gestantes quanto temas únicos, tentando refletir a respeito dessas semelhanças e diferenças. Abordo os temas de maneira qualitativa, e não quantitativa.

    Durante a gravidez, não só a consciência da mulher se volta para as questões maternas e os preparativos para a vinda da criança, mas, como pude observar em seus sonhos, essas questões também se constelam no seu inconsciente. Por entender que, na gravidez, se constela o arquétipo materno, inicio o trabalho explicitando os conceitos de Jung de arquétipo, complexo e complexo materno, no capítulo 1.

    A importância do presente estudo, em nível clínico, parece-me residir na percepção de algumas questões de adaptação que se apresentam para a personalidade da mulher durante essa fase de sua vida, levantando indícios que poderiam ajudá-la na compreensão da transformação requerida e na compreensão do processo do parto, que considero ser de ajuda no trabalho com grávidas no consultório.

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    FUNDAMENTOS DA ABORDAGEM JUNGUIANA

    Arquétipo e complexo

    O arquétipo da Grande Mãe é a base do assim chamado complexo materno. Enquanto possibilidade dada a priori de forma de representação, o arquétipo faz parte das predisposições psíquicas inconscientes, à mercê das quais o homem está em condições de reagir de forma humana. A psique do homem recém-nascido não é um vazio que adquirirá tudo através da aprendizagem e da experiência, mas uma psique pré-formada própria de sua espécie, na qual existem ideias, formas e predisposições que, apesar de inconscientes, não são menos ativas e vivas, e pré-formam o pensamento, o sentimento e a atuação de cada psique, e neles influem. Da mesma forma que os instintos compelem o homem a um modo especificamente humano de existência, os arquétipos forçam sua percepção e apreensão dentro de padrões especificamente humanos.

    Arquétipos são, por definição, fatores e motivos que arranjam os elementos psíquicos em certas imagens, caracterizadas como arquetípicas, mas de tal modo que eles só podem ser reconhecidos pelos efeitos que produzem. Eles existem pré-conscientemente, e presumivelmente formam a dominância estrutural da psique em geral... Como fatores condicionantes a priori, eles representam um exemplo psicológico especial dos patterns of behavior biológicos, que conferem a todas as coisas suas qualidades específicas. Da mesma maneira como as manifestações desse plano básico biológico podem mudar durante o curso do desenvolvimento, assim também o podem as do arquétipo. Considerado empiricamente, entretanto, o arquétipo nunca veio a existir como um fenômeno da vida orgânica, mas entrou em cena com a própria vida (JUNG, 1958, p. 222).

    A psique, como esfera intermediária, se encontra, por um lado, com a physis que, através dos instintos, age sobre a esfera psíquica, e, por outro lado, com o espírito, que atua sobre a esfera psíquica através dos arquétipos. A transição entre essas esferas é fluida. Nos efeitos dos instintos, temos a introdução da esfera corporal na psique. Assim como não podemos perceber o instinto em si, mas só através de seus efeitos, como impulsos, assim também não podemos perceber o arquétipo em si, mas só a representação ordenada pelo arquétipo – e nunca o fator ordenador em si. Arquétipo e instinto não são psíquicos, apesar de se manifestarem psiquicamente.

    Os processos psíquicos comportam-se como numa escala, ora sob a influência dos processos impulsivos, ora na proximidade do outro extremo, onde o espírito predomina e até pode assimilar processos impulsivos opostos.

    Na visão de Jung (1952), a psique é a esfera intermediária

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