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O que Beethoven não pôde ouvir: a Nona Sinfonia e os Direitos Humanos, como a corrupção internacional afeta o direito das minorias
O que Beethoven não pôde ouvir: a Nona Sinfonia e os Direitos Humanos, como a corrupção internacional afeta o direito das minorias
O que Beethoven não pôde ouvir: a Nona Sinfonia e os Direitos Humanos, como a corrupção internacional afeta o direito das minorias
E-book244 páginas3 horas

O que Beethoven não pôde ouvir: a Nona Sinfonia e os Direitos Humanos, como a corrupção internacional afeta o direito das minorias

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Sobre este e-book

Nesta obra, a autora escreve em forma de narrativa literária para denunciar um sistema jurídico internacional que requer reflexões decoloniais. Por meio da construção metafórica, com base na Nona Sinfonia de Ludwig van Beethoven, a escritora demonstra o abalo aos Direitos Humanos que a corrupção internacional causa ao vulnerar os direitos sociais. Com o propósito de refletir sobre o óbice que a corrupção (nacional e/ou internacional) representa para um Direito que se pretenda Global, firma-se o posicionamento de defesa da pluralidade, das vozes que foram silenciadas, em especial o silêncio das minorias que, por meio da construção de um Direito Comum, poderão ser livres para compor suas polifonias. Assim, sustenta que a Margem Nacional de Apreciação enquanto um instituto jurídico, por meio do diálogo, apresenta um caminho possível para que o som da pluralidade possa ser ouvido, a fim de uma democratização universal, refletindo sobre o papel, o lugar e o espaço do Direito frente ao mal democrático da corrupção. Ao defender que a corrupção é condição de possibilidade para que as colonizações (de corpos e de mentes) aconteçam nos diferentes espaços geográficos, a autora faz um chamado para que nos questionemos sobre as estruturas do direito internacional, de modo que, aliando arte e direito, expressa-se uma escrita profunda sobre um debate essencialmente político e social em uma esfera de atuação global.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento23 de jan. de 2024
ISBN9786527001447
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    O que Beethoven não pôde ouvir - Carla Dalenogare

    1 A NONA SINFONIA E A CORRUPÇÃO: O DIREITO E A LITERATURA UNIDOS PELA ARTE

    É preciso romper com a narrativa dominante, ir além da geografia do saber do Norte Global. Há saberes para além do monopólio epistêmico imperialista de publicação, difusão e tradução de conhecimento ao resto do mundo. O padrão global precisa de uma resistência decolonial.

    — Carla Akotirene

    Inicialmente, para que a presente obra faça sentido – visto que ela foi construída a partir de uma narrativa – é importante compreender a relação do Direito¹¹ com a literatura¹². É justamente essa relação que me permite, enquanto pesquisadora, o aprofundamento de uma escrita que pretende unir arte e Direito.

    Essa área da epistemologia encontra-se em uma fase de amadurecimento, de modo que sua aceitação acadêmica em nível universal começa a se verificar como uma espécie de passaporte disciplinar e institucional (Cunha, 2016).

    Ainda assim, é preciso considerar que a literatura corporifica a arte, e a ela, por anos, restou o silenciamento. Os livros de história e os noticiários, por exemplo, denunciam esse silêncio artístico ao relembrar épocas de totalitarismo¹³, de modo que a dificuldade de pensar o Direito aliado em interdisciplinaridade com a literatura é um dos resultados de tal opressão.

    Na atualidade, porém, se vivencia a fase¹⁴ do Direito em diálogo com a literatura. O autor Paulo Ferreira da Cunha (2016) explica que a ponte entre ambos já foi construída, pois a literatura já não é mais avessa ao Direito, em vez disso, ele é dela solidário devido à consciência de seus vários sentidos.

    Como refere Martha Nussbaum (1997), a imaginação literária que exalta emoções e sentimentos deve impregnar, sem, necessariamente, substituir as regras que determinam o raciocínio jurídico e moral, a partir da ideia de harmonização.

    O que acontece é que o pensamento estritamente positivista há tempos já não é mais suficiente para compreender o Direito e os desafios que essa compreensão impõe, sendo necessário abrir caminho para um novo paradigma interdisciplinar, aliando a arte ao Direito (Malvasio, 2016).

    Aliás, a questão da interpretação jurídica e dos textos legais, de maneira geral, tem tudo a ver com a música, pois ela é um instrumento de união das culturas e dos povos. Significa que a música reflete a arte, cuja a lei é a partitura, abrindo espaço para quem a interprete (Ferraz Junior, 2016).

    Observe que a Sinfonia n.º 9 foi composta em Ré Menor: musicalmente, assim como as demais tonalidades menores, este acorde representa uma sensação principal mais profunda, que é reconhecida pela sonoridade representativa da sensibilização e da tristeza (Guest, 1996). Dessa característica justifica-se a importância de usá-la como narrativa para desenvolver o assunto da corrupção, já que, embora de maneiras diferentes, a corrupção afeta (triste e sensivelmente) a todos os seres ao redor do globo, o que não nos permite o abraço sob o céu estrelado que Beethoven menciona ao poetizar tal Sinfonia.

    O Direito unido à literatura sustenta a ideia de que os textos jurídicos podem receber a interpretação literária, pois a compreensão que se alia à hermenêutica¹⁵ possibilita uma percepção para além do que está escrito em uma obra narrativa, por exemplo (Karam, 2017).

    Na medida em que se compreende que a literatura não precisa ser necessariamente bela, mas depende sim de um sujeito voluntário que se encoraje a escrever em forma literária, outro olhar é possível para envolver o próprio Direito (Cunha, 2016). Nesse sentido, a ideia é propor uma atividade interativa entre o(a) leitor(a) e o texto jurídico, de forma semelhante ao que acontece nos textos literários (Malvasio, 2016).

    Demonstrar questões a partir de uma coerência narrativa é de extrema relevância para o Direito, pois possibilita novas formas de percebê-lo, abrindo espaço para os diversos sons que se propagam ao redor do globo. Aliar-se à arte para escrever sobre o cenário jurídico (nacional e/ou internacional) pode significar uma aproximação dos sujeitos¹⁶ com os seus próprios direitos, visto que a literatura, como objeto artístico, propicia uma afinidade entre o sujeito e o texto a ser interpretado.

    Importa destacar que a atividade jurídica é um exercício de interpretação que não precisa, nem deve, se restringir a documentos particulares ou textos normativos, na verdade, ela precisa ser comum e acessível a todas e para todas as pessoas, ou seja, polifônica. Por exemplo, quando Ronald Dworkin (2000) propôs uma interpretação literária do Direito, ele afirmou que os textos jurídicos devem ser estudados (e principalmente compreendidos) como algo próximo de si, e não alheio.

    Tal compreensão propicia uma abertura para o diálogo da interdisciplinaridade, de modo que a construção de significados sociais, culturais, políticos e jurídicos possa propiciar espaços para vozes polifônicas, isto é, para que a pluralidade de sons possa compor uma melodia harmônica. Em outras palavras, os textos que o Direito produz precisam ser escritos e interpretados com base na polifonia, abrangendo diversas vozes para compor tais textos.

    Boa parte dos atuais desenvolvimentos narrativos que envolvem o fenômeno jurídico se situa no terreno do Direito e literatura, incrementando o vínculo do Direito com as humanidades. Assim, apresentar temas jurídicos/humanos a partir da escrita literária torna possível um tipo de interpretação que, aliada a interdisciplinaridade, possui inclusive um caráter social de largo alcance (Gonzáles, 2013).

    Por esse motivo, é possível comunicar o Direito através da música, já que essa relação nos permite atingir um novo patamar teórico no domínio geral da filosofia e da arte, considerando a interdisciplinaridade, no sentido de que a filosofia do Direito, em sua expansão, comprova a existência filosófica da literatura, sendo ela uma expressão da própria arte (Ferraz Junior, 2016).

    Assim, no presente tópico e no próximo, a Nona Sinfonia é apresentada como forma de narrativa para tratar sobre o tema da corrupção (e a vulnerabilidade social que ela causa) como um fenômeno glocal. Da mesma forma, discorro sobre a necessidade de construção de uma polifonia.

    É oportuno explicar a definição de polifonia segundo o The New Grove Dictionary of Music and Musicians (2001), cujo conceito expressa que as práticas musicais de cunho polifônico não são somente aquelas que se unem por diversos sons, mas aquelas que se harmonizam na sonoridade. De acordo com essa concepção, os sons de todos os instrumentos (e vozes) possuem a mesma importância para que a música seja tocada pelos seres ao mesmo tempo em que os toca em um nível sentimental.

    Portanto, ao falar em um Direito polifônico, afirmo que ele será representado (construído) pela democracia (som de todos os instrumentos/vozes), por meio de uma composição consciente, evitando que a corrupção possa dissimular o som dos Direitos Humanos, que representam a sinfonia da tutela humana.

    É justamente por essa razão que me alio às ideias de Mireille Delmas-Marty para compreender o papel, o lugar e o espaço que o Direito ocupa, percebendo que essa compreensão abre caminho para construirmos uma polifonia jurídica e social, harmonizando o som de todas as notas e vozes. Aqui, o Direito, a literatura e a arte são fontes de linguagem abertas para essa composição.

    No campo do Direito, a escrita da literatura foi adotada de tal modo que a dinâmica de escritura jurídica se corporifica com a estrutura própria da literatura, de modo que o hibridismo se verifica em um interesse de escrita comum (Gonzáles, 2018).

    Tal hibridismo se percebe na elaboração dos signos, pois estamos falando de uma forma de linguagem, cuja execução se assemelha a um maestro que direciona as notas a serem tocadas para conduzir a polifonia, surgindo de forma interpretativa. O autor Jerome Bruner (2018) explica que a narrativa é um instrumento de percepção dos significados que envolve as complexidades das áreas humanas, de modo que ela aparece de forma tão natural quanto a própria linguagem.

    O argumento jurídico sustenta-se com mais nitidez se for compreendido o papel da cultura, considerando-a em seu sentido mais vasto. A atividade jurídica interpretativa, quando aliada à interpretação literária, possibilita a compreensão da fábula (narrativa) porque exerce uma linguagem interpretativa para além do texto positivado (Dworkin, 1999).

    A Teoria Narrativista do Direito, entende o argumento jurídico como forma linguística de um mundo puramente textual. A esse respeito, José Calvo Gonzáles (2018) elucida que uma atividade discursiva de estrutura narrativa possibilita um estudo das estruturas (sociais, jurídicas, humanas), que poderá construir signos por meio do diálogo.

    Quando o assunto é corrupção inter(nacional), a escrita construída a partir de uma narrativa pode apresentar benefícios à compreensão e a leitura. Isso ocorre porque são considerados os próprios seres humanos que vivenciam as consequências de pactos, acordos e tratados (i)legais¹⁷, tornando fundamental uma escrita literária fluida e acessível. Assim, quem é afetado por esse mal pode interpretar com mais facilidade o contexto histórico, social, jurídico e político que se constituem tais contextos, bem como compreender os reflexos sociais que eles produzem.

    Dessa forma, ao abordar o tema da corrupção por meio do Direito em uma construção narrativa, quero demonstrar o curso de um som que, em razão da desarmonia das notas, produz uma homofonia¹⁸ em vez de polifonia, perpetuando o descaso em relação à voz das minorias.

    1.1 O SOM DESARMÔNICO: A SERENIDADE DIFÍCIL DE SER ALCANÇADA DIANTE DE UM FENÔMENO GLOCAL

    Essa é a forma como a hegemonia protege a si mesma: silenciando e punindo as diferenças ao arrancar sua legitimidade.

    — Rafia Zakaria

    Conforme falei anteriormente, ao compor a Sinfonia nº 9 em Ré Menor inspirando-se no poema Ode à Alegria, Beethoven impulsionou a ideia sobre a necessidade de um abraço humano que afirma a irmandade dos seres vivendo abaixo do mesmo céu. Por meio da arte, ele demonstrou o desejo de união entre os homens, representando no poema e na música, a serenidade de um abraço a ser alcançada (Solomon, 1998).

    Bem, é neste momento que enfrento o desafio de escrever em forma de narrativa para que, metaforicamente, a música com a liberdade que a arte permite possa expressar a desarmonia existente entre os direitos e a corrupção, demonstrando que não haverá serenidade enquanto os Direito Humanos¹⁹ forem desrespeitados.

    Penso que abraçar significa acolher por inteiro, unir de forma harmônica corpos e propósitos, respeitar, receber com aceitação as diferenças culturais, sociais, raciais, de gênero, é uma forma de dizer: eu vejo você.

    É o que acontece nos concertos acompanhados de orquestras, eles são formados pela união harmônica de vários sons, quando as notas sinfônicas se unem para expressar o encontro de partituras; nesse momento, é como se elas se abraçassem. Forma-se, portanto, uma polifonia para expressar sentimentos por meio da arte, revelando a liberdade e os signos contidos em cada melodia, comprovando que todos os sons importam.

    Para sentir uma sinfonia, precisamos dar espaço para ouvir cada som: é assim que percebemos a polifonia acontecendo, pois os sons não ficam isolados, eles estão em harmonia. Como seria se todos os sons que o Direito compõe fossem polifônicos? Será que as notas da corrupção ainda teriam força?

    Da mesma forma, o som da corrupção não é isolado, não se trata de um fenômeno que ocorre de forma solitária no Brasil, tampouco é característica presente somente na cultura brasileira. Com a intensificação das relações internacionais e o fortalecimento da globalização, essa questão atingiu escala mundial.

    Tal prática existe desde a formação das primeiras civilizações, mas hoje ela é uma realidade tanto nos países desenvolvidos quanto naqueles em desenvolvimento. A corrupção é uma prática antidemocrática que acarreta o descrédito nas instituições públicas e o enfraquecimento dos valores morais (Garapon, 2014).

    A luta contra a corrupção – seja em um cenário global, seja em plano nacional – vem sendo travada há anos. Como exemplo de suas consequências cito a queda de Wall Street²⁰, quando milhões de cidadãos perderam suas casas e os seus empregos, em um momento que direitos sociais foram negligenciados, mas econômica e financeiramente gerou ganho para áreas isoladas de instituições privadas (e públicas) que, corrupta ou ilegalmente, lucraram com o

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