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Bioquímica Essencial
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E-book1.157 páginas7 horas

Bioquímica Essencial

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Sobre este e-book

Em "Bioquímica Essencial", Rafael Escada nos conduz por uma jornada fascinante pelo intricado mundo molecular que sustenta a vida. Este livro abrangente e acessível oferece uma exploração detalhada dos princípios fundamentais da bioquímica, desvendando os segredos das moléculas que formam a base da existência.

Desde as estruturas dos aminoácidos até as complexas vias metabólicas, o autor apresenta os conceitos essenciais da bioquímica de forma clara e envolvente. Com uma linguagem acessível e exemplos práticos, "Bioquímica Essencial" torna compreensíveis os processos bioquímicos que ocorrem em todos os seres vivos.

Com ilustrações detalhadas e explicações claras, este livro se torna uma leitura indispensável para estudantes de biologia, bioquímica e áreas afins, assim como para profissionais que buscam aprofundar seu entendimento sobre os fundamentos da vida. Escrito com paixão e expertise, "Bioquímica Essencial" não apenas informa, mas também inspira uma nova apreciação pela complexidade e beleza da química da vida.

Prepare-se para uma jornada emocionante pelo universo molecular, onde cada página oferece uma nova perspectiva sobre os segredos bioquímicos que nos tornam quem somos.

IdiomaPortuguês
Data de lançamento28 de abr. de 2024
ISBN9798224893881
Bioquímica Essencial

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    Bioquímica Essencial - Rafael Escada

    BIOQUÍMICA

    ESSENCIAL

    Rafael Escada ©

    Bem-vindo a Bioquímica Essencial.

    Neste livro, embarcaremos juntos em uma jornada pelo fascinante mundo da bioquímica, desvendando os segredos das moléculas que formam a base da vida. Meu objetivo ao escrever este livro é oferecer uma compreensão clara e acessível dos princípios fundamentais da bioquímica, fornecendo uma base sólida para aqueles que desejam explorar mais a fundo esse campo emocionante.

    A bioquímica é a ciência que estuda as reações químicas que ocorrem nos organismos vivos, e é essencial para entendermos os processos que sustentam a vida em todas as suas formas. Desde a respiração celular até a síntese de proteínas, cada aspecto da biologia é fundamentado em princípios bioquímicos, e é meu objetivo tornar esses princípios acessíveis a todos os leitores, independentemente de seu nível de conhecimento prévio.

    Neste livro, você encontrará explicações claras e concisas dos conceitos bioquímicos fundamentais, acompanhadas de exemplos do mundo real que ilustram sua importância e aplicação. Desde as estruturas moleculares dos aminoácidos até as complexas vias metabólicas que regulam o funcionamento do corpo humano, cada capítulo é projetado para construir uma compreensão progressiva dos temas abordados.

    Espero que Bioquímica Essencial seja uma fonte de inspiração e conhecimento para todos os leitores interessados em explorar os mistérios da vida em nível molecular. Que este livro seja uma ferramenta valiosa em sua jornada de descoberta e aprendizado na fascinante área da bioquímica.

    Rafael Escada

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    As Moléculas da Vida

    Introdução: A Vida É Feita de Moléculas!

    1.1 Exemplo Ilustrativo #1: A Origem Molecular da Vida

    1.1.1 A Hipótese Replicadora

    1.1.2 A Hipótese Metabólica

    1.2 Exemplo Ilustrativo #2: Vírus, Máquinas Moleculares A Interferir Com A Vida

    1.3 Exemplo Ilustrativo #3: Moléculas enquanto Ferramentas, Descoberta e Desenvolvimento de Drogas

    Bibliografia Selecionada

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    3.3.2 Estrutura e Função das Proteínas

    3.3.3 Interações Cooperativas Entre a Estrutura Terciária e Quaternária

    3.3.4 Enzimas

    Bibliografia Selecionada

    A Interação e a Regulação do Metabolismo

    Introdução ao Metabolismo

    4.1 Reações Consecutivas Sem Enzimas

    4.2 Reações Consecutivas Com Enzimas

    4.2.1 As Bases para a Catálise Enzimática e o Seu Impacto no

    Metabolismo

    Bibliografia Selecionada

    A Regulação dos Metabolismos

    5.1 Níveis de Regulação: Impacto e a Escala de Tempo

    5.2 Inibição e Ativação de Enzimas pelos Ligandos

    5.2.1 Nomenclatura dos Ligandos

    5.3 A Disponibilidade dos Precursores Primários numa Via Metabólica

    5.3.1 Transporte de Metabolitos e Efetores Através de Membranas

    5.4 Mecanismos Lentos (Mas Eficientes!) do Controlo da Ação Enzimática

    5.5 Moléculas-Chave do Metabolismo Energético Bibliografia Selecionada

    Conversão Energética no Metabolismo: O Mecanismo da Síntese de ATP

    6.1 Fermentação: A Via Anaeróbica da Síntese de ATP

    6.1.1 Uma Perspetiva Histórica da Descoberta do Processo da Fermentação

    6.1.2 Uma Visão Geral da Síntese de ATP Através da Fosforilação ao Nível do Substrato Durante a Fermentação

    6.1.3 Reações de Fermentação da Glucose

    6.2 Fosforilação Oxidativa: O Mecanismo Principal de Síntese de ATP na Maioria das Células Humanas

    6.2.1 Uma Perspetiva Histórica da Compreensão da Respiração Celular

    6.2.2 Uma Visão Geral Sobre o Processo da Fosforilação Oxidativa

    6.2.3 O Sistema Transportador de Eletrões

    6.2.4 A Síntese de ATP Através da Fosforilação Oxidativa

    6.2.5 Regulação da Fosforilação Oxidativa

    Bibliografia Selecionada

    Catabolismo das Principais Biomoléculas

    7.1 Uma Visão Geral Sobre o Catabolismo

    7.2 Ciclo do Ácido Tricarboxílico: A Via Central para a Oxidação das Três Classes de Moléculas dos Nutrientes

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    v Conteúdos

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    Regulação e Integração do Metabolismo Durante a Hipoglicemia

    9.1 Perspetiva Geral do Metabolismo Durante Jejum: Exemplificando com Estudos sobre Jejum Prolongado Terapêutico

    9.2 Degradação do Glicogénio no Fígado

    9.2.1 Reações da Degradação do Glicogénio

    9.2.2 Regulação da Degradação de Glicogénio no Fígado

    9.3 Gliconeogénese

    9.3.1 Reações da Gliconeogénese

    9.3.2 Percursores para a Síntese de Glicose

    9.3.3 Regulação da Gliconeogénese

    9.3.4 Utilização Dinâmica dos Precursores da Gliconeogénese

    9.4 Respostas Hormonais à Hipoglicemia

    9.4.1 Glicagina: Mecanismo de Ação e Efeitos no Metabolismo Energético

    9.4.2 Glucocorticoides: Mecanismo de Ação e Efeitos no Metabolismo Energético

    Bibliografia Selecionada

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    Controlo do Peso Corporal e as Doenças Metabólicas Atuais

    11.1 Controlo Humoral da Ingestão de Alimentos

    11.1.1 Uma Perspetiva Histórica do Papel do Hipotálamo na Ingestão de Alimentos

    11.1.2 Leptina: Uma Hormona Indicativa da Adiposidade

    11.1.3 Péptidos Intestinais: Desencadeadores da Saciedade Pós-Prandial

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    As Moléculas da Vida

    Introdução: A Vida É Feita de Moléculas!

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    Estudar as moléculas é a chave para percebermos a vida. Uma definição de vida comummente aceite, conhecida como a Hipótese da NASA (North American Space Agency), afirma que A vida é um sistema químico autossustentável capaz de sofrer evolução Darwiniana (Fig. 1.1). A ligação entre moléculas e vida pode ser difícil de explicar, mas é fácil de se ilustrar.

    Nesta introdução selecionámos 3 exemplos que são suficientes para mostrar que o conhecimento molecular é essencial para pensar sobre a vida em si mesma, a saúde e a doença.

    Procurar pela origem da vida é uma aventura química que envolve as moléculas da Terra primitiva e a sua reatividade.

    Os vírus são máquinas moleculares incríveis, demasiado simples para serem considerados seres vivos para a maior parte dos investigadores, mas com uma agilidade incrível para interferir com o decurso da vida, por vezes de forma trágica.

    O mundo da descoberta e desenvolvimento de drogas consiste em moléculas a serem desenhadas e sintetizadas e a interagirem com outras moléculas in silico, in vitro e in vivo com o objetivo de interferirem com processos fisiológicos vitais.

    É tudo sobre moléculas. É tudo sobre vida.

    ––––––––

    1.1 Exemplo Ilustrativo #1: A Origem Molecular da Vida

    Nada há nada melhor do que tentar responder à pergunta Qual é a origem da vida? para se perceber que as moléculas são a base da vida. Desde o trabalho pioneiro de Aleksandr Oparin, a origem e evolução da vida foram elucidadas com base na química das moléculas que contêm car3..000bono. Ao introduzir este conceito, Oparin verdadeiramente revolucionou a forma como a ciência interpreta a vida. Hoje em dia, existem duas grandes hipóteses que explicam a evolução da complexidade da organização molecular naquilo a que hoje chamamos de células, a replicadora e a metabólica (Fig.

    1.2). Estás hipóteses são baseadas em duas características específicas comuns a todos os seres vivos: Apesar da diversidade tremenda existente entre espécies, todas as formas de vida organizam-se em células e todas estas têm um polímero replicador (DNA) e uma membrana com permeabilidade restrita (uma membrana que contém lípidos na sua constituição). Portanto, não é surpreendente que as hipóteses prevalentes na explicação da origem da vida sejam modelos que elaboram no aparecimento do polímero replicador e na compartimentação. O polímero replicador é essencial para transmitir a informação molecular herdada da geração anterior e a membrana que forma um compartimento que separa a célula ancestral do ambiente é essencial para assegurar que as moléculas neste espaço possam reagir entre elas numa forma controlada e autorregulada (um proto-metabolismo), com um impacto mínimo de flutuações em condições ambientais. Estes dois aspetos são consensuais entre os investigadores que estudam a origem da vida, mas os detalhes e a ordem cronológica dos eventos que resultaram nas células tal como as conhecemos hoje está longe de estar definido.

    1

    2 1  Introdução: A Vida É Feita de Moléculas!

    Fig. 1.1 Linha temporal da definição de vida ou ser vivo. Figura reproduzida com permissão de Moreva & López-Garcia, Nat. Rev. Microbiol. 7:306–311, 2009

    Fig. 1.2 Representação esquemática das hipóteses replicadora e metabólica para descrever a origem da vida. Ambos são de natureza molecular e concordam nos papéis cruciais que a molécula replicadora e a compartimentação desempenham, mas diferem na sequência de eventos. Figura representada com autorização de Saphiro, Investigacion y Ciencia 371, 2007

    4 1  Introdução: A Vida É Feita de Moléculas!

    De acordo com a hipótese replicadora, a vida começou com uma molécula que foi formada aleatoriamente, mas tinha a capacidade de se replicar. É um evento extremamente improvável, dificilmente possível de ocorrer duas vezes no universo, mas que um já é possível na hipótese de que tenha ocorrido. A primeira escolha óbvia para a molécula replicadora é o DNA, o atual replicador universal, mas isto deixa-nos com um paradoxo: são necessárias proteínas para gerar DNA e é necessário DNA para gerar proteínas. O que apareceu primeiro então? É possível que o DNA tenha tido um ancestral com capacidade autocatalítica. O RNA é elegível para esse papel. O RNA não é tão quimicamente estável como o DNA, por isso não é tão adequado para armazenar informação por longos períodos de tempo, mas pode constituir material genético (muitos vírus, como o VIH ou o vírus da dengue, têm genoma de RNA). Concomitantemente, a dinâmica conformacional do RNA permite atividade catalítica, a combinação perfeita para o replicador original. A introdução de mutações e outros erros na replicação, juntamente com outros fatores, levaram à evolução e à seleção. Como este processo está associado ao aparecimento de um metabolismo é difícil de conceber, mas o confinamento de replicadores em ambientes separados pode ter favorecido algumas reações químicas que evoluíram nesse espaço restrito de forma a causar um metabolismo (Fig. 1.2).

    Um modelo alternativo salta o calcanhar de Aquiles da hipótese replicadora. Segundo ele, a origem da vida não é dependente de um evento que é praticamente impossível de ocorrer. A chave do processo terá sido o confinamento de pequenas moléculas que reagiram entre elas. Nalguns casos, agrupamentos organizados de moléculas poderão ter formado ciclos reativos estáveis que se foram tornando cada vez mais complexos. O resultado foi a criação de um metabolismo e de complexas moléculas poliméricas, incluindo replicadores (Fig. 1.2). Naturalmente, os limites do ambiente confinado onde estas reações ocorriam teriam de ter uma permeabilidade seletiva para a matéria. A permeabilidade permite crescimento e replicação.

    Atualmente, virtualmente todas as membranas celulares são formadas não exclusivamente, mas maioritariamente por lípidos. Os lípidos modernos são produtos resultantes de metabolismos. Assim sendo, quais terão sido os predecessores das membranas lipídicas no confinamento das primeiras reações proto-metabólicas? Orevices presentes nas camadas externas das rochas são uma possibilidade. Fosfolípidos e outras moléculas surfactantes podem ter começado como coberturas que, devido às suas dinâmicas intrínsecas e capacidade de se expandirem numa película e de selarem, podem ter evoluído para membranas. Lípidos e outros surfactantes têm a habilidade de formar estruturas tridimensionais para além de lamelas que pode ter contribuído para o confinamento de sistemas químicos (Fig. 1.3).

    Fig. 1.3 A estrutura de agrupamentos lipídicos depende maioritariamente do grau de hidratação e da estrutura molecular dos lípidos. Os lípidos podem organizar-se de diferentes formas: bicamadas rígidas (L ), bicamadas fluidas (L ), micelas (M) ou fases hexagonais (H)

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    Os metabolismos evoluíram no sentido da autorregulação, criando a homeostase, uma situação onde existe equilíbrio. Perturbações pequenas a moderadas neste equilíbrio despoletam respostas que tendem a restabelecer o equilíbrio original. A habilidade de certos metabolitos (moléculas intermédias numa complexa sequência de reações num sistema vivo) de ativarem ou inibirem reações específicas num metabolismo foram uma grande contribuição para a homeostase (Fig. 1.4).

    Atualmente, até as células mais simples, bactérias micoplasmáticas, por exemplo, são sistemas extremamente complexos do ponto de vista químico/molecular. Considerando a evolução natural, todos os metabolismos em todas as células vivas estão relacionados entre si por laços históricos e mapas metabólicos, mostrando que sequências metabólicas principais podem ser concebidas (Fig. 1.5). É incrível que estas complexas séries de reações operem e não entrem em conflito umas com as outras. Na realidade, nem todas as reações representadas na Fig. 1.5 ocorrem nas mesmas espécies e as que ocorrem dentro de uma mesma espécie podem não estar presentes em todas as células. Caso estas coexistam na mesma célula, elas podem não ocorrer no mesmo compartimento celular, e caso estejam no mesmo compartimento, podem não funcionar ao mesmo tempo. Complexo não é o mesmo que confuso.

    6 1  Introdução: A Vida É Feita de Moléculas!

    Fig. 1.4 A evolução das redes de reações químicas. Reações cíclicas simples (esquerda) podem ter evoluído em complexidade (direita). A interferência de certos metabolitos no decurso das reações terá possivelmente resultado em metabolismos autorregulados. Figura reproduzida com autorização de Saphiro, Investigacion y Ciencia 371, 2007

    ––––––––

    Tendo em conta que as vias metabólicas (conjuntos de reações metabólicas) evoluíram a partir do mesmo fundo histórico, todas as moléculas de todas as células vivas estão também relacionadas por laços históricos. As suas raízes comuns determinam que, apesar de toda a aparente diversidade molecular, praticamente todas as moléculas em todas as células podem ser agrupadas em algumas famílias. É também intrigante à primeira vista que com tantos elementos químicos conhecidos pelo Homem (Fig. 1.6), as células dependem imensamente de poucos deles: hidrogénio, carbono, oxigénio e azoto constituem 99% de todos os átomos que constituem uma célula. Como pode ser este aparente puzzle explicado? Essencialmente, vai tudo dar ao antepassado comum de todas as células vivas: estes eram os elementos mais abundantes em solução no oceano primitivo. Estes eram os elementos base e a vida evoluiu a partir deles.

    Iremos abordar com mais detalhe a natureza química das células no Capítulo 3.

    Fig. 1.5 Um mapa metabólico que mostra uma célula hipotética, onde todo o metabolismo se reuniria em diferentes metabolismos sectoriais: aminoácidos, fosfolípidos, esteroides, lípidos, sacáridos, etc. Na realidade, nem todas as células realizam todos os metabolismos sectoriais; aqueles que ocorrem numa dada célula podem não ocorrer no mesmo organelo e aqueles que ocorrem no mesmo organelo podem não ocorrer ao mesmo tempo. O metabolismo como um todo é normalmente tão complexo que na prática tende-se a referir-se-lhe como metabolismos, referindo os metabolismos sectoriais. A palavra pode ser enganadora, visto que pode deixar a impressão de que há muitos metabolismos independentes. Os metabolismos não são independentes uns dos outros e estão altamente correlacionados, mesmo os que ocorrem em diferentes órgãos. A necessidade de regulação metabólica estende-se a todo o corpo humano. Figura reproduzida com permissão de IUBMB, International Union of Biochemistry and Molecular Biology

    8 1  Introdução: A Vida É Feita de Moléculas!

    Fig. 1.6 Tabela periódica dos elementos, realçando a abundância de alguns nos seres vivos (marcados a vermelho). Deve ser notado que são poucos os elementos necessários para construir a quase totalidade das células e que alguns elementos estão apenas presentes em pequenas quantidades (marcados a cor-de-rosa). Ainda assim, os elementos que são raros podem ser absolutamente essenciais à vida. O cobalto, Co, por exemplo, faz parte da vitamina B12 (ver Caixa 3.8)

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    1.2 Exemplo Ilustrativo #2: Vírus, Máquinas Moleculares A Interferir Com A Vida

    Os vírus não são considerados como seres vivos por muitos investigadores. Estão no limite que divide o vivo do não-vivo, capazes de interferir com a homeostasia. Eles têm constituintes moleculares semelhantes comparativamente com as células (proteínas, lípidos, ácidos nucleicos, etc.) mas existem diferenças importantes. Acima de tudo, os vírus não possuem um metabolismo próprio. A sua simplicidade não é uma consequência de antiguidade nem está relacionada com qualquer forma de vida primitiva sobrevivente. Em vez disso, é uma consequência de parasitismo e de evolução regressiva. Alternativamente, os vírus podem ter sido partes de células. Genomas de tamanho mínimo implicam uma taxa reprodutiva mais acelerada para os vírus e, como tal, uma vantagem evolutiva. Pode-se argumentar que, apesar não possuírem um metabolismo próprio, os vírus são entidades físicas capazes de se auto-replicarem e de evoluírem, sendo assim seres vivos. Ainda assim, é questionável que possam ser considerados seres vivos, visto que não se replicam ou evoluem de forma independente das células. Virtualmente, todos os parasitas precisam de um hospedeiro para sobreviverem e se multiplicarem, mas, para além disto, os vírus são incapazes de evoluírem de forma independente: eles são dependentes das células para evoluírem porque eles não possuem a sua própria maquinaria de síntese molecular.

    As interações vírus-célula são maioritariamente físicas nas primeiras etapas de infeção celular, visto que não há reações químicas envolvidas (não são criadas nem destruídas ligações covalentes). Vamos considerar como exemplo o vírus influenza, o vírus causador da gripe (existem 3 tipos de vírus Influenza, A, B e C, sendo que o A é o responsável pela gripe sazonal). O vírus influenza A é um vírus encapsulado, cujo genoma consiste em 8 moléculas de RNA de cadeia simples que codificam entre 11 e 12 proteínas (Fig. 1.7). O vírus possui a proteína hemaglutinina A (HA) na sua superfície. Esta proteína permite a entrada do vírus nas células hospedeiras ligando-se a um sacárido, o ácido siálico ligado a moléculas (glicanos) presentes na superfície da célula, conhecidos como recetores do vírus. O HA reconhece o ácido siálico devido a uma combinação precisa de pontes de hidrogénio e de reações iónicas, entre outras, entre átomos da proteína e átomos da molécula de ácido siálico bem estabelecidos (Fig. 1.7).

    Fig. 1.7 Vírus Influenza a entrar numa célula que contém recetores de ácido siálico na sua superfície. A orientação, natureza química e distância dos aminoácidos responsáveis pela ligação da hemaglutinina (HA) são tais que o ácido siálico é capaz de desenvolver pontes de hidrogénio e outras forças atrativas. O painel (a) mostra um aumento de parte do esqueleto proteico da HA a contactar com o ácido siálico (esqueleto de carbono proteico a verde; esqueleto de carbono do ácido siálico a amarelo). Depois da acidificação das vesículas endocíticas no interior da célula, a HA sofre mudanças conformacionais (não mostradas) que fazem com que as membranas viral e celular entrem em contacto (Painel (b)), o que leva ao colapso das membranas (chamado de fusão), com consequente libertação do conteúdo viral dentro da célula

    ––––––––

    Estes átomos, tanto os da proteína como do sacárido, estão a distâncias e orientações precisas entre eles, para que a combinação única das forças crie uma forte ligação entre eles. O vírus influenza A pode estabelecer contacto com muitas células do corpo humano, mas só irá às que possuírem um recetor que contenha ácido siálico na sua superfície (maioritariamente, células do epitélio do trato respiratório superior). Consequentemente, estas são as células preferencialmente infetadas pelo vírus. A ligação vírus-célula (ligação HA-ácido siálico, mais precisamente) induz a entrada do vírus via endocitose. O vírus é envolvido numa vesícula no espaço citosólico. Com a acidificação do meio da vesícula endocítica, o HA é clivado e sofre mudanças conformacionais que resultam da exposição a um segmento terminal hidrófobo, chamado péptido de fusão, à membrana da vesícula endocítica. O

    10 1  Introdução: A Vida É Feita de Moléculas!

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    equilíbrio entrópico serve como a força motriz (ver Secção 3.1) que promove a fusão do péptido com a membrana da vesícula endocítica. Posteriormente, mudanças adicionais na conformação da proteína levarão a que a o invólucro viral e a membrana vesicular se juntem. Ambas são bicamadas lipídicas e, como tal, colapsam. No final, elas irão fundir completamente e o conteúdo viral deixa de estar separado do citoplasma. As moléculas de RNA viral seguem para o núcleo, onde serão transcritas e replicadas. Os mRNA virais transcritos são traduzidos usando a maquinaria celular de síntese proteica. O recém sintetizado genoma viral é empacotado por algumas das proteínas virais, formando a núcleo-cápsula, enquanto as proteínas membranares virais migram para a superfície celular pelo caminho secretor celular. A núcleo-cápsula associa-se depois às proteínas membranares na membrana plasmática e novos vírus saem das células, prontos para iniciarem um novo ciclo de infeção.

    Quando duas estripes diferentes infetam a mesma célula, o RNA das duas pode coexistir no núcleo. Misturas de RNA originam novos vírus que possuem misturas aleatórias do material genético de ambas as estripes. Os vírus combinados podem não ser funcionais, mas, ocasionalmente, uma nova estripe de eficácia aumentada pode ser criado. Por exemplo, é possível que estripes de gripe suína e das aves se combinem com a da gripe humana para formar novas estripes de gripe humana. Estes eventos, combinados com mutações aleatórias nas proteínas virais, podem resultar em vírus extremamente letais. Este foi o caso em 1918, quando uma estripe de gripe, erradamente chamada de Gripe Espanhola, matou centenas de milhões (!) de pessoas na Europa e nos EUA (ver Caixa 1.1). A mutação de um simples aminoácido no local de ligação do HA nos recetores de um vírus aviário foi o suficiente para que pudesse infetar tecidos humanos (Fig. 1.8), uma pequena mudança numa molécula com um impacto trágico para a humanidade.

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    1.3 Exemplo Ilustrativo #3: Moléculas enquanto Ferramentas, Descoberta e Desenvolvimento de Drogas

    Desenhar novas drogas que possam ser desenvolvidas em novos medicamentos requer conhecimentos sobre o papel de diferentes moléculas em diferentes patologias. É necessário um alvo ao nível molecular para a droga candidata, e o investigador precisa de ter uma noção de como eles vão interagir para que o alvo seja inibido ou ativado. Uma droga candidata que tem como alvo uma proteína, como uma enzima ou um recetor membranar, por exemplo, precisa de um local de ligação de possa reagir, ou fixar-se tanto forte como seletivamente. Seletivamente significa que distinguirá este local de todos os outros no mesmo alvo ou em qualquer outra molécula do corpo. Esta singularidade de local de ligação é direcionada pelo arranjo preciso dos átomos no espaço. Idealmente, apenas aquele local tem os átomos certos à distância certa, na orientação certa para maximizar as forças moleculares de atração (ver o exemplo da ligação HA-ácido siálico na Fig. 1.8). Pontes de hidrogénio, forças iónicas/eletroestáticas, forças de van der Waals, etc., todas elas estão dependentes do arranjo espacial dos elementos tanto da droga candidata como do alvo. O modelo Beckett-Casy para recetores opioides ilustra a base destes princípios (Fig. 1.9). Para além da eficácia da ligação ao seu alvo, as drogas moleculares não podem ser excessivamente tóxicas ou ter outros efeitos indesejados, que estão diretamente relacionados com a sua reatividade e seletividade.

    O mesmo se aplica a moléculas terapêuticas complexas, tais como anticorpos. Tomemos um dos anticorpos que têm como alvo a proteína gp120 na superfície do vírus da imunodeficiência humana (VIH) (Fig. 1.10). Esta proteína é responsável pela ligação aos recetores e co-recetores dos linfócitos T, sendo este o primeiro passo para a infeção na síndrome de imunodeficiência adquirida (SIDA). Quando um anticorpo se liga à gp120, pode bloquear o acesso desta aos recetores e co-recetores, prevenindo assim a infeção. Anticorpos anti-VIH são uma das esperanças para futuras terapêuticas, apesar da taxa de mutações da gp120 e da presença de grupos glicosilados na sua superfície se apresentem como problemas difíceis de ultrapassar.

    Alguns investigadores dedicam o seu trabalho à engenharia de anticorpos, isto é, manipulação de anticorpos para uma finalidade específica. Alguns tentam encontrar a porção mais pequena de um anticorpo que esteja ainda ativa, para que a terapia com anticorpos possa tornar-se mais simples e com menor proporção de custo/benefício. Manipular anticorpos requer conhecimento das interações

    Fig. 1.8 A hemaglutinina 3 está adaptada a células humanas; a hemaglutinina 5 está adaptada a pássaros. Em 1918, uma mutação num único aminoácido no local de ligação da hemaglutinina aviária fez com que ela conseguisse ligar-se a células humanas que tivessem ácido siálico na sua superfície. Isto levou a uma trágica pandemia de gripe entre humanos – a Gripe Espanhola ou Gripe de 1918. Figura reproduzida com permissão de Stevens et al., Science 303:1866–1870, 2004

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    ao nível molecular que estes têm com os antigénios. A este nível, as forças responsáveis pela seletividade e força da ligação não são diferentes daquelas estabelecidas por pequenas moléculas (tal como os opioides da Fig. 1.9) com as suas moléculas alvo, mas o número total de ligações (pontes de hidrogénio, interações eletroestáticas, forças de van der Waals, etc.) envolvidas pode ser maior, resultando em forças e seletividade elevadas.

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    Caixa 1.1: Gripe Espanhola, Terrível e Quase Esquecida

    Entre Abril de 1918 e Fevereiro de 1919, o mundo sofreu a pandemia mais severa dos tempos modernos. Terá sido provavelmente a pior pandemia desde a praga da Morte Negra do século catorze. Influenza, o vírus que causa a gripe, infetou centenas de milhões de pessoas e matou, direta ou indiretamente, entre 50.000.000 e 100.000.000 pessoas, números tão elevados que é difícil estimar. Para além dela, a Europa estava a ser devastada pela Primeira Guerra Mundial. A mobilização dos exércitos e as condições precárias de assistência médica ajudaram a doença a espalhar-se. Mais, os horrores da guerra e a censura das notícias da frente de batalha distraíram a atenção da humanidade da verdadeira dimensão da pandemia, que continua largamente ignorada.

    Apesar de chamada de Gripe Espanhola, a doença não começou em Espanha. Visto que tinha uma menor censura das notícias devido à sua neutralidade, Espanha tornou-se uma fonte privilegiada de informação acerca da doença, o que pode ter levado à impressão de que a doença estava de alguma forma relacionada com Espanha. Na realidade, acredita-se que a pandemia tenha começado na região do estado do Kansas, nos EUA, em Março de 1918. A nova estripe viral causava efeitos súbitos, matando em apenas alguns dias. Nos piores casos, os pacientes sofriam de dores de cabeça, dor pelo corpo todo, febre, cianose, tosse com sangue e sangramentos nasais. A maioria das mortes estava associada a pneumonia, que era uma consequência da infeção oportunista dos pulmões por bactérias. As propriedades histológicas dos pulmões eram transformadas, e havia acumulação de fluídos que, literalmente, sufocavam as vítimas, tal como se elas estivessem a afogar-se.

    O microscópio eletrónico foi inventado nos anos 40. Antes deste avanço tecnológico, era muito difícil estudar vírus. Outros avanços se seguiram, tal como o desenvolvimento

    12 1  Introdução: A Vida É Feita de Moléculas!

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    microscópios óticos de alta resolução e da técnica de PCR (reação em cadeia da polimerase), mas a singularidade molecular do vírus de 1918 é ainda um desafio. A busca pela sequência dos resíduos de aminoácidos das proteínas da estripe de 1918 é uma história de persistência e de devoção. Em 1940, Johan Hultin, um estudante de Medicina, passou o verão no Alaska. Ele ouvira sobre a Missão Teller, uma pequena comunidade de missionários que desapareceu literalmente em Novembro de 1918. Setenta e duas vítimas de gripe foram enterradas numa vala comum. Mais tarde, Hultin desenvolvera a ideia de recuperar o vírus da gripe de 1918 dos corpos das vítimas das vítimas da Missão Teller, presumidamente conservados no gelo do Alaska. No verão de 1951, ele uniu forças com dois colegas da Universidade de Iowa, um virologista e um patologista, e regressou ao Alaska para visitar a antiga Missão Teller, entretanto rebatizada como Missão Brevig. Com consentimento prévio da tribo local, Hultin obteve amostras de tecido pulmonar de algumas das vítimas de 1918. A equipa tentou isolar e cultivar o vírus usando as mais avançadas técnicas disponíveis, mas não foram bem sucedidos. Foi uma grande desilusão. Hultin desistiu do seu doutoramento e especializou-se em patologia. 46 anos depois, em 1997, estava ele reformado em São Francisco (Califórnia, EUA), quando lê um artigo científico sobre o estudo dos genes da estripe viral de 1918 obtida a partir de autópsias realizadas entre 1918 e 1919, utilizando PCR. Entusiasticamente, Hultin recuperou a intenção de estudar as amostras da Missão Teller/Brevig. Um dos colegas de Hultin de Iowa mantivera as amostras desde 1951 até 1996! As amostras tinham sido eliminadas um ano antes! Hultin não desistiu e pediu permissão para repetir a colheita de amostras. Desta vez, ele encontrou o corpo de uma jovem obesa, cujos pulmões haviam sido conservados pelas baixas temperaturas e pela camada de gordura que as rodeava. O genoma completo da estripe viral de 1918 foi obtido a partir destas amostras.

    A sequência da hemaglutinina da estripe de 1918 (H1) foi reconstruída a partir do genoma do vírus. O local de ligação ao ácido siálico sofrera mutações nos seus resíduos de aminoácidos a partir do vírus aviário (H5), que alargou o local de ligação, permitindo aos vírus mutados ligarem-se e infetarem células humanas. Estudos modernos da árvore filogenética dos vírus da gripe, que inclui agora informação de amostras da Carolina do Sul, Nova Iorque e Brevig, todas de 1918, relacionam a origem do vírus a uma estripe aviária encontrada num ganso (Alaska, 1917) (ver figura). Apesar desta hipótese não ser totalmente consensual entre os investigadores, o medo de que novos vírus anormalmente letais adaptados a humanos evoluam a partir de gripes aviárias persiste e é uma questão de vigilância constante por parte de autoridades de saúde por todo o mundo.

    Fig. 1.9 Hipótese de Beckett-Casy para a ligação entre uma molécula analgésica (tal como a morfina, que está ilustrada) a um recetor opioide. Ainda que o estrutura exata do recetor não seja conhecida, as forças de interação/atracão fundamentais foram identificadas: atracão eletrostática, pontes de hidrogénio e forças de van der Waals. O recetor e tão específico ao ligando que moléculas quirais (que possuem os mesmo grupos químicos, mas numa orientação diferente no espaço) não encaixam

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    Todo o processo de planear e estudar drogas (frequentemente chamado de pipeline) tem três etapas principais: pesquisa, desenvolvimento e registo (Fig. 1.11). A etapa de pesquisa é tipicamente, mas não exclusivamente, conduzida em universidades e centros de pesquisa académica. Durante esta fase, alvos relevantes para certas patologias são identificados e a molécula a interferir com eles é selecionada. A molécula é designada por lead e o processo de aperfeiçoamento é designado por otimização da lead. A etapa da pesquisa dura muitos anos (raramente menos de 5).

    O desenvolvimento pré-clínico é o primeiro passo da fase de desenvolvimento e o último antes dos ensaios clínicos. Estudos pré-clínicos consistem no máximo de experiências in vivo e in vitro (tanto em células como em sistemas artificiais) necessárias para assegurar que uma certa lead otimizada é segura a um certo intervalo de dosagem quando preparada como uma formulação selecionada específica e usando um modo definido de administração. O objetivo é minimizar os riscos ao mínimo possível quando administrando a lead em humanos. A eficácia vem a seguir à segurança na lista de prioridades. Esta é a razão pela qual os primeiros testes em humanos (Fase I dos ensaios clínicos) são feitos em alguns voluntários saudáveis e não nos pacientes. Na Fase I dos ensaios clínicos, é a segurança que é testada, usando doses pequenas dos componentes em estudo. Tolerância à droga, absorção, distribuição pelo corpo e excreção são monitorizados. A Fase II dos ensaios clínicos inclui pacientes e a eficácia, para além da segurança, é também testada. As drogas são administradas em números que vão às várias centenas de indivíduos por várias semanas ou alguns meses, tipicamente. A amplitude de dosagem da droga é aperfeiçoada durante os ensaios. É de salientar que todos os ensaios são cientificamente controlados para a significância estatística dos resultados. O efeito placebo (Caixa 1.2) também é tido em conta nos ensaios. O processo de desenhar ensaios clínicos, recolher dados e análise relevante dos dados é, em si mesma, uma disciplina complexa.

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    Fig. 1.10 (a) Ilustração que representa uma partícula de VIH, onde está marcada a cápsula (magenta), que rodeia

    ácido nucleico viral e as proteínas do envelope (cor-de-rosa). Para além da cápsula, o vírus está carregado com muitas outras proteínas com diferentes funções no ciclo da replicação (reproduzido com autorização de Goodsell, The Machinery of Life, 2009). (b) Anticorpos monoclonais amplamente neutralizantes ligam-se a motives específicos (epítopos) na superfície das proteínas do envelope, gp120 e hp41. O modelo representado foi gerado por recolha de dados científicos de diversas fontes. O contorno das proteínas do envelope e da membrana viral é mostrado a cinzento; o que é conhecido da estrutura da gp120 é mostrado a cores. A porção glicosídica (sacárido) da proteína é mostrada a verde e azul. MPER significa Região Membranar Externa Proximal (Membrane Proximal External Region) e refere-se à porção proteica da gp41 mais próxima da membrana viral (reproduzido com permissão de Burton & Weiss, Science 239:770–772, 2010). (c, d) Alguns anticorpos, tal como o 4E10, reagem com esta porção da proteína. Nos pontos de contacto entre os resíduos de aminoácidos do anticorpo e da gp41, forças atrativas como iónicas, pontes de hidrogénio e forças de van der Waals contribuem para uma ligação forte. A natureza química e o arranjo espacial dos aminoácidos conferem seletividade à interação anticorpo-epítopo. Figura reproduzida com permissão de Elsevier from Cardoso et al., Immunity, 22:163–173, 2005

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    A Fase III dos ensaios clínicos são uma réplica da Fase II, mas são usados milhares de indivíduos e o tratamento pode estender-se no tempo. A Fase III é, assim, um refinamento da Fase II, quer em termos de segurança como de eficácia. Acontecimentos raros como um efeito colateral indesejado do qual não se estava à espera que pudessem não ter sido detetados na Fase II são agora mais facilmente detetados. A preocupação pelo aparecimento de efeitos colaterais indesejados e raros que possam ameaçar a segurança das drogas, até a apenas pequenas e específicas subpopulações de pacientes, está sempre presente, mesmo depois da droga já ter sido aprovada como medicamento para uso clínico. Isto é por vezes designado como Fase IV e consiste em monitorizar como as drogas se comportam no mundo real, fora de um ambiente altamente controlado.

    Fig. 1.11 A descoberta de uma droga e o seu processo de desenvolvimento, normalmente referido como pipeline na indústria farmacêutica. Há 3 etapas principais, pesquisa, desenvolvimento e registo (centro), distribuídas por vários anos (linha temporal numérica). Cada etapa está dividida em subfases. Durante a fase da pesquisa, alvos relevantes para determinadas patologias são identificados e as moléculas que interferem com esses alvos são selecionadas (leads). A etapa de pesquisa demora tipicamente por volta de 5 anos. A fase de desenvolvimento pode decorrer pelos 7 anos seguintes, durante as quais as drogas são testadas em termos de segurança e eficácia em ensaios clínicos animais e humanos cuidadosamente planeados. No final de cada fase há uma avaliação dos resultados; problemas relacionados com um destes dois critérios podem evitar a progressão para futuros testes. Tipicamente, por cada 1000 moléculas que começam o processo, apenas uma chega ao fim da última fase com sucesso. Esta taxa, chamada taxa de atrito, é incrivelmente baixa. Mais ainda, nem todas as moléculas recebem aprovação para entrar no Mercado por razões regulamentares, e as que entram são ainda monitorizadas posteriormente (Fase IV)

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    Caixa 1.2: O Efeito Placebo, o Poder do Nada

    (baseado no O Poder do Nada de Michael Specter, no The New Yorker, 12 de Dezembro de 2011) Um placebo é um tratamento simulado ou medicamente ineficaz para uma doença ou outra condição médica com o fim de enganar aquele que o toma. Alguns pacientes que recebem o tratamento placebo vão ter melhorias ilusórias ou mesmo reais de uma dada condição médica,

    um fenómeno comummente referido como o efeito placebo.

    Por grande parte da história da humanidade, os placebos foram uma ferramenta fundamental do armamento de qualquer médico, por vezes a única. Quando não havia mais nada a oferecer,

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    os placebos eram uma pomada. A palavra em si vem do Latim para Eu irei dar prazer. Na época medieval, enlutados de contrato que participavam nas Vésperas pelos Mortos cantavam muitas vezes a linha nove do Salmo 116: Eu agradarei aos mortos na terra dos vivos. Visto que os enlutados eram contratados, as suas emoções eram consideradas insinceras. As pessoas chamavam-lhes de placebos. A palavra sempre carregou conotações mistas. Os placebos são muitas vezes tratados como uma fraude pia, pois pílulas de pão, gotas de água colorida e pós de cinza de nogueira, por exemplo, podem levar a uma perceção de melhoria por parte dos pacientes.

    O primeiro teste controlado com placebo reconhecido publicamente – e ainda entre os mais

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