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Aprendizagem em matemática: Registros de representação semiótica
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E-book210 páginas4 horas

Aprendizagem em matemática: Registros de representação semiótica

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Sobre este e-book

O filósofo e psicólogo de formação Raymond Duval desenvolveu importantes estudos relativos à Psicologia Cognitiva no Instituto de Pesquisa em Educação Matemática (IPEM) de Estrasburgo, na França. Tomando por base seu trabalho Sémiosis et pensée humaine, essa obra discute sua teoria dos registros de representação, que tem se mostrado importante instrumento de pesquisa no estudo da complexidade da aprendizagem de matemática. Na perspectiva de Duval, uma análise do conhecimento matemático é, essencialmente, uma análise do sistema de produção de suas representações semióticas. A maneira matemática de raciocinar e de visualizar está intrinsecamente ligada à utilização das representações semióticas, e toda comunicação em matemática se estabelece com base nelas. Assim, a abordagem cognitiva adotada por Duval, desenvolvida em estreita relação com o "funcionamento" matemático, torna sua teoria operatória por excelência. Esse livro apresenta algumas pesquisas de brasileiros com a finalidade de divulgar e de compartilhar essa teoria com os leitores, mostrando sua riqueza e suas possibilidades. - Papirus Editora
IdiomaPortuguês
Data de lançamento26 de jul. de 2017
ISBN9788544902578
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    Aprendizagem em matemática - Silvia Dias Alcântara Machado

    Machado

    1

    REGISTROS DE REPRESENTAÇÕES SEMIÓTICAS E FUNCIONAMENTO COGNITIVO DA COMPREENSÃO EM MATEMÁTICA

    Raymond Duval

    Como compreender as dificuldades muitas vezes insuperáveis que muitos alunos têm na compreensão da matemática? Qual é a natureza dessas dificuldades? Onde elas se encontram? Essas questões passaram a ter uma amplitude e uma importância particulares com a recente exigência de uma maior formação matemática inicial para todos os alunos, a fim de prepará-los para enfrentar um ambiente informático e tecnológico cada vez mais complexo. Mas, para responder a essas questões, não podemos nos restringir ao campo matemático ou à sua historia. É necessária uma abordagem cognitiva, pois o objetivo do ensino da matemática, em formação inicial, não é nem formar futuros matemáticos, nem dar aos alunos instrumentos que só lhes serão eventualmente úteis muito mais tarde, e sim contribuir para o desenvolvimento geral de suas capacidades de raciocínio, de análise e de visualização.

    A originalidade de uma abordagem cognitiva não está em partir dos erros para tentar determinar as concepções dos alunos e a origem de suas dificuldades em álgebra, em decimais, neste ou naquele conceito geométrico etc. A originalidade da abordagem cognitiva está em procurar inicialmente descrever o funcionamento cognitivo que possibilite a um aluno compreender, efetuar e controlar ele próprio a diversidade dos processos matemáticos que lhe são propostos em situação de ensino. Isso nos conduz a colocar duas questões preliminares e fundamentais, para analisar as condições e os problemas da aprendizagem em matemática.

    1. Quais sistemas cognitivos são necessários mobilizar para aceder aos objetos matemáticos e para efetuar as múltiplas transformações que constituem os tratamentos matemáticos?

    2. Esses sistemas cognitivos são os únicos a ser mobilizados por qualquer processo de conhecimento em outros domínios científicos (geologia, astronomia, física, biologia...) e práticos, ou, ao contrário, trata-se de sistemas específicos, cujo desenvolvimento e cuja aquisição são próprios da atividade matemática?

    Somente baseados na coleta de dados para essas duas questões é que podemos procurar compreender as reais causas das dificuldades dos alunos e delimitar os problemas de aprendizagem da matemática em todos os níveis. Começaremos pela segunda questão, pois ela envolve orientações diferentes daquelas que são postuladas nas abordagens didáticas neo ou pós-piagetianas: não podemos nos ater a um modelo geral comum de aquisição de conhecimentos centrado sobre a ação, as interações e os desequilíbrios como fatores principais da construção de conceitos matemáticos. Apresentaremos a seguir os dados que permitem induzir a complexidade do funcionamento cognitivo que está subjacente às atividades matemáticas das mais simples ou mais elementares. Poderemos, então, voltar à análise das dificuldades dos alunos. Enfim, apresentaremos as exigências metodológicas e também o tipo de observações necessárias para a evolução das pesquisas sobre aprendizagem de matemática.

    O que caracteriza a atividade matemática do ponto de vista cognitivo?

    Comumente, em análises do que consiste a compreensão em matemática e na procura da razão dos bloqueios de compreensão que muitos alunos experimentam, evocam-se os conceitos matemáticos e suas complexidades epistemológicas, os quais podem ser explicados pela história de suas descobertas. Porém, uma tal abordagem não é suficiente para caracterizar aquilo que faz a originalidade e a especificidade do funcionamento do pensamento em matemática em relação aos outros domínios do conhecimento científico como a astronomia, a biologia etc. A diferença entre a atividade cognitiva requerida pela matemática e aquela requerida em outros domínios do conhecimento não deve ser procurada nos conceitos – pois não há domínio de conhecimento que não desenvolva um contingente de conceitos mais ou menos complexo – mas nas duas características seguintes:

    1. A importância primordial das representações semióticas – É suficiente observar a história do desenvolvimento da matemática para ver que o desenvolvimento das representações semióticas foi uma condição essencial para a evolução do pensamento matemático. Ora, a importância das representações semióticas se deve a duas razões fundamentais. Primeiramente, há o fato de que as possibilidades de tratamento matemático – por exemplo, as operações de cálculo – dependem do sistema de representação utilizado. Por exemplo, o sistema de numeração decimal de posição oferece mais possibilidades que os sistemas grego ou romano de numeração e, no entanto, a aquisição desse sistema de numeração pelos alunos não é simples. Poder-se-ia acreditar que seu emprego desde o início do maternal torne sua utilização progressivamente transparente. Pesquisas nacionais de avaliação na França (Ministère de l’Education Nationale 1992, 1997) mostram que esse não é ainda o caso no início do collège (11-12 anos): somente um terço dos alunos parece ter compreendido o funcionamento do sistema decimal e pode verdadeiramente utilizar suas possibilidades para acertar o conjunto dos itens concernentes às operações, as mais simples, de multiplicação ou divisão dos decimais (38,45 x 10; 45 x 0,1). A seguir, há o fato de que os objetos matemáticos, começando pelos números, não são objetos diretamente perceptíveis ou observáveis com a ajuda de instrumentos. O acesso aos números está ligado à utilização de um sistema de representação que os permite designar.

    2. A grande variedade de representações semióticas utilizadas em matemática – Além dos sistemas de numeração, existem as figuras geométricas, as escritas algébricas e formais, as representações gráficas e a língua natural, mesmo se ela é utilizada de outra maneira que não a da linguagem corrente. Para designar os diferentes tipos de representações semióticas utilizados em matemática, falaremos, parodiando Descartes, de registro de representação. Mas o mais interessante é notar que existem quatro tipos muito diferentes de registros.

    Figura 1: Classificação dos diferentes registros mobilizáveis no funcionamento matemático (fazer matemático, atividade matemática)

    A originalidade da atividade matemática está na mobilização simultânea de ao menos dois registros de representação ao mesmo tempo, ou na possibilidade de trocar a todo o momento de registro de representação.

    Certamente, segundo os domínios ou as fases da pesquisa, em uma resolução de problema um registro pode aparecer explicitamente privilegiado, mas deve existir sempre a possibilidade de passar de um registro ao outro. Podemos então antecipar a hipótese, ou, em linguagem matemática, conjecturar o seguinte: a compreensão em matemática supõe a coordenação de ao menos dois registros de representações semióticas. Podemos colocar já uma primeira questão: uma tal coordenação é adquirida naturalmente pelos alunos e estudantes durante o ensino de matemática?

    Os dois tipos de transformação de representações semióticas

    Existe uma diferença-chave para analisar a atividade matemática numa perspectiva de aprendizagem (e de ensino) e não em uma perspectiva de pesquisa matemática por matemáticos. Existem dois tipos de transformações de representações semióticas que são radicalmente diferentes: os tratamentos e as conversões. Ora, quando se descreve a resolução matemática de um problema e quando se analisa a produção dos alunos, não se toma o cuidado de distingui-los.

    Figura 2: A distinção decisiva para toda análise do funcionamento cognitivo da compreensão – dois tipos radicalmente diferentes de transformação de representações semióticas

    • Os tratamentos são transformações de representações dentro de um mesmo registro: por exemplo, efetuar um cálculo ficando estritamente no mesmo sistema de escrita ou de representação dos números; resolver uma equação ou um sistema de equações; completar uma figura segundo critérios de conexidade e de simetria.

    • As conversões são transformações de representações que consistem em mudar de registro conservando os mesmos objetos denotados: por exemplo, passar da escrita algébrica de uma equação à sua representação gráfica.

    Do ponto de vista matemático, a conversão intervém somente para escolher o registro no qual os tratamentos a serem efetuados são mais econômicos, mais potentes, ou para obter um segundo registro que serve de suporte ou de guia aos tratamentos que se efetuam em um outro registro. Em outros termos, a conversão não tem nenhum papel intrínseco nos processos matemáticos de justificação ou de prova, pois eles se fazem baseados num tratamento efetuado em um registro determinado, necessariamente discursivo (Figura 1). É por isso que a conversão não chama a atenção, como se se tratasse somente de uma atividade lateral, evidente e prévia à verdadeira atividade matemática. Mas, do ponto de vista cognitivo, é a atividade de conversão que, ao contrário, aparece como a atividade de transformação representacional fundamental, aquela que conduz aos mecanismos subjacentes à compreensão. No entanto, essa diferença entre o estrito ponto matemático e o ponto de vista cognitivo não é muitas vezes levada em conta nas pesquisas em didática e no ensino de matemática. É preciso, então, se deter sobre aquilo que torna absolutamente necessário levar em conta o ponto de vista cognitivo nas análises das aprendizagens e naquelas dos processos de compreensão. Apresentaremos, aqui, duas razões que não se situam apenas no plano das observações, mas que se baseiam em uma análise teórica. A primeira pode parecer surpreendente à primeira vista.

    1. A irredutibilidade da conversão a um tratamento

    Geralmente, considera-se converter a representação de um objeto de um registro a outro, uma operação simples e local. É comum descrever a conversão como uma associação preestabelecida entre nomes e figuras (como, por exemplo, em geometria), ou reduzi-la a uma codificação. De acordo com essas ideias, o ato da conversão seria uma das formas mais simples de tratamento, pois seria suficiente aplicar regras de correspondência para traduzir. Assim, passar de uma equação à sua representação gráfica constituiria uma codificação em que seria suficiente aplicar a regra segundo a qual um ponto está associado a um par de números sobre um plano quadriculado por dois eixos graduados. Ou, ainda, passar de uma expressão em português[1] – como o conjunto dos pontos cuja ordenada é superior à abscissa – à escrita simbólica – no caso, x > y – seria igualmente uma codificação, como toda a escrita literal de relações entre os números. Uma tal visão é superficial e enganadora não somente nos fatos concernentes às aprendizagens (Duval 1988), mas igualmente de um ponto de vista teórico, pois a regra de codificação permite somente uma leitura pontual das representações gráficas. Essa regra não permite uma apreensão global e qualitativa. Ora, é essa apreensão global e qualitativa que é necessária para extrapolar, interpolar, ou para utilizar os gráficos para fins de controle, ou de exploração, relacionados aos tratamentos algébricos. Na realidade, a conversão entre gráficos e equações supõe que se consiga levar em conta, de um lado, as variáveis visuais próprias dos gráficos (inclinação, intersecção com os eixos etc.) e, de outro, os valores escalares das equações (coeficientes positivos ou negativos, maior, menor ou igual a 1 etc.), como indica o esquema abaixo (Duval 1996a, pp. 7-10):

    Há, por trás da aplicação de uma regra de codificação para passar de uma equação a um gráfico cartesiano, a necessária articulação entre as variáveis cognitivas que são específicas do funcionamento de cada um dos dois registros. Pois são essas variáveis que permitem determinar quais as unidades de significado pertinentes, que devem ser levadas em consideração, em cada um dos dois registros. A conversão das representações, quaisquer que sejam os registros considerados, é irredutível a um tratamento.

    Figura 3: Esquema de organização semiótica e do funcionamento das representações gráficas. Essa organização permite três tipos de tratamento (isto é, de operações internas aos gráficos) e dois tipos de conversão com o registro simbólico. As ligações A e A’ permitem somente uma leitura pontual dos gráficos. Somente a coordenação B permite uma apreensão global qualitativa. Mas será que somente essa coordenação permite reconhecer a forma de uma equação (ou de uma inequação), olhando a forma e a posição de retas e curvas (em um gráfico não quadriculado)? Ora, para a maioria dos alunos, essa coordenação não é jamais efetuada, mesmo ao fim do ensino médio (18 anos)

    O exemplo

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