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Educação: Políticas, Cultura e Transdisciplinaridade
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E-book432 páginas9 horas

Educação: Políticas, Cultura e Transdisciplinaridade

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Sobre este e-book

Este livro é resultado de uma coletânea de textos dos pós-graduandos de mestrado da área da Educação, de modo a realizar experimentações sobre políticas educacionais, cultura e transdisciplinaridade na educação. Os textos são atravessamentos que se constituem em importantes trabalhos que envolvem discussões teórico-metodológicas acerca do cenário educacional na Amazônia. Os autores buscaram revelar práticas curriculares e educativas em diferentes contextos abrangendo lentes das identidades que, ao mesmo tempo, se problematizam e se entrelaçam na trama socioeducativa amazônica. Destina-se a profissionais da educação, movimentos sociais, pós-graduação em educação, além de pesquisadores de outros campos científicos que dialogam e têm interesse por essa temática. A intenção desta obra é ampliar as interfaces das pesquisas na área de Currículo, Políticas Educacionais e Cultura na região da Amazônia. O livro contém duas partes Sociedade, cultura e transdisciplinaridade e Políticas de educação. A organização é de um grupo de docentes e discentes do programa de pós-graduação em Educação (PPGED) e do programa de pós-graduação em Currículo e Gestão de Escola Básica (PPEB), ambos da Universidade Federal do Pará (UFPA). Laís Campos e Camila Souza
IdiomaPortuguês
Data de lançamento20 de dez. de 2018
ISBN9788546213054
Educação: Políticas, Cultura e Transdisciplinaridade

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    Pré-visualização do livro

    Educação - Larissa de Nazaré Carvalho de Aviz

    2018.

    APRESENTAÇÃO

    Profa. Dra. Ney Cristina Monteiro de Oliveira²

    Tenho a honra e a satisfação de apresentar esta obra de um grupo de ex-alunos e ex-alunas, jovens pesquisadores, mestres em Educação, egressos do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPA, que se comprometeram com um projeto coletivo de reunir suas pesquisas em um único documento, revelando o investimento feito ao longo do processo de formação pós-graduada.

    Os temas aqui apresentados são abordados por educadores fortemente vinculados com a realidade da educação pública brasileira, paraense e amapaense, do que resulta um texto dotado de profundidade e profissionalismo, além de boa base teórica. Respeitadas as especificidades dos objetos de pesquisa, guardam articulação na contemporaneidade dos assuntos e das abordagens empregadas.

    A educação, ao sintonizar-se com a promoção social e intelectual das camadas populares, prepara cidadãos que resistem à submissão realizada por projetos impostos de fora e de cima, que não se instrumentalizam pelo mercado, mas assumem uma concepção de democracia que institui sujeitos políticos ativos e capazes de responsabilidades sociais, de reinventar o mundo e recriar modos de intervenção. Este livro carrega esta possibilidade, pois os(as) autores(as) com a formação teórica conquistada no mestrado possuem o conhecimento que é indispensável para uma intervenção consequente.

    Enquanto espaço transdisciplinar este livro analisa as questões da educação que se mostram nas juventudes da periferia urbana, ribeirinha e da floresta, jovens e adultos invisíveis na cegueira crônica das políticas públicas pouco eficazes; tratam ainda da formação de educadores que estão no campo, no quilombo, nas áreas de reserva ambiental, nos interiores amazônicos.

    Os autores trouxeram ainda possibilidades de análise sobre o discurso da qualidade na escola pública brasileira, os desafios da implantação da escola integral em tempo integral, as políticas de valorização da carreira docente, as práticas educativas realizadas em espaços formais e não-formais, em dimensões curriculares que não se realizam somente na escola.

    Este projeto coletivo, um livro escrito por muitas mãos, além das virtudes teóricas, contém o olhar crítico da prática próxima. Traz à baila a experiência de autores que não só estudaram e problematizaram temas importantes, mas queriam confrontar-se com os grandes desafios da educação.

    O interesse de colocar a público seus achados denota o tamanho do desafio assumido, do olhar arguto de gente que não se dispõe a apenas questionar a realidade, mas questiona a condição efetiva a partir da qual se realiza a educação pública para milhares de crianças, jovens e adultos sujeitos de direitos. Questiona a falta de investimentos, os frágeis arranjos institucionais que impedem que se faça uma educação verdadeiramente democrática e de qualidade para todos. Questiona a si mesmo e coloca novos desafios para a vida.

    Recomendo este livro não só para os interessados em conhecer os processos percorridos por estes(as) jovens pesquisadores(as), mas também a todos os que pretendem transformar a sociedade e a escola pública que temos na escola pública que sonhamos para nossos filhos, cidadãos e cidadãs brasileiros(as).

    Nota

    2. E-mail: .

    SOCIEDADE, CULTURA E TRANSDISCIPLINARIDADE

    1. JUVENTUDE DA CLASSE TRABALHADORA E SUAS EXPECTATIVAS EM UMA ESCOLA DE PERIFERIA EM BELÉM DO PARÁ

    Rodrigo Moraes

    Considerações iniciais

    Este texto é fruto da pesquisa realizada para a construção da dissertação de mestrado na Universidade Federal do Pará, com o título Trabalho e educação: expectativa do jovem da classe trabalhadora quanto às possibilidades da escola de ensino médio da periferia de Belém ser contributiva para sua inserção no mercado de trabalho.

    Nesta perspectiva, optei por abordar o tema juventude partindo de um recorte de classe, compreendendo que sua condição de classe trabalhadora é fundamental na sua identidade e construção social. Não nego, entretanto, suas características biológicas, etárias e suas relações cotidianas. Essa heterogeneidade possibilita ratificar que não se pode falar em uma juventude, mas em várias juventudes. Assim, para Frigotto (2004), ao optarmos por essa compreensão, podemos levar em conta particularidades e até aspectos singulares sem cair em uma perspectiva atomizada.

    Posto isto, não abordo a juventude como uma característica homogênea, pois reconheço suas particularidades e individualidades subjetivas, porém, sua condição de classe é algo que unifica o ser jovem.

    Assim, trabalho na visão que não existe juventude, mas juventudes, respeitando suas particularidades sem negar sua condição de classe, portanto, abordo a questão juvenil e suas expectativas a partir de sua inserção classista na sociedade. Para Thompson (2015), classe é uma categoria histórica, ou seja, é derivante de processos sociais através dos tempos.

    Ao entender a inserção da juventude na sociedade a partir de sua condição de classe, reforço a compreensão de uma escola dual, fruto da divisão da sociedade capitalista. Para Moraes (2016), a divisão da sociedade gerou duas classes antagônicas: a burguesia e o proletariado; gerou a exploração da classe burguesa sobre a classe trabalhadora e possibilitou o acirramento da dualidade na sociedade e, em consequência, na escola.

    A burguesia é detentora dos modos de produção e vive da exploração do trabalho da classe trabalhadora, enquanto o proletariado vive de sua força de trabalho e não tem acesso à maioria das riquezas que produz.

    Para Thompson (1977), a classe se delineia segundo o modo como homens e mulheres vivem suas relações de produção e segundo a experiência de suas situações determinadas, no interior do conjunto de suas relações sociais, com a cultura e as expectativas a elas transmitidas e com base no modo pelo qual se valeram dessas experiências em nível cultural (p. 31).

    A escola dual, fruto do modo de produção capitalista, se mantém com um ensino propedêutico e cientifico para os filhos da burguesia e um ensino aligeirado para os filhos da classe trabalhadora.

    A escola que existe no Brasil reflete essa divisão, essa dualidade educacional, a qual é fruto de um processo de construção histórica, constituído a partir do desenvolvimento do modo de produção capitalista. Para Thompson (1977), a classe está presente desde o início, como um resultado de relações de produção, daí derivando a luta de classes. Lênin (2007) reforça o conceito da divisão de classes ao afirmar que, para Marx, o Estado é um órgão de dominação de classes, um órgão de submissão de uma classe por outra, é a criação de uma ordem que legalize e consolide essa submissão. Nesta perspectiva, o Estado vai reforçando a dualidade em todos os setores da sociedade, e a educação não fica de fora deste processo de consolidação do ethos capitalista, pois a escola, por estar inserida organicamente na sociedade dualista, também se torna dual, reproduzindo internamente essa divisão. (Moraes, 2016, p. 26)

    Portanto, parto da premissa de que as juventudes da classe trabalhadora são construídas a partir de suas relações concretas com o modo de produção capitalista que, ao impor a divisão do trabalho na sociedade, constitui a dualidade na escola.

    O texto está dividido em três seções, na primeira, se discute a relação da juventude e classe social, ancorando-se no materialismo histórico para afirmar a existência da condição de uma juventude da classe trabalhadora. Em seguida, tratamos da dualidade da escola, em especial na periferia de Belém, depois, são apresentadas as expectativas dos jovens filhos da classe trabalhadora em relação à escola Mario Barbosa na periferia de Belém.

    1. Juventudes da classe trabalhadora: é questão de classe!

    Reconhecer o recorte de classe na análise do ser jovem pressupõe compreender que a sociedade é dividida em classes sociais, burguesia e proletariado, e que essa divisão decorre do modelo de produção capitalista.

    Porém, com a queda do muro de Berlim em 1989, emergiu um pensamento de negação da luta de classes e, consequentemente, do recorte classista nas análises das condições sociais dos sujeitos, no caso da juventude isso foi fortemente reforçado.

    Essas teorias compreendem que não se pode estudar os fenômenos sociais e suas relações com os indivíduos a partir de uma análise classista, mas a partir de sua individualidade e subjetividade.

    Aceitação desta ideia é a de que as metanarrativas, que se propõem a explicar os problemas e as soluções que afetam a humanidade (as grandes teorias tais como o marxismo e o liberalismo) teriam perdido a sua força explicativa já que não haveria mais a possibilidade de explicar o mundo ou mesmo de entendê-lo e porque as explicações existentes focavam principalmente na organização do trabalho na sociedade humana. Assim as teorias pós-modernas passam a defender a imperspicuidade da realidade (Habermas, 1987), a impossibilidade de um conhecimento objetivo (científico) da sociedade, a falibilidade das teses que prometiam a possibilidade de felicidade humana pela revolução social (marxismo), pela liberdade do mercado (liberalismo) ou pela aceitação das leis de deus (cristianismo), a possibilidade de, apenas, compreender, subjetivamente, o espaço vital e o mundo do cotidiano. (Rorty, 1988; Araujo; Benedita; Moraes, 2016, p. 3)

    Essa concepção pós-moderna foi amplamente aceita no debate relacionado à juventude e sua condição, a análise de sua relação com a sociedade passou a ser compreendida pela subjetividade, pelas relações cotidianas, por questões de gênero, de raça e afins, sempre relativizando ou até mesmo negando a condição de classe do ser jovem.

    Compreendo ser preciso reconhecer essas individualidades, suas subjetividades e as várias questões que norteiam a constituição da condição juvenil no Brasil, não é possível negar as relações do cotidiano, assim não entendo ser possível caracterizar de forma homogênea a juventude; ao partir da premissa da heterogeneidade das relações do jovem é que reconheço que existe JUVENTUDE.

    Nesta perspectiva é que se estabelece não ser possível caracterizar o jovem partindo de uma homogeneidade, de uma única identidade juvenil, pois as características diversas vão se constituindo de forma heterogênea, evidenciando as suas mais variadas formas de ser. Assim, se pode reafirmar que existem várias juventudes, várias identidades juvenis, caracterizadas por jovens que se aglutinam em torno de algo em comum, e que se diferenciam entre si. (Moraes, 2016, p. 56)

    Ao reconhecer a diversidade da realidade dos jovens, suas particularidades, é que entendo sua inserção na sociedade e, em especial, na escola, assim, é imprescindível que o processo de ensino reconheça os sujeitos que fazem seu cotidiano.

    Analiso a realidade escolar a partir de sua dualidade, fruto da divisão estabelecida pelo modelo capitalista que norteia as relações educativas em nossa sociedade. Assim, faço a mesma análise e recorte da questão juvenil.

    Ratifico que não é possível negar as questões subjetivas e cotidianas da condição juvenil, por isso não se caracteriza de forma homogênea o jovem, porém entendo que existe algo que caracteriza de forma unitária esses jovens, a saber, sua condição de classe.

    Esta complexidade e esta controvérsia têm início com a dificuldade de ter-se um conceito unívoco de juventude, tanto por razões históricas quanto por razões sociais e culturais. Assim é necessário, de imediato, não tomá-lo de forma rígida. Mais adequado seria talvez falar, como vários autores indicam, em juventudes, especialmente se tomarmos um recorte de classe social. (Frigotto, 2004, p. 54)

    Assim, é fundamental estabelecer a relação entre o cotidiano do jovem e sua condição classista. Para Moraes (2016), mesmo compreendendo a importância de se considerar as diferenças culturais e individuais dos jovens que se aglutinam nas mais variadas tribos juvenis, busco analisar esses jovens partindo de sua condição de classe, compreendendo a sua inserção social a partir do modelo de produção capitalista.

    Classes sociais significam para o marxismo, em um e mesmo movimento, contradições e luta das classes: as classes sociais não existem a priori, como tais, para entrar em seguida na luta de classe, o que deixa supor que existiriam classes sem luta das classes. As classes sociais abrangem as práticas de classe, isto é, a luta de classes. (Poulantzas apud Miguel, 2004, p. 26)

    Parto, então, da perspectiva de que a classe social é a categoria sociológica fundamental na análise da condição juvenil e suas relações na sociedade. Segundo Moraes (2016), mesmo as classes sociais adquirindo centralidade nesta análise, é fundamental compreender a heterogeneidade da juventude, suas crenças, cultura, gostos, práticas esportivas e um conjunto de afinidades e formação sócio-histórica que vão desenvolvendo as várias juventudes, inseridas aí as juventudes da classe trabalhadora.

    Posto isto, é fundamental reconhecer as variadas formas de relações que se estabelecem no seio da juventude, assim reconhecer que existem JUVENTUDES, mas não se pode negar a classe social como categoria mais importante na análise da condição dessas juventudes, assim compreendo que existem as JUVENTUDES da CLASSE TRABALHADORA.

    2. A dualidade na escola e as juventudes da classe trabalhadora

    Assim como as juventudes que estão inseridas em uma sociedade capitalista, a escola também sofre influência desse modo de produção, sendo, segundo Althusser (1987), espaço de reprodução da dualidade existente na sociedade.

    A sociedade dividida em classes também estabelece uma divisão social da escola, sendo que a escola que serve as juventudes da classe trabalhadora tem um ensino aligeirado e concentrado na aquisição de habilidades básicas para o desenvolvimento do jovem, em contrapartida a escola que serve as juventudes mais elitizadas tem um ensino propedêutico voltado para a aquisição de amplas habilidades para o seu desenvolvimento e consequente inserção na sociedade.

    Nesta perspectiva educacional, é relegada aos jovens filhos da classe trabalhadora uma educação aligeirada e uma preparação precária para o mercado de trabalho, enquanto que, para os jovens da burguesia, proporciona-se o ensino propedêutico, a preparação para o prosseguimento dos estudos e para a inserção nos melhores e mais bem remunerados postos de trabalho, além da preparação para postos de comando na hierarquia social. (Moraes, 2016, p. 26)

    É preciso compreender a sociedade e a escola a partir da divisão em classes que se originaram na divisão social do trabalho e dos meios de produção. Para Thompson (1977), classe é uma categoria histórica, ou seja, deriva de processos sociais através do tempo. Segue afirmando que:

    A classe se delineia segundo o modo como homens e mulheres vivem suas relações de produção e segundo a experiência de suas situações determinadas, no interior do conjunto de suas relações sociais, com a cultura e as expectativas a elas transmitidas e com base no modo pelo qual se valeram dessas experiências em nível cultural. (p. 31)

    É a partir de tal realidade que faço a análise da escola, de sua dualidade e da inserção do jovem da classe trabalhadora no processo educacional formal. Saviani (2012) reforça que aos jovens da classe trabalhadora é destinada uma formação geral. Em seguida, há uma sondagem de aptidão e o encaminhamento para o mercado de trabalho.

    Ora, vejam vocês como está aqui de modo bem caracterizado aquilo que chamo o aligeiramento do ensino destinado as camadas populares. Desta maneira, o ensino das camadas populares pode ser aligeirado até o nada, até se desfazer em mera formalidade. (Saviani, 2012, p. 54)

    A escola que existe no Brasil reflete essa divisão, essa dualidade educacional, a qual é fruto de um processo de construção histórica, constituído a partir do desenvolvimento do modo de produção capitalista.

    A situação dos jovens da classe trabalhadora, que já é extremamente precária na periferia das grandes cidades, torna-se mais complexa na periferia das cidades mais periféricas do capitalismo, como é o caso de Belém do Pará. Essa perspectiva serve também para as escolas que estão inseridas na periferia da nossa cidade.

    Nossa juventude trabalhadora paraense é constituída por ribeirinhos, quilombolas, assentados, indígenas, agricultores, moradores das periferias das grandes cidades. Em trabalho recente (Araujo e Alves, 2014) afirmavam a situação de precariedade e vulnerabilidade em que vive grande parte da juventude trabalhadora. São jovens que sofrem com a violência urbana, com o trabalho infanto-juvenil, o trabalho escravo, a inserção precoce no mercado de trabalho, a desescolarização e condições precárias de moradia. (Araujo; Benedita; Moraes, 2016, p. 7)

    São esses jovens da classe trabalhadora, que estudam em escolas da periferia da cidade de Belém, que estão sujeitos a ensino precário fruto da dualidade da sociedade.

    É importante frisar que mesmo a escola inserida no capitalismo e reproduzindo sua dualidade, consegue, a partir de suas contradições e construções sócio-históricas, constituir ações e possibilidades de ruptura com o aligeiramento do processo formativo. As práticas docentes e ações da comunidade escolar podem, a partir de uma perspectiva crítica, formular um ensino mais amplo e propedêutico na formação dos jovens da classe trabalhadora.

    Essas contradições no interior da escola também refletem as contradições da sociedade capitalista, movimentos de luta e resistência em defesa de um ensino público e com qualidade, que possam oferecer aos jovens da classe trabalhadora o mesmo ensino destinado aos jovens da burguesia.

    Desta forma, vão se construindo espaços contra-hegemônicos dentro da própria escola, que visam garantir uma nova função social para ela, em detrimento da função de reprodução do modelo de produção capitalista.

    A possibilidade de garantir aos jovens filhos da classe trabalhadora uma educação mais científica dos conteúdos sistematizados e com métodos de ensino que possibilitem a assimilação destes conteúdos vai se tornando o orientador da ação contra hegemônica no interior da escola. As preocupações com o cumprimento da principal finalidade do processo educativo, que é a formação humana e o desenvolvimento das condições para o exercício da cidadania plena pelos sujeitos em sua vida social, leva-nos a compreender que a educação científica é uma condição necessária ao desenvolvimento da pessoa humana. (Ramos, 2008, p. 3)

    Para Saviani (2012), a questão escolar na sociedade capitalista é objeto de disputa, dada a sua divisão em classes com interesses opostos. A disputa ocorre porque se reafirma um caráter dual do processo de ensino.

    A função que a escola exerce nessa sociedade é fruto do processo histórico contemplado pela dualidade na sociedade capitalista, conforme expõe Gramsci (2011), no momento em que discorre sobre a divisão fundamental da escola em Clássica e Profissional: a Escola Profissional destinava-se às classes instrumentais, enquanto que a Clássica se destinava às classes dominantes e aos intelectuais. (Moraes, 2016, p. 32)

    Segundo Frigotto (2005), a imensa desigualdade educacional ganha compreensão, nesse contexto, como expressão da forma de constituição de nossa formação histórica, ou seja, de modernização conservadora, de interdependência e dependência associada ao grande capital.

    Por ser a escola uma instituição produzida dentro de determinadas relações sociais, este retrato só ganha melhor compreensão quando apreendido no interior da especificidade do projeto capitalista de sociedade, que foi sendo construído no Brasil: um longo processo de colonização (econômica, político-social e cultural), sendo a última sociedade a proclamar o fim da escravidão. (Frigotto, 2005, p. 7)

    Partindo da reafirmação da dualidade educacional, em especial das regiões periféricas do país, pois é nela que está inserida a Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Mário Barbosa, situada na Avenida Tancredo Neves (Perimetral), ao lado da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), no bairro da Terra Firme.

    Foi nesta escola, de um bairro de periferia da grande Belém, que realizei a pesquisa com jovens da classe trabalhadora que norteou a produção deste capítulo. O bairro concentra parte da população de baixa renda do centro da capital e sofre com carência de serviços básicos (saneamento, em especial). Esse fator foi determinante para a escolha da escola Mario Barbosa como objeto de pesquisa, pois ela está localizada em um bairro carente, onde se concentra boa parte da fração mais pobre da classe trabalhadora de Belém.

    3. As expectativas dos jovens da classe trabalhadora em relação à escola

    Após afirmar que os jovens e a escola necessitam ser compreendidos tendo a divisão de classes como categoria sociológica determinante, constituindo, assim, a definição da condição juvenil como juventudes da classe trabalhadora e a escola a partir de sua dualidade, faz-se necessário analisar as expectativas que estes jovens têm da escola, escutando suas vozes. A pesquisa buscou então fazer a análise partindo do sujeito, do jovem, mas não de forma atomizada, mas sempre compreendendo sua condição de classe e a sociedade em que está inserido.

    A pesquisa buscou analisar, nas falas desses jovens estudantes, as seguintes categorias: escola, universidade e mercado de trabalho. Durante a realização do grupo focal, pude perceber que a principal expectativa desses jovens é o acesso à universidade e, com isso, buscar uma vida mais confortável por meio de uma melhor inserção no mercado de trabalho.

    Os sujeitos da pesquisa são estudantes do primeiro ano do ensino médio da Escola Mario Barbosa, e com eles foi realizado um grupo, e a partir de suas falas ficou nítido algumas expectativas em relação à escola.

    As expectativas desses jovens em relação à escola relacionam-se à possibilidade de prosseguimento nos estudos para, após a formação superior, terem um bom emprego e uma vida melhor no futuro. Eles não nutrem uma expectativa de inserção imediata no mercado de trabalho; enxergam, antes, a possibilidade de ingresso em uma universidade e, após a conclusão do curso, a inserção no mercado de trabalho.

    Nesta perspectiva, apresento, neste capítulo, as categorias analisadas a partir da fala dos sujeitos:

    Sobre o mercado de trabalho – esses jovens sonham em trabalhar apenas após a conclusão do ensino superior. Nenhum tem a expectativa de concluir o ensino médio e adentrar de forma imediata no mercado de trabalho. A maioria quer ter um bom emprego, e compreendem que só com a conclusão do nível superior é que terão condições de ter uma boa inserção no mercado de trabalho.

    Com certeza, se eu quiser um emprego bom, lá na frente eu vou ter que passar por isso. (L.B.)

    A gente vai ter uma concorrência de emprego, a gente vai ter concorrência e aí entre o mercado onde tu estiveres... O teu chefe vai escolher alguém que tenha um ensino superior ou alguém que tenha só o médio? (M.C.L.)

    As falas desses jovens ratificam o elemento de não apenas ingressar no mercado de trabalho, mas ter boas condições para essa inserção, partindo de uma formação mais qualificada, a partir da conclusão de um curso de nível superior.

    Sobre a escola – esses jovens fazem críticas à estrutura da escola, mas, ao mesmo tempo, elogiam ações de professores que contribuem para a sua formação; encaram que a escola pode contribuir nas suas expectativas, porém, de forma bem contundente, apresentam que a escola Mário Barbosa não dá a eles as condições ideais para a possibilidade de ingresso em uma universidade.

    A greve impossibilitou a gente de ter alguns estudos para a gente fazer o ENEM esse ano. (M.C.L.)

    Essa greve realmente foi o que nos prejudicou, tipo, a gente não tem conteúdo suficiente para entrar numa prova tão importante como essa. (S.R.)

    Não é só a greve que atrapalha os estudos tipo ENEM, vestibular, esse tipo de coisa. Acho também que a estrutura de escolas, por exemplo, é uma, falta de professor que não tem. Às vezes tem um professor que manda fazer resumo, ninguém aprende fazendo resumo. (C.M.)

    Nas falas acima, os jovens M.C.L., S.R. e C.M. expressam as problemáticas ocasionadas pela greve dos trabalhadores em educação no Pará, mas, ao mesmo tempo em que surgem esses questionamentos acerca da greve, os jovens demonstram compreender o motivo que leva os trabalhadores a aderirem a esse recurso de luta:

    Eu acho (...) eu acho que não foi por causa do governo, foi por falta dele, por falta de apoio dos professores, porque o professor daqui do estado não recebe o piso salarial dos outro, não recebe o piso salarial do/ de político (...) o professor está educando a gente, o professor está ensinando a gente... É, está dando conhecimento, eles estão (com) falta de dinheiro, claro, ninguém vai chegar aqui e se matar estudando para chegar e dar aula para aluno de graça, ninguém quer isso, trabalhar e não ganhar nada. Eles estão lutando pelos direitos deles, mas não só deles, o direito de alunos, direito de uma escola melhor, de uma escola justa. Acho que é isso... A greve... Gira em torno... Não gira só em torno de dinheiro pros professores... Gira em torno de/ de um conceito tanto pro professor quanto pro aluno. (C.M.)

    Acredito que a profissão do professor é uma das mais importantes, eu acredito que deveria ser uma das mais pagas no Brasil também, porque a gente tem que entender que o professor, ele em nossa/ em toda nossa vida, praticamente, ele nos ensina e também nós deveríamos (...) em alguns lugares do mundo o professor é como se fosse, não um Deus, mas só que ele é respeitado, uma coisa que no Brasil, que infelizmente não tem, é respeito, é o salário também que é uma porcaria. O governo que é uma porcaria também, que não paga. (L.B.)

    Neste movimento, os jovens entendem a greve, mas compreendem-na como um elemento que não contribui na sua formação, o que atrapalha o papel que a escola pode desenvolver em sua inserção no mercado de trabalho e na universidade.

    Os jovens, que possuem a expectativa de ingresso no ensino superior e de uma inserção qualificada no mercado de trabalho, através da educação, começam a encarar a dura realidade da educação pública no Estado do Pará e como essa realidade pode ser um entrave no anseio de suas expectativas.

    As falas dos jovens M.C.L., S.R. e C.M. trazem elementos importantes sobre o papel desta Escola, em particular, ser contributiva para as suas expectativas. São elementos que vão do macro, como greves e falta de investimentos, ao micro, como os métodos pedagógicos de cada professor em sala de aula.

    Essa avaliação também perpassa pela análise dos jovens estudantes que apresentam, em suas falas, aspectos referentes à escola e, ainda de forma bastante acentuada, a crítica ao papel que ela desempenha em suas vidas. Portanto, a avaliação que fazem da escola é negativa.

    Falta de material que não tem, falta de livro. Eu estudo nesta escola desde a 5ª série; foi a primeira vez que tive aula com Datashow. (C.M.)

    Eu não vou fazer o ENEM, por causa da escola não [ter] preparatório. (L.B.)

    A greve atrapalhou muito, muita gente. Eu vou tentar fazer o ENEM porque já estava inscrita. (A.F.B.)

    A bolacha Maria é cruel, a gente só tem bolacha Maria e Trigolino, bolacha Maria e água... Água esses dias estava imunda. (M.C.L.)

    Sobre a universidade – os jovens compreendem que o caminho para uma boa inserção no mercado de trabalho é ter uma formação superior, nutrindo a expectativa de ingressar, ao término do ensino médio, na universidade, e ter, segundo eles, uma boa profissão.

    Essa perspectiva aparece em todas as falas. Os jovens M.F. e C.M. apontam, como expectativa de futuro, a formação superior. M.F. nutre a expectativa de estar formada em Música, enquanto C.M. deseja ser bióloga.

    Já estar formada em Música. (M.F.)

    Eu me vejo formada na área de Biologia. (C.M.)

    Um fator que considero ter contribuído com essa expectativa é o fato de uma inserção cada vez maior de jovens oriundos das classes trabalhadoras nas universidades. Com isso, essa expectativa passa a fazer parte, mesmo que ainda de forma muito pontual, da vida desses jovens estudantes das escolas públicas da cidade de Belém. Isso vai se reafirmando quando falam de suas expectativas de futuro.

    Considerações finais

    Este capítulo se ancora no resultado da pesquisa realizada sobre as expectativas dos jovens da classe trabalhadora em relação à escola Mario Barbosa, na periferia de Belém, ser contributiva para sua inserção na sociedade, em especial no mercado de trabalho.

    A partir da concepção do materialismo histórico dialético, foi constituído o conceito sobre identidade juvenil, que tem sua diversidade social, subjetiva e cotidiana preservada, sem negar a centralidade de sua condição de classe na constituição do ser jovem. Posto isto, compreende-se esses jovens a partir de sua diversidade e sua condição classista, ou seja, juventudes da classe trabalhadora.

    O mesmo recorte de classe, realizado na análise da condição juvenil, foi utilizado para ratificar a dualidade da educação, em especial da escola. A partir da divisão da sociedade imposta pelo modelo de produção capitalista, é possível aferir a divisão social do trabalho e, consequentemente, a dualidade da escola, ou seja, a escola destinada à classe trabalhadora e a escola destinada à burguesia.

    É a partir dessas concepções sobre sociedade, juventude e escola que a pesquisa sobre as expectativas dos jovens da classe trabalhadora em relação à escola foi desenvolvida.

    Dar voz aos jovens foi importante, pois foi possível compreender seus anseios em relação ao futuro e à própria escola. No início da pesquisa, minha hipótese era de que esses jovens tinham o desejo de concluir o ensino médio

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