Contos Sombrios
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Contos Sombrios - Felipe B. Pereira
Contos Sombrios
Este livro é composto de 7
histórias, cujos títulos estão
listados abaixo:
1. A Bruxa da Floresta
2. A Maldição do
Lobisomem
3. Assombrados
4. O Pistoleiro do Inferno
5. O Portal
6. Ritual
7. O Inferno de Alice
A Bruxa da
Floresta
1
Tudo aconteceu há muito tempo em uma pequena vila do reino de Edharon. Localizada próxima a Floresta Parda, os seus moradores viviam da caça e do comércio com a capital de Edharon, que ficava ao norte atravessando a Floresta Parda.
Era um fim de tarde e o sol já descia no horizonte, quando dois homens atravessavam a Floresta Parda.
Estes eram dois irmãos comerciantes que voltavam da capital para a vila. Vinham conversando sobre os negócios que tinham feito aquele dia e estavam satisfeitos com o que haviam ganho.
_ Espero que alcancemos logo o rio _ disse o mais velho, de nome Rossi, mudando de assunto _ Estou com muita sede.
_ Mesmo? _ estranhou o outro chamado Rossini _
Porque eu não estou nem um pouco.
_ Isso porque você bebeu toda a água que trouxemos em nossos cantis _ retrucou Rossi inconformado.
_ Se eu soubesse que você queria, teria deixado um pouco para você _ disse Rossini tentando se explicar.
_ Sei _ resmungou Rossi.
Estavam ainda na parte norte da floresta, seguindo
pela trilha que fora feita tempos atrás exatamente com a intenção de ligar a capital à vila. Caminhavam devagar, conduzindo os cavalos com cuidado quando perceberam que na beira da trilha tinha uma mulher muito velha caída.
_ Por favor, me ajudem _ pediu a mulher que parecia ferida.
_ O que aconteceu? _ perguntou Rossi se agachando perto dela enquanto Rossini tomava conta dos cavalos.
_ Eu estava pegando lenha e acabei torcendo meu pé quando voltava para casa _ explicou a velha fazendo cara de dor.
_ E onde a senhora mora? _ perguntou Rossi imaginando que ela fosse da capital, pois não poderia ser da vila, já que ele não a conhecia. No entanto a mulher o surpreendeu respondendo que sua casa ficava naquela floresta, próxima de onde estavam.
_ Nunca soube de ninguém morando nesta floresta _
interviu Rossini desconfiado.
_ Fica naquela direção _ disse a velha apontando com o dedo _ Será que vocês poderiam me ajudar a chegar até lá. É aqui perto.
A mulher falou em um tom quase de súplica que os dois homens não puderam recusar. Com certa
dificuldade, eles ajudaram ela a se levantar e adentraram na mata seguindo na direção que lhes fora indicada.
A noite se aproximava quando eles avistaram uma pequena casa de madeira que mais parecia uma cabana.
Eles entraram e os irmãos colocaram a velha em uma cadeira no que pareceu-lhes ser o único cômodo da casa.
_ Muito obrigada _ agradeceu a velha.
_ Bem, é melhor irmos agora _ disse Rossini voltando-se para a porta.
_ Mas por que a pressa? Não querem comer ou beber algo? _ ofereceu a velha gentilmente.
_ Não queremos incomodar _ disse Rossi.
_ Mas vocês parecem estar com fome _ retrucou a velha e percebendo que os dois permaneciam relutantes ela insistiu quase se levantando _ Tomem ao menos um pouco de água.
Rossi então acabou aceitando, pois estava com muita sede. A velha mostrou-lhe onde estava uma jarra com água e um copo, e ele se serviu.
_ Você não vai beber? _ perguntou ela à Rossini que permanecia perto da porta.
_ Não estou com sede _ respondeu ele enquanto o irmão terminava de beber o segundo copo de água.
_ Agora podemos ir _ disse Rossi deixando a jarra e o copo onde estavam.
_ Têm certeza de que não querem mais nada? _
perguntou a velha.
_ Não, muito obriga... _ começou a dizer Rossi e foi então que sentiu uma forte dor na barriga. Caiu de joelhos no chão e começou a gritar de dor.
Rossini aproximou-se dele e agachou-se ao seu lado amparando-o.
_ O que foi, meu irmão? _ perguntou Rossini e foi então que ele percebeu que a velha tinha se levantado e avançava em sua direção com uma faca.
Ele tentou se esquivar dela, mas acabou sendo golpeado de raspão no ombro esquerdo. Ele então empurrou a mulher que caiu no chão.
_ Por que você não bebeu? _ resmungou a velha e Rossini olhando para seu irmão caído percebeu o que havia acontecido.
_ Você envenenou o meu irmão, sua velha maldita _
gritou ele.
_ Sim, e agora vou matar você _ disse a velha
erguendo a faca e Rossini viu que o rosto dela não era mais como antes. Ao invés de uma velha dócil, o que ele via agora era uma mulher mais jovem, porém de aparência grotesca e assustadora.
A mulher então avançou novamente sobre ele que desta vez conseguiu se desvencilhar dela. Correu para a porta e saiu da casa fugindo sem olhar para trás. Nem mesmo se lembrou dos cavalos e das coisas que traziam.
Enquanto fugia Rossini pensava em tudo que havia acontecido. Não entendia por que aquela mulher envenenara seu irmão e depois tentara lhe matar. Mas o que o deixara realmente intrigado fora o modo como o rosto da velha havia se transformado.
Correndo por entre as árvores, ele sentia o ombro doer e, pondo a mão no ferimento, ele percebeu que estava sangrando. Porém, mesmo estando ferido, ele conseguiu chegar até a vila. Já era tarde da noite quando Rossini chegou em casa. Sua esposa, Ista, logo que o viu percebeu que algo acontecera e o indagou a respeito.
Ele ainda estava muito abalado, mas mesmo assim conseguiu descrever com detalhes a ela tudo que se passara com o irmão e ele na Floresta Parda. Ela ouviu atentamente tudo o que ele falava enquanto lhe fazia um curativo.
_ Essa mulher só pode ser louca _ disse Ista quando ele terminou de contar.
_ Foi o que eu também pensei, mas... _ começou Rossini.
_ O que foi? _ quis saber Ista terminando de fazer o curativo.
_ Não sei, mas o modo como o rosto dela ficou me fez pensar que talvez ela seja mais do que uma velha louca _ disse Rossini.
_ No que você está pensando? _ perguntou Ista.
_ Em uma bruxa _ respondeu Rossini de um modo sombrio, mas notando a expressão de medo no rosto da esposa, continuou _ Ou talvez ela seja apenas louca mesmo.
_ É, deve ser isso _ disse Ista, mais tranquila.
_ É melhor irmos dormir _ sugeriu Rossini.
Naquela noite porém, Ista não dormiu direito, pois ficara muito impressionada com a história contada pelo marido.
No dia seguinte, Rossini foi à casa do líder da vila informá-lo do ocorrido. Este se chamava Milo e estranhou sua visita tão cedo. Milo deixou que Rossini entrasse e este foi logo contando o que ocorrera com o irmão e ele. Rossini não pôde evitar de comentar sua suspeita de que a velha seria uma bruxa.
_ Meu irmão está morto _ disse Rossini inconsolável.
_ Sinto muito por seu irmão _ disse Milo com pesar _
Mas não sei o que posso fazer por você.
_ Temos que fazer algo _ esbravejou Rossini _ Isto não pode ficar assim. Mande alguns homens prendê-la.
_ Mas se ela for mesmo uma bruxa? _ Milo estava cismado _ Quem terá coragem de ir até ela?
Rossini ficou sem resposta, pois ele mesmo não queria ter que voltar naquele lugar.
_ O melhor é esquecer o assunto _ disse Milo decidido _ E não conte a ninguém essa história, senão deixará as pessoas assustadas.
_ Está bem _ consentiu Rossini. No entanto o que os dois não sabiam era que a mulher de Rossini contaria tudo e logo a vila inteira estava sabendo.
2
Assim os moradores da vila começaram a temer atravessar pela Floresta Parda, principalmente sozinhos, passando por aquele lugar somente quando necessário.
Alguns homens deixaram até de caçar naquele lugar, ou pelo menos não adentravam muito na floresta.
Outros porém, céticos, continuavam caçando sem
nada temer. Asgo e seu filho Narf eram dois caçadores que ainda seguiam perambulando pela floresta. Em busca de uma presa, os dois saíram de casa em uma manhã ensolarada dias depois do ocorrido com Rossini.
Eles seguiram juntos até o rio que cortava a Floresta Parda ao meio sem avistar nenhuma possível presa. Isto deixou Asgo intrigado pois aquela era uma floresta cheia de cervos e porcos selvagens e, no entanto, eles não acharam nem mesmo rastros que pudessem indicar a presença destes animais.
Portando arcos e flechas, eles se moviam lenta e silenciosamente em meio as árvores, comunicando-se apenas por assovios e gestos. De vez em quando os dois paravam e ficavam escutando, tentando identificar ruídos que pudessem indicar a presença de uma presa.
Já estavam pensando em voltar para a vila quando Narf ouviu um ruído vindo de trás de arbustos. Com um assovio ele chamou a atenção do pai que com um gesto pediu para que Narf o esperasse. O jovem no entanto começou a se aproximar dos arbustos e em um momento de desatenção pisou em alguns gravetos provocando um estalo. Foi então que dos arbustos saiu uma criatura semelhante a um lobo, porém maior e saltou sobre Narf, caindo sobre ele antes que pudesse disparar sua flecha.
A fera então mordeu o pescoço de Narf ao mesmo
tempo que era atingida no seu lado por uma flecha disparada por Asgo. A criatura soltou um uivo e, erguendo-se, ficou de pé como se fosse um homem.
Avançou na direção de Asgo que disparando novamente atingiu a criatura no pescoço. A fera deu um grito e fugiu, sumindo na mata.
_ Narf! _ gritou Asgo se aproximando do filho caído no chão. Este porém, nada respondeu, pois estava morto.
Asgo então chorou e depois de permanecer ali por muito tempo inconsolável; em silêncio, ergueu o corpo de seu filho e o carregou de volta à vila. Assim ele chegou na vila gritando para quem quisesse ouvir que um lobisomem tinha tirado a vida de seu filho e jurando vingança.
3
Com a notícia de mais uma morte, os moradores da vila passaram a ter ainda mais medo de entrar na Floresta Parda, principalmente depois que Rossini, ligando as duas mortes, começou a dizer que o lobisomem que matara Narf devia ser criação da bruxa que matara seu irmão.
Os boatos se espalhavam e logo alguns moradores começaram a dizer que a floresta estava amaldiçoada e que quem nela entrasse não sairia com vida. Desse
modo muitos deixaram de caçar ali ou de ir a capital com receio de não mais voltar. Preferiam passar fome ou arranjavam outro jeito de se sustentarem, desde que não tivessem que passar pela floresta. Alguns pensavam até em se mudar para regiões mais ao sul. Outros, até entravam na floresta, mas apenas para pegar água em um poço que ficava na borda da floresta.
Alguns dias depois, precisando de água para cozinhar, Lea, uma moradora da vila, mandou sua sobrinha ir até o poço. Alda, era como