Normas tributárias indutoras de proteção ambiental e ESG: uma proposta de reforma tributária sustentável
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Sobre este e-book
A partir da premissa de que essa agenda não se desenvolverá sem a atuação do Poder Público, a tributação pode assumir protagonismo na alavanca da sustentabilidade. A OCDE aponta que a tributação indutora pode atingir objetivos de preservação e desenvolvimento sustentável ao menor custo. Para tanto, o livro traz os critérios para a sua instituição na ordem brasileira.
O ESG impulsionou relevantes mudanças do ambiente de negócios globais das últimas décadas, no caminho para o desenvolvimento sustentável, pela integração de aspectos ambientais, sociais e de governança nos critérios de investimentos do mercado financeiro e nas práticas empresariais. Todavia, falta-lhe regulação, o que limita seu alcance e efetividade.
Pelo critério da subsidiariedade, segundo o qual a opção pela via tributária para a promoção das finalidades estatais deve ocorrer de forma subsidiária, e não principal, é necessária a convivência entre tributação indutora e ESG, evitando-se que a tão esperada reforma tributária brasileira venha obsoleta.
Assim, presente obra traz recomendações para que o Sistema Tributário induza às boas práticas ambientais de forma sustentável no Brasil, aproximando a preservação ambiental do crescimento econômico.
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Normas tributárias indutoras de proteção ambiental e ESG - Clarissa Nepomuceno Caetano Soares
1 INTRODUÇÃO
Historicamente, a preservação ambiental e o desenvolvimento econômico permaneceram em polos antagônicos. Todavia, desde a Conferência de Estocolmo, realizada em 1972 pela Organização das Nações Unidas (ONU), os países têm buscado desenvolver políticas públicas a favor do desenvolvimento sustentável¹, que se tornou um tema recorrente nas pautas e conferências mundiais. Em matéria ambiental, o Brasil, que sediará a COP 30, em 2025, é um dos países mais ricos em diversidade de espécies e ecossistemas², embora seja constantemente pauta na ótica internacional a destruição acelerada do meio ambiente nacional.
A ação humana, em seguida das catástrofes naturais infrequentes, é responsável pelos maiores impactos ambientais que modificam os meios físico e químico do planeta, extirpando e transformando ecossistemas inteiros, apagando espécies e florestas e poluindo o ar, o solo e as águas com substâncias tóxicas e perigosas, o que pode comprometer a sadia qualidade de vida das presentes e futuras gerações (BENJAMIN, 2003). Por isso, um dos grandes desafios atuais está em encontrar soluções eficientes para minimizar os impactos ambientais em decorrência da atividade econômica, interessando para o presente trabalho o que tange à esfera jurídica.
O Fórum Econômico Mundial define riscos globais
como eventos ou condições cujas consequências podem impactar negativamente o planeta, sejam pessoas, biodiversidade ou recursos naturais. No relatório Global Risks Report 2023 (WORLD ECONOMIC FORUM, 2023), os 6 dos 10 principais riscos apontados para os próximos 10 anos são relacionados ao meio ambiente e ao impacto das mudanças climáticas: (i) falhas nas ações contra as mudanças climáticas; (ii) falha na adaptação das mudanças climáticas; (iii) desastres naturais e eventos climáticos extremos; (iv) perda da biodiversidade e colapso de ecossistemas; (v) crise dos recursos naturais; e (vi) desastres naturais em larga escala.
Figura 1: Riscos globais ranqueados pela ordem de severidade no curto e no longo prazo
Fonte: (WORLD ECONOMIC FORUM, 2023).
Nesse contexto, a presente pesquisa tem por pressuposto que o sistema tributário atual deve se articular com outros temas de relevância para a sociedade e o Poder Público, inclusive com temáticas de direito ambiental, de modo a se alcançar o objetivo do desenvolvimento sustentável (MOREL, 2010). Nesse sentido, destaca-se a afirmação do Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso de que é preciso que os agentes privados ajam em confluência com o Estado na consecução dos seus fins:
é dever do Estado, como agente da ordem econômica, criar mecanismo de incentivo que estimulem a iniciativa privada a auxiliar na consecução desses mesmos fins.
Nessa linha de raciocínio, é próprio do papel do Estado procurar influir legitimamente nas condutas dos agentes econômicos, através de mecanismos de fomento – incentivos fiscais, financiamentos públicos, redução da alíquota de impostos, sem que possa, todavia, obrigar a iniciativa privada à adesão.
De fato, nos termos do art. 174 da Carta em vigor, o Estado exercerá as funções de incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e o indicativo para o setor privado. (BARROSO, 2001, p. 187-212).
A tributação ambiental, segundo Regina Helena Costa,
pode ser singelamente conceituada como o emprego de instrumentos tributários para gerar os recursos necessários à prestação de serviços públicos de natureza ambiental (aspecto fiscal ou arrecadatório, bem como para orientar o comportamento dos contribuintes à proteção do meio ambiente (aspecto extrafiscal ou regulatório). (COSTA, 2005, p. 313).
Ante as normas que estabelecem a obrigação constitucional ao Poder Público de garantir um meio ambiente equilibrado e um ambiente propício ao desenvolvimento da atividade econômica e à valorização da livre iniciativa e do trabalho, com fundamentação no artigo 170, VI, da Constituição, o que se defende é uma postura intervencionista do Estado não só como agente responsável por garantir o equilíbrio do mercado econômico, mas como direcionador de ações que promovam o desenvolvimento sustentável. Isso porque, no Estado Democrático, cabe ao Estado utilizar dos instrumentos constitucionais para realizar a justiça social, dentre eles a tributação (GUTMANN, 2004).
Sendo assim, o presente trabalho responde a seguinte pergunta: as normas tributárias indutoras de proteção do meio ambiente são instrumento adequado para se alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU relacionados à temática ambiental?
. Para tanto, como objetivos específicos, buscou-se: (i) justificar o seu uso para a promoção do meio ambiente equilibrado, sadio e necessário para a qualidade de vida das presentes e futuras gerações; (ii) explorar os aspectos que devem ser observados da edição de uma norma fiscal de cunho ambiental; (iii) estabelecer critérios de controle para a norma tributária indutora de proteção ambiental, haja vista as mitigações que impõe nos princípios do sistema constitucional tributário; e (iv) analisar a viabilidade da Proposta de Reforma Tributária Sustentável
apresentada aos parlamentares coordenadores das frentes ambientalistas, em setembro de 2020, sob a ótica do ordenamento jurídico-tributário brasileiro.
Para tanto, a metodologia utilizada envolveu os métodos exploratório, por meio de revisão bibliográfica, hipotético-dedutivo, para confirmar que o uso das normas tributárias indutoras de proteção ambiental é meio adequado para acelerar o atingimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU, e, por fim, o método heurístico, para estabelecer critérios de controle e requisitos a serem observados no momento da edição da norma em questão.
1 Desde a Conferência Mundial de Meio Ambiente, realizada em 1972, em Estocolmo, e repetido nas demais conferências sobre meio ambiente, em especial a ECO-92, os países têm buscado a implementação de políticas públicas relacionadas à economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável. Nessa linha, a Constituição brasileira de 1988 adotou expressamente princípio do desenvolvimento sustentável no caput do artigo 225. (FIORILLO; FERREIRA, 2018, p. 50-55).
2 O Brasil é o país com a maior biodiversidade do mundo, com mais de 116.000 espécies de animais e mais de 46.000 espécies vegetais conhecidas, espalhadas pelos seis biomas terrestres e por três grandes ecossistemas marinhos (BRASIL, 2022).
2 EXTRAFISCALIDADE
2.1 O TRIBUTO COMO FORMA DE INTERVENÇÃO ESTATAL NA ORDEM ECONÔMICA E SOCIAL: EXTRAFISCALIDADE E NORMAS TRIBUTÁRIAS INDUTORAS
Após a Segunda Guerra Mundial, o Neoconstitucionalismo surgiu como uma atualização do constitucionalismo ocidental, sintetizando as premissas liberais e sociais à luz do humanismo jurídico e novas concepções democráticas, com foco no pluralismo social, na força normativa dos princípios constitucionais e na efetividade dos direitos e garantias fundamentais (OLIVEIRA, 2016).
No Brasil, os reflexos jurídico-políticos do constitucionalismo ocidental contemporâneo adquiriram relevância a partir da redemocratização do país ocorrida após o fim da Ditadura Militar, tendo como marco a Constituição da República de 1988, com fundamento na democracia e na supremacia do interesse público. Com o objetivo de promover a justiça distributiva em uma sociedade plural, o Estado Democrático de Direito busca garantir o acesso a bens e serviços públicos e privados de forma a proporcionar um mínimo necessário para o exercício da autonomia privada e da inclusão social.
A Constituição Brasileira é marcada pela solidariedade, trazendo mecanismos para corrigir as desigualdades econômicas e sociais, dentre eles a intervenção estatal na economia (BARACHO, 1995), uma vez que
apenas o Estado, com a colaboração corresponsável e solidária da sociedade civil e da iniciativa privada, é capaz de oferecer os meios formais e matérias para que o mínimo existencial material se transforme em uma potencialidade realizável. (OLIVEIRA, 2016, p. 230).
Para tanto, são desenvolvidas políticas públicas, chamadas de o Estado em ação
, que dizem respeito a um conjunto de ações implementadas para setores específicos da sociedade, como resposta a determinada situação ou condição social relevante (HÖFLING, 2001). Temos, de um lado, as causas do problema e, de outro, o efeito pretendido com as ações governamentais propostas em