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O Prisioneiro do Rochedo
O Prisioneiro do Rochedo
O Prisioneiro do Rochedo
E-book237 páginas3 horas

O Prisioneiro do Rochedo

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Sobre este e-book

Mónaco e o Prisioneiro do Rochedo

Luigi Ciardelli

Em colaboração com Corinne Héron-Mimouni, guarda prisional.

Colocado atrás das grades em França, por assalto à mão armada, Luigi Ciardelli está em plena estrada quando, devido a uma extradição para Itália para que lá cumpra a pena, a carrinha penitenciária se desvia na direção do Mónaco. A justiça monegasca quer prendê-lo.

Considerado como o inimigo número 1, Luigi Ciardelli será encarcerado numa das prisões mais discretas do mundo: a do Mónaco.

Seguimos o conflito que, desde o início, o opõe à administração monegasca que recusa enviá-lo para uma prisão italiana. O braço de ferro é desigual, e Luigi Ciardelli terá, desde o início, um único objetivo: fugir.

No seu projeto de fuga, envolve um antigo marine americano. O autor torna-se então o personagem real de um romance de aventuras. A fuga tem sucesso. O Rochedo leva um abanão. Explicações exigem-se. Ter-se-á ele evadido sem ajuda externa? Um rumor de complô começa a pairar no Principado.

Esta narrativa vivida em primeira pessoa, de um homem que aceita testemunhar, é a ocasião de refletir sobre o tema da justiça, numa área nunca abordada. A pena de prisão, única resposta à delinquência, já não é retratada apenas do ponto de vista da degradação das prisões. O autor exprime-se sobre a noção do encarceramento. Um assunto intemporal.

Luigi Ciardelli emprestou a sua caneta a Corinne Héron-Mimouni, autora nomeadamente de Matonne, das Edições Ramsay

IdiomaPortuguês
EditoraBadPress
Data de lançamento14 de jun. de 2015
ISBN9781633398450
O Prisioneiro do Rochedo

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    O Prisioneiro do Rochedo - Héron-Mimouni

    O Prisioneiro do Rochedo

    Luigi Ciardelli com Corinne Héron-Mimouni

    Corinne Héron-Mimouni é autora das seguintes obras:

    Matonne. Mémories de Fresnes et d`ailleurs, das edições Ramsay, 2002.

    Matonne de jeunes, das edições De l`arbre, 2010.

    La peur dans l`ombre, romance em edição eletrónica, 2012.

    Os apelidos e os nomes próprios foram alterados, com exceção dos do americano Ted Maher e do autor, Luigi Ciardelli.

    ÍNDICE

    1. 25 de dezembro de 2002

    2. Uma promessa

    3. Turismo penitenciário

    4. De um dia ao outro

    5. A fortaleza do Mónaco

    6. O meu voo por cima de um ninho de cucos

    7. A prisão dentro da prisão

    8. O cordeiro

    9. A cela 22

    10. O trabalhar do ferro

    11. A fuga

    12. Livre

    Epílogo

    CAPÍTULO 1

    25 DE DEZEMBRO DE 2002

    Doem-me as costas. O tempo passa em câmara lenta e não é por causa da minha meditação mas sim por causa do desconforto do banco. Tenho os olhos fixos na chama. Ela oscila, e por um instante domina a luz que irradia dos vitrais. O círio afasta-me da cruz de madeira, que se impõe e que me bloqueia a vista, como tudo aqui. Sinto um formigueiro nas pernas, inquietações pululam na minha cabeça. Mais que em qualquer outro dia, a irritação incomoda-me. Contra a parede, o olhar de desespero e de compaixão do rosto do Cristo, coroado de espinhos, irrita-me. Não tenho qualquer vontade de suportar o fardo... ele é muito injusto. Contudo, eu conheço o peso que cada pena de prisão efetiva encerra. Estou nisto já há numerosos anos, tantos que o meu intelecto recusa dizer quantos!

    Nesta brancura, apenas vejo um homem agitado. Atrás do altar, ele fala. Ele fala de Jesus, mas também fala de nós. De mim. Cada vez suporto menos as palavras dele, bem como os seus gestos, a mão calmante, mas também acompanhada pelo movimento hipócrita que acompanha a frase «caros irmãos e irmãs ... ».

    «Uma criança nasceu. Nasceu num estábulo em Belém...»

    O meu espírito parte à deriva. Só escuta quem quer este bispo, que vem uma vez por ano pagar penitência atrás destas altas grades. «A manifestação de Deus... o grande mistério da fé.» As paredes de reboco imaculado dominam-me. Tento acalmar os batimentos do coração. Fixo um ponto à minha frente, e respiro a brisa de um ámen.

    Na minha cabeça, o ressentimento preparou a minha própria homilia. Levanto-me com um salto, deslizo para a direita e saio para a alameda. Sinto o olhar espantado do procurador-geral. Ele também está presente nesta jornada piedosa, jornada que deseja festejar depressa fora da prisão. A capela é pequena, com alguns passos fico defronte do altar. O bispo observa-me, boca entreaberta, a mão no ar e a ponta do dedo na direção do céu. Direciono o meu indicador para ele... «Você disse a sua homilia, agora vou dizer a minha.»

    Volto-me para a assembleia. Os homens e as mulheres vestidos com um fato de jogging azul, o uniforme da nossa condição, algumas mulheres benévolas. E esta morena ao canto não será da família real? Ou pelo menos, e sobretudo, este homem de fato e gravata escuros, a condizer com a imagem da justiça neste local abominável, o senhor Delet, que com o braço toca o diretor, no rosto pálido. Continuo: «A minha detenção é arbitrária, aqui falais ininterruptamente de justiça.» No zunzum dos meus pensamentos, aparece a imagem do procurador que se inclina contra a orelha do diretor. Eu adivinho a pergunta: quem é este aqui? E o diretor responde: o aperta-tomates do Ciardelli. Então o meu íntimo partiu para a máxima revolta.

    ― ... e eu considero-me raptado.

    O procurador em frente, todo vestido de fato e gravata, levanta-se e ordena.

    ― Já chega, cale-se!

    ― Eu tenho tanto direito como vocês de falar, digo eu.

    ― Nós estamos em plena missa. Retorne ao seu lugar e já o vejo daqui a pouco. Falaremos do seu caso.

    Com uma curta vénia, que não tem nada de religioso, introduzo-me entre os bancos, sento-me. Silêncio. O bispo dá um passo em frente, afina a voz. O homem perdeu o fio à meada da missa.

    Senhor Delet, o procurador, é um homem de palavra. Assim que a missa termina, ele espera-me no corredor, enquanto os outros detidos se dirigem para a porta de ferro.

    ― Mas que raio de enredo é este, ataca ele.

    ― Este «enredo», como você diz, é o meu sequestro. Não tenho nada que estar nesta prisão! Há um acordo de extradição assinado pelo tribunal de Aix-en-Provence entre a França e a Itália e ele deve ser respeitado. A vossa representação teatral de justiça nem isso respeita! Quando acabei de cumprir a pena em França, devia ter sido entregue a Itália e não ser raptado. E vocês nem renovaram o mandado de captura internacional!

    ― Você sabe muito bem, Senhor Ciardelli, que aqui nós estamos num enclave. Nós, e eu muito menos, não podemos decidir enviá-lo para um país, para si a Itália, sem fazer o pedido a França.

    ― Parai de me lançar a litania habitual dos vossos acólitos. Esse é exatamente o discurso do diretor, parece que estou a ouvi-lo e ...

    ― E nada Senhor Ciardelli. Se compreendo bem o vosso pensamento, e nesse espeto, tenho de lembrar a sua exibição de há bocado, eu tenho de o lembrar que você está aqui por causa de um delito que cometeu.

    ― Palavras ao vento... e eu quero algo concreto. Ir para onde eu devo ir, pois existe um acordo de extradição com a Itália. Mas eu não sou como o senhor, io non parlo a vanvera e dico que se entre o Natal e o cantar dos reis a justiça deste país não me enviar para Itália, farei coisas na prisão que irão ridicularizar este principado e toda a sua gente fina!

    ― Você fala do Mónaco, senhor. Do principado do Mónaco!

    ― Eu sei onde estou, senhor procurador, estou encarcerado na prisão do Mónaco. E é daqui, desta prisão, que farei que o mundo tagarele sobre o Mónaco!

    ― Você está a fazer ameaças, diz o procurador que se esquece do «Senhor Ciardelli».

    ― De modo nenhum, pois não é uma ameaça, mas sim uma promessa.

    CAPÍTULO 2

    UMA PROMESSA

    Um labirinto de mosaicos. Grandes retângulos beges no chão, os mais pequenos e claros contra as paredes, entre as portas das celas. Todos estão encastrados com postigos de tipo guilhotina. Um ar gélido de hospital. É como se visse isto pela primeira vez, como na manhã do meu encarceramento. Já se passaram vários meses. Contra a minha cabeça, o ar condicionado sopra uma aragem tépida. Prisão de luxo, prisão fora da lei. Natal no Mónaco. Natal de ameaças. Porque ele tem toda a razão, o Senhor Delet, o procurador. Ameaças que agitei à frente do seu nariz, como quem esfrega um pano vermelho. Ele teria rido, se não receasse algumas más habilidades da minha parte. Algumas más habilidades.

    «... Rirão do principado do Mónaco...» e não é pegando fogo ao meu colchão que o irei conseguir. De qualquer maneira, o fogo já está ateado! E eu não quero esturricar, também não sou louco. Eu tenho uma ideia melhor, bem melhor. E está prestes a concretizar-se.

    Não foi esta manhã que tomei esta decisão, ela já estava tomada. Terei necessitado desta discussão para começar com as hostilidades? Uma altercação para que eu possa extrair dela os meus últimos motivos.

    Uma simples passagem com o cartão magnético e a porta da minha cela abre-se. O instante que se segue parece suspenso no ar. Com um passo indeciso, entro na divisão que não contém nada de especial. Toda a minha vida é fora do comum, com algumas questões do meu passado fechadas a sete chaves. Na prisão do Mónaco, os detidos entram nus. Despidos das roupas e despidos das recordações. Nenhum bem pessoal, nem calças, nem cuecas, ou meias vos acompanharão durante a vossa detenção. Nada que vos identifique, para que possais seguir o passar dos meses, dos anos.

    «...rirão do Mónaco... », o instante de cólera comprimido rodeia em circuito na minha cabeça.

    Um desejo de liberdade, claro. Mas também a esperança de que as pessoas riam do principado. O risco valerá a pena?

    Poderei escolher a resposta? Se desistir da ideia, sentirei uma enorme falta de esperança no futuro. O meu sonho, o meu projeto, no decorrer das semanas transformou-se num plano. Um plano preparado com rigor.

    Não estou na minha primeira tentativa. Será que durante o meu passado me impus pessoalmente com coragem?... Com coragem hoje, enquanto homem, e ontem, enquanto criança?

    Sentado na minha cadeira da prisão, eu sei que se não tivesse tido a iniciativa de agir, a depressão teria tomado conta de mim. O abismo está debaixo dos meus pés, eu já estou bem enterrado nele, e a única opção que tenho é voltar a subir. Eu, o Luigi, o italiano, decidi não desistir do jogo. Eu tenho o olhar aguçado e o espírito ágil. É impossível imaginar os atos que movem a minha sede de vingança.

    (Os detidos não monegascos, condenados a mais de 6 meses, não permanecem na prisão do Mónaco. Uma vez condenados, são transferidos para uma das prisões francesas.)

    CAPÍTULO 3

    TURISMO PENITENCIÁRIO

    Alguns meses antes, março de 2002.

    Apenas vejo pinturas foscas e antigas. No chão, contra o soalho de ferro, uma chapa de ferrugem destrói o uniforme azul. Estou sentado num banco dentro de uma jaula cuja porta é feita de rede. Tenho o coração aos saltos. Mais um bocadinho e vomitaria o pouco que ingurgitei esta manhã com o stresse da partida. «Despacha-te Ciardelli, entra aí para dentro que eu tenho de revistar aqui um pouco...» e de outras despedidas da prisão central de Arles, sem as quais eu passaria bem.

    Num canto da carrinha prisional, a minha vida de detido está escrita numas caixas. Muitos anos de prisão produzem muita tralha. E além disso, existem as cartas de Élise. Os meus projetos. Os meus poemas no dossiê que eu tinha sempre numa absoluta ordem. Eu gosto que tudo esteja no seu lugar e lá já nada estava no seu devido lugar. Um vigilante vasculhou tudo de modo apressado. Apenas o tempo suficiente para pôr tudo num caos, e de poder mostrar uma aparente espécie de controlo.

    A badalhoquice nas minhas coisas põe-me fora de mim. É mais forte que eu. Desde há oito anos que organizo a minha vida em nove pequenos metros quadrados. Às vezes menos. Cada coisa no seu lugar. Talvez seja nesse particular que tenha o controlo da minha própria vida. Meter em ordem o que é possível. Suportar ser considerado um insignificante num universo prisional. Sim eu sei, isto não é a melhor das coisas. Mas acontece que já há muito tempo que não vejo a luz do dia. Há oito anos que o céu está enxadrezado com arame farpado ou dilacerado com grades. Oito anos sem qualquer interregno.

    Todos os dias e todas as semanas dependente dos ferrolhos, sei o que isso é. Anteriormente a esta espécie de eternidade, houve a Itália. Lucca, Modena, Pianosa perto de Livorno, e para mim era suficiente. A lista é longa. Eu era jovem. O Cyrano dos assaltos à mão armada, como me apelidavam nos jornais. Não preciso de dizer mais nada. O meu rosto. Os olhos castanhos, talvez pequenos... ou não, conforme aquilo que desponta na minha cabeça. Grande, magro. Se bem que as testemunhas, às vezes, apenas retivessem do meu rosto a memória de um bigode postiço a condizer com um chapéu original.

    ― Ele tinha um boné vermelho, tenho a certeza, diz a senhora. E além disso, ele também era bem-educado. Também tinha um bigode.

    Confirmo que sempre fui bem-educado. Assaltar não significa violentar e eu nunca matei ninguém. Não é por causa disso que tenho vontade de ir para a prisão. De qualquer das maneiras, assassino ou não, a justiça italiana anda atrás de mim. Eu amo a liberdade e portanto avanti la Francia. Dei por mim a fugir de Itália e como era necessário que eu sobrevivesse, fiz assaltos! Não sei fazer nada além de assaltos à mão armada. Nunca soube. O tempo pressionava-me Quatro assaltos à mão armada. Em três dias. Menton, Nice... e demoro-me um pouco do lado do Mónaco. Pilho as vilas dos ricos. Eis senão quando o meu projeto de encher os bolsos, antes de uma nova partida para Espanha, correu mal num dia do mês de setembro quando um bófia armado, como num filme de Belmondo, me apanhou em pleno Jardim dos Ingleses. Detido, condenado, a França vingou-se de mim. Quatro anos por tráfico de droga. Quem é que não era. Apenas algumas trocas de mercadorias. Um pouco de coca encontrada uma noite num hotel. Acontece nas melhores famílias. Era o meu cartão pessoal multibanco. Em caso de penúria. Aos quatro anos, juntam-se mais oito anos por causa de assaltos à mão armada. Eis o somatório. A soma é razoável. Doze anos a cumprir, dos quais oito realmente à custa da princesa. Pois bem, a justiça e eu nunca temos o saldo bem definido. Sobre mim recaem também oito anos de purificação na minha terra natal. A barra dos vinte anos está atingida. Ao mesmo nível da pena de um assassino.

    O veículo trava e é por pouco que consigo segurar o meu coração. Penduro-me para poder fixar um ponto à minha frente. Sem baixar a cabeça. Finalmente, o tempo passou. Ali estamos nós à espera que ele desfile. E depois, um dia, tudo acabou, encontramo-nos naquele momento pelo qual tanto ansiámos. Há anos que penso na Itália e há anos que espero regressar. Desde que o tribunal de Aix-en-Provence assinou o acordo de extradição, o tempo arrastou-se. E depois, finalmente, chega o grande dia, em marcha Luigi, Andiamo! Andare in Italia.

    Debaixo de um calor tórrido, sufoco na minha despensa. A placa de ferrugem muda de forma com a transpiração que me escorre pelos olhos e confunde o meu olhar. Já faz bem umas duas horas que rodamos. De repente, as sirenes da carrinha berram. Marselha, certamente. E como é hábito, engarrafamentos em toda a cidade. Travagens durante os arranques, no declive que conduz à prisão Baumettes. Algumas viragens, sei que me aproximo da minha última paragem dentro de uma prisão francesa. Este momento toca-me profundamente, apesar de tudo. Não é uma questão de alegria ou de melancolia, longe disso. É a consequência de uma página que se vira e que deixa atrás dela todo um enredo com uma centena de capítulos. Um naco da minha vida, com a espessura de oito anos.

    Conheço esta construção cinzenta com pedras feridas pelos impactos das balas alemãs. Recordação dos corpos que se vergam, sem vida, contra as paredes. Imagino atrás da chapa metálica as esculturas dos sete pecados capitais, lá posicionadas antes da guerra, em homenagem às velhas utopias de celas prisionais libertadoras, pois acreditava-se na redenção das transgressões pela oração, pelo isolamento e pelo trabalho. Que presunção... Que contraste com as celas enegrecidas, e que nunca mais foram pintadas. A multidão de mais de mil detidos na fábrica das punições.

    Conheci muitas prisões. Celas prisionais que abusaram da minha vida dia após dia, mês após mês. Hoje, estou no armazém das encomendas. Numa cela suja por todas as misérias do mundo, estou à espera que os meus vigilantes se alimentem. Não ouso sentar-me no colchão esburacado pelo uso. Não há cadeiras. Apenas a janela estriada de grades e uma cama. Finalmente, ouço o barulho de uma chave na fechadura. A porta abre-se para dar entrada a um homem forte. Olhar cansado. O cinzento das paredes é para toda a gente. Com uma mão aliso as minhas calças de ganga como se apagasse as rugas do rosto dele.

    ― Vamos lá, diz o enorme guarda.

    No cartório, fico com novos guardas para a viagem. Do estabelecimento prisional vou à polícia francesa. Uniformes azul-marinhos, camisas claras. Um tipo alto com uma pequena Barbicha cinzenta, cabelos rapados num crânio redondo. Um Magricela que flutua nas roupas que veste.

    ― As vossas mãos, por favor, diz o Barbicha. Para trás, por favor.

    Retenho as palavras. Não vale a pena discutir, as algemas permanecerão nas minhas costas e não haverá nada a fazer. A viagem não vai ser confortável. O Magricela tem um dossiê na mão e suponho que as minhas proezas estão lá anotadas ponto por ponto. O risco não fará parte da transferência.

    ― Tudo bem, pergunta o polícia, não consegue puxar?

    ― Já vai abrir.

    Será bem necessário, não tenho mesmo escolha. Tomo o gosto àquilo que me espera enquanto abandonamos o edifício dos homens. Enquadrado por Magricela e Barbicha. O pátio de honra com os seus pequenos paralelos. A portada, enorme ferro-velho que não me permite imaginar um arranque em cima de um veículo, algemas nas mãos, atrás das costas. Um Ford Galaxy. Pelo menos não vou na carrinha prisional. Há um terceiro bófia ao volante, com o mesmo uniforme, com o mesmo rosto enrugado. Vou aqui atrás, do lado do passageiro. Na eventualidade de ter vontade de dar uma cabeçada no motorista. O Barbicha à minha esquerda.

    A viatura arrancou. Com o ruído do motor, sinto-me melhor. Aquelas horas passadas na Baumettes reavivaram as minhas angústias. Não tenho nenhum motivo para inquietar-me. Mas nisto de prisões nunca se sabe. Tenho uma noção fiel das capacidades desta administração. Durante estes últimos meses, vivi com um mau pressentimento. Eu sei que a prisão é uma coisa de gente hipócrita! Toda a gente parece querer-me tranquilizar, do guarda ao diretor e ao professor. «Não se inquiete, Senhor Ciardelli, você vai sair, Senhor Ciardelli.» Todos me tentam explicar o que eu já sei. O tribunal de Aix-en-Provence assinou o acordo de extradição entre a França e a Itália. Ponho as minhas inquietudes para trás

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