Gestão Estratégica Integradora de Design
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Gestão Estratégica Integradora de Design - Ana Paula Perfetto
REFERÊNCIAS
Prefácio
Por que a Gestão do Conhecimento interessa ao Design?
Quando um designer vai atender um novo cliente, qual é a sua primeira ação? Imaginemos que uma marca queira mudar sua identidade. Considerando que ela já tenha uma história, como o designer irá conhecer o que essa marca quer transmitir? Quem disseminará as informações sobre essa história ou a tradição que deve ser difundida nessa identidade? Obviamente, uma pessoa que tenha responsabilidade sobre ela e que tenha importância para ela, que saiba de tudo o que ocorreu durante sua trajetória e que, ainda que não tenha vivido o seu início, a conheça muito bem. A essa pessoa chamamos repositório cultural. Esse repositório traz a carga emocional da organização, tão necessária ao designer (a quem chamamos agente externo). A função do designer, então, no momento do briefing, é tentar extrair todo o conhecimento do repositório cultural. Para isso, ele precisará conhecer diferentes técnicas de como extrair esse conhecimento, deter certas habilidades para aplicar essas técnicas (e, claro, saber utilizá-las depois), saber comunicar-se com essa pessoa (considere o amplo sentido da comunicação), ter conhecimentos específicos (em design, em cultura e em outros fatores que você verá nesse livro), além de tomar determinadas atitudes que gerem confiabilidade, para que a pessoa de quem ele está extraindo o conhecimento sinta-se segurança.
Quando o designer consegue extrair conhecimento do repositório cultural, ele consegue produzir algo, seja marca, seja produto, enfim, um projeto de design (sem redundância) para o qual foi contratado, com sentido, mas, para isso, precisa reduzir esse conhecimento adquirido por meio de insights (também de conhecimento). Entretanto, quanto mais redução houver, mais frágil ficará o conhecimento para ser traduzido em forma. Se ele retirar conhecimentos importantes, poderá reduzir em formas não importantes (é como espremer uma laranja e tirar o suco bom – e não o suco da casca). Aqui, entra o design thinking (DT), que requer habilidades distintas, como a de saber fazer (conhecimento procedural), a de visual thinker (ver no espaço, intimidade com a imagem), a iniciativa de tomar atitude (para unir o que ele conheceu da organização com o que ele tem, sem interferir na personalidade dessa organização, mas tomando o cuidado de traduzi-la). Estamos, então, na fase de Produção, do design operacional, a de fazer. Depois de produzir, o designer, além de mostrar, precisa convencer o seu cliente, portanto, precisa de habilidade (e conhecimento) de comunicação (usando estratégias de apresentação, técnicas de contação de histórias e outras ferramentas estudadas pelo design).
Após a fase da Produção, diferentemente do que era há bem pouco tempo (em muitos casos, hoje ainda), o design deve gerenciar o seu projeto na organização, e não mais apenas entregá-lo. Nesse momento, é feita, novamente, uma grande redução (representada por um símbolo, por exemplo). Esse símbolo representa mesmo a empresa? Se a resposta for afirmativa, ela deve ser incorporada (integrada) na organização. Um dos maiores problemas, atualmente, é que o projeto não é explicado para quem o fará ou divulgará (considere aqui a organização, o projeto e quem estiver envolvido com ela), causando um grande ruído entre o que se planejou e o produto final, ou, novamente, reduções indesejadas: o fato é que causa uma quebra de conceito.
Ana Paula trata desse assunto em detalhes. Principalmente da Produção, extremamente importante para atividades que envolvem o design, não apenas para o design. Por que algumas pessoas conseguem traduzir no papel o que outra pessoa pensa? Por que é tão fácil para alguns e para outros não? Como os saberes extraídos das pessoas devem ser convertidos em conhecimentos organizacionais? Como o designer os codifica? Falhas em produtos no mercado estão relacionadas a como o designer extrai conhecimentos das comunidades? Como codificar os conhecimentos das pessoas certas e da forma certa?
Essas questões são respondidas neste livro, que nos mostra que, ao contrário de um anjo que desceu do céu, algumas habilidades alguns têm mais que outros; que umas podem ser desenvolvidas e, outras, não. O designer pode não ter todas essas competências, bem como o gestor pode não ter as habilidades de design (o anjo ajuda alguns). Ana clarifica essas questões, enfatizando que este é um aspecto cada vez mais presente em trabalhos de design: a colaboração, o trabalho colaborativo, o conhecimento compartilhado. Por isso é tão importante que os empresários saibam reconhecer essas habilidades nas pessoas que compõem sua equipe. Alguns são estratégicos, outros operacionais, outros conseguem abstrair os que outros pensam e colocar esse pensamento no papel e, melhor ainda, no desenho. Em uma época de mundo e marketing 4.0, em que o 3.0 já é sine qua non (para não dizer superado), no qual as histórias e as pessoas, ou as histórias das pessoas, são tão valorizadas, num resgate ao terceiro renascimento, abstraí-las e traduzi-las graficamente de forma eficiente torna-se um desafio para um gestor. Ele tem que saber que não precisa saber fazer, mas gerenciar – e encontrar uma pessoa com habilidades de design thinking. Um designer? Nem é preciso (desculpem-me, meus colegas designers, mas o mundo é de quem sabe, de quem detém o conhecimento e de quem faz o que faz com esse conhecimento), mas a habilidade que a maioria deles tem, sim.
Ana define o conhecimento de organizações colaborativas e analisa se ele está incorporado às suas identidades (e de que forma). Define Gestão do Conhecimento, define Conhecimento Organizacional, como é produzido e incorporado, mostrando, por meio de uma pesquisa com vinhos, como é feita a tradução desse conhecimento, e trata da Gestão do Conhecimento em uma abordagem estratégica – design estratégico, que significa muito mais do que somente definir o caminho que o design irá percorrer durante um processo –, logo, vai além de Estratégia de Design. É, portanto, Gestão de Design, que estabelece a inserção adequada do design nas organizações, gerencia os recursos humanos e materiais, integrando áreas, e abrange desde a concepção de um projeto até a implantação de uma cultura empresarial que envolva sua imagem. A Gestão de Design deve iniciar-se pelo nível estratégico.
Se a meta da Gestão do Conhecimento é atingir e manter uma inovação sustentada no processamento do conhecimento, todo gestor vai querer ler. Todo designer, também.
Rosane Fonseca de Freitas Martins
Cleuza Bittencourt Ribas Fornasier
Introdução
O ato real de descobrimento não consiste em encontrar novas terras, mas em vê-las com novos olhos.
(Marcel Proust)
As mudanças e as influências da globalização econômica (com todas as características da era industrial) na organização do trabalho e nos ambientes organizacionais têm alterado o padrão de consumo, o ciclo de produção em massa e o consumo sem sentido: isso não é mais aceitável. Em um novo cenário, os consumidores mudaram suas expectativas: de funcional, para uma experiência mais ampla, que deixa nebulosa a linha que divide design operacional e design estratégico (um não funciona sem o outro). A forma como essas mudanças serão superadas tem merecido atenção e, assim como é do instinto humano adaptar-se ao ambiente para sobreviver, também os negócios precisam adaptar-se às mudanças. As estratégias utilizadas até hoje estão sendo questionadas por uma sociedade capitalista em constante mudança. E ainda bem que é assim. Conforme Drucker (2002), nenhuma sociedade pode operar como sociedade sem conceder aos seus membros uma posição e uma função social. O lucro sempre foi e sempre será uma das principais forças motivadoras das pessoas. A sociedade capitalista foi a primeira e única a fundar seus alicerces no lucro e a valorizá-lo como positivo e aquele no qual uma sociedade livre e igualitária seria fundada.
O capitalismo se tornou dominante e a sociedade tende a tornar isso natural. Segundo Singer (2002, p. 10), o Capitalismo é um modo de produção cujos princípios são os direitos de propriedade individual aplicados ao capital e ao direito à liberdade individual
. Esse modo de produção também tem sido questionado por causa de seus efeitos sociais, culturais e econômicos. Os que dominam o capital e suprem as necessidades da sociedade vencem, e, se existem vencedores, também existem os perdedores. Portanto, o capitalismo gera a desigualdade crescente devido à competição, verdadeira polarização entre ganhadores e perdedores. No entanto, como os que não sobressaem precisam sobreviver, buscam canais alternativos para isso.
Para que houvesse uma sociedade na qual a forma de produção e consumo e a distribuição de riqueza fossem igualitárias, ou no mínimo justas, alguns estudiosos defendem que seria necessário que a economia fosse solidária. Para Singer (2002, p. 10), a economia solidária é outro modo de produção cujos princípios básicos são a propriedade coletiva ou associada do capital e o direito à liberdade individual
, ou seja, baseada no cooperativismo. Porém, mesmo que os empreendimentos solidários cooperassem
entre si, seria inevitável que algumas organizações se sobressaíssem a outras, havendo, portanto, organizações ganhadoras e perdedoras. Para manter a igualdade, seria necessário que o poder estatal redistribuísse dinheiro dos ganhadores para os perdedores, o que conflita com os princípios de uma sociedade capitalista.
Ocorre que esses empreendimentos se isolam e dependem do consumo solidário, o que os relega a um patamar de produtividade muito mais baixo que a média das empresas capitalistas. Dessa forma, separar esse tipo de economia solidária do seu entorno só funcionaria se isso propiciasse o surgimento de uma sociedade pós-capitalista, com mudanças radicais no padrão de consumo. A sociedade capitalista está em transição, e o que se vê é uma sociedade que, apesar de mudanças nos padrões de consumo, mantém as características desenvolvidas sob o domínio do capitalismo, no qual os meios de comunicação de massa são parceiros do capital monopolista e cuja única preocupação é manter a ordem estabelecida, o lucro.
O fato é que os empreendimentos solidários, para competir em condições de igualdade, terão de tornar-se competitivos. No Brasil, eles surgem com o nome de cooperativas ou de unidades familiares de produção, cuja gestão, a propriedade e a maior parte do trabalho vêm das pessoas que possuem laços de sangue ou de casamento (ABRAMOVAY apud STRAPASOLAS, 2006). Esses empreendimentos têm trabalhado de forma colaborativa, constituindo comunidades colaborativas que, por sua vez, devem adotar a inovação social.
Inovação social, segundo Manzini (2008), é uma mudança no modo de agir de pessoas ou comunidades para resolver seus problemas ou criar oportunidades. Essas comunidades, definidas como comunidades criativas, têm a necessidade de inventar, aprimorar e gerenciar soluções de forma criativa focadas nos novos modos de vida. Brown (2009) sugere que estas comunidades formulem um novo contrato social participativo, no qual não é mais possível pensar em termos adversários, o mercado comprador
e o mercado vendedor
– é necessária uma nova maneira de pensar.
Para tornarem-se comunidades colaborativas, a essência cultural das unidades familiares de produção deve ser convertida em produtos, assim como ter valor agregado. Para que isso ocorra, defendemos, neste livro, a necessidade da adoção do design thinking, que significa, grosso modo, pensar como um designer, tema que exploraremos mais detalhadamente no decorrer do livro.
As definições de design thinking que usaremos aqui baseiam-se basicamente nos autores Tim Brown e Roger Martin (2009). Para Martin (2009), design thinking é a
disciplina que utiliza a sensibilidade e os métodos do designer para corresponder as necessidades dos consumidores, com o que é tecnologicamente factível, e o que a estratégia viável de negócio possa converter em valores para consumidores e oportunidades de mercado (MARTIN, 2009, p. 62).
Acreditamos que, utilizando o design thinking, essas comunidades trabalharão de forma criativa e colaborativa e gerarão casos promissores. Quando isso acontece, elas se tornam organizações colaborativas que podem ser classificadas como serviço social, empreendimentos colaborativos e cidadãos colaborativos (MANZINI, 2008). Vamos adotar, aqui, a terminologia organização colaborativa, que é mais abrangente.
A organização colaborativa não pode ser imposta, pois é formada geralmente por sujeitos que possuem valores e culturas comuns. Qualquer intervenção externa de agrupamento coloca em risco a harmonia das relações interpessoais. Dessa forma, são aquelas que, reunidas espontaneamente por meio de um contexto cultural específico, capitalizam as capacidades dos membros da equipe de forma eficaz, em um conjunto fluido de interdependência que ocorre por meio da rede integracional e emocional (do prazer pelo trabalho, pelo aprendizado contínuo, pela consciência individual e de equipe, do sentido da organização, que reforça a responsabilidade de cada um pelo todo) para criar estruturas, culturas e práticas participativas com um objetivo comum (BEYERLEIN et al., 2003). Essas organizações são focadas no consumo solidário.
O consumo solidário é praticado para contribuir socialmente para o bem-viver de toda a coletividade, pois é no consumo que a produção se completa (MANCE, 2002), e é ele quem impacta sobre todo ecossistema e sobre a sociedade em geral. As pessoas que consomem focando o bem-viver não se deixam levar pelos meios de comunicação, mas, sim, pela força do conceito atrelado ao produto. Nesse contexto, o design se torna indispensável para a competitividade dessas organizações, que têm evidenciado a necessidade de seu emprego. No ambiente econômico atual, os investimentos voltados para a área de design deixaram de ser uma questão estética e tornaram-se uma questão estratégica (BAHIANA, 1998). As organizações colaborativas que adotarem o design, ou, mais especificamente, as habilidades e as posturas do designer, sairão à frente dos concorrentes, tornando seus produtos diferenciados, reforçando os seus valores conceituais, certificando procedências e racionalizando os custos de produção.
A vida das organizações colaborativas brasileiras tem