As Doutrinas Abrangentes E A Razão Pública No Liberalismo Político De John Rawls
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As Doutrinas Abrangentes E A Razão Pública No Liberalismo Político De John Rawls - Antonio G.sobreira
AS DOUTRINAS ABRANGENTES E A RAZÃO PÚBLICA NO LIBERALISMO POLÍTICO DE JOHN RAWLS
Conselho editorial:
Chrislene Carvalho dos Santos P. Cavalcante - UNINTA
Michele Ferreira Maia - UNINTA
Gerson Pires de Araujo - UNINTA
Evandro Mesquista Cunha - UNINTA
Francisco E. Souza Nascimento - UNINTA
Eládio Pessoa de Andrade Filho - UFC
Francisco Artur Silva e Filho - UESPI
Francisco Eduardo Catunda Aragão - UEMA
Maria da Conceição Rocha Sampaio - UERJ
Marta Genú Soares - UEPA
Antonio Gonçalves Sobreira
AS DOUTRINAS ABRANGENTES E A RAZÃO PÚBLICA NO LIBERALISMO POLÍTICO DE JOHN RAWLS
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Sumário
1 As Doutrinas abrangestes e a estabilidade democrática
Justificação pública
Equilíbrio reflexivo
O Consenso sobreposto
2 A Razão pública
Razão pública e concepção de cidadania democrática.
A razão pública e a razão não pública.
O princípio da reciprocidade
O conteúdo da razão pública
Os valores políticos e não políticos e a participação na razão pública
Doutrina abrangente religiosa e razão pública
Os limites da razão
A introdução das doutrinas na discussão política pública
3 Críticas e objeções
Objeções de Michael Sandel
Exclui questões morais importantes
O fato de um pluralismo razoável
Os limites a razão pública liberal
Objeções de Charles Taylor
Jügen Habermas
Os direitos e as liberdades fundamentais
A liberdade de expressão
Resposta de Rawls a algumas questões
Considerações finais
Referências Bibliográficas
Introdução
No vasto panorama da filosofia política contemporânea, poucos pensadores deixaram uma marca tão profunda e duradoura quanto John Rawls. Sua obra, notável por sua complexidade e profundidade, tem sido um farol para aqueles que buscam entender e fortalecer as bases da democracia liberal. No cerne da filosofia política de Rawls, encontramos a intrigante interseção entre as doutrinas abrangentes
e a razão pública
, um tema central que exploraremos neste livro.
O termo doutrinas abrangentes
refere-se às visões abrangentes de mundo, valores morais, religiosos e filosóficos que os indivíduos mantêm. Rawls reconhece a pluralidade de tais doutrinas em sociedades democráticas, onde pessoas com crenças profundamente diversas coexistem. Essas doutrinas moldam a visão que cada um de nós tem do que é bom e justo, e, por sua vez, influenciam nossas opiniões políticas e sociais.
No entanto, a verdadeira inovação de Rawls reside em seu conceito de razão pública
. Ele propõe que, no domínio político, os cidadãos devem deixar de lado suas doutrinas abrangentes pessoais e recorrer à razão pública
ao debater questões políticas fundamentais. A razão pública é um espaço de deliberação onde os cidadãos podem articular argumentos políticos em termos que sejam acessíveis e aceitáveis para os outros, independentemente de suas doutrinas abrangentes.
Neste livro, exploraremos como a razão pública serve como um mecanismo crucial de contenção das doutrinas abrangentes. Rawls argumenta que, ao participar na esfera pública com base na razão pública, as pessoas podem encontrar pontos de convergência que transcendem suas visões pessoais e religiosas. Isso, por sua vez, permite a construção de consensos políticos sobre princípios de justiça e direitos fundamentais, que servem como alicerce das instituições democráticas.
No entanto, essa relação entre doutrinas abrangentes e razão pública não é isenta de desafios. Como a razão pública pode limitar as doutrinas abrangentes sem recorrer a medidas coercitivas injustas? Como podemos garantir que a esfera pública seja genuinamente inclusiva e acessível a todas as perspectivas? Essas são questões cruciais que examinaremos ao longo deste livro.
À medida que exploramos o pensamento de Rawls sobre a interação entre doutrinas abrangentes e razão pública, convidamos o leitor a refletir sobre os dilemas e desafios enfrentados pelas democracias liberais contemporâneas. Em última análise, este livro busca oferecer insights valiosos sobre como podemos conciliar a diversidade de crenças e valores em uma sociedade democrática, mantendo a estabilidade e a justiça que Rawls via como fundamentais para o projeto do liberalismo político.
No entanto, essa relação entre doutrinas abrangentes e razão pública não é isenta de desafios. Como a razão pública pode limitar as doutrinas abrangentes sem recorrer a medidas coercitivas injustas? Como podemos garantir que a esfera pública seja genuinamente inclusiva e acessível a todas as perspectivas?
Além disso, é fundamental reconhecer que a filosofia política é um campo em constante debate e evolução. Portanto, na parte final deste livro, também exploraremos objeções e críticas de renomados pensadores contemporâneos, como Michael Sandel, Charles Taylor e Jürgen Habermas, em relação ao tema das doutrinas abrangentes e razão pública. Suas perspectivas críticas desafiam as ideias de Rawls e enriquecem nosso entendimento das complexidades envolvidas nesse debate fundamental.
É importante considerar as críticas que têm sido levantadas sobre a posição de John Rawls em relação às doutrinas abrangentes. Algumas dessas críticas argumentam que sua abordagem pode ser demasiadamente restritiva em relação às crenças e valores pessoais dos cidadãos.
Uma das principais críticas é que a ênfase de Rawls na razão pública pode parecer limitar excessivamente a liberdade de expressão e a participação política de indivíduos que desejam trazer suas concepções abrangentes de bem para o debate público. Alguns argumentam que essa restrição pode minar a riqueza do debate democrático, reduzir a diversidade de perspectivas e até mesmo criar uma esfera pública homogeneizada, onde apenas argumentos considerados razoáveis
têm espaço.
Outra crítica se concentra na capacidade da razão pública de resolver eficazmente conflitos políticos profundos em sociedades pluralistas. A preocupação é que a busca de consensos políticos em termos de razão pública pode ser inatingível quando se trata de questões fundamentais relacionadas a valores morais e religiosos. Isso pode levar a impasses políticos persistentes e à incapacidade de chegar a acordos sobre questões cruciais.
Além disso, críticos argumentam que Rawls não fornece uma resposta clara sobre como a razão pública deve lidar com grupos minoritários que podem se sentir marginalizados ou oprimidos por uma maioria que adere a uma concepção dominante de razão pública. Isso levanta preocupações sobre a capacidade da razão pública de garantir a igualdade de participação e representação para todos os cidadãos.
Em última análise, enquanto a abordagem de Rawls em relação às doutrinas abrangentes visa criar uma base de consenso que possa sustentar sociedades democráticas pluralistas, as críticas levantadas destacam a necessidade de equilibrar a restrição das doutrinas abrangentes com a promoção da diversidade de perspectivas e a garantia da igualdade de participação política. Essas questões desafiam continuamente os estudiosos da filosofia política e os formuladores de políticas democráticas, lembrando-nos da complexidade inerente à construção de sociedades justas e estáveis.
À medida que exploramos o pensamento de Rawls e as objeções desses influentes pensadores, convidamos o leitor a refletir sobre os dilemas e desafios enfrentados pelas democracias liberais contemporâneas. Em última análise, este livro busca oferecer insights valiosos sobre como podemos conciliar a diversidade de crenças e valores em uma sociedade democrática, mantendo a estabilidade e a justiça que Rawls via como fundamentais para o projeto do liberalismo político.
1
As Doutrinas abrangentes e a estabilidade democrática
Nesta obra queremos compreender como se estabelece no liberalismo político de Rawls, a relação entre as doutrinas abrangentes e a razão pública, à luz da questão de como as doutrinas participam do consenso sobreposto, e como se dá a inclusão ou exclusão das doutrinas no âmbito político pela razão pública.
Para Rawls, as doutrinas abrangentes, religiosas ou seculares, participam do processo de estabilidade democrática ao serem chamadas a darem apoio e participarem da construção do consenso sobreposto. Para tanto, neste capítulo, aprofundaremos nosso estudo tratando da concepção de consenso sobreposto e como de dá a participação das doutrinas na esfera pública. Também conheceremos algumas objeções por parte de dois comunitaristas, Sandel e Taylor, a alguns aspectos da teoria rawlsiana, e as percepções de Habermas sobre o tema. Queremos compreender melhor a natureza das restrições que a razão pública impõe sobre as doutrinas abrangentes e se são bem justificadas de modo a não constituir violações às liberdades fundamentais.
Antes, porém, precisamos entender melhor o que Rawls entende por esfera pública
.[1] No seu livro Liberalismo Político, John Rawls argumenta que a ideia de razão pública é fundamental para uma sociedade democrática (RAWLS, 2011). Embora Rawls não tenha oferecido uma definição clara do que ele entende exatamente por esfera pública, é possível afirmar que uma noção desse conceito está implícita no liberalismo político, que estabelece claramente a necessidade de separar assuntos e espaços públicos e privados, embora sem desenhar explicitamente essa distinção. Para entender como a razão pública e a